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de mercadorias” em todo o território nacional.<br />
No ano seguinte, com o nascimento<br />
de Maicon Douglas, seu primeiro filho,<br />
passou a integrar uma comuni<strong>da</strong>de estatística<br />
bem maior, a <strong>da</strong>s mães adolescentes.<br />
A ca<strong>da</strong> ano – ain<strong>da</strong> de acordo com a<br />
Unicef, que cruza informações do IBGE e<br />
de outros órgãos oficiais –, 1 milhão de<br />
brasileiras dão à luz antes de entrar na<br />
maiori<strong>da</strong>de, num processo de gravidez precoce<br />
que médicos, autori<strong>da</strong>des, ONGs e especialistas<br />
consideram prejudicial ao desenvolvimento<br />
<strong>da</strong> pessoa e <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de.<br />
O que levou Débora a se incomo<strong>da</strong>r tão<br />
cedo com o próprio envelhecimento foram<br />
as alterações no corpo provoca<strong>da</strong>s pela segun<strong>da</strong><br />
gravidez, também comum entre as<br />
jovens. O surgimento de Ana Caroline Kerolaine,<br />
há onze meses, colocou a brasileira<br />
<strong>da</strong> Caio Prado no grupo de 30% a 40%<br />
<strong>da</strong>s meninas que voltam a ser gestantes<br />
num prazo de três anos após o primeiro<br />
parto, segundo números <strong>da</strong> Associação<br />
Paulista de Adolescência, enti<strong>da</strong>de que<br />
agrega profissionais de várias áreas médicas.<br />
Essas porcentagens to<strong>da</strong>s, bem como<br />
os debates em torno delas, na<strong>da</strong> dizem a<br />
Débora. Entre um e outro sonho, ela está<br />
mais preocupa<strong>da</strong> em obter os reais necessários<br />
à sobrevivência familiar. Além dos<br />
dois filhos, moram na mesma casa a mãe<br />
e a irmã de 13 anos.<br />
Para pôr comi<strong>da</strong> na mesa, pagar o aluguel<br />
e cobrir outras despesas, Débora levanta<br />
às 4 <strong>da</strong> manhã, vai ao Vale do Anhangabaú<br />
se abastecer de mercadorias, assume<br />
seu posto na esquina de sempre e só retorna<br />
para casa às 9 <strong>da</strong> noite. Cumpre o<br />
ritual de segun<strong>da</strong> a sexta, seja qual for a<br />
intensi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> chuva, do calor ou do frio.<br />
Nos fins de semana, reserva um tempo para<br />
a academia <strong>da</strong> Augusta, que ela freqüenta<br />
sem desembolsar os centavos do semáforo.<br />
“Tem um senhor de 80 anos que quer<br />
casar com minha mãe e paga a academia<br />
pra mim”, explica.<br />
A mãe, de 36 anos, está sempre por perto,<br />
cui<strong>da</strong>ndo para que a filha sonhadora se<br />
concentre na tarefa de oferecer recibos e<br />
chicletes a taxistas e motoristas em geral.<br />
Exigência difícil de ser cumpri<strong>da</strong>, porque<br />
o que não falta são marmanjos querendo<br />
desviá-la de seus afazeres. Quando Débora<br />
afirma que sabe lavar, passar e cozinhar<br />
– credenciais para o trabalho nas “casas de<br />
família” – um homem que passa por ali, e<br />
que aparenta alguma intimi<strong>da</strong>de com a<br />
moça, não perde a oportuni<strong>da</strong>de de sairse<br />
com um gracejo: “Se é assim, vou te levar<br />
lá pra casa!”.<br />
Ela sorri e desconversa. O assédio sexual<br />
é um dos principais incômodos para adolescentes<br />
que trabalham nas ruas, freqüen-<br />
8 | REVISTA DOS BANCÁRIOS<br />
temente vistas como garotas à disposição<br />
do primeiro que passar. Em locais muito<br />
movimentados isso não chega a ser um<br />
grande problema, já que os próprios colegas<br />
de ponto se encarregam de afastar os<br />
mais insistentes. “Com a gente por aqui, o<br />
povo se intimi<strong>da</strong> um pouco”, comenta um<br />
dos muitos vendedores que disputam com<br />
Débora a atenção <strong>da</strong> freguesia motoriza<strong>da</strong>.<br />
Sem infância<br />
Essa rede solidária de proteção é uma<br />
constante nas calça<strong>da</strong>s que abrigam as jovens<br />
vendedoras, mesmo nos lugares onde<br />
a segurança oficial, patrocina<strong>da</strong> pelo Estado,<br />
está ao alcance <strong>da</strong> vista. Para o pessoal<br />
que vende bugigangas na aveni<strong>da</strong> Tiradentes,<br />
a imponente presença do Quartel<br />
Geral <strong>da</strong> Polícia Militar de São Paulo,<br />
a poucos metros <strong>da</strong>li, é um detalhe sem<br />
importância na paisagem barulhenta e poluí<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>quela região. Quando o assunto é<br />
garantir a integri<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s duas meninas<br />
que se arriscam diariamente entre carros,<br />
ônibus e caminhões, ninguém se lembra<br />
de citar a proximi<strong>da</strong>de de centenas de policiais<br />
como fator positivo. “Aqui não tem<br />
problema. Nós ficamos de olho nelas”, resume<br />
um rapaz de 25 anos que ganha a<br />
vi<strong>da</strong> vendendo réplicas infláveis do Homem<br />
Aranha e do Bob Esponja.<br />
As protegi<strong>da</strong>s são as irmãs Flávia, de 11<br />
anos, e Márcia, de 10, apresenta<strong>da</strong>s aqui<br />
com nomes fictícios. Os heróis de plástico,<br />
comuns naquele ponto, fazem grande<br />
sucesso entre a moleca<strong>da</strong> que passa no banco<br />
traseiro dos carros, mas não despertam<br />
nenhum interesse nas jovens trabalhado-