GNOSE ALEM DA RAZÃO O FENÔMENO DA SUGESTÃO JEAN ...
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em condições de curar outra pessoa graças ao magnetismo animal e sua aptidão de fazer o paciente compartilhar dessa convicção, eram outros tantos fatores que desempenhavam papel importante. Além disso, Puységur achava evidente que, mergulhado no sono magnético, o adormecido ficava excepcionalmente apto a acolher as sugestões, em particular as referentes à sua cura. À teoria unicamente fluídica e fisiológica sustentada pelo menos em público por Mesmer, Puységur, e seus adeptos depois dele, não se considerando comprometidos com o segredo,. acrescentaram e com freqüência opuseram a teoria chamada de animista ou psicológica. Em conferência pronunciada em agosto de 1785 na loja maçô-nica de Estrasburgo, onde estava estacionado o regimento sob seu comando, Puységur afirmava: "Toda a doutrina do magnetismo animal resume-se a estas duas palavras: creia e queira. Eu creio que tenho o poder de acionar o princípio vital dos meus semelhantes. Eu quero fazer uso desse poder: eis toda a minha ciência e todos os meus meios". Na realidade, e sem tê-la identificado como fenômeno específico, Puységur já estava bem a par do papel e da importância da sugestão, em dois de seus componentes muito importantes: confiança do magnetizador na existência e na eficácia do magnetismo animal em cada caso, e vontade decidida de utilizá-lo para curar outra pessoa. A isto, em seguida, Puységur acrescentou a crescente convicção tanto da importância da relação afetiva entre magnetizador e magnetizado, como da necessidade de preservar este último da dependência em que era colocado, com relação ao magnetizador, pela regressão psicológica devida à indução sonambúlica: a generosidade natural, a grande sensibilidade de Puységur e o seu respeito pelas pessoas fizeram-no pressentir instintivamente a diferença existente entre o sono magnético e a hipnose. Voltaremos a isto. Já se insistiu muito a respeito da oposição doutrinária entre Mesmer e Puységur. E com muito exagero, em nossa opinião. A principal diferença entre os dois homens está sem dúvida em que um dizia abertamente aquilo que o outro acreditava dever calar, presumivelmente pela preocupação de evitar uma publicidade que ele considerava prematura. Mas um e outro estavam convencidos das virtudes curativas do fluido animal. Um e outro praticavam, e bastante, a sugestão terapêutica. Um e outro, enfim, usavam o sonambulismo artificial em diferentes graus, atribuindo-lhe maior ou menor importância: Puységur sem dúvida o "descobriu" em 1784, mas Mesmer utilizou-o antes dele para fins terapêuticos, mesmo se de forma muito empírica e provavelmente sem ter entendido claramente a especificidade e a importância do fenômeno. Em todo caso, em suaMêmoire, de 1799, Mesmer insiste longamente a respeito da importância do sono magnético, coluna-mestra, segundo ele, do magnetismo animal.
As razões de certas dissemelhanças entre Mesmer e Puységur, e que sem dúvida explicam o deslize incontestável da doutrina do primeiro para a prática do segundo, estão em parte relacionadas com a diferença de temperamento e de personalidade de ambos. Puységur era desinteressado, modesto, fundamentalmente filantropo e também tão pouco necessitado quanto possível de publicidade e de afirmação pessoal, qualidades estas que nem sempre parecem ter sido o forte de Mesmer. É verdade que Puységur, grande senhor que era, não teve de lutar, como o precisou Mesmer, ao mesmo tempo para construir sua fortuna e tentar assegurar o êxito de suas idéias. A prática de Puységur certamente era bem mais "modesta" que a de Mesmer, muito menos autoritária, muito menos preocupada com efeitos espetaculares, e também mais respeitadora de certos mecanismos naturais de cura, em particular no trabalho com o sono magnético. E igualmente mais humana, sem dúvida. A relação entre magnetizador e magnetizado era, segundo Puységur, tanto ou mais carregada de afetividade do que o fluido cósmico e impessoal ao qual Mesmer pretendia ligá-la, e muito exclusivamente. Pode-se legitimamente perguntar, com Ellenberger, por que, senão sempre, pelo menos de maneira geral, "a mesma técnica dos passes suscitava crises aos pacientes de Mesmer enquanto mergulhava os de Puységur no sono magnético".1 A diferença dizia respeito à condição social dos pacientes, responde Ellenberger, sem nos convencer nem um pouco. Segundo ele, as ilustres senhoras e os burgueses que se tratavam com Mesmer tinham suas crises porque no seu meio social estavam na moda as manifestações espetaculares de nervosismo e hipocondria, enquanto os humildes camponeses ou os soldados de seu regimento de quem Puységur tratava adormeciam, sempre segundo Ellenberger, pelo respeito e submissão ancestrais que lhes inspirava a própria pessoa do coronel-marquês, aureolado do prestígio ligado à sua condição e às suas funções. A isso se somava a confiança afetuosa e total que os pacientes dedicavam espontaneamente a Puységur, bom, desinteressado, caloroso, infinitamente menos dominador do que Mesmer e, provavelmente, animado também pela visão do bem do próximo e pelo senso do poder curativo da natureza bem mais profundos do que os que inspiravam Mesmer. É antes a estes últimos fatores e em definitivo a uma diferença de atitude íntima que estamos tentados a atribuir a diferença dos resultados — crises ou sono magnético — da técnica sensivelmente igual usada por Mesmer e Puységur, embora a disparidade dos meios sociais dos pacientes e sobretudo o tipo de relação ao mesmo tempo social e pessoal que mantinham com o magnetizador também tenham desempenhado importante papel. Resulta em definitivo que só uma sugestão suave — e a de Mesmer certamente não o era — pode estabelecer o sono magnético.
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particular as referentes à sua cura. À teoria unicamente fluídica e<br />
fisiológica sustentada pelo menos em público por Mesmer, Puységur, e<br />
seus adeptos depois dele, não se considerando comprometidos com o<br />
segredo,. acrescentaram e com freqüência opuseram a teoria chamada de<br />
animista ou psicológica.<br />
Em conferência pronunciada em agosto de 1785 na loja maçô-nica de<br />
Estrasburgo, onde estava estacionado o regimento sob seu comando,<br />
Puységur afirmava: "Toda a doutrina do magnetismo animal resume-se a<br />
estas duas palavras: creia e queira. Eu creio que tenho o poder de acionar o<br />
princípio vital dos meus semelhantes. Eu quero fazer uso desse poder: eis<br />
toda a minha ciência e todos os meus meios".<br />
Na realidade, e sem tê-la identificado como fenômeno específico, Puységur<br />
já estava bem a par do papel e da importância da sugestão, em dois de seus<br />
componentes muito importantes: confiança do magnetizador na existência<br />
e na eficácia do magnetismo animal em cada caso, e vontade decidida de<br />
utilizá-lo para curar outra pessoa. A isto, em seguida, Puységur<br />
acrescentou a crescente convicção tanto da importância da relação afetiva<br />
entre magnetizador e magnetizado, como da necessidade de preservar este<br />
último da dependência em que era colocado, com relação ao magnetizador,<br />
pela regressão psicológica devida à indução sonambúlica: a generosidade<br />
natural, a grande sensibilidade de Puységur e o seu respeito pelas pessoas<br />
fizeram-no pressentir instintivamente a diferença existente entre o sono<br />
magnético e a hipnose. Voltaremos a isto.<br />
Já se insistiu muito a respeito da oposição doutrinária entre Mesmer e<br />
Puységur. E com muito exagero, em nossa opinião. A principal diferença<br />
entre os dois homens está sem dúvida em que um dizia abertamente aquilo<br />
que o outro acreditava dever calar, presumivelmente pela preocupação de<br />
evitar uma publicidade que ele considerava prematura. Mas um e outro<br />
estavam convencidos das virtudes curativas do fluido animal. Um e outro<br />
praticavam, e bastante, a sugestão terapêutica. Um e outro, enfim, usavam<br />
o sonambulismo artificial em diferentes graus, atribuindo-lhe maior ou<br />
menor importância: Puységur sem dúvida o "descobriu" em 1784, mas<br />
Mesmer utilizou-o antes dele para fins terapêuticos, mesmo se de forma<br />
muito empírica e provavelmente sem ter entendido claramente a<br />
especificidade e a importância do fenômeno. Em todo caso, em<br />
suaMêmoire, de 1799, Mesmer insiste longamente a respeito da<br />
importância do sono magnético, coluna-mestra, segundo ele, do<br />
magnetismo animal.