UM DESFILE ATÉ AO TOPO - Diário Económico - Sapo
UM DESFILE ATÉ AO TOPO - Diário Económico - Sapo
UM DESFILE ATÉ AO TOPO - Diário Económico - Sapo
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
32 Fora de Série Março 2011<br />
F<br />
azer uma montra é como fazer uma peça<br />
de teatro”, diz Filipe Faísca. E é com paixão<br />
que o ‘designer’ de moda, que tem a seu<br />
cargo as vitrines da Hermès e da Fashion<br />
Clinic, fala deste trabalho e da inspiração que vai<br />
buscar às artes cénicas.<br />
“Eu nunca me consegui focar numa só mensagem”, refere<br />
o criador, e explica que apesar de a moda ter sempre<br />
feito parte da sua vida, “só se tornou um projecto<br />
económico a partir de 2006”. O percurso ditou-lhe outros<br />
rumos, que o fi zeram passar pelo teatro, pela ópera,<br />
pelo cinema e pela dança. Trabalhou como fi gurinista<br />
durante 12 anos e é da bagagem que lhe trouxe este<br />
passado que retira hoje a essência das suas montras.<br />
“Fazer uma vitrine, não é mais do que pôr em cena”,<br />
explica. E vê o resultado deste trabalho como uma<br />
acção fi lantrópica, “uma forma generosa de comunicar<br />
com um público que pode muito bem não ser o<br />
da marca que ali está exposta”, porque aquilo que interessa<br />
não é apenas o lado comercial. Aliás, o ideal é<br />
mesmo “conseguir equilibrar bem as coisas de forma<br />
a que este não seja tão evidente”.<br />
Para Filipe Faísca, fazer uma montra é uma arte que<br />
vai buscar alimento ao ‘background’<br />
cultural do seu autor.<br />
Há regras, evidentemente. Cada<br />
marca tem as suas e, neste campo,<br />
a Hermès e a Fashion Clinic<br />
não são excepção. “A Hermès, por<br />
exemplo, tem regras muito rígidas<br />
em relação aos materiais que<br />
se colocam nas montras. Não podemos<br />
usar plástico, esferovite ou<br />
Artes<br />
CENÁRIOS DE RUA<br />
São pequenas encenações e contam histórias. Umas vezes surpreendem-nos, outras<br />
roubam-nos um sorriso. As melhores fazem-nos parar, olhar e depois entrar.<br />
TEXTO DE INÊS QUEIROZ FOTOGRAFIA DE PAULA NUNES<br />
“<strong>UM</strong>A BOA<br />
MONTR A É<br />
SEMPRE AQUELA<br />
QUE ME MOSTR A<br />
O QUE NÃO ESTOU<br />
À ESPERA”.<br />
pêlo falso”. De resto, o céu é o limite. Cada projecto<br />
tem obrigatoriamente que seguir o tema do ano, mas<br />
depois é dada total carta-branca ao criador.<br />
No fundo é como uma encenação em que existe um<br />
texto que é traduzido para aqueles pequenos palcos.<br />
E a opção tanto pode passar pelo ‘nonsense’ como<br />
pelo realismo absoluto em que os bonecos se transformam<br />
em pessoas “para que as pessoas se identifi -<br />
quem com eles”. Filipe Faísca recorda o dia em que se<br />
viu compelido a disfarçar uma lasca na perna de um<br />
manequim com um penso rápido, porque não havia<br />
tempo para o substituir. “Não imagina a quantidade<br />
de pessoas que entraram na loja por causa daquilo”,<br />
conta a rir. Porque é precisamente esta a fi losofi a subjacente<br />
a uma montra Hermès: “que as pessoas parem,<br />
olhem e entrem”.<br />
Quando lhe falamos do trabalho de Leïla Menchari,<br />
que desde 1977 faz das montras Hermès em Paris<br />
um verdadeiro acontecimento público, Filipe Faísca<br />
sorri: “é uma deusa”. No entanto considera o trabalho<br />
da artista tunisina um pouco ‘vieux jeu’. Na<br />
opinião de Faísca, as grandes montras desta marca<br />
estão no Japão e conjugam artes plásticas com o úl-<br />
timo grito em tecnologia. “São<br />
absolutamente fantásticas”, garante,<br />
recordando um trabalho<br />
do ‘designer’ Tokujin Yoshioka:<br />
um ecrã vídeo com a imagem de<br />
uma rapariga a soprar um lenço<br />
real, pendurado em frente. É que<br />
“uma boa montra é sempre aquela<br />
que me mostra o que não estou<br />
à espera”.<br />
Nesta página, duas montras criadas por Filipe<br />
Faísca para a Fashion Clinic e para a Hermès.<br />
Ao lado, o criador na montra da sua loja,<br />
na Calçada do Combro, em Lisboa.