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SONHO E REALIDADE<br />
Débora quer ser atriz. Faz<br />
até academia para manter a<br />
forma. Sustenta a família<br />
vendendo chicletes na rua<br />
ras. Acompanha<strong>da</strong>s de um rapaz de 15<br />
anos, que se apresenta como tio delas, as<br />
irmãs, recém-saí<strong>da</strong>s <strong>da</strong> primeira infância,<br />
já esqueceram o que é ser criança. Questiona<strong>da</strong><br />
se não preferia estar em casa, brincando,<br />
Flávia responde: “Não. Eu queria<br />
estar em casa, mas aju<strong>da</strong>ndo minha mãe”.<br />
As duas moram em Franco <strong>da</strong> Rocha,<br />
município <strong>da</strong> Grande São Paulo que, embora<br />
ostente o dístico “Ci<strong>da</strong>de Ciência e<br />
Ternura”, é mais conhecido por abrigar um<br />
complexo <strong>da</strong> Febem que vive expondo, com<br />
fugas e rebeliões recorrentes, a maneira como<br />
o governo do Estado reeduca crianças<br />
e adolescentes infratores. Flávia e Márcia<br />
passam boa parte do dia longe de tais acontecimentos.<br />
To<strong>da</strong>s as manhãs, elas embarcam<br />
num vagão superlotado <strong>da</strong> CPTM<br />
(Companhia Paulista de Trens Metropolitanos)<br />
e uma hora depois estão na Tiradentes,<br />
a 30 quilômetros de casa. Aos motoristas<br />
barrados pelo infalível sinal vermelho,<br />
oferecem revistas de colorir, as mesmas<br />
que deveriam estar rabiscando, não<br />
vendendo.<br />
Segundo o tio, as pequenas sobrinhas<br />
conseguem arreca<strong>da</strong>r de R$ 20 a R$ 50 por<br />
dia – valores que parecem um padrão para<br />
as pessoas nessa ativi<strong>da</strong>de. Oito entrevistados,<br />
em diferentes pontos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de,<br />
declararam sobreviver com a mesma faixa<br />
de rendimentos, embora o movimento presenciado<br />
pela reportagem, durante to<strong>da</strong>s<br />
as entrevistas, indique pelo menos o dobro.<br />
Seja quanto for, Flávia e Márcia não<br />
ficam com na<strong>da</strong>. O dinheiro é entregue à<br />
mãe, que cui<strong>da</strong> <strong>da</strong> casa, e ao pai, que complementa<br />
a ren<strong>da</strong> familiar vendendo verdura<br />
de porta em porta.<br />
Acostuma<strong>da</strong> à rotina de uma <strong>da</strong>s aveni<strong>da</strong>s<br />
mais movimenta<strong>da</strong>s de São Paulo – ela<br />
freqüenta o mesmo farol desde os 7 anos<br />
–, Flávia diz não se incomo<strong>da</strong>r com o barulho<br />
dos carros, a fumaça e as intempéries<br />
do clima. “Mas as pernas ficam um<br />
pouco cansa<strong>da</strong>s”, relata com um sorriso no<br />
rosto, <strong>da</strong>ndo a entender que, tudo bem, a<br />
vi<strong>da</strong> não será assim para sempre.<br />
Como a Débora <strong>da</strong> Caio Prado, as irmãs<br />
<strong>da</strong> Tiradentes imaginam um futuro de<br />
grandes platéias, em que elas seriam a atração<br />
principal. Influencia<strong>da</strong>s pela opção religiosa<br />
dos pais, querem ser cantoras evangélicas<br />
e fazer tanto sucesso quanto Mara<br />
Maravilha, <strong>da</strong> qual são fãs de carteirinha.<br />
Existe, no entanto, uma importante diferença<br />
em relação a Débora. Enquanto esta<br />
abandonou os estudos antes que pudesse<br />
aprender a ler e escrever, Flávia e Márcia<br />
voltam to<strong>da</strong>s as tardes para Franco <strong>da</strong><br />
Rocha, onde freqüentam uma escola pública.<br />
Dizem estar na 5ª e 4ª séries, respectivamente,<br />
e que pretendem fazer facul<strong>da</strong>-<br />
REVISTA DOS BANCÁRIOS | 9