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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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<strong>que</strong> circulou por a<strong>que</strong>la rua, <strong>que</strong> subiu e desceu a<strong>que</strong>las escadas, discursou e inflamou<br />

nossa revolta contra a ditadura. Declarações como “Zé Dirceu, eu te amo”, “Zé Dirceu,<br />

paixão de minha vida” conviviam pacificamente na<strong>que</strong>la época com “Abaixo a Ditadura”,<br />

“Fora milicos” e “Viva Che”. Ainda hoje, quando nos reunimos, comentamos essa paixão<br />

coletiva pelo Zé. E tem mais: sim, confesso, fomos, no Brasil, os precursores das pichações<br />

<strong>que</strong> hoje tantos condenam. A diferença é <strong>que</strong> nossas pichações traduziam nossa<br />

preocupação com o momento difícil <strong>que</strong> o país vivia e, nisso, difere muito das atuais.<br />

Foi também na<strong>que</strong>le prédio <strong>que</strong> um português bonito instalou uma banca de livros. Seu<br />

Jaime, além de ter os livros de <strong>que</strong> os alunos precisavam para os cursos, era capaz de<br />

atender a todos nossos pedidos de obras, muitas vezes raras. Sempre solícito, sempre<br />

elegante, era capaz de ficar horas conversando sobre literatura. Tornou-se uma pessoa<br />

ines<strong>que</strong>cível para mim.<br />

Outra pessoa <strong>que</strong> para sempre estará gravada tanto na memória quanto em minha<br />

saudade é Helenira Resende. Alta, magra, muito alegre, muito doce, foi ela a primeira<br />

pessoa a me falar de Maria Bethânia. Ela foi ver o show “Opinião” em <strong>que</strong> a cantora<br />

baiana substituiu Nara Leão, e voltou encantada:<br />

- Riso, você não acredita no <strong>que</strong> a<strong>que</strong>la mulher é! É uma deusa! Ela não é alta, mas<br />

quando sobe ao palco torna-se enorme. Linda! Você tem de ir vê-la!<br />

Não lembro exatamente o ano, talvez tenha sido em <strong>68</strong> <strong>que</strong> ela desapareceu da faculdade.<br />

Deixei um bilhete no grêmio, mas não recebi retorno. Só em 76, fi<strong>que</strong>i sabendo o <strong>que</strong> lhe<br />

acontecera.<br />

Fui ao lançamento de um livro na sede da Revista Escrita e comprei uma publicação<br />

sobre a guerrilha do Araguaia. Cheguei em casa tarde da noite e, antes de dormir, comecei<br />

a ler a revista. De repente, levei um susto: entre as fotos dos guerrilheiros desaparecidos,<br />

estava a foto de minha amiga. Não consegui dormir na<strong>que</strong>la noite. Reconstituí como em<br />

um filme, várias imagens: ela discutindo com um professor, defendendo Castro Alves. Eu<br />

sentada, comendo bolo Pullmann com Nescafé na pe<strong>que</strong>na mesinha do seu apartamento,<br />

na Rua Jaguaribe. Ela me mostrando algum texto <strong>que</strong> escrevera, falando nas assembleias...<br />

Uma dor, uma saudade muito grande invadiu meu peito.<br />

Agora, sabia o verdadeiro motivo do seu afastamento. Onde estaria ela? Teria fugido para<br />

algum lugar de onde não pudesse se comunicar com os familiares e com os amigos ou a<br />

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