Revista Sinais Sociais N20 pdf - Sesc
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desaparecer” (BADIOU, 2002, p. 84). E é aqui onde parece residir o<br />
milagre da escrita pensada como um corpo que dança, entre planejar<br />
o milagre e ensaiar, pois o corpo que dança e tão logo desaparece é<br />
também o corpo que dura, o corpo infinito. José Gil, por sua vez, diz<br />
que “não havia repouso porque não havia paragem do movimento. O<br />
repouso era apenas uma imagem demasiado vasta daquilo que se movia,<br />
uma imagem infinitamente fatigada que afrouxava o movimento”<br />
(GIL, 2004, p. 13). Por isso o corpo leve, desobediente e soberano,<br />
esse corpo de escrita inventado por Gonçalo M. Tavares, “um bailarino<br />
subtil”, atravessa furiosamente todos os seus livros, sem repouso,<br />
em uma dança desenfreada, por dentro do seu permanente começar,<br />
como uma aparição sutil, um fantasma ou um esquecimento milagroso.<br />
Ou na sugestão de Valéry, como uma espécie de movimento<br />
ondulatório de saias engrinaldadas, que o bailarino levanta repetidas<br />
vezes com uma estranha e impudica insistência, em um jogo entre<br />
deixar o corpo à mostra e exposto, e esconder o corpo, fazer o corpo<br />
desaparecer.<br />
Badiou afirma que o corpo dançante tal como ele advém no sítio,<br />
tal como se espaça na iminência, “é um corpo-pensamento, jamais é<br />
alguém” (BADIOU, 2002, p. 87, grifo do autor). É bom lembrar que<br />
para Gonçalo M. Tavares o pensamento, o ato de pensar, é – ainda – o<br />
nosso gesto de resistência agora, como se um pensamento fosse – com<br />
o que afirma Nietzsche – leve e sutil, mas igualmente desconfiado<br />
e desobediente. E vejamos que, acerca desses corpos sugeridos por<br />
Badiou, Mallarmé já declarara que eles são sempre símbolo, apenas,<br />
não alguém. Por isso Gonçalo escreve tão incisivamente que “Alguém<br />
me aconteço!”.<br />
CoNSiDERAÇÕES fiNAiS<br />
O que parece é que Gonçalo M. Tavares apresenta, a partir desse<br />
primeiro livro, o Livro da dança, que ele define como “projeto para<br />
uma poética do movimento”, e em todos os livros posteriores a este,<br />
um texto que seria, antes, um corpo que cai e que também se eleva,<br />
como um corpo-móbil flexível e que dança, um corpo monstruoso,<br />
soberano, anônimo, desobediente, impossível, como uma criança travessa,<br />
sem gravidade e sem memória, que parece negar toda a ideia<br />
144 SiNAiS SoCiAiS | Rio DE JANEiRo | v.7 nº 20 | p. 114-147 | SEtEmbRo > DEzEmbRo 2012