Pedagogia dos monstros - Apresentação
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Permite-se que, por meio do corpo do monstro,<br />
fantasias de agressão, dominação e inversão tenham uma<br />
expressão segura em um espaço claramente delimitado,<br />
mas permanentemente situado em um ponto de<br />
limiaridade. O prazer escapista dá lugar ao horror apenas<br />
quando o monstro ameaça ultrapassar essas fronteiras,<br />
para destruir ou desconstruir as frágeis paredes<br />
da categoria e da cultura. Quando contido pela marginalização<br />
geográfica, de gênero, ou epistêmica, o monstro<br />
pode funcionar como um alter ego, como uma<br />
aliciante projeção do eu (um Outro eu). O monstro<br />
nos desperta para os prazeres do corpo, para os deleites<br />
simples e evanescentes de ser amedrontado ou de<br />
amedrontar — para a experiência da mortalidade e da<br />
corporeidade. Nós vemos o monstruoso espetáculo do<br />
filme de terror porque sabemos que o cinema é um<br />
lugar temporário, que a vibrante sensualidade das<br />
imagens de celulóide serão seguidas pela reentrada no<br />
mundo do conforto e da luz. 23 Da mesma forma, a<br />
história na página à nossa frente pode aterrorizar (pouco<br />
importa se ela aparece na seção de notícia do jornal<br />
ou no último livro de Stephen King), desde que estejamos<br />
seguros por sabermos de seu fim próximo — o<br />
número de páginas em nossa mão direita está diminuindo<br />
— e de que nós logo estaremos livres dela.<br />
Narrativas recebidas de forma auditiva não funcionam<br />
de forma diferente; não importa quão desestabilizadora<br />
seja a descrição do gigante, não importa quantas<br />
crianças pagãs e quantos indefesos cavaleiros ele<br />
devore, o Rei Artur acabará por destruí-lo. O público<br />
sabe como funciona esse gênero.<br />
Épocas de carnaval marginalizam, temporariamente,<br />
o monstruoso, mas, ao mesmo tempo, concedem-<br />
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