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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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14.8 até seMPre, leda!<br />

282<br />

Pedro Viegas<br />

Faleceu no dia 4 último (outubro de 2007), no Rio, Leda Sheffer Viegas, com <strong>que</strong>m havia<br />

me casado no início da década de 60. Mulher de personalidade forte e dotada de elevado<br />

espírito solidário, entregou-se por inteira à ajuda a perseguidos políticos do regime<br />

instalado em 64 no país. Enquanto foi possível manter minha legalidade, nossa casa era<br />

ponto de passagem quase obrigatória para a<strong>que</strong>les <strong>que</strong>, na clandestinidade, se esquivavam<br />

dos órgãos repressivos. Inicialmente, a maioria era de ex-marinheiros; mais adiante, essa<br />

acolhida se estendeu a militantes de diversas organizações armadas e não armadas. Era<br />

ela, quase sempre e sem <strong>que</strong>stionamentos prévios, a abrir as portas.<br />

Leda não se intimidava facilmente. Lembro bem, certa vez nossa casa foi invadida por um<br />

bando fardado. Quebraram o <strong>que</strong> puderam e roubaram o <strong>que</strong> quiseram, seguindo a praxe,<br />

incluindo uma máquina de escrever portátil <strong>que</strong> me acompanhava em viagens de<br />

trabalho. Ela não descansou enquanto não foi ouvida na unidade do Exército responsável<br />

pela agressão. Até <strong>que</strong> um oficial, para livrar-se dela, ordenou <strong>que</strong> o acompanhasse a<br />

uma sala. Lá, apontou para uma mesa e, tão irônico quanto autoritário, berrou:<br />

- A máquina <strong>que</strong> a senhora está procurando é mesmo a<strong>que</strong>la ali. Mas daqui ela não vai<br />

sair. E dê-se por satisfeita por ter ficado com as mãos para poder trabalhar e comprar<br />

outra, se quiser. Agora, retire-se de minha frente!<br />

Ela se retirou em silêncio e sem levar, claro, a máquina de volta. Mas não se sentiu<br />

derrotada. Antes, sentiu-se vitoriosa com a confissão do roubo com um dos membros da<br />

gangue exibindo a prova do crime como troféu ao “heroico” ato. Contou-me isso rindo,<br />

parecendo feliz. Assim era.<br />

Enfrentou dois momentos particularmente duros no plano individual diante da repressão.<br />

Um, quando foi realizada a operação de libertação de companheiros presos na<br />

Penitenciária Lemos de Brito. Antes desse episódio, eu já solto e empenhado nessa tarefa,<br />

ela manteve sua rotina de todos os domingos: visitar os <strong>que</strong> lá se encontravam reclusos.<br />

Foi presa, entre outras pessoas, acusada de ter introduzido armas na prisão, o <strong>que</strong> era<br />

falso. Voltaria a ser presa quando houve o cho<strong>que</strong> do grupo <strong>que</strong> eu integrava - o

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