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AIDS 25 ANOS AIDS 25 ANOS - Portal ENSP - Fiocruz

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PÓS-TUDO<br />

RADIS 40 DEZ/2005<br />

[ 35 ]<br />

“Modernidade” ou “promiscuidade” no SUS?<br />

Luiz Marcos de Oliveira Silva *<br />

Adécada de 1990 no Brasil foi<br />

marcada pela implementação<br />

de uma contra-reforma conservadora<br />

de cunho neoliberal<br />

— considerada pela nossa elite cosmopolita<br />

como uma grande possibilidade<br />

de acesso à “modernidade” —, que visou,<br />

entre outras coisas, obstruir a consolidação<br />

dos novos direitos formalmente<br />

assegurados pela Constituição de<br />

1988. A repercussão foi significativa. A<br />

descentralização dessas políticas deuse<br />

pelo “desmonte” do aparato burocrático<br />

sem a devida articulação do<br />

governo central, e o desenho dessa<br />

nova agenda política apontou para<br />

um distanciamento das concepções<br />

universalistas e equânimes de direitos<br />

sociais, acentuando-se a seletividade,<br />

dirigida aos grupos “mais carentes”.<br />

Essa estratégia de ataque à presença<br />

do Estado adquiriu, desde fins<br />

da década de 1990, ainda maior densidade,<br />

com novo ciclo de reformas<br />

do sistema de proteção social para a<br />

desmontagem da já insuficiente estrutura<br />

de Bem-Estar Social do país.<br />

Uma das características mais<br />

marcantes do setor de saúde brasileiro<br />

é a politização dos seus atores.<br />

Talvez por isso sejam mais difíceis e<br />

conflituosas as tentativas de atacar<br />

as bases do sistema de saúde. Ainda<br />

assim, vê-se o aprofundamento de<br />

uma lógica cruel: ao mesmo tempo<br />

em que aumentam as atribuições de<br />

estados e municípios e as necessidades<br />

da população, o orçamento diminui<br />

em termos reais per capita, além<br />

das dificuldades de gestão, com a Lei<br />

de Responsabilidade Fiscal e a crescente<br />

busca de superávits primários.<br />

Os interesses do setor privado, associados<br />

à crise financeira do Estado e<br />

às políticas neoliberais, fizeram com<br />

que a universalização do acesso à saúde<br />

em todos os níveis de complexidade<br />

não ocorresse de forma satisfatória.<br />

* Economista, mestrando em Desenvolvimento<br />

Econômico na área de Economia<br />

Social e do Trabalho no Instituto de<br />

Economia da Unicamp.<br />

Ao desvalorizar o serviço público e defender<br />

a eficácia do setor privado, a<br />

lógica de mercado legitimou a desigualdade<br />

no acesso à saúde. Aconteceu<br />

uma “explosão” de empresas de medicina<br />

de grupo. O novo padrão de intervenção<br />

do Estado trouxe “inovações”<br />

expressivas na conformação do<br />

setor de saúde, que redefiniram a articulação<br />

entre as diversas modalidades<br />

de prestação de serviços de saúde,<br />

tanto públicas quanto privadas.<br />

Assim, ganharam importância os<br />

planos e seguros de saúde, as instituições<br />

do chamado “terceiro setor” —<br />

articuladas com o setor público na prestação<br />

de serviços de saúde —, o Programa<br />

Saúde da Família e os Agentes Comunitários<br />

de Saúde, que se autonomizam<br />

em sua lógica preventiva e assistencial.<br />

A lógica da contratação de terceiros<br />

em lugar da contratação direta<br />

de empregados assalariados no setor<br />

privado é relativamente antiga.<br />

Pode-se dizer que é um pouco mais<br />

recente a tendência de contratação<br />

ou “credenciamento” de profissionais<br />

autônomos para a provisão de serviços.<br />

Mas a irregularidade está associada<br />

à intermediação de mão-de-obra<br />

entre empresas privadas e instituições<br />

públicas, porque a terceirização tem<br />

sido a resposta formal que os setores<br />

fundamentados no regime salarial encontraram<br />

para evadir-se dos custos<br />

indiretos do trabalho. Entre as formas<br />

de subcontratação no SUS há as cooperativas<br />

de trabalho, bolsas de trabalho,<br />

contratos de gestão com or-<br />

ganizações sociais, convênios com<br />

Oscips e com empresas privadas,<br />

“triangulações” de fundações de<br />

apoio, gestão de consórcios municipais<br />

por entidades privadas não-lucrativas<br />

e contratos temporários.<br />

A forma de terceirização mais discutida<br />

foi a cooperativa de trabalho,<br />

regulamentada em 1994. Por essa via,<br />

não existe vínculo empregatício entre<br />

a cooperativa e o associado; logo,<br />

esses trabalhadores não têm registro<br />

em carteira ou qualquer outro direito<br />

trabalhista assegurado. Tanto no<br />

setor privado quanto no público, as<br />

cooperativas têm sido usadas como forma<br />

de desonerar o contratante de<br />

uma gama de encargos sociais e fiscais.<br />

No setor público é irregular o<br />

simples fato de que esta forma de<br />

contratação fere os dispositivos constitucionais<br />

de mérito e publicidade<br />

exigidos para a entrada no serviço<br />

público, descaracterizando o vínculo<br />

empregatício.<br />

O problema não é apenas a subcontratação<br />

em si — e a conseqüente<br />

diminuição do assalariamento e da<br />

proteção social —, mas principalmente<br />

a terceirização dos serviços ou de trabalho<br />

vivo. Em outras palavras, a<br />

terceirização da própria atividade-fim.<br />

Nesses casos, em que a contratação<br />

de terceiros é realizada de forma contínua,<br />

tem características de pessoalidade,<br />

dependência, subordinação e<br />

onerosidade, fica evidente a existência<br />

da relação de emprego.<br />

As relações de trabalho no setor<br />

de saúde, nos últimos anos, têm se tornado<br />

cada vez mais precárias em função<br />

da proliferação dessas novas formas de<br />

contratação e vinculação dos trabalhadores,<br />

o que acaba por se refletir numa<br />

completa ausência de política salarial<br />

para o setor — como um plano de carreiras<br />

—, uma elevada rotatividade nos<br />

postos de trabalho, problemas de ordem<br />

jurídica e de regulação do ingresso<br />

no serviço público.<br />

Com isso, deve-se procurar solução<br />

para diminuir a flexibilidade e a precariedade<br />

das formas de contratação, uma<br />

vez que é amplamente conhecida a<br />

assimetria entre as partes envolvidas nos<br />

contratos de trabalho.

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