06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

seria inocentado no dia seguinte e <strong>que</strong> tudo voltaria a ser como dantes. No fundo eu<br />

também <strong>que</strong>ria acreditar nisso.<br />

Assim <strong>que</strong> Celerino voltou para casa, saímos para ir a outro aparelho e eu agarrei o<br />

primeiro telefone <strong>que</strong> encontrei na rua. Evitei chamar para o telefone de minha casa,<br />

notoriamente grampeado, dis<strong>que</strong>i para a casa de meu amigo Luiz Carlos e falei com sua<br />

mãe, dona Laila.<br />

- Como foi a festa, dona Laila? - falei em um código meio óbvio.<br />

- Não foi bem - disse ela, ignorando os códigos - Todos foram condenados a dois anos de<br />

prisão.<br />

- Já imaginava - disse eu, embora a garganta me secasse imediatamente - Abrace todos<br />

lá em casa. - Desliguei.<br />

- Como foi?- perguntou-me Celerino.<br />

Tentei parecer indiferente.<br />

- Peguei dois anos. Agora estou na clandestinidade. Vamos?<br />

Minha aparente indiferença a uma radical mudança de vida impressionou o Celerino,<br />

mas ele não disse nada. Na verdade, eu estava em estado de cho<strong>que</strong>, a ficha caindo<br />

devagar e o sentimento de ter entrado num caminho sem volta foi-se formando na<br />

minha cabeça. Fora tudo muito rápido. Em janeiro, eu era um presidente de Diretório<br />

Acadêmico, caso raro de militante independente de partidos, estudante quase formado<br />

em Engenharia Química. Oito meses depois, eu era candidato à diretoria da UNE,<br />

condenado e procurado pelo Exército e quadro em ascensão em um dos partidos mais<br />

radicais na luta contra a ditadura. Não foram opções fúteis, mas me preocupava o quanto<br />

eu tinha de dúvidas sobre as políticas da AP, para não falar dos outros partidos. Não fosse<br />

a repressão ter precipitado as minhas opções, eu, certamente, teria seguido na militância,<br />

mas os caminhos poderiam ter sido outros. Teria sido melhor ou pior? Quem sabe?<br />

Dormi em na casa de um militante da AP da engenharia da Universidade Mackenzie,<br />

perto do Pacaembu. Fui apresentado como João Carlos, estudante de passagem por São<br />

Paulo, mas não enganamos ninguém. Os pais dele fingiram não me reconhecer, mas<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - a BaTalHa Da Maria aNTôNia (3/10/19<strong>68</strong>) e o CoNGreSSo De iBiúNa (12/10/19<strong>68</strong>) 203

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!