Revista Sinais Sociais N20 pdf - Sesc
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p. 115); a escrita segue a ideia de um corpo não inteligente, AMNÉSICO<br />
e sem projetos, porque é aqui e agora, nem antes e nem depois.<br />
Não por acaso Gonçalo M. Tavares escreve no breve fragmento<br />
de número 82 – que na edição brasileira ganha o significativo título de<br />
“Exclamação” 11 , ou seja, algo que se diz com ênfase ou em voz alta e<br />
que exprime admiração ou alegria –, uma espécie de acontecimento do<br />
corpo aqui e agora, como se a força do não ter lugar do movimento<br />
retido, em estado de desobediência, eclodisse em movimento violento<br />
e espantoso, em dança, em exclamação para todos os lados, como<br />
se também perdesse de vista a sua condição de sujeito do enunciado,<br />
para montar o paradoxo em direção a um sujeito da enunciação:<br />
Alguém me aconteço!<br />
Alguém<br />
me<br />
aconteço.<br />
(TAVARES, 2001, p. 99).<br />
O verso-exclamação “Alguém me aconteço!”, tal qual o gesto de<br />
levantar o braço (verso e gesto para nada, como talvez seja o lugar<br />
da literatura agora: para nada, logo para tudo), também parece conservar<br />
o segredo no corpo, a ausência de sexo e de ornamento na<br />
indeterminação do pronome “alguém” que produz um acontecimento<br />
no corpo; assim como levantar o braço é também um gesto indeterminado.<br />
Tudo não passa de uma tentativa de incorporação, um<br />
exercício de releitura da imagem do escritor como um corpo que se<br />
lança no mundo a partir do que escreve e a partir, principalmente, do<br />
que publica daquilo que escreve. Onde o acontecimento da escrita?<br />
Badiou diz justamente que o movimento desse corpo em eclosão, em<br />
exclamação e que jorra sugere o seguinte: “A dança seria a metáfora<br />
de que todo pensamento verdadeiro depende de um acontecimento.<br />
Pois um acontecimento é precisamente o que permanece indecidido<br />
entre o ter-lugar e o não-lugar, um surgir que é indiscernível de seu<br />
11 Na versão para a edição brasileira de o Livro da Dança (Editora da Casa,<br />
2008) Gonçalo M. Tavares desloca a exclamação para o final do poema: “Alguém<br />
me aconteço./ Alguém/ me/ aconteço!” (TAVARES, 2008, p. 99).<br />
SiNAiS SoCiAiS | Rio DE JANEiRo | v.7 nº 20 | p. 114-147 | SEtEmbRo > DEzEmbRo 2012<br />
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