Revista Palavra 2012 - Sesc
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ARTIGO<br />
SÓ EXISTE UM TEMPO: O TEMPO VIVO<br />
Quando Bartolomeu lançou seu O livro de<br />
Ana, escreveu uma dedicatória para mim:<br />
“Ruth, eu gosto cada vez mais de tê-la perto<br />
de mim.” E eu também gostava de tê-lo perto<br />
de mim, em seus livros e na Livraria Quixote, onde<br />
seus amigos se reuniam, aos sábados, para estar<br />
com ele. Agora que acabo de reler seu O livro de<br />
Ana, sublinhei uma frase-verso do escritor-poeta<br />
e o reencontrei nela, cheguei a ver seus anjos que<br />
voam acendendo estrelas. Os anjos voam e cantam<br />
e sua canção é leve, acompanhada de flauta, violino<br />
e cítara, ele, o poeta, revela. De novo, encantei-me<br />
com a imagem dos anjos e com Ana, a leitora, que<br />
sabia ler com emoção e contou a Bartolomeu<br />
que, “ao ler, também se vê e se escuta”. Compre endi<br />
que essa hora é sagrada e pensei como Maria teve<br />
em sua mãe uma professora que lia e se fazia escutar.<br />
E Maria deve ter aprendido tudo, ao som dessa voz.<br />
Há mãe e madrasta na obra de meu amigo escritor,<br />
figuras femininas positivas e negativas, como em<br />
um conto de fadas ou no conto de fadas que é nossa<br />
vida, e na vida dos escritores que recorrem a histórias<br />
alheias, por meio da memória que têm de livros<br />
de outros autores, pois sabem que sempre recorremos<br />
a nossas leituras, com as quais dialogamos,<br />
nesse espaço ímpar que é a literatura. Escutamos as<br />
vozes desses amigos na letra, que também habitam<br />
nossas letras, pois ninguém acredita mais na lenda<br />
da originalidade absoluta. E essa verdade nos possibilita<br />
recriar nosso mapa-múndi, descentrarmos<br />
quarenta e seis • julho <strong>2012</strong> REVISTA PALAVRA<br />
Ruth Silviano Brandão<br />
nossa visão das coisas deste mundo, ele mesmo em<br />
movimento constante.<br />
Também amigo de Bartolomeu, João Paulo<br />
Gonçalves da Costa me enviou este depoimento recebido<br />
de uma amiga que tem em comum com o escritor.<br />
Se alguém achar que plagiei o autor de O livro<br />
de Ana, fico até orgulhosa, mas não plagiei. Quer<br />
dizer apenas que somos almas fraternas no espaço<br />
da escrita. Leiamos juntos:<br />
Desconheço liberdade maior e mais duradoura<br />
do que esta do leitor ceder-se à escrita do<br />
outro,<br />
inscrevendo-se entre as suas palavras e os<br />
seus silêncios. Texto e leitor ultrapassam a<br />
solidão individual<br />
para se enlaçarem pelas interações. Esse<br />
abraço a partir do texto é soma das diferenças,<br />
movida pela<br />
emoção, estabelecendo um encontro fraterno<br />
e possível entre leitor e escritor. Cabe ao escritor<br />
estirar<br />
sua fantasia para, assim, o leitor projetar<br />
seus sonhos.<br />
As palavras são portas e janelas. Se debruçamos<br />
e reparamos, nos inscrevemos na paisagem.<br />
Se<br />
destrancamos as portas, o enredo do universo<br />
nos visita. Ler é somar-se ao mundo, é<br />
iluminar-se com<br />
Foto: SXC.