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Revista Sinais Sociais N20 pdf - Sesc

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Dansa<br />

Tem S a palavra, pois certas curvaturas do mundo<br />

exigem alterações de grafia.<br />

O traço imprevisto obriga a parar a meio;<br />

E à paragem insólita chamarás insólito movimento.<br />

E ficarás contente.<br />

(TAVARES, 2005, p. 109).<br />

Esse “erro” de grafia, essa célula que salta da origem, levanta a questão<br />

acerca de um problema de legitimação do termo: dançar é com<br />

“s”, para oscilar na curvatura do mundo, ou é com “ç”, para insistir na<br />

repetição do comum? A palavra grafada assim, com “s”, clama a sua<br />

revolução, a sua recusa, a sua emancipação. Ela demonstra por fora o<br />

que acontece por dentro, a sua animalidade: sair do comum, provocar<br />

um desequilíbrio: dançar.<br />

Dessa maneira, a partir do primeiro livro de Gonçalo M. Tavares,<br />

pode-se pensar a invenção do corpo no seu trabalho e o seu trabalho<br />

como um corpo-bailarino, o que sai do comum para provocar o desequilíbrio<br />

entre ficção e imaginação. A ideia é propor ler o corpo mais<br />

como esse desvio, como desequilíbrio, e menos simplesmente como<br />

ausência de peso e de gravidade. Uma tarefa da literatura e para a<br />

literatura, um modo de uso político e crítico da literatura construída<br />

com um arsenal de corpos misturados e moventes, é o que parece<br />

propor Gonçalo M. Tavares. Isso nos leva ainda a José Gil, quando ele<br />

diz que “este pequeno deslocamento marca o nascimento da arte ou,<br />

pelo menos, da sua possibilidade” (GIL, 2004, p. 22) e que o bailarino<br />

não se limita a conservar o equilíbrio comum, mas procura uma<br />

espécie de equilíbrio no desequilíbrio, quase que em um estado de<br />

desobediência do corpo, uma resistência, uma intensidade. Mas a luta<br />

para vencer o próprio peso do corpo, essa leveza que deve ser incorporada<br />

ao corpo do bailarino como uma ausência de peso no interior<br />

do corpo – o corpo tornado espaço –, não deve ser compreendida<br />

apenas como simples ausência de peso. Bem como a dança, o voo e<br />

a leveza não são apenas gestos que se opõem ao espírito de peso ou<br />

de gravidade, mesmo que possam ser também uma espécie de marco<br />

fundador, capaz de deslocar todos os marcos de fronteiras já que,<br />

segundo Nietzsche “quem, um dia, ensinar os homens a voar, terá<br />

SiNAiS SoCiAiS | Rio DE JANEiRo | v.7 nº 20 | p. 114-147 | SEtEmbRo > DEzEmbRo 2012<br />

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