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sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina

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ninguém que morasse num lugar assim. Depois <strong>de</strong> algum tempo<br />

procurando, <strong>de</strong>sanimada com a corda <strong>de</strong>pendurada no pescoço como um<br />

rabo <strong>de</strong> gato amarelo e sem saber on<strong>de</strong> amarrá-la, sentei na cama <strong>de</strong> minha<br />

mãe e tentei puxá-lo com as mãos. Mas cada vez que apertava bem a<br />

corda, a ponto <strong>de</strong> sentir um zumbido no ouvido e uma onda <strong>de</strong> sangue no<br />

rosto, minhas mãos soltavam e eu me recobrava. Percebi então que meu<br />

corpo tinha uma série <strong>de</strong> pequenos truques, como esse <strong>de</strong> fazer com que —<br />

no último instante da salvação — minhas mãos soltassem, pois, se<br />

continuassem apertando, eu morreria na hora. O que eu precisa fazer era<br />

atacar <strong>de</strong> surpresa com qualquer sentido que me restasse, ou ficaria presa<br />

naquela estúpida carcaça durante cinqüenta anos, sem qualquer sentido. E<br />

quando as pessoas percebessem que eu estava maluca — acabariam<br />

<strong>de</strong>scobrindo, mais cedo ou mais tra<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> minha mãe não abrir a<br />

boca para falar nisso. Então, as pessoas iriam convencê-la a, em vez <strong>de</strong> me<br />

vigiar, me internar num hospício on<strong>de</strong> eu pu<strong>de</strong>sse me curar. Só que o meu<br />

caso não tinha cura. 133<br />

Do humor sórdido ao <strong>de</strong>boche da vingaça sobre Buddy Willard que Esther em<br />

silêncio, apenas com seu olhar, festeja a <strong>de</strong>sgraça alheia. Vejamos:<br />

A última coisa que eu esperava era que Buddy estivesse gordo. Sempre<br />

que imaginava-o no sanatório, via os ossos encovados <strong>de</strong> seu rosto e os<br />

olhos queimando em órbitas quase <strong>de</strong>scarnadas. Mas tudo que era côncavo<br />

em Buddy tinha <strong>de</strong> repente virado convexo. Uma barriga <strong>de</strong> moringa<br />

apontava por baixo da apertada camisa <strong>de</strong> náilon branco e suas bochechas<br />

estavam redondas e coradas como uma fruta <strong>de</strong> marzipã. A risada <strong>de</strong>le<br />

parecia gorda. Os olhos <strong>de</strong> Buddy encontraram os meus. — É a comida —<br />

disse ele. — Eles nos cevam o dia inteiro e <strong>de</strong>pois nos mandam <strong>de</strong>itar. Mas<br />

agora já permitem que eu an<strong>de</strong> algumas vezes por dia: não se preocupe,<br />

emagreço em duas semanas. Levantou, sorrindo como um alegre anfitrião.<br />

— Querem ver meu quarto? 134<br />

A ironia <strong>de</strong> Esther <strong>de</strong>ixa transparecer em Buddy Willard a certeza <strong>de</strong> achar<br />

uma resposta para o olhar in<strong>de</strong>cente que Esther escon<strong>de</strong> sob a visão da pieda<strong>de</strong> por<br />

Buddy estar em um sanatório, por ter contraído tuberculose, mas não por tê-la feito<br />

sofrer durante um tempo.<br />

Dos muitos momentos diferenciados na narrativa, Esther mostra-se múltipla,<br />

não é finita em sua plenitu<strong>de</strong>. Locomove-se aqui e acolá, na corda bamba, na ponte<br />

pêncil, nos abismos possíveis criados na mente <strong>de</strong> Esther e se <strong>de</strong>senda<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> todos,<br />

porque Esther é assim, é assim que Esther é. Neste último momento da análise<br />

fechamos ilustrando com um dos momentos em que Esther se encontra internada.<br />

133 PLATH, Sylvia. A redoma <strong>de</strong> vidro. Ibid., 1999, p. 174.<br />

134 PLATH, Sylvia. A redoma <strong>de</strong> vidro. Ibid., 1999, p. 100.

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