Pedagogia dos monstros - Apresentação
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Limitámo-nos a indicar a relação entre essas<br />
extraordinárias mutações e a que marca o interesse pela<br />
monstruosidade; mas de tal forma que nos ajudará,<br />
talvez, a compreender o que acontece hoje, nesse mesmo<br />
plano, sob o nosso olhar, nos corpos e no pensamento<br />
do corpo humano.<br />
***<br />
Se é verdade que o homem procura nos <strong>monstros</strong>,<br />
por contraste, uma imagem estável de si mesmo, não é<br />
menos certo que a monstruosidade atrai como uma<br />
espécie de ponto de fuga do seu devir-inumano: deviranimal,<br />
devir-vegetal ou mineral. Nele se confundem<br />
duas forças de vectores opostos: uma tendência à metamorfose<br />
e o horror, o pânico de se tornar outro.<br />
Vimos como, da Antiguidade a Descartes, a imagem<br />
do monstro se compunha de elementos repulsivos,<br />
adequa<strong>dos</strong> à função de complemento inverso e<br />
simétrico da humanidade do homem. Porém, essa<br />
imagem também atrai; é, aliás, porque atrai irresistivelmente<br />
que ela estanca o processo de transformação<br />
que induz.<br />
O que faz do monstro um “atractor” (da imaginação)?<br />
O facto de se situar numa fronteira indecisa entre<br />
a humanidade e a não-humanidade. Melhor: o<br />
nascimento monstruoso mostraria como potencialmente<br />
a humanidade do homem, configurada no corpo<br />
normal, contém o germe da sua inumanidade.<br />
Qualquer coisa em nós, no mais íntimo de nós —<br />
no nosso corpo, na nossa alma, no nosso ser — nos<br />
ameça de dissolução e caos. Qualquer coisa de imprevisível<br />
e pavoroso, de certo modo pior do que uma