22.04.2013 Views

Mulheres_na_Antiguidade

Mulheres_na_Antiguidade

Mulheres_na_Antiguidade

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

MULHERES NA ANTIGUIDADE - NEA/UERJ<br />

amigo e aliado, igualmente bárbaro. Hécuba compreende que está diante<br />

de uma nova crise e, <strong>na</strong> sua aposta, percebemos um si<strong>na</strong>l de defesa de<br />

um princípio de retribuição 320 a que as próprias circunstâncias a<br />

conde<strong>na</strong>m (756-757) 321: ‗que somente eu castigue os culpados e aceito ser escrava a<br />

vida inteira‘. Hécuba muda simplesmente de tom, passa a dar prioridade à<br />

vingança, a agir em nome de um objectivo reprovável a que tem de<br />

ajustar argumentos igualmente reprováveis.<br />

Como se, mesmo assim, a nobreza de alma que ainda resiste a<br />

orientasse, são éticos os argumentos que ensaia junto de Agamémnon, o<br />

seu novo interlocutor, o chefe supremo dos Aqueus, de quem suplica<br />

justiça e a punição dos culpados. Vemo-la repetir a estratégia retórica 322<br />

primeiro usada com Ulisses, antes de passar ao seu principal argumento<br />

<strong>na</strong> circunstância, a falta de respeito pela piedade devida às leis divi<strong>na</strong>s,<br />

além da quebra dos deveres impostos pela xenia e philia. Hécuba brada<br />

contra a impiedade do gesto de Polimestor, no seu desrespeito pela vida<br />

320 Como é sabido, se, no código moral grego, a philia exige um código<br />

retributivo, está também consagrada a vingança como um dever de<br />

compensação perante um inimigo. Cf. M. Nussbaum (1986), The fragility of<br />

goodness: luck and ethics in Greek tragedy and philosophy, Cambridge, 416; M. W.<br />

Blundell (1989), Helping friends and arming enemies. A study in Sophocles and Greek<br />

ethics, Cambridge. A mesma regra tinha aplicação em sociedade, impondo-se às<br />

famílias obter a desforra pelo crime de que algum dos seus membros tivesse<br />

sido vítima; cf. D. M. MacDowell (1963), The Athenian homicide law in the age of the<br />

Orators, 1.<br />

321 Não se trata, para Eurípides, de contrapor, a uma primeira Hécuba, uma<br />

outra, determi<strong>na</strong>da, activa, vingativa, como é a posição defendida por W. Steidle<br />

(1968), Studien zum antiken Drama, Munich.<br />

322 Na verdade, o motivo retórico que cruza a peça, e que se repete, com<br />

simetria de argumentos, quando estão em causa os interesses de Políxe<strong>na</strong> ou de<br />

Polidoro, é mais um factor a contrariar a interpretação de alguns estudiosos de<br />

que a Hécuba seja a colagem, mais ou menos incoerente, de dois temas distintos;<br />

cf. D. J. Co<strong>na</strong>cher, op. cit., 1-2; G. M. Kirkwood (1980), ‗Hecuba and nomos‘,<br />

Transactions of the American Philological Association 14, 30-44; P. Schubert, op. cit.,<br />

87-88. Entra <strong>na</strong>quilo que Ch. Segal (1990), ‗Violence and the other: Greek,<br />

female and barbarian in Euripides‘Hecuba‘, Transactions of the American Philological<br />

Association 120, 109, desig<strong>na</strong> por factores de ‗unidade temática‘.<br />

246

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!