sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina
sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina
sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
O apagamento do ―eu‖ equivale à recusa da realida<strong>de</strong>, isso é, à fragilida<strong>de</strong> da<br />
mente humana em não aceitar que o real possa ser uma prerrogativa <strong>de</strong> reconhecer na<br />
realida<strong>de</strong> aquilo que não concebemos ou não é aceito. Segundo Rosset:<br />
Da mesma forma como o real só é admitido sob certas condições e apenas<br />
até certo ponto: se ele abusa e mostra-se <strong>de</strong>sagradável, a tolerância é<br />
suspensa. Uma interrupção <strong>de</strong> percepção coloca então a consciência a<br />
salvo <strong>de</strong> qualquer espetáculo in<strong>de</strong>sejável. 95<br />
Há ainda muitas possibilida<strong>de</strong>s do apagamento do ―eu‖ ou a recusa em aceitar<br />
a realida<strong>de</strong> tal como é. Essas recusas mostram-se <strong>de</strong> várias maneiras.<br />
A realida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser recusada radicalmente e consi<strong>de</strong>rada pura e simplesmente<br />
como não ser o fator real. Rosset <strong>de</strong>fine:<br />
Isto — que julgo perceber — não existe. As técnicas a serviço <strong>de</strong> uma tal<br />
negação radical são, aliás, elas mesmas muito diversas. Posso aniquilar o<br />
real aniquilando a mim mesmo: fórmula do suicídio, que parece a mais<br />
segura <strong>de</strong> todas, ainda que, apesar <strong>de</strong> tudo, um minúsculo coeficiente <strong>de</strong><br />
incerteza pareça vinculado a ela. 96<br />
A loucura segue-se também como elemento capaz <strong>de</strong> negar o eu ou recusar a<br />
realida<strong>de</strong> para não ser reconhecida como um incômodo, <strong>de</strong>ssa maneira exemplifica<br />
Rosset:<br />
Em troca da perda <strong>de</strong> meu equilíbrio mental, obterei uma proteção mais ou<br />
menos eficaz em relação ao real: afastamento provisório no caso do<br />
recalcamento <strong>de</strong>scrito por Freud (subsistem vestígios do real em meu<br />
inconsciente), ocultação total no caso da forclusão <strong>de</strong>scrita por Lacan.<br />
Posso, enfim, sem sacrificar nada da minha vida bem <strong>de</strong> minha luci<strong>de</strong>z,<br />
<strong>de</strong>cidir não ver um real do qual, sob um outro ponto <strong>de</strong> vista, reconheço a<br />
existência: atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> cegueira voluntária. 97<br />
No romance A Redoma <strong>de</strong> Vidro há um reconhecimento do real e a negação<br />
<strong>de</strong>le, é o caso <strong>de</strong> Esther/Doreen/Betsy/Joan. De maneira que Esther reconhece em<br />
Doreen seu lado inquieto, sua sexualida<strong>de</strong> em grau <strong>de</strong> exposição, ao contrário <strong>de</strong><br />
95 ROSSET, Clément. O real e seu duplo: ensaio sobre a ilusão. Op. cit., 1976, p. 11.<br />
96 ROSSET, Clément. O real e seu duplo: ensaio sobre a ilusão. Ibid., 1976, p. 12.<br />
97 ROSSET, Clément. O real e seu duplo: ensaio sobre a ilusão. I<strong>de</strong>m, 1976, p. 12.