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Para um pensamento do sul : diálogos com Edgar Morin - BVS-Psi

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A globalização em andamento exige <strong>um</strong> espaço-tempo único e indiferente.<br />

O "lugar", o "local", nada mais são <strong>do</strong> que o ponto no qual interesses<br />

e investimentos baixam, investimentos e interesses que são contingentes<br />

e aleatórios: em <strong>um</strong>a homologação abstrata e universal, eles<br />

não têm a menor possibilidade de "salvação". Na realidade, a própria<br />

metáfora <strong>do</strong> global é altamente problemática. Com efeito, ela mitifica o<br />

fato de que o "local" está se transforman<strong>do</strong> em mero produto <strong>do</strong> global,<br />

ao passo que a individualidade <strong>do</strong> "lugar" só tem senti<strong>do</strong> em grandes<br />

espaços concretos, historicamente defini<strong>do</strong>s. Nenh<strong>um</strong> lugar pode viver<br />

sem poliarquia. Nenh<strong>um</strong> nomos da terra, que não seja <strong>um</strong>a lex mercatoria<br />

universal defendida pelo poderio militar e prega<strong>do</strong> em nome de direitos<br />

que nenh<strong>um</strong>a jurisdição internacional sanciona e defende, poderá<br />

existir. <strong>um</strong>a globalização poliárquica e policêntrica parece ser, hoje, o<br />

único horizonte político capaz de dar <strong>um</strong>a alma à ordem mundial que<br />

se encontra no aperto <strong>do</strong> duplo movimento da despolitização universal<br />

e da expansão de <strong>um</strong> direito internacional a serviço de toda ingerência<br />

ou intervenção militar, que hoje já parece ter toma<strong>do</strong> o lugar <strong>do</strong> antigo<br />

direito fundamenta<strong>do</strong> em pactos interestaduais.<br />

<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> renova<strong>do</strong> e livre pode dar a si próprio outra missão<br />

— talvez a mais elevada — indican<strong>do</strong> a viabilidade e a necessidade política,<br />

em escala planetária, de <strong>um</strong>a coexistência, de <strong>um</strong> foedus entre grandes<br />

espaços culturais autônomos? A tarefa teórica mais alta e urgente é<br />

hoje <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> federativo capaz de se medir <strong>com</strong> os processos de<br />

globalização, em to<strong>do</strong>s os seus aspectos. Não alg<strong>um</strong> vago dever ser, mas<br />

aquele dever ser que vive nos momentos reais. A exigência de justiça não<br />

é <strong>um</strong> sonho, mas <strong>um</strong>a realidade histórica, e não reconhecer esse fato é,<br />

antes de tu<strong>do</strong>, <strong>um</strong> erro político. Nunca existiu e nunca existirá <strong>um</strong>a ética<br />

da responsabilidade sem a defesa da reciprocidade e da possibilidade<br />

de troca das convicções. Reduzir tu<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o se faz, para além da retórica<br />

habitual, a choque de civilizações, a relações de força, é irrealismo<br />

puro. Mais <strong>um</strong>a vez, são anos cruciais, e <strong>um</strong>a decisão entre a desmedida<br />

universalista e a medida federalista se faz urgente.<br />

O ARQUIPÉLAGO<br />

A ideia de poliarquia não é <strong>um</strong>a globalização <strong>com</strong>o ocidentalização,<br />

porque nenh<strong>um</strong>a Nova Ordem da Terra nascerá espontaneamente da<br />

ocidentalização planetária das forças e <strong>do</strong>s sistemas econômicos; tampouco<br />

<strong>um</strong>a ideologia, oposta e <strong>com</strong>plementar a essa, que poderíamos<br />

definir da dissolução da soberania, porque nenh<strong>um</strong> poder militar consegue<br />

hoje estar sozinho no cenário internacional. A ideia da poliarquia<br />

está perfeitamente presente na metáfora <strong>do</strong> arquipélago, e precisamente<br />

na ideia da coexistência <strong>do</strong>s diferentes (nómoi, lógoi etc.), que também é

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