Pedagogia dos monstros - Apresentação
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aquilo que ele deixou para trás, ele deve constantemente<br />
abençoar a feliz hora que o elevou para sempre<br />
do estado da natureza e fez, de um animal<br />
estúpido, limitado, uma criatura de inteligência e<br />
um homem (ROUSSEAU, 1968, p. 64-5).<br />
Para compreender essa tensão é necessário colocála<br />
contra dois eixos do pensamento de Rousseau, os<br />
quais interseccionam-se em sua crítica do contrato social<br />
liberal como um dispositivo para a manutenção<br />
de relações sociais iníquas. Um <strong>dos</strong> eixos é ético e<br />
teleológico. Em seu pólo retrospectivo, ele postula um<br />
estado de natureza do qual emerge uma sociedade<br />
possessiva e competitiva, indicando, assim, os custos<br />
tanto quanto os benefícios desta transformação. Em<br />
seu pólo profético, ele imagina uma sociedade futura<br />
na qual indivíduos livres e iguais podem criar uma<br />
ordem política baseada na obrigação política auto-assumida<br />
— estando, assim, em sintonia com aquilo que<br />
é verdadeiro e duradouro na natureza humana. O eixo<br />
definido por esses pólos — um reconstruído “deveter-sido”<br />
e um hipotético “poderia-ser” — torna possível<br />
mapear a fraqueza e as duplicidades de um presente<br />
corrupto, bem como os perigos de mudanças na sociedade<br />
civil que não levem em conta a natureza do homem.<br />
O “retorno à natureza” de Rousseau não significa<br />
regressão ao primitivismo: “quando quero treinar um<br />
homem natural, não quero fazer dele um selvagem e<br />
enviá-lo de volta à selva” (ROUSSEAU, 1911, p. 217).<br />
Em vez disso, ele oferece um guia para sobreviver ao<br />
presente e criar um futuro mais democrático. De forma<br />
similar, a aspiração à liberdade sugere não apenas<br />
uma alternativa imaginável à experiência da alienação,<br />
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