06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

amainar as bases fluminenses, o Comitê Central enviou Apolônio de Carvalho para<br />

Niterói. Com a fama de ex-combatente da guerra civil espanhola e da resistência francesa,<br />

o mitológico dirigente do Partido chegou para implantar o <strong>que</strong> ele chamava de “trabalho<br />

especial”. Boa praça, acessível e culto, o Lima (esse era o nome de guerra do Apolônio)<br />

começou a nos ensinar táticas e estratégias militares. Num quadro-negro, ele desenhava<br />

os soldados em suas posições no campo de batalha e falava de trincheiras, infantaria,<br />

cavalaria e outras teorias ensinadas na Academia Militar das Agulhas Negras. Caramba!<br />

A gente não <strong>que</strong>ria aprender aquilo. Nós <strong>que</strong>ríamos partir logo para a fabricação de<br />

bombas molotov e de minas. Queríamos lidar com dinamite e aprender a atirar. Apolônio,<br />

porém, continuava com suas teorias militares naquilo <strong>que</strong> o Comitê Central chamava de<br />

“trabalho especial” ou “Tereza”, segundo o vocabulário de Apolônio. O tarimbado Lima<br />

costumava dar nome de mulher para cada trabalho <strong>que</strong> ele desenvolvia.<br />

Na<strong>que</strong>le primeiro semestre de 64, eu estreitei meus contatos com os trotskistas do PORT<br />

- Partido Operário Revolucionário dos Trabalhadores. Eles seguiam as teorias de J.<br />

Posadas, codinome do argentino Homero Cristalli Frasnelli. Em Niterói, resumiam-se a<br />

um grupo pe<strong>que</strong>no. A gente se encontrava sob a marquise do edifício do antigo Banco<br />

Predial. Meu contato mais fre<strong>que</strong>nte era com Helena, uma loira de cabelos encaracolados<br />

e olhos claros. Parecia Mae West, a<strong>que</strong>la atriz dos velhos filmes em preto e branco <strong>que</strong><br />

mexeu com o imaginário e a libido de muita gente. Pois bem, esta beleza de trotskista<br />

mexeu fundo com meus sentimentos e quase me recrutou para o PORT. E olha <strong>que</strong> ali<br />

mesmo, em 1962, debaixo da<strong>que</strong>la mesma marquise eu havia rejeitado um convite de<br />

Pedro Pomar e Henri<strong>que</strong> Oest para entrar no recém fundado PC do B.<br />

Helena morava nas proximidades da estação rodoviária de Niterói e seu pai era oficial do<br />

Exército.<br />

- Um profissional com ideias nacionalistas - dizia ela, <strong>que</strong> já percebia minha atração por<br />

sua beleza e capacidade intelectual. Na<strong>que</strong>la altura do campeonato, eu já conhecia as<br />

teses e comentários de J. Posadas de cor e salteado. Era, por assim dizer, um experto em<br />

jotaposadismo.<br />

Num de nossos encontros, avancei o sinal e dei uma rasteira no temor reverencial <strong>que</strong> eu<br />

tinha da<strong>que</strong>le monumento <strong>que</strong> defendia com ardor a classe operária e pregava a<br />

revolução mundial. Tentei um contato físico junto a uma das imensas colunas <strong>que</strong><br />

sustentam a marquise do Banco Predial em toda sua largura e comprimento. “Não”, disse<br />

minha doce trotskista enquanto encostava o indicador no meu peito.<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - oPreSSão Da DiTaDUra 139

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!