06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Dentro do espírito de <strong>que</strong> o homem é um animal político e o político é um animal<br />

humano, vou recortar aqui três momentos de Gregório Bezerra <strong>que</strong> considero de<br />

importância para desenhar o seu perfil de revolucionário e de pessoa.<br />

Primeiro Momento - Gregório me disse <strong>que</strong> fumava, mas um dia, vendo um preso político,<br />

durante a ditadura Vargas, se agachar e se esgueirar, tentando apanhar pela grade da<br />

cela uma ponta de cigarro largada no chão por um policial, sentiu uma repugnância tão<br />

grande <strong>que</strong> jurou nunca mais fumar na sua vida. E cumpriu.<br />

Segundo Momento - Quando visitei Gregório pela primeira vez, na Casa de Detenção do<br />

Recife, ouvi dele a lamentação: “Em 35, tínhamos armas e não tínhamos massa; em 64,<br />

tínhamos massa e não tínhamos armas”. Era o lamento de um guerreiro impossibilitado<br />

de lutar, e não a racionalização filisteia dos <strong>que</strong> interpretaram o golpe de 64, não como<br />

uma resposta inevitável das classes dominantes ante o crescimento do movimento de<br />

massas, para a qual era preciso <strong>que</strong> se estivesse preparado, mas como um efeito da<br />

radicalização de alguns setores (minoritários) do movimento popular. Essa leitura<br />

guerreira da derrota sofrida com o golpe de 64 é ratificada por Gregório no segundo<br />

volume das suas memórias.<br />

Terceiro Momento - Gregório estava na cidade de Palmares, na Zona da Mata canavieira<br />

de Pernambuco, quando eclodiu o golpe. Alguns dirigentes camponeses o procuraram e<br />

sugeriram <strong>que</strong> ficassem em assembleia permanente na sede do sindicato rural. Gregório<br />

lhes disse <strong>que</strong> o tempo não era mais para aquilo. Saíssem de casa, avisassem às famílias<br />

e fossem pra dentro do mato, <strong>que</strong> ele iria no Recife trazer armas para a resistência. Foi e<br />

voltou de mãos abanando, por<strong>que</strong> armas não existiam. Segundo afirmação de David<br />

Capistrano na minha primeira reunião clandestina no Recife, para a rearticulação do PCB,<br />

o revólver do próprio Gregório só tinha quatro balas. Quando partiu para o Recife atrás<br />

de armas, Gregório Bezerra cumpriu antes uma tarefa <strong>que</strong> também considerava<br />

importante: foi entregar uns chocolates <strong>que</strong> havia prometido a uma das filhas do<br />

companheiro Severino Aguiar, pai de Ivan Aguiar, estudante de engenharia metralhado<br />

em praça pública no Recife, no dia do golpe, juntamente com o estudante do Colégio<br />

Pernambucano, Jonas Barros.<br />

Entre as outras, esta é a imagem de Gregório Bezerra <strong>que</strong> eu desejo enaltecer agora, e<br />

<strong>que</strong> gostaria <strong>que</strong> se reproduzisse nas gerações do presente e do futuro: a de um<br />

revolucionário <strong>que</strong> se preocupava em levar armas para os combatentes e chocolates para<br />

as crianças.<br />

118

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!