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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Conheceu minha mãe vestido assim, todo de branco. Ela, por sua vez, nesse dia, trajava<br />

seu melhor vestido preto. Encontraram-se num bonde quando ele pagou-lhe a passagem,<br />

pretexto <strong>que</strong> meses depois, resultou em casório. Meu pai foi da base do Partido Comunista<br />

e, com sua turma de boxeadores e capoeiristas, tornou-se uma espécie de guarda-costas<br />

de Prestes em seus comícios. Do jeito <strong>que</strong> contava essas histórias, ficou-me a certeza de<br />

<strong>que</strong> ele tinha muito orgulho em exercitar seus punhos, socando os azarados camisasverdes<br />

<strong>que</strong> ousaram perturbar tais reuniões.<br />

Conheceu Olga Benário. Levava comida para ela na prisão e saiu do partido por sua<br />

causa, quando Prestes apoiou Getúlio, o homem <strong>que</strong>, através da polícia especial, torturou<br />

tantos de seus camaradas e, ainda, enviou a brava mulher para os campos de extermínio<br />

nazistas. Nenhum argumento do partido mudou a opinião de meu pai <strong>que</strong> admirava Olga<br />

a ponto de considerá-la superior ao próprio “Cavalheiro da Esperança”.<br />

Em 19<strong>68</strong>, eu fui preso em uma manifestação e levado ao DOPS. O AI-5 já estava em vigor<br />

e o <strong>que</strong> me esperava era a Lei de Segurança Nacional. Por precaução, não carregava<br />

nenhum documento, apenas uma carteira de uma desconhecida sociedade de meditação<br />

transcendental, na qual não constava minha data de nascimento. Assim, antes de ser<br />

trancafiado, jurei <strong>que</strong> era menor de idade, chorei, esperneei, disse mil vezes <strong>que</strong> era<br />

inocente, <strong>que</strong> meu negócio era meditar e <strong>que</strong> simplesmente estava no lugar errado na<br />

hora errada. Nada disso convenceu os agentes.<br />

Minha casa em Jacarepaguá, na época, não tinha telefone e, então, o Delegado mandou,<br />

por rádio, uma mensagem para <strong>que</strong> uma rádio patrulha fosse até minha casa intimar<br />

meus pais a virem imediatamente ter com ele, prestar depoimento.<br />

A joaninha da polícia acordou meus pais com o recado e eles chegaram ao DOPS por<br />

volta de uma hora da manhã. Fui levado, então, da cela para a sala do delegado onde<br />

todos me esperavam. Minha mãe, em lágrimas, abriu sua bolsa e pegou um maço de<br />

documentos, com minha carteira de trabalho, identidade e tudo mais, no intuito de<br />

provar <strong>que</strong> eu era um estudante-trabalhador, direito e inocente. Consegui milagrosamente,<br />

com gestos, evitar <strong>que</strong> minha mãe mostrasse tais documentos. Eles estragariam meu álibi<br />

simplório: o de ser menor de idade. Minha pobre mãe ficou mais nervosa ainda, mas meu<br />

pai compreendeu, imediatamente, a situação.<br />

O Delegado, ladeado pelos dois esbirros <strong>que</strong> me prenderam, começou uma raivosa falação<br />

dirigida principalmente ao meu pai. Dizia:<br />

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