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Mulheres_na_Antiguidade

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MULHERES NA ANTIGUIDADE - NEA/UERJ<br />

hábil exercício de persuasão. Esta é uma causa que justifica dois debates<br />

<strong>na</strong> peça: uma assembleia pública, masculi<strong>na</strong> e política, que decorre fora<br />

de ce<strong>na</strong>, seguida de um agon a dois, pessoal e directo, entre Ulisses e<br />

Hécuba. Vários são os fios que estreitam estes dois momentos retóricos:<br />

o filho de Laertes, como interventor em ambos, e a questão em debate, a<br />

sorte de duas filhas de Hécuba, Políxe<strong>na</strong> e Cassandra, cujo destino, a<br />

diferentes níveis, está em causa. Ainda que numa terminologia genérica,<br />

sem usar os vocábulos apropriados que se vão tor<strong>na</strong>r adiante insistentes,<br />

o coro, desabituado destas lides, captou-lhes no entanto o sentido<br />

essencial. Tratava-se de um confronto de duas argumentações<br />

simetricamente opostas (117) – ou seja, de um puro exercício de retórica<br />

– em torno de um caso onde charis e philia ponderavam: a concessão de<br />

um geras devido a Aquiles e por ele reclamado do além-túmulo. Ao que<br />

parecia ser um entendimento colectivo, cívico, dos deveres para com um<br />

companheiro de armas e herói público, vieram subrepticiamente<br />

adicio<strong>na</strong>r-se motivações pessoais e íntimas, de credibilidade duvidosa.<br />

Agamémnon (120-122), por charis e philia, ‗gratidão e sentimento‘ para com<br />

assandra, com quem gostosamente partilhava o leito, contrariava a<br />

pretensão de Aquiles, aliás seu rival <strong>na</strong>s honras em debate junto a Tróia.<br />

A voz ateniense, a própria encar<strong>na</strong>ção do modelo democrático de<br />

retórica, representada pelos dois filhos de Teseu, Acamas e Demofonte<br />

(123-124), em uníssono defendia a reivindicação do herói morto, mas<br />

não pelos melhores motivos; não era sobretudo a time devida a um<br />

companheiro que os movia, mas o desejo de contrariar o comandante,<br />

Agamémnon, e os seus inconfessáveis impulsos pela cativa troia<strong>na</strong>.<br />

Afi<strong>na</strong>l, neste debate, a vida de Políxe<strong>na</strong> não se discute perante os<br />

interesses de um único opositor, o herói da Ftia; com a sua eventual<br />

sobrevivência joga-se, como um preço a pagar, ‗a escravização de<br />

Cassandra‘. Ulisses interveio para aniquilar escrúpulos, repor a discussão<br />

no plano colectivo e recolocar, no centro da polémica, o conceito em<br />

debate, a charis devida ao herói (138).<br />

Quando Ulisses chega, como mensageiro da decisão dos Aqueus<br />

(218-228), omite a sua intervenção no processo e escuda-se no voto<br />

colectivo. É manifesto o seu desejo de executar rapidamente uma<br />

sentença, imoral e controversa, sem deixar margem a quaisquer outros<br />

argumentos (220-224): ‗Decretaram os Aqueus que a tua filha Políxe<strong>na</strong> fosse<br />

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