Revista Sinais Sociais N20 pdf - Sesc
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desejo no outro: um mundo onde se entra para a sensação do fora,<br />
de exclusão, por isso pode tratar o “infinito”, por exemplo, como um<br />
“objecto exacto”. No fragmento 67 do Livro da dança, intitulado na<br />
edição brasileira como “Um objecto exacto”, ele inscreve:<br />
Entreter o infinito.<br />
Tratar o infinito como objecto, atirá-lo ao chão, partir-lhe a FACE,<br />
curar-lhe as feridas, chamar pelo pai e pela mãe; dar-lhe pão à boca<br />
no dia das doenças, contar-lhe os ossos e, por fim, desprezá-lo.<br />
Entreter o infinito.<br />
Tratar o infinito como objecto.<br />
(TAVARES, 2001, p. 81).<br />
Neste “Um objecto exacto”, note-se, há um convite para deslocar o<br />
infinito de sua abstração numérica e jogá-lo ao chão para quebrá-lo ao<br />
meio, partir a sua face e, principalmente, dar a ele fome, contar seus ossos<br />
e desprezá-lo. Ou seja, dar a ele um corpo, a doença, uma possibilidade<br />
de morte, medo e, como paradoxo, alguma exatidão. O poema<br />
“O mapa”, então, nos apresenta sensações que tocam, principalmente,<br />
algo muito próximo de uma exterioridade, um não sentido da escrita.<br />
Assim, a sua tentativa de resposta pelas possibilidades de acertar muito,<br />
que vêm da matemática, e das de errar muito, que vêm da literatura.<br />
Daí o gesto mais ou menos sem meta nos modos de sua escrita que o<br />
poema já sugere: nada para lá, nada para cá do poema. A conclusão,<br />
na última linha, é categórica, “Escrevo porque perdi o mapa”, mas também<br />
não diz muita coisa, porque um mapa é sempre uma composição<br />
ficcional de um lugar imaginário ou imaginado, construído a partir do<br />
método dedutivo, como um ensaio, movido por uma errância sem método<br />
para atingir uma suposta meta 4 . E, assim, se meta tem a ver com<br />
4 Não por acaso, Gonçalo M. Tavares desenvolve um projeto intitulado “O<br />
Bairro”, que parte de um mapa. Esse mapa é a ficção de um lugar imaginário<br />
ou imaginado, também construída a partir do método dedutivo, sempre como<br />
um ensaio e movida pela errância sem método. Nesse bairro moram escritores,<br />
críticos, filósofos, uma bailarina e coreógrafa (Pina Bausch), que ele chama<br />
de “Senhores”. Esse “O Bairro” é também uma recuperação de sua afirmação:<br />
“Escrevo porque perdi o mapa.”<br />
SiNAiS SoCiAiS | Rio DE JANEiRo | v.7 nº 20 | p. 114-147 | SEtEmbRo > DEzEmbRo 2012<br />
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