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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Em março de 1966, chegou o dia em <strong>que</strong> resolvi sumir com um dos meus livros mais<br />

preciosos segundo meu critério – o Curso de Filosofia do Roger Garaudy (nunca mais<br />

encontrei nas livrarias do meu mundo a<strong>que</strong>le livro tão importante para mim). Saí do<br />

Banco do Brasil às 18h, onde trabalhava há mais de 10 anos, com o livro debaixo do<br />

braço. Dobrei à es<strong>que</strong>rda, o ponto do meu ônibus era na Praça Quinze. A ideia de<br />

perseguição me perseguia, e senti alguém me seguir de perto.<br />

Entrei na fila, entrei no ônibus e fi<strong>que</strong>i quieto lá atrás. O suposto policial do DOPS <strong>que</strong><br />

estaria no meu encalço entrou no ônibus e sentou-se três bancos à minha frente, do lado<br />

direito. Quatro ou cinco vezes virou-se e me encarou. Numa delas, observei <strong>que</strong> ele olhou<br />

para o livro <strong>que</strong> eu carregava e deixou perceber um leve sorriso, um ameaçador esgar.<br />

Minha conclusão foi imediata, a<strong>que</strong>le senhor seria da Polícia Política e Social. Até o meu<br />

destino, ainda faltavam 15 minutos, em <strong>que</strong> nossos olhares se cruzaram duas vezes ou<br />

mais, por<strong>que</strong> ele se virava para trás repetidamente.<br />

Logo a moça ao meu lado, estudante do Pedro II, puxou a campainha para saltar.<br />

Levantou-se e caminhou para a porta. O policial também se levantou, mas andou para<br />

trás, me pediu licença e sentou-se junto de mim, no lugar em <strong>que</strong> a garota estivera.<br />

Pensei: “estou frito, vou preso, <strong>que</strong> ideia andar com este livro!” O policial me pegou o<br />

braço e senti seus dedos me apertarem os músculos. Seriam as garras da ditadura. As<br />

unhas do torturador. O DOPS.<br />

Ele me perguntou, com a mão presa em meu braço:<br />

- Qual o seu nome?<br />

Sua voz, macia, doce, me aliviou, não podia ser da Polícia!<br />

Fi<strong>que</strong>i indignado, sem saber se era pelo assédio sexual ou pelo medinho <strong>que</strong> o pobre<br />

coitado me despertava. Levantei-me indignado, com a intenção de sumir dali. Senti o<br />

infeliz atrás de mim. Já estávamos na Praça Saens Peña, o ponto final era ali, em frente<br />

ao cine Metro.<br />

Quando saltei, ele estava pertinho e ouvi perfeitamente o <strong>que</strong> ele disse:<br />

-Vocês são assim mesmo. Dão bola, dão bola e depois fogem com medo da gente...<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - oPreSSão Da DiTaDUra 149

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