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A CIDADE IDEAL DE PLATÃO 1<br />
A política em <strong>Platão</strong> é assumida como a arte que cura a alma e a torna o mais virtuosa<br />
possível, sendo assim, esta seria a arte do filósofo. A filosofia coinci<strong>de</strong> com a política. Por isso é que<br />
um Estado fundado verda<strong>de</strong>iramente sobre os valores do bem e da justiça só será possível se o<br />
político se tornar filósofo ou vice-versa. Esta Cida<strong>de</strong>-Estado assumiria o horizonte <strong>de</strong> todos os valores<br />
morais erguendo-se como a única forma <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> possível.<br />
Nenhum homem basta a si mesmo, todos necessitam dos serviços alheios, portanto<br />
encontraremos aqui três subdivisões: em primeiro lugar todos aqueles que provêm às necessida<strong>de</strong>s<br />
matérias, como alimentação, roupas e moradia; em segundo lugar é necessário que alguns se<br />
responsabilizem pela <strong>de</strong>fesa e segurança da <strong>cida<strong>de</strong></strong>; E por último haverá aqueles que se <strong>de</strong>diquem<br />
ao bom governo. Sendo assim, esta <strong>cida<strong>de</strong></strong> precisará <strong>de</strong> três classes sociais: os lavradores,<br />
comerciantes e artesãos; os guardas e os governantes.<br />
A primeira classe é constituída por homens nos quais o aspecto concupiscível da alma, é<br />
mais forte. Sua virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>verá ser a temperança, dominando os prazeres e <strong>de</strong>sejos, e submetendo-se<br />
às classes superiores. Os bens que administrarem não <strong>de</strong>verão ser nem escassos nem excessivos.<br />
Essa virtu<strong>de</strong> a que <strong>Platão</strong> se refere <strong>de</strong>ve ser entendida como aquilo que faz com que uma coisa se<br />
torne boa e perfeita naquilo que <strong>de</strong>ve ser.<br />
Na segunda classe estarão os homens nos quais prevalecem a força irascível da alma, sendo<br />
dotados ao mesmo tempo <strong>de</strong> fero<strong>cida<strong>de</strong></strong> e mansidão. A virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta classe <strong>de</strong>ve ser a fortaleza e a<br />
coragem. Estes guardas <strong>de</strong>verão estar atentos tanto para os perigos que venham do exterior da<br />
<strong>cida<strong>de</strong></strong> quanto para aqueles que possam surgir em seu seio. Deverão controlar os bens da primeira<br />
classe, evitando que se torne tanto rica quanto pobre em <strong>de</strong>masia; cuidar para que o Estado não se<br />
torne excessivamente gran<strong>de</strong> ou pequeno; provi<strong>de</strong>nciar a cada cidadão tarefas e educação<br />
correspon<strong>de</strong>ntes à sua índole.<br />
Por fim a classe dos governantes <strong>de</strong>verá ter aqueles homens que amaram a <strong>cida<strong>de</strong></strong> mais que<br />
os outros, e acima <strong>de</strong> tudo saibam conhecer e contemplar o Bem. Nestes predomina a alma racional<br />
e a virtu<strong>de</strong> especifica é a sabedoria. Quando cada um dos cidadãos, respeitando as classes sociais,<br />
cumprirem as funções que lhes cabem da melhor maneira possível, será realizada a justiça perfeita.<br />
Construir esta Cida<strong>de</strong> implica, antes <strong>de</strong> qualquer coisa, um conhecimento do homem e do seu<br />
lugar no universo. Ela seria constituída na mesma essência do homem, porém <strong>de</strong> forma bastante<br />
ampliada. Em cada homem estão presentes as três faculda<strong>de</strong>s da alma, representadas nas três<br />
classes sociais da Cida<strong>de</strong>: diante <strong>de</strong> um mesmo objeto, existe em nós uma tendência que nos atrai<br />
para eles – o <strong>de</strong>sejo; outra tendência que nos afasta <strong>de</strong>le, dominando o <strong>de</strong>sejo – a razão; e também<br />
aquela que não é nem <strong>de</strong>sejo nem razão, mas pela qual ficamos irados e nos <strong>de</strong>ixamos inflamar.<br />
Nesta or<strong>de</strong>m, teremos a alma apetitiva, a racional e a irascível.<br />
1 Baseado em:<br />
ANTISERI, Dario. REALE, Giovanni. História da filosofia: Antiguida<strong>de</strong> e Ida<strong>de</strong> Média, V.1. 3º ed. São<br />
Paulo: Paulus, 1990. p. 693, pp. 162-168.
A justiça se dará quando cada parte da alma realizar as suas funções da melhor maneira<br />
possível: as partes inferiores <strong>de</strong>vem harmonizar-se e obe<strong>de</strong>cerem a superior; e a sabedoria se dará<br />
quando a parte racional (superior) possuir a verda<strong>de</strong>ira ciência do que é útil às outras partes.<br />
No que se refere a arte <strong>Platão</strong> irá posicionar-se <strong>de</strong> forma bastante negativa. Para ele a arte<br />
não nos conduz à verda<strong>de</strong>, pelo contrário, ela a escon<strong>de</strong> visto que se volta para as partes inferiores<br />
da alma e, portanto, não tornará o homem melhor, mas irá corrompê-lo, <strong>de</strong>seducá-lo. Sobre a poesia,<br />
ele a consi<strong>de</strong>ra inferior à filosofia: o poeta, quando compõe, não o faz através da razão e do<br />
conhecimento, mas por inspiração divina; encontra-se fora <strong>de</strong> si, quase em inconsciência.<br />
Em A República, irá consi<strong>de</strong>rar todas as expressões <strong>de</strong> arte como uma imitação das<br />
realida<strong>de</strong>s sensíveis. Como sabemos, <strong>Platão</strong> consi<strong>de</strong>ra esta realida<strong>de</strong> como sendo uma cópia <strong>de</strong><br />
uma realida<strong>de</strong> inteligível, o mundo das idéias, sendo assim a arte seria uma cópia <strong>de</strong> outra cópia e<br />
estaria três vezes mais distante da verda<strong>de</strong>. <strong>Platão</strong> não a nega, mas lhe tira qualquer valor em si<br />
mesma. Deste modo a arte <strong>de</strong>ve ser banida <strong>de</strong>ste Estado perfeito caso não se submeta às leis do<br />
bem e do verda<strong>de</strong>iro.<br />
A <strong>cida<strong>de</strong></strong> perfeita <strong>de</strong>verá possuir uma educação também perfeita. À primeira classe social,<br />
entretanto, não será oferecida nada especial, visto que as artes e os ofícios são facilmente<br />
aprendidos com a prática. Quanto aos guardas, <strong>Platão</strong> propõe uma educação ginástico-musical a fim<br />
<strong>de</strong> potencializar a parte <strong>de</strong> nossa alma <strong>de</strong> on<strong>de</strong> <strong>de</strong>riva a coragem e a fortaleza. <strong>Platão</strong> irá propor<br />
também a comunhão <strong>de</strong> homens e mulheres, dos filhos, e <strong>de</strong> qualquer bem material. Os filhos, <strong>de</strong>sta<br />
classe, seriam imediatamente retirados do convívio com os pais, sendo educados sem nunca<br />
conhecê-los. <strong>Platão</strong> pretendia com isso criar uma gran<strong>de</strong> família on<strong>de</strong> todos se amassem igualmente,<br />
eliminando o egoísmo e o sentimento <strong>de</strong> posse. Não haveria nada individual, tudo seria coletivo.Para<br />
os governantes a educação giraria em torno do aprendizado filosófico. <strong>Platão</strong> a chamou <strong>de</strong> “longa<br />
estrada”, pois duraria até os cinquenta anos. A educação <strong>de</strong>ste político-filósofo tinha um único<br />
objetivo conduzi-lo ao conhecimento e à contemplação do Bem, inserindo-o na realida<strong>de</strong> prática.<br />
Antes <strong>de</strong> se realizar na realida<strong>de</strong> exterior, esta <strong>cida<strong>de</strong></strong> <strong>i<strong>de</strong>al</strong> <strong>de</strong>verá existir <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> cada<br />
homem. <strong>Platão</strong> chegou a dizer no final do livro IX <strong>de</strong> A república que pouco importa se tal <strong>cida<strong>de</strong></strong><br />
possa ou não existir, basta que cada indivíduo viva segundo as leis <strong>de</strong>ssa <strong>cida<strong>de</strong></strong>, ou seja, as leis do<br />
bem e da justiça.