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ECO, Umberto. Como se faz uma tese (livro - Sociologia e Política

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tentaremos demonstrar isto e aquilo. Deve ter-<strong>se</strong> pre<strong>se</strong>nie que nos fixámos<br />

determinados limites precisos, isto é, tais ciais. Dentro destes limites,<br />

o método que <strong>se</strong>guiremos é o <strong>se</strong>guinte... E assim por diante.»<br />

A função desta introdução fictícia (fictícia porque <strong>se</strong>rá refeita uniu<br />

série de vezes antes de a te<strong>se</strong> estar terminada) é permitir-nos fixar<br />

idéias ao longo de <strong>uma</strong> linha directriz que só <strong>se</strong>rá alterada à custa<br />

de <strong>uma</strong> reestruturação consciente do índice. Assim, podereis controlar<br />

os vossos desvios e impulsos. Esta introdução <strong>se</strong>rve ainda para<br />

mostrar ao orientador o que <strong>se</strong> pretende <strong>faz</strong>er. Mas <strong>se</strong>n'e sobretudo<br />

para ver <strong>se</strong> já <strong>se</strong> tem as idéias em ordem. Com efeito, o estudante<br />

provém geralmente da escola média superior, onde <strong>se</strong> presume que<br />

tenha aprendido a escrever, dado que teve de <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> grande quantidade<br />

de composições. Depois passa quatro, cinco ou <strong>se</strong>is anos na<br />

universidade, onde regra geral já ninguém lhe pede para escrever,<br />

e chega ao momento da te<strong>se</strong> <strong>se</strong>m estar minimamente exercitado'.<br />

Será um grande choque e um fracasso tentai" readquirir essa prática<br />

no momento da redacção. É necessário começar a escrever logo de<br />

início c mais vale escrever as próprias hipóte<strong>se</strong> de trabalho.<br />

Estejamos atentos, pois. enquanto não formos capazes de escrever<br />

um índice c <strong>uma</strong> introdução, não estaremos <strong>se</strong>guros de <strong>se</strong>r aquela<br />

a nossa te<strong>se</strong>. Sc não con<strong>se</strong>guirmos escrever o prefácio, isso significa<br />

que não temos ainda idéias claras sobre como começar. Se as temos,<br />

é porque podemos pelo menos «suspeitar» de aonde chegaremos.<br />

E é precisamente ba<strong>se</strong>ados nesta suspeita que devemos escrever a<br />

introdução, como <strong>se</strong> fos<strong>se</strong> um resumo do trabalho já feito. Não receemos<br />

avançar demasiado. Estaremos <strong>se</strong>mpre a lempo de voltar atrás.<br />

Vemos agora claramente que introdução e índice <strong>se</strong>rão reescritos con -<br />

tinuamente à medida que o trabalho avança. E assim que <strong>se</strong> <strong>faz</strong>. O índice<br />

e a introdução finais (que aparecerão no trabalho dactüograíado) <strong>se</strong>rão<br />

diferentes dos iniciais. E normal. Se não fos<strong>se</strong> assim, isso sigriificaria que<br />

toda a investigação feita não tinha trazido nenh<strong>uma</strong> idéia nova. Seríamos<br />

provavelmente pessoas de caracter, mas <strong>se</strong>ria inútil <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> te<strong>se</strong>.<br />

O que distingue a primeira e a última redacção da introdução?<br />

O facto dc, na última, <strong>se</strong> prometer muito menos do que na primeira.<br />

10 mesmo não acomccc noutros paí<strong>se</strong>s, como nus Estadas Unidos, onde o estudante^<br />

em ve/. dos exames orais, escreve papers. ou ensaios, ou pequenas te<strong>se</strong>s de<br />

dez ou vinte páginas para cada disciplina em que <strong>se</strong> lenha inscrito. É um sisieim<br />

muito útil que uimhém já tem sido adoptado enire nÓS (dada que os regulamentos<br />

dc modo nenhum o excluem c a forma «oral-<strong>se</strong>bencisia» do exame 6 apenas um dos<br />

métodos permitidos ao docente para avaliar as aptidões do estudante).<br />

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e <strong>se</strong>rmos mais prudentes. O objectivo da introdução definitiva <strong>se</strong>rá<br />

ajudar o leitor a penetrar na te<strong>se</strong>: mas nada de lhe prometer aquilo<br />

que depois não lhe daremos. O objectivo dc <strong>uma</strong> boa introdução<br />

definitiva é que o leitor <strong>se</strong> contente com cia, compreenda tudo e já<br />

não leia o resto. E um paradoxo, mas muitas vezes <strong>uma</strong> boa introdução,<br />

num <strong>livro</strong> publicado, dá <strong>uma</strong> idéia exacta ao crítico, levando-<br />

-o (ou a outros) a falar do <strong>livro</strong> como o autor gostaria. Mas, sc depois<br />

o orientador ler a te<strong>se</strong> e verificai' que <strong>se</strong> anunciaram na introdução<br />

resultados que não <strong>se</strong> obtiveram? Eis a razão por que esta última<br />

deve <strong>se</strong>r prudente e prometer apenas aquilo que a te<strong>se</strong> dará.<br />

A introdução <strong>se</strong>rve também para estabelecer qual é o centro c<br />

qual a periferia da te<strong>se</strong>. Distinção esta que é muito importante, c não<br />

apenas por razões de método. E-nos exigido que <strong>se</strong>jamos exaustivos<br />

muito mais paia aquilo que <strong>se</strong> definiu como centro do que para<br />

o que <strong>se</strong> definiu como periferia. Se n<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> sobre o conflito dc<br />

guerrilhas no Monferrato estabelecermos que o centro são os movimentos<br />

das formações badoglianas. <strong>se</strong>r-nos-á perdoada qualquer inexactidão<br />

relativamente às brigadas garibaldinas. mas <strong>se</strong>r-nos-á exigida<br />

<strong>uma</strong> informação exaustiva sobre as formações de Franchi e de Mauri.<br />

Evidentemente, o inverso também é verdadeiro.<br />

Para decidir qual <strong>se</strong>rá o centro da te<strong>se</strong>. devemos saber algo sobre<br />

o material de que dispomos. Esta é a razão por que o título «<strong>se</strong>creto»,<br />

a introdução fictícia e o índice-hipóte<strong>se</strong> são das primeiras coisas a<br />

<strong>faz</strong>er mas nào a primeira,<br />

A primeira coisa a <strong>faz</strong>er é a investigação bibliográfica (e vimos<br />

cm 1U.2.4. que <strong>se</strong> pode <strong>faz</strong>erem menos de <strong>uma</strong> <strong>se</strong>mana, mesmo n<strong>uma</strong><br />

pequena cidade). Voltemos à experiência de Alexandria: em três dias<br />

estaríamos em condições de elaborar um índice aceitável.<br />

Qual deverá <strong>se</strong>r a lógica que preside ã construção do índice-hipóte<strong>se</strong>?<br />

A escolha depende do tipo de te<strong>se</strong>. N<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> histórica poderemos<br />

ter um plano cronológico (por exemplo: As per<strong>se</strong>guições dos<br />

Valden<strong>se</strong>s em Itália) ou um plano de causa e efeito (por exemplo,<br />

As causas do conflito israeh-árabe). Pode haver um plano espacial<br />

(A distribuição das bibliotecas itinerantes no canavesano) ou comparativo-contrastante<br />

(Nacionalismo e populismo na literatura<br />

italiana do período da Grande Guerra). N<strong>uma</strong> le<strong>se</strong> de caracter experimental<br />

ter-sc-á um plano indutivo de alg<strong>uma</strong>s provas até à proposta<br />

de <strong>uma</strong> teoria: n<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> dc caracter lógico-maiemãtico, um<br />

plano de tipo dedutivo, primeiro a proposta da teoria e depois as<br />

suas possíveis aplicações e exemplos concretos... Direi que a lite-<br />

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