sandra bernardes puff - Universidade Federal de Santa Catarina
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— Esta aqui é Doreen. — Lenny passou a mão nos ombros <strong>de</strong>la,<br />
apertando-os.<br />
Era estranho, Doreen parecia não notar o que ele estava fazendo. Ficou ali<br />
sentada, obscura como uma negra <strong>de</strong> cabelo pintado <strong>de</strong> louro no seu<br />
vestido branco e tomando <strong>de</strong>licadamente uns goles <strong>de</strong> drinque.<br />
— Meu nome é Elly Higginbottom – disse eu. — Sou <strong>de</strong> Chicago. —<br />
Depois <strong>de</strong> dizer isso, me senti mais segura. Não queria que nada do que eu<br />
dissesse ou fizesse naquela noite fosse ligado a mim ou ao meu nome<br />
verda<strong>de</strong>iro e ao fato <strong>de</strong> eu ser <strong>de</strong> Boston.<br />
— Bem, Elly, que tal dançarmos um pouco? [...]— Não estou com vonta<strong>de</strong><br />
— disse eu com frieza, virando as costas para ele e puxando minha ca<strong>de</strong>ira<br />
para mais perto <strong>de</strong> Doreen e Lenny. [...] — Acho que já vou — disse<br />
Frankie, levantando-se. [...] — Olha, Lenny, você me <strong>de</strong>ve uma coisa.<br />
Lembra, Lenny, hein?<br />
Achei estranho que Frankie tivesse que lembrar Lenny que lhe <strong>de</strong>via<br />
alguma coisa na nossa frente. [...] — Cale a boca e suma.<br />
Por um instante, achei que Lenny estava falando comigo também, mas<br />
<strong>de</strong>pois ouvi Doreen dizer:<br />
— Só vou se Elly também for. — Tinha que agra<strong>de</strong>cer o jeito como ela<br />
pronunciou meu nome falso.<br />
— Claro que vou — disse eu. Frankie tinha sumido na noite e concluí que<br />
eu queria ficar com Doreen. Queria ver o máximo que pu<strong>de</strong>sse. 45 [sem<br />
grifo no original]<br />
Nesse momento, quando Esther se sente acuada ela usa subterfúgios como o<br />
pseudônimo <strong>de</strong> Elly Higginbotton, <strong>de</strong> Chicago, para se proteger <strong>de</strong> qualquer<br />
enventualida<strong>de</strong> que possa transcorrer, ou até mesmo dispõe-se a usar essa máscara<br />
para não revelar sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>ira quando encontrasse um homem com o qual<br />
não quisesse nenhum contato. Segundo Rosenfeld,<br />
O uso consciente da máscara dos pseudônimos e ainda mais dos<br />
heteronômios, (...) esse <strong>de</strong>sdobramento e dissociação da personalida<strong>de</strong>, se<br />
liga à procura e ao questionamento da autenticida<strong>de</strong>, da escolha e opção,<br />
enfim do engajamento absoluto do sujeito. 46<br />
Esther se protege através <strong>de</strong>sse artifício da máscara para se sentir segura e<br />
assumir a persona <strong>de</strong> Elly Higginbottom, totalmente <strong>de</strong>svencilhada da Esther<br />
Greenwood, <strong>de</strong> Boston. E a melhor situação para Esther é quando sua amiga Doreen<br />
reconhece em Esther sua outra persona, ou seja, a Elly, <strong>de</strong> Chicago, mantendo o jogo<br />
ilusário das máscaras bem <strong>de</strong>finidos, uma afirmação do duplo <strong>de</strong> Esther Greenwood,<br />
não só reconhecido por ela mesma, mas também com o aval <strong>de</strong> sua amiga Doreen.<br />
45 PLATH, Sylvia. A redoma <strong>de</strong> vidro. Ibid., 1999, p. 17-19.<br />
46 ROSENFELD, Anatol. Texto e contexto. São Paulo: Brasílica/Perspectiva/MEC, 1973, p. 15.