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ECO, Umberto. Como se faz uma tese (livro - Sociologia e Política

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(3) pôr em ordem es<strong>se</strong>s documentos: (4) reexaminar o tema cm primeira<br />

mão. á luz dos documentos recolhidos; (5) dar <strong>uma</strong> forma<br />

orgânica a todas as reflexões precedentes; (6) proceder de modo que<br />

quem lê perceba o que <strong>se</strong> quer dizer e fique em condições, <strong>se</strong> for<br />

necessário, de voltar aos mesmos documentos para retomar o tema<br />

por sua conta.<br />

Fa/cr <strong>uma</strong> te<strong>se</strong> significa, pois. aprender a pôr ordem nas próprias<br />

idéias e a ordenar dados: é <strong>uma</strong> experiência de trabalho<br />

metódico; quer dizer, construir um «objecto» que, em princípio,<br />

sirva também para outros. E deste modo nõo importa tanto o tema<br />

da te<strong>se</strong> quanto a experiência de trabalho que ela comporta. Quem<br />

soube documcniar-<strong>se</strong> sobre a dupla redacção do romance de Manzoni.<br />

saberá depois também recolher com método os dados que lhe <strong>se</strong>rvirão<br />

para o organismo turístico. Quem escreve já publicou <strong>uma</strong><br />

dezena de <strong>livro</strong>s sobre temas diversos, mas <strong>se</strong> con<strong>se</strong>guiu <strong>faz</strong>er os<br />

últimos nove é porque aproveitou sobretudo a experiência do primeiro,<br />

que era <strong>uma</strong> reclaboração da te<strong>se</strong> de licenciatura Sem aquele<br />

primeiro trabalho, não leria aprendido a <strong>faz</strong>er os outros. E. tanto<br />

nos aspectos positivos como nos negativos, os outros reflectem<br />

ainda 0 modo como <strong>se</strong> fez o primeiro. Com o lempo tornamo-nos<br />

provavelmente mais maduros, conhecemos mais as coisas, mas a<br />

maneira como trabalhamos nas coisas que sabemos dependerá <strong>se</strong>mpre<br />

do modo como estudámos inicialmente muitas coisas que não<br />

sabíamos.<br />

Em última análi<strong>se</strong>, <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> le<strong>se</strong> é como exercitar a memória.<br />

Temos <strong>uma</strong> boa memória cm velhos quando a mantivemos em<br />

exercício desde muito jovens. E não importa <strong>se</strong> ela <strong>se</strong> exercitou<br />

aprendendo de cor a composição de todas as equipas da Primeira<br />

Divisão, as poesias de Carducci ou a série de imperadores romanos<br />

dc Augusto a Rórnulo Augusto. Bem entendido, já que <strong>se</strong> exercita<br />

a memória, mais vale aprender coisas que nos interessam ou<br />

que venham a <strong>se</strong>rvir-nos; mas. por vezes, mesmo aprender coisas<br />

inúteis constitui <strong>uma</strong> boa ginástica. E, assim, embora <strong>se</strong>ja melhor<br />

<strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> le<strong>se</strong> sobre um tema que nos agrade, o tema é <strong>se</strong>cundário<br />

relativamente ao método de trabalho e à experiência que dele<br />

<strong>se</strong> tira.<br />

E isto também porque, <strong>se</strong> <strong>se</strong> trabalhar bem. não há nenhum<br />

tema que <strong>se</strong>ja verdadeiramente estúpido: a trabalhar bem tiram-<br />

-« conclusões úteis mesmo dc um tema aparentemente remoto<br />

ou periférico. Marx nào fez a te<strong>se</strong> sobre economia política, mas<br />

sobre dois filósofos gregos como Epicuro e Demócrito. H não <strong>se</strong><br />

tratou de um acidente. Marx foi talvez capaz de analisar os problemas<br />

da história c da economia com a energia teórica que<br />

sabemos precisamente porque aprendeu a reflectir sobre os <strong>se</strong>us<br />

filósofos gregos. Perante tantos estudantes que começam com<br />

<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> ambiciosíssima sobre Marx e acabam na <strong>se</strong>cção de pessoal<br />

das grandes empresas capitalistas, c necessário rever os conceitos<br />

que <strong>se</strong> têm sobre a utilidade, a aciualidade e o interes<strong>se</strong><br />

dos temas das te<strong>se</strong>s.<br />

1.4. Quatro regras óbvias<br />

Há casos em que o candidato <strong>faz</strong> a te<strong>se</strong> sobre um lema imposto<br />

pelo docente. Tais casos devem evitar-<strong>se</strong>.<br />

Nào estamos a referir-nos. evidentemente, aos casos em que o<br />

candidato pede con<strong>se</strong>lho ao docente, mas sim àqueles em que a<br />

culpa é do professor (ver 11.7.. «<strong>Como</strong> evitar deixar-<strong>se</strong> explorar pelo<br />

orientador») ou àqueles em que a culpa é do candidato, desinteressado<br />

de tudo e disposto a alinhavar qualquer coisa para <strong>se</strong> despachar<br />

depressa.<br />

Ocupar-nos-emos, pelo contrário, dos casos em que <strong>se</strong> pressupõe<br />

a existência de um candidalo movido por um interes<strong>se</strong> qualquer e<br />

de um docente disposto a interpretar as suas exigências.<br />

Nestes casos, as regras para a escolha do tema são quatro:<br />

1) Que o lema corresponda aos interes<strong>se</strong>s do candidata (quer<br />

esteja relacionado com o lipo de exames feitos, com as<br />

sua*; leituras, com o <strong>se</strong>u mundo político, cultural ou religioso):<br />

2) Que as fontes a que recorre <strong>se</strong>jam acessíveis, o que quer dizer<br />

que estejam ao alcance material do candidalo;<br />

3) Que as fontes a que recorre <strong>se</strong>jam manit<strong>se</strong>dveis. o que quer<br />

dizer que estejam ao alcance cultura! do candidato;<br />

4) Que o quadro metodológico da investigação esteja ao alcance<br />

da experiência do candidato.<br />

Expressas desta maneira, estas quatro regras parecem banais e<br />

resumir-<strong>se</strong> na norma <strong>se</strong>guinte: quem quer <strong>faz</strong>er <strong>uma</strong> te<strong>se</strong> deve fa/er<br />

<strong>uma</strong> te<strong>se</strong> que <strong>se</strong>ja capaz de lazer. Pois bem. é mesmo assim, c há<br />

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