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Revista Sinais Sociais N20 pdf - Sesc

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Mais uma vez Gonçalo M. Tavares faz uso do verbo treinar (exercitar,<br />

acostumar, adestrar, versar, educar, ensaiar), agora para propor<br />

um ensaio da nudez, a repetição da nudez, bem como “experimentar<br />

roupas nuas”, desnudar-se de todo e qualquer ornamento para<br />

sentir no corpo profundo a nudez. Interessante também é que no<br />

fragmento de Gonçalo pode-se ser melhor ou pior NU, por isso a<br />

importância de treinar a nudez, de colocar nudez na dança, até que<br />

o corpo saiba-se NU de vez, e uma nudez sem julgamento ou valor,<br />

que tanto pode ser “céu”, como pode ser “sexo”, “inocência” ou<br />

“fornicação”. É uma nudez expandida, pois ele sugere experimentar<br />

roupas nuas; assim, se pode pensar em uma escrita que seja vestir a<br />

nudez com a própria nudez, o sentido com o não sentido do sentido.<br />

É como se a dança, como afirmou Badiou, fosse sempre uma nova<br />

invenção de começo, nem antes e nem depois, antes nada e depois<br />

nada, um corpo “amnésico”, subtraído de todo saber, de toda memória.<br />

Badiou lembra a conhecida proposição de Mallarmé 10 nas suas<br />

observações críticas de 1886, intituladas “Ballets”, quando este diz<br />

que a bailarina não é uma mulher que dança, visto que não é uma<br />

mulher, mas um corpo anônimo; e que não dança, pois não é a realização<br />

de um saber, mas um “corpo como eclosão”, um “esquecimento<br />

milagroso”. Mallarmé diz ainda que o corpo anônimo que dança é<br />

uma espécie de poema liberto de todo aparelho do escriba, ou seja,<br />

um poema não inscrito, livre e que dança sem deixar vestígio, uma<br />

espécie de corpo desobediente, subtraído de qualquer vulgaridade,<br />

em uma relação direta entre ser e desaparecer – um “hieróglifo” que<br />

dança, uma “aparição como acontecimento”, uma invenção do corpo<br />

de intensidade, do corpo profundo e paradoxal, como parece ser o<br />

projeto de Gonçalo M. Tavares com a sua literatura. Sobre essa proposição<br />

de Mallarmé, Badiou diz:<br />

O que se pronuncia aqui é a dimensão subtrativa do pensamento.<br />

Todo pensamento verdadeiro é subtraído ao saber onde se constitui.<br />

10 Mallarmé deixou alguns breves escritos sobre a dança, algumas observações<br />

críticas – as prosas de circunstâncias –, que foram destinadas a revistas de<br />

pouca circulação na época, mas que mais tarde foram incluídas nos capítulos<br />

Crayonné au théâtre e Ballets do livro Divagations, publicado em 1897.<br />

138 SiNAiS SoCiAiS | Rio DE JANEiRo | v.7 nº 20 | p. 114-147 | SEtEmbRo > DEzEmbRo 2012

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