J. Herculano Pires - Portal Luz Espírita
J. Herculano Pires - Portal Luz Espírita
J. Herculano Pires - Portal Luz Espírita
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
124 – J. <strong>Herculano</strong> <strong>Pires</strong><br />
espécie de entusiasmo, dispondo de tal maneira do seu espírito já cansado, que o pôs<br />
em estado de receber as impressões dos sonhos e das visões”.<br />
De fato, Descartes, que se preocupava demasiado com a incerteza dos<br />
conhecimentos humanos, transmitidos tradicionalmente, deitouse para dormir e teve<br />
nada menos de três sonhos, que considerou bastante significativos. O mais curioso é<br />
que esses sonhos já lhe haviam sido preditos pelo Demônio, que à maneira do que se<br />
verificava com Sócrates, o advertia de coisas por acontecer. A importância desses<br />
sonhos, como sempre acontece quando se trata de ocorrências paranormais, não foi<br />
até hoje apreciada pelos historiadores e pelos intérpretes do filósofo. Mas Descartes<br />
declarou que eles lhe haviam revelado “os fundamentos da ciência admirável”, uma<br />
espécie de conhecimento universal, válido para todos os homens e em todos os<br />
tempos. Essa ciência não seria elaborada apenas por ele, pois tratavase de “uma<br />
obra imensa, que não poderia ser feita por um só”. Comentando o episódio, acentua<br />
Gilbert Mury: “Esse homem voluntarioso e frio tem qualquer coisa de um profeta.<br />
Anuncia a Boa Nova. Escolheu a rota da sabedoria, e nela permanecerá”.<br />
Descartes sentiuse de tal maneira empolgado pelos sonhos que acreditou<br />
haver sido inspirado pelo Espírito da Verdade. O Abade Baillet registra esse fato em<br />
sua biografia do filósofo. Foi tal a clareza da intuição recebida, em forma onírica,<br />
que Descartes se considerou capaz de pulverizar a velha e falsa ciência escolástica,<br />
que lhe haviam impingido desde criança. Pediu a Deus que o amparasse, que lhe<br />
desse forças para realizar a tarefa que lhe cabia, na grande obra a ser desenvolvida.<br />
Rogou a Deus que o confirmasse no propósito de elaborar um método seguro para a<br />
boa direção do espírito humano. E desse episódio originouse toda a sua obra, que<br />
abriu os caminhos da ciência moderna. Não tinha Descartes, nessa ocasião, mais do<br />
que 23 anos. Julgouse, por isso mesmo, demasiado jovem para tão grande e<br />
perigosa empreitada. Não obstante, como um verdadeiro vidente, empenhou, dali<br />
por diante, todos os seus esforços, no sentido de adquirir conhecimentos e condições<br />
para o trabalho entrevisto. E dezoito anos depois lançou o DISCURSO DO MÉTODO,<br />
que rasgaria os novos caminhos da ciência.<br />
Cauteloso, diante dos perigos que ameaçavam os pensadores livres da<br />
época, Descartes não deixou, entretanto, de cumprir o seu trabalho, que Espinosa<br />
prosseguiria mais tarde, e que mais tarde ainda se completaria com a dedicação de<br />
Kardec. A epopeia do cogito, realizada no silêncio da meditação, é uma indicação de<br />
rumos à nova ciência. Descartes mergulhou em si mesmo, negando toda a realidade<br />
material, inclusive a do próprio corpo, na procura de alguma realidade positiva, que<br />
se afirmasse por si mesma, de maneira indubitável. Foi então que descobriu a<br />
realidade inegável cio espírito, proclamando, no limiar da nova era: “Cógito, ergo<br />
sum”, ou seja: “Penso, logo existo”.<br />
E no mesmo instante em que reconheceu essa verdade, julgouse isolado do<br />
universo, perdido em si mesmo. Só podia afirmar a sua própria existência. Nada