ECO, Umberto. Como se faz uma tese (livro - Sociologia e Política
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Milano. Mursia. 1972. Era praticamente a minha te<strong>se</strong>. Se for desonesto,<br />
posso limitar-me a copiá-la. mas <strong>se</strong>ria também estúpido, pois<br />
é muito provável que o meu orientador também conheça este <strong>livro</strong>.<br />
Se qui<strong>se</strong>r <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> boa te<strong>se</strong> original, este <strong>livro</strong> põe-me n<strong>uma</strong> situação<br />
difícil, dado que ou consigo dizer qualquer coisa mais e diferente,<br />
ou estou a perder o meu tempo. Mas <strong>se</strong> qui<strong>se</strong>r <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong><br />
honesta te<strong>se</strong> de compilação, ele pode constituir um bom ponto de<br />
partida. Poderei, pois, começar por ele <strong>se</strong>m mais problemas.<br />
ü <strong>livro</strong> tem o defeito de não possiür <strong>uma</strong> bibliografia final, mas<br />
tem densas notas no fim de cada capítulo, onde os <strong>livro</strong>s, além de<br />
cilados. são muitas vezes descritos e apreciados. Consigo <strong>se</strong>leccionar<br />
aproximadamente uns cinqüenta títulos, mesmo depois de ter<br />
verificado que o autor <strong>faz</strong> freqüentes referências a obras de estética<br />
c de <strong>se</strong>miótica contemporânea que não têm propriamente que ver<br />
com o meu tema, mas que aclaram as suas relações com os problemas<br />
de hoje. Neste caso, estas indicações podem <strong>se</strong>rvir-me para imaginar<br />
<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> um pouco diferente, orientada para as relações entre<br />
Barroco e estética contemporânea, como veremos depois.<br />
Com os cinqüenta títulos «históricos» assim reunidos, ficarei já<br />
com um ficheiro preliminar, para explorar depois o catálogo por<br />
autores.<br />
Mas decidi renunciar lambem a este caminho. O golpe dc sorte<br />
tinha sido demasiado singular. Deste modo. procedi como sc a biblioteca<br />
não tives<strong>se</strong> o <strong>livro</strong> de Conte (ou como <strong>se</strong> não o tives<strong>se</strong> registado<br />
nos assuntos cm questão).<br />
Para tornar o trabalho mais metódico, decidi passar à via número<br />
dois: fui, assim, ã sala de obras de referência e comecei pelos<br />
lextos gerais, mais precisamente pela Enciclopédia Treccani.<br />
Nào encontrei «Barroco»: em contrapartida, havia «Barroca, arte»,<br />
inteiramente dedicado às artes figurativas. O volume da letra B é<br />
dc I93U. pelo que o facto fica explicado: ainda nào <strong>se</strong> tinha iniciado<br />
na altura a reabilitação do Barroco, em Itália. Pen<strong>se</strong>i então em ir<br />
procurar «Seiscentismo». termo que durante muilo tempo teve <strong>uma</strong><br />
conotação um tanto depreciativa, mas que cru 1930. n<strong>uma</strong> cultura<br />
bastante influenciada pela desconfiança croeiana relativamente ao<br />
Barroco, podia ter inspirado a formação da terminologia. E aqui tive<br />
<strong>uma</strong> grande surpresa: um belo artigo, extenso, aberto a todos os problemas<br />
da época, desde os teóricos e poetas do Barroco italiano<br />
como Marino ou Tcsauro. até às manifestações do barroquismo noutros<br />
paí<strong>se</strong>s (Gracián. l.ily. Gongora, Crashaw. etc). Boas citações.<br />
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<strong>uma</strong> bibliografia substancial. Vejo a data do volume e verifico que<br />
é tlc 1936; vejo as iniciais e verifico que são dc Mario Praz. Tudo<br />
o que <strong>se</strong> podia ter de melhor naquela época (c em muitos aspectos<br />
ainda hoje). Mas admitamos que o nosso estudante não sabia quão<br />
grande e subtil crítico é Praz: verificará, todavia, que o artigo é estimulante<br />
e decidirá pô-lo em ficha, com tempo, mais tarde. Por agora,<br />
passa à bibliografia e vê que este Praz. que de<strong>se</strong>nvolve os artigos<br />
tão bem, escreveu dois <strong>livro</strong>s sobre o assunto: Secenüsmo e marinismo<br />
in Inghilterra, de 1925. c Studi sul concettismo, de 1934. Fará<br />
assim <strong>uma</strong> ficha para cada um destes <strong>livro</strong>s. Depois encontrará alguns<br />
títulos italianos, de Crocc a D'Ancona, que anota: detecta <strong>uma</strong> referência<br />
a um poeta crítico contemporâneo como T. S. Eliot e. finalmente,<br />
depara-<strong>se</strong>-lhe <strong>uma</strong> série dc obras em inglês e em alemão.<br />
Toma obviamente nota delas todas, mesmo <strong>se</strong> não souber estas línguas<br />
(depois <strong>se</strong> verá), mas verifica que Praz falava do <strong>se</strong>iscentismo<br />
em geral, enquanto ele procura coisas mais especificamente centradas<br />
na situação italiana. A situação no estrangeiro <strong>se</strong>rá evidentemente<br />
de ter em conta como pano de fundo, mas talvez não <strong>se</strong> deva<br />
começar por aí.<br />
Vejamos ainda a Treccani cm «Poética» (nada. o leitor é remetido<br />
para «Retórica». «Estética» e «Filologia»»), «Retórica» e<br />
«Estética».<br />
A retórica é tratada com <strong>uma</strong> certa amplitude, há um parágrafo<br />
sobre o século xvu, a rever, mas nenh<strong>uma</strong> indicação bibliográfica<br />
específica.<br />
A estética é da autoria dc Guido Calogero, mas. como sucedia nos<br />
anos trinta, é entendida como disciplina eminentemente filosófica Lá<br />
está Vico. mas nào os tratadistas barrocos. Isto permite-me vislumbrar<br />
um caminho a <strong>se</strong>guir: <strong>se</strong> procuro material italiano, encontrá-lo-<br />
-ei mais facilmente entre a crítica literária e a história da literatura, e<br />
não na história da filosofia (pelo menos, como depois <strong>se</strong> verá. até as<br />
épocas mais recentes). Em «Estética» encontro, todavia, <strong>uma</strong> série de<br />
títulos de histórias clássicas da estética que poderão dizer-me qualquer<br />
coisa — são qua<strong>se</strong> todas em alemão ou inglês c muito antigas:<br />
Zimmerman, dc 1858. o Schlasler. de 1872, o Bosanqucu de 1895.<br />
<strong>se</strong>guidamente Saintsbury, Menendez y Pelayo, Xnight c, finalmente,<br />
"roce. Direi desde já que. salvo o de Croce, nenhum destes textos<br />
xiste na biblioteca de Alexandria. De qualquer forma, são registados,<br />
pois mais tarde ou mais cedo poderei precisar de lhes dar <strong>uma</strong><br />
vista de olhos, depende do caminho que a te<strong>se</strong> tomar.<br />
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