TATIANE OLIVEIRA DA CUNHA - Programa de Pós-Graduação em ...
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No entanto, é preciso tomar cuidado, pois, “os fra<strong>de</strong>s eram anfíbios ou biculturais,<br />
homens da universida<strong>de</strong> e homens da praça <strong>de</strong> mercado”. 34 Assim como os franciscanos<br />
foram mediadores importantes na Europa, os capuchinhos foram aqui no Brasil. Por exigência<br />
da Or<strong>de</strong>m produziram fontes importantes para estudarmos a história do Brasil. Utilizar frei<br />
João Evangelista como um mediador cultural nos faz compreen<strong>de</strong>r melhor o universo<br />
cultural do capuchinho e do hom<strong>em</strong> e da mulher comuns a partir das múltiplas interações,<br />
que produz a troca <strong>de</strong> experiências. Para o historiador não cabe julgar se havia o dominante ou<br />
o subordinado, mas como a troca se dava nessa tessitura social. 35<br />
Mediante a complexida<strong>de</strong> apresentada pelos pesquisadores que se <strong>de</strong>safiaram a<br />
<strong>de</strong>finir cultura e, não sendo nosso objetivo discutir tal conceito, optamos por pensá-lo como<br />
sendo um <strong>em</strong>aranhado <strong>de</strong> teias construídas pelo próprio hom<strong>em</strong>, conforme Clifford Geertz. 36<br />
Desse modo, os capuchinhos entravam <strong>em</strong> contato com pessoas <strong>de</strong> diversas comunida<strong>de</strong>s e<br />
ajudavam a construir “novas teias”, num <strong>em</strong>aranhado muito mais complexo do que as fontes<br />
oficiais revelavam. Os m<strong>em</strong>orialistas também apresentam a troca <strong>de</strong> experiência e as<br />
adaptações tanto dos missionários quanto das populações locais.<br />
Segundo um dos maiores estudiosos da m<strong>em</strong>ória, Michael Pollack, “a priori, a<br />
m<strong>em</strong>ória parece ser um fenômeno individual, algo relativamente íntimo, próprio da pessoa”. 37<br />
Entretanto, o indivíduo faz parte da socieda<strong>de</strong> e por se tratar <strong>de</strong> um ser social participa direta<br />
ou indiretamente dos acontecimentos. Corroboram com essa i<strong>de</strong>ia outros estudiosos, como<br />
Maurice HalbWachs, ao afirmar que as l<strong>em</strong>branças do eu <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da coletivida<strong>de</strong>, pois a<br />
m<strong>em</strong>ória individual é construída a partir <strong>de</strong> valores sociais. 38 Também Ecléa Bosi, ao <strong>de</strong>stacar<br />
que as l<strong>em</strong>branças, principalmente as da infância, possu<strong>em</strong> um caráter não só pessoal, mas<br />
familiar, grupal e social. Assim, o <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> qu<strong>em</strong> l<strong>em</strong>bra ass<strong>em</strong>elha-se ao do historiador que<br />
é o <strong>de</strong> “reconstruir no que lhe for possível, a fisionomia dos acontecimentos”. 39 Visto que, não<br />
34 I<strong>de</strong>m, p. 96.<br />
35 Ibi<strong>de</strong>m, p. 69. Para Burke a cultura popular não é monolítica, por isso, utiliza-se da divisão dos grupos sociais<br />
<strong>de</strong>screvendo as suas especificida<strong>de</strong>s. Essas “subculturas” possu<strong>em</strong> um sist<strong>em</strong>a <strong>de</strong> significados partilhados<br />
através da “interação” com a cultura geral que acontecia, mais facilmente, <strong>de</strong>vido aos mediadores, nesse caso,<br />
as mulheres da nobreza e os oficiais impressores. Embora <strong>em</strong> Burke pareça que a cultura está dividida <strong>em</strong> blocos<br />
exist<strong>em</strong> as interações entre as culturas <strong>em</strong> suas múltiplas varieda<strong>de</strong>s ou subculturas. Apesar das críticas ao<br />
trabalho <strong>de</strong> Burke no tocante ao termo “bicultural” e ao conceito <strong>de</strong> cultura, inclusive, as críticas esten<strong>de</strong>m-se a<br />
diversos pesquisadores que ousaram conceituar cultura, acreditamos que o termo mediador cultural, apesar <strong>de</strong><br />
aplicado <strong>em</strong> outro contexto, po<strong>de</strong> ser usado para compreen<strong>de</strong>r a atuação capuchinha no Sergipe oitocentista.<br />
36 GEERTZ, Clifford. “Uma Descrição Densa: Por uma Teoria Interpretativa da Cultura” In: A Interpretação das<br />
Culturas. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Zahar, 1978, p.15.<br />
37 POLLAK, Michael. M<strong>em</strong>ória, Esquecimento, Silêncio. In: Associação <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação<br />
Histórica. São Paulo: Vértice. S/D. 1992, p. 206.<br />
38 HALBWACHS, Maurice. A M<strong>em</strong>ória Coletiva. São Paulo, Edições Vértice, 1990, p.14.<br />
39 BOSI, Eclea. M<strong>em</strong>ória e Socieda<strong>de</strong>: L<strong>em</strong>brança <strong>de</strong> Velhos. SP: Cia das Letras, 1994, p. 54 e 59.<br />
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