sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina
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Aí, Joan, disse agressiva:<br />
— Eu jamais gostei <strong>de</strong> Buddy Willard. Ele achava que sabia tudo. Achava<br />
que sabia tudo a respeito das mulheres...<br />
Olhei para Joan. Apesar da ojeriza e da velha antipatia que sentia, ela me<br />
fascinava. Era como observar um marciano, ou uma <strong>de</strong>terminada espécie<br />
<strong>de</strong> sapo verruguento. Eu não pensava do mesmo jeito que ela, não sentia as<br />
mesmas coisas que ela, mas éramos próximas o bastante para as idéias e os<br />
sentimentos <strong>de</strong>la parecerem uma imagem distorcida e em negativo dos<br />
meus.<br />
Às vezes eu me perguntava se tinha inventado Joan. Outras, pensava que<br />
ela ia continuar a aparecer <strong>de</strong> repente, em cada crise da minha vida, para<br />
me lembrar <strong>de</strong> como eu tinha sido e do que passei e esfregar no meu nariz<br />
suas crises similares. [...]<br />
— Gosto <strong>de</strong> você — Joan estava dizendo. — Gosto mais <strong>de</strong> você que do<br />
Buddy.<br />
E quando ela se esticou na minha cama como um sorriso bobo, lembrei <strong>de</strong><br />
um pequeno escândalo no dormitório da nossa faculda<strong>de</strong>. [...] Sempre que<br />
eu pensava em homem com homem e mulher com mulher, não conseguia<br />
imaginar o que faziam.<br />
— Gosto <strong>de</strong> você.<br />
— Problema seu, Joan – disse eu, pegando meu livro. — Porque eu não<br />
gosto <strong>de</strong> você. Você me dá vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> vomitar, se quer saber.<br />
E saí do quarto, largando Joan <strong>de</strong>itada na minha cama, arriada como um<br />
cavalo velho. 75<br />
Neste momento Esther se vê no outro, o ―eu‖ já é um ―outro‖. Com os efeitos<br />
dos eletrochoques ela fica confusa achando que isso possa ser um produto <strong>de</strong> sua<br />
imaginação ou mesmo que seja realida<strong>de</strong> que Joan está tentando imitar Esther. Agora<br />
Esther não só se vê em outra pessoa como a nova personalida<strong>de</strong> a imita, parecendo<br />
um jogo <strong>de</strong> espelhos <strong>de</strong>formados. Seria o alter-ego <strong>de</strong> Esther se <strong>de</strong>sdobrando em Joan<br />
ao fazer uma imagem refletida em seu duplo e isso só po<strong>de</strong>ria ser o produto da mente<br />
esquizofrênica, uma ruptura em ver a si mesma e observar o outro como ela mesma<br />
em duas vertentes, como se Esther e Joan fossem o reflexo <strong>de</strong> um espelho, o qual leva<br />
o observador a ser observado. Um ato narcísico e reflexivo entre Joan e Esther, ou<br />
seja, Joan/Esher são da mesma cida<strong>de</strong>, namoraram Buddy, tinham repulsa <strong>de</strong> Buddy,<br />
estudaram na mesma instituição, estavam internadas na mesma clínica, mas para<br />
Esther, Joan é sua sombra, seu lado negativo, um <strong>de</strong>mônio <strong>de</strong> perversida<strong>de</strong> que<br />
representa que Joan não tem limites para fazer o que bem enten<strong>de</strong>, até mesmo<br />
75 PLATH, Sylvia. A redoma <strong>de</strong> vidro. Ibid., 1999, p. 239-240.