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Mulheres_na_Antiguidade

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MULHERES NA ANTIGUIDADE - NEA/UERJ<br />

sobrepõem. O que vale a vida de uma jovem, para mais mulher,<br />

estrangeira, inimiga, cativa, perante a home<strong>na</strong>gem devida a Aquiles, o<br />

primeiro dos heróis, um símbolo helénico de glória militar? Com a<br />

própria interrogação é o respeito fundamental pela vida huma<strong>na</strong>, um<br />

traço superior de civilização, que se vê abalado e relativizado por um<br />

nomos meramente político e circunstancial. Entrelaçada com charis e philia,<br />

a solidariedade, prática e salvadora, ou permeada de afecto, sofre do<br />

mesmo mal, despojada do seu carácter absoluto para se ver objecto de<br />

todos os condicio<strong>na</strong>mentos e contradições. Entendida, mais do que<br />

como um vínculo pessoal que age em situações de dificuldade e salva,<br />

como um processo de alianças políticas, susceptíveis e frágeis <strong>na</strong> sua<br />

contingência, a philia tor<strong>na</strong>-se um processo destrutivo, se a ela se puder<br />

recorrer para justificar a legitimidade da conde<strong>na</strong>ção de uma jovem ao<br />

sacrifício, ou para defender o assassínio de um hóspede por motivos de<br />

mera ambição. No meio do mesmo descalabro social, dike perdeu a<br />

limpidez de um conceito norteador em sociedade. Como protectora<br />

essencial da vida e dos direitos humanos, a justiça deixou-se abalar por<br />

outros interesses e motivações pessoais. Além de consentir o sacrifício<br />

injustificado de uma vida, claramente hesita <strong>na</strong> indigitação das suas<br />

vítimas (quando permite a conde<strong>na</strong>ção de uma Políxe<strong>na</strong> inocente em vez<br />

de Hele<strong>na</strong>), ou <strong>na</strong> avaliação das infracções grotescas que é chamada a<br />

punir (como o crime agravado por todos os maus motivos e estratégias<br />

que é o cometido por Polimestor contra o troiano Polidoro). Por fim,<br />

sobre todas essas regras construtivas de um verdadeiro sentido de<br />

humanidade, impõe-se um conflito de culturas, onde Gregos, Troianos e<br />

Bárbaros se polemizam, como se os grandes princípios universais, de<br />

respeito pela vida e coesão huma<strong>na</strong>s, estivessem condicio<strong>na</strong>dos por<br />

barreiras geográficas ou políticas.<br />

A ficção dramática permite a Eurípides incumbir a sua<br />

protagonista, Hécuba, a velha rainha de Tróia, símbolo extremo da ruí<strong>na</strong><br />

huma<strong>na</strong>, decepada de todos os bens que estruturam a civilização – ‗sem<br />

filhos, sem marido, sem pátria‟, 669 -, de fazer uma avaliação do mundo que<br />

a cerca, como uma espécie de cúmulo exemplar de decadência pessoal e<br />

cívica. Mais do que envolvê-la, com habilidade oratória, em sucessivos<br />

conflitos retóricos com os mais temíveis adversários – com Ulisses, o<br />

exemplar completo do retórico contemporâneo; com Agamémnon, o<br />

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