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Reinaldo Azevedo Schiavo.pdf - ICHS/UFOP

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO<br />

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS<br />

REINALDO AZEVEDO SCHIAVO<br />

OS REDENTORISTAS EM TEMPOS DE AGGIORNAMENTO:<br />

UM ESTUDO SOBRE A PASTORAL MISSIONÁRIA DA PROVÍNCIA DO<br />

RIO DE JANEIRO, MINAS GERAIS E ESPÍRITO SANTO<br />

ENTRE AS DÉCADAS DE 1960-1980<br />

Mariana<br />

2011


REINALDO AZEVEDO SCHIAVO<br />

OS REDENTORISTAS EM TEMPOS DE AGGIORNAMENTO:<br />

UM ESTUDO SOBRE A PASTORAL MISSIONÁRIA DA PROVÍNCIA DO<br />

RIO DE JANEIRO, MINAS GERAIS E ESPÍRITO SANTO<br />

ENTRE AS DÉCADAS DE 1960-1980<br />

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-<br />

Graduação em História do Instituto de Ciências<br />

Humanas e Sociais da Universidade Federal de<br />

Ouro Preto, como requisito parcial à obtenção do<br />

grau de Mestre em História.<br />

Área de concentração: Estado, Região e Sociedade<br />

Linha de pesquisa: Cultura, Ideia e Historiografia<br />

Orientador: Sérgio Ricardo da Mata<br />

Mariana<br />

Instituto de Ciências Humanas e Sociais/ <strong>UFOP</strong><br />

2011


S329r <strong>Schiavo</strong>, <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong>.<br />

Os redentoristas em tempos de Aggiornamento [manuscrito] : um estudo<br />

sobre a pastoral missionária da Província Redentorista do Rio de Janeiro,<br />

Minas Gerais e Espírito Santo entre as décadas de 1960-1980 / <strong>Reinaldo</strong><br />

<strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. - 2011.<br />

162f. : il., color.; mapas.<br />

Orientador: Prof. Dr. Sérgio Ricardo da Mata.<br />

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de<br />

Ciências Humanas e Sociais. Departamento de História. Programa de Pósgraduação<br />

em História.<br />

Área de concentração: Estado, Região e Sociedade.<br />

1. Igreja católica - Brasil - Séc. XX - Teses. 3. Redentoristas - Missões -<br />

Brasil - História - Teses. 4. Comunidades eclesiais de base - Teses. 5. Concílio<br />

Vaticano (2.:1962-1965) - Teses. I. Universidade Federal de Ouro Preto.<br />

II. Título.<br />

CDU: 27-789.9(815.1/.3)(091)<br />

Catalogação: sisbin@sisbin.ufop.br


<strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong><br />

Os Redentoristas em tempos de aggiornamento:<br />

Um estudo sobre a pastoral missionária da província do Rio de<br />

Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo entre as décadas de<br />

1960-1980<br />

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em História<br />

da <strong>UFOP</strong> como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre<br />

em História. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.<br />

___________________________________<br />

Prof. Dr. Sérgio Ricardo da Mata<br />

Orientador<br />

Universidade Federal de Ouro Preto<br />

___________________________________<br />

Profª. Drª. Virgínia Albuquerque de Castro Buarque<br />

Universidade Federal de Ouro Preto<br />

___________________________________<br />

Prof. Dr. Marcelo Ayres Camurça<br />

Universidade Federal de Juiz de Fora<br />

___________________________________<br />

Prof. Dr. Gilberto Paiva<br />

Província Redentorista de São Paulo


À Alexandra <strong>Schiavo</strong>,<br />

minha amiga, namorada, esposa…<br />

meu amor!


Agradecimentos<br />

Realizar essa pesquisa de mestrado foi uma tarefa árdua e prazerosa, recheada de<br />

imprevistos e momentos de solidão, mas também de satisfação e alegria. Tudo isso só foi<br />

possível porque tive a meu auxílio amigos e instituições que me deram todo o suporte necessário<br />

e, por isso, merecem meus sinceros agradecimentos.<br />

Agradeço ao professor Ivan Antônio de Almeida (in memoriam) por me orientar<br />

nessa empreitada pelo tempo que lhe foi permitido. Infelizmente, a vida não permitiu que<br />

chegássemos juntos ao final desse trabalho, mas sua contribuição foi fundamental para o<br />

desfecho dessa dissertação. Agradeço também ao professor Sérgio da Mata por ter assumido<br />

prontamente a orientação num momento delicado e, certamente, o mais difícil dessa<br />

pesquisa.<br />

Sou grato à Universidade Federal de Ouro Preto e seu Instituto de Ciências Humanas<br />

e Sociais, pela oportunidade de compor seu quadro de mestrandos; aos professores do<br />

Programa de Pós-graduação em História, pela atenção e dedicação que sempre tiveram; à<br />

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por ter financiado<br />

esse estudo com uma bolsa de pesquisa, o que permitiu uma dedicação exclusiva de<br />

minha parte.<br />

Estendo meus agradecimentos aos padres e irmãos redentoristas que educadamente<br />

me receberam em seus conventos e abriram o baú de suas memórias e esse mero desconhecido,<br />

sedento por vasculhar suas lembranças em busca de informações que interessassem<br />

ao nosso propósito. De forma especial, agradeço ao provincial padre Vicente de Paula Ferreira,<br />

por permitir meu trabalho no arquivo da Província do Rio; à arquivista Luciana Verônica,<br />

que me deu todo suporte necessário; ao padre Gilberto Paiva que, sempre atencioso<br />

e prestativo, compartilhou comigo seus profundos conhecimentos sobre a Congregação do<br />

Santíssimo Redentor.<br />

Deixo registrados meus sinceros agradecimentos aos meus pais, Efigênio e Margarida;<br />

aos meus irmãos, Rogério e Regina; meus cunhados, Camila e Juarez; meus sobrinhos,<br />

Juan, Pedro, João e Bernar. Uma família maravilhosa que sempre me apoiou e acre-


ditou em meu potencial. Agradeço também ao Ladim e à Dona Maria, por me acolherem e<br />

me considerarem verdadeiramente como um filho.<br />

De forma especial, agradeço ao amigo e padrinho Fabrício Oliveira, meu fiel companheiro<br />

que, desde os tempos de graduação, tem sido essencial em todas as minhas conquistas.<br />

Sem suas leituras atentas, suas sugestões, seus conselhos e sua amizade, teria sido<br />

tudo muito mais difícil. Também sou grato aos bons amigos(as) Renata, João Vitor, Arnaldo<br />

e Iza, por complementarem esse belo time que formamos.<br />

Ao velho amigo Luís da Paixão, que me acolheu em sua casa num momento delicado<br />

de minha vida e me incentivou a levar adiante o ainda incipiente projeto de pesquisa;<br />

aos incansáveis pejoteiros da Arquidiocese de Mariana, principalmente os da ‘velha guarda’;<br />

aos companheiros de Matipó, em especial àquelas ‘onze e ocultas’ amizades de boteco.<br />

Aos amigos do “1521”, pelas boas conversas, pelas cervejas geladas, pelas partidas de<br />

sinuca e pelas gargalhadas que sempre me proporcionam. De forma especial agradeço ao<br />

Rodrigo Mandruvá, pelas várias transcrições de entrevistas, e ao José Maurício Sapo, por<br />

sua fundamental ajuda com as ilustrações dessa dissertação.<br />

Não posso deixar de agradecer aos inúmeros e anônimos motoristas que me deram<br />

carona em todas as vezes que coloquei o “pé na estrada” para assistir as aulas em Mariana,<br />

pesquisar no arquivo em Juiz de Fora e visitar os conventos e comunidades em distintas<br />

cidades de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro.<br />

Por último, agradeço àquela que deveria encabeçar esta lista: minha doce Alexandra.<br />

Seu amor é meu combustível, seu olhar é minha alegria, seu cheiro é minha inspiração,<br />

seu caráter é meu orgulho e sua bondade é minha admiração. Foi ela que me encorajou<br />

quando tive medo, me aconselhou quando tive dúvida, me engrandeceu quando senti-me<br />

pequeno e me amou em todos os momentos.


Resumo<br />

A presente dissertação é um estudo sobre a pastoral missionária da Província Redentorista<br />

do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo entre as décadas de sessenta e oitenta do<br />

século XX. Submetida a uma forte crise institucional e influenciada pelo aggiornamento<br />

do Concílio Vaticano II, essa Província promoveu uma reformulação em seu método missionário,<br />

passando a fomentar o surgimento de Comunidades Eclesiais de Base nas paróquias<br />

missionadas. As tradicionais Santas Missões foram substituídas por dois novos modelos<br />

denominados: 1) Ação Missionária, um evento de caráter extraordinário realizado em<br />

três etapas sob a metodologia conhecida como ver-julgar-agir; 2) Missões Inseridas, evento<br />

de caráter ordinário que consiste numa experiência de inserção em uma paróquia por um<br />

período de tempo determinado. A pesquisa foi baseada principalmente na análise de documentos<br />

provinciais e em entrevistas temáticas realizadas com missionários e leigos. Concluímos<br />

que as missões redentoristas suscitaram um conjunto de comunidades de base sem,<br />

contudo, imputar-lhes um caráter político e militante normalmente atribuído às CEBs.<br />

Palavras-chave: Igreja Católica, Redentoristas, Missões, Comunidades Eclesiais de Base,<br />

Concílio Vaticano II.


Abstract<br />

This dissertation is a study of the mission pastoral of the Redemptorist Province of Rio de<br />

Janeiro, Minas Gerais and Espírito Santo between the sixties and eighties decades of the<br />

twentieth century. Submitted to an institutional crisis and influenced by the aggiornamento<br />

of Second Vatican Council, the province promoted a reformulation in its missionary method,<br />

starting to encourage the emergence of Basic Ecclesial Communities in missionary<br />

parish. The traditional Holy Missions were replaced by two new models called: 1) Missionary<br />

Action, an extraordinary event, realized in three stages under the methodology known<br />

as “see-judge-act”, 2) Inserted Missions, an ordinary event which consists in an experience<br />

of being inserted in a parish for a period of time. The research was based primarily on<br />

analysis of documents in provincial and thematic interviews conducted with missionaries<br />

and laymen. We conclude that the Redemptorist Missions have raised a set of base communities,<br />

but without imputing to them a political and militant usually attributed to the<br />

BECs.<br />

Key words: Catholic Church, Redemptorists, Missions, Basic Ecclesial Communities,<br />

Second Vatican Council.


Ilustrações<br />

Figura 01. Santuários administrados pelos redentoristas no Brasil<br />

Figura 02. Fundações da Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo<br />

Figura 03. Missões Inseridas da Província do Rio de Janeiro<br />

Figura 04. (Vice) Províncias Redentoristas no Brasil<br />

Figura 05. Ilustração de documentos do Arquivo da Província do Rio de Janeiro.


Siglas e abreviaturas<br />

AM: Ação Missionária<br />

APRJ: Arquivo da Província do Rio de Janeiro<br />

APSP: Arquivo da Província de São Paulo<br />

CEBs: Comunidades Eclesiais de Base<br />

CELAM: Conselho Episcopal Latino-Americano<br />

CERESP: Centro Redentorista de Espiritualidade<br />

CERIS: Centro de Estudos Religiosos de Investigações Sociais<br />

CNBB: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil<br />

CRB: Conferência dos Religiosos do Brasil<br />

CSSR: Congregação do Santíssimo Redentor<br />

CVII: Concílio Vaticano II<br />

INAL: Instituto Nacional de Apostolado Leigo<br />

INP: Instituto Nacional de Pastoral<br />

ISPAC: Instituto Superior de Pastoral Catequético<br />

ISPAL: Instituto Superior de Pastoral Litúrgica<br />

ISPAV: Instituto Superior de Pastoral Vocacional<br />

MI: Missões Inseridas<br />

Pe: Padre<br />

PPC: Plano de Pastoral de Conjunto<br />

PPE: Plano de Pastoral de Emergência<br />

TdL: Teologia da Libertação


Sumário<br />

Introdução ................................................................................................................ 12<br />

Capítulo I: Congregação do Santíssimo Redentor: história e carisma ............... 18<br />

Santo Afonso e o carisma missionário ....................................................................... 22<br />

A gênese da Congregação do Santíssimo Redentor .................................................. 30<br />

Os redentoristas para além dos Alpes ........................................................................ 34<br />

A missão redentorista no Brasil ................................................................................. 37<br />

A Vice-Província do Rio e sua expansão .................................................................. 40<br />

Capítulo II: Os Redentoristas no Contexto Conciliar: aggiornamento, planejamento<br />

pastoral e crise ........................................................................................... 47<br />

A CNBB e o planejamento pastoral na década de 1960 ............................................ 56<br />

A Província do Rio e a crise dos anos sessenta ......................................................... 65<br />

Capítulo III: A Pastoral Missionária Redentorista: conflitos, divergências e<br />

renovação .................................................................................................................. 75<br />

Conflitos e renovação ................................................................................................ 77<br />

A Província do Rio e a pastoral de conjunto ............................................................. 82<br />

A Ação Missionária redentorista ............................................................................... 93<br />

As Missões Inseridas ................................................................................................. 100<br />

Capítulo IV: Organização de Base na Igreja Católica: CEBs, Teologia da Libertação<br />

e Missões Inseridas ................................................................................... 106<br />

Comunidades ou Grupos: uma análise conceitual ..................................................... 111<br />

Comunidades (Grupos) de Base e Comunidades Eclesiais de Base .......................... 116<br />

Missões inseridas e CEBs: a campanha redentorista para organização de base ....... 123<br />

Considerações Finais ............................................................................................... 133<br />

Fontes ........................................................................................................................ 137<br />

Referências Bibliográficas ....................................................................................... 142<br />

Anexos ....................................................................................................................... 155


O<br />

Introdução<br />

cristianismo, desde os primórdios de sua existência, encontrou nas atividades missionárias<br />

sua principal fonte para propagação dos ensinamentos de seu messias. O<br />

cristão, por excelência, é o missionário de Cristo, o anunciante da boa nova e o evangelizador<br />

de outros povos. No caso da Igreja Católica Romana, um ligeiro olhar à sua história<br />

é suficiente para percebermos como a atividade missionária compõe vários capítulos de sua<br />

trajetória. A conversão dos “pagãos”, a catequização dos “bárbaros”, a evangelização do<br />

“novo mundo”, talvez nada disso teria sido possível sem as missões cristãs. Sem querer<br />

minimizar os aspectos políticos que proporcionaram tais feitos, o que aqui destacamos é a<br />

importância da dimensão missionária para o cristianismo como um todo, e para o catolicismo<br />

de modo particular.<br />

Ao longo de sua história, surgiram, na Igreja Católica, vários institutos religiosos<br />

dedicados majoritariamente à pastoral missionária. Dentre eles destaca-se a Congregação<br />

do Santíssimo Redentor, fundada no século XVIII por Afonso Maria de Ligório, um ícone<br />

das missões católicas. Em quase três séculos de existência, os redentoristas – como ficaram<br />

conhecidos os confrades dessa congregação – expandiram seu arcabouço institucional<br />

através da prática missionária herdada do carisma afonsiano, pregando a mensagem cristã<br />

da redenção. Atualmente, figuram entre os dez mais numerosos institutos religiosos católicos,<br />

com sede em setenta e sete países dos cinco continentes do globo, somando aproximadamente<br />

5.500 membros entre padres, irmãos e seminaristas 1 .<br />

No Brasil, a obra redentorista teve início em 1894 com a chegada dos missionários<br />

holandeses que se instalaram na cidade mineira de Juiz de Fora, então circunscrita à Diocese<br />

de Mariana. Ao longo do século XX, essa missão holandesa deu origem à Província<br />

Redentorista do Rio de Janeiro, também conhecida como Província do Rio-Minas-Espírito<br />

Santo. Desde as primeiras experiências no final do século XIX até os dias atuais, os confrades<br />

dessa fundação missionária têm se dedicado à evangelização, administração de pa-<br />

1<br />

Cf. Site oficial da Congregação do Santíssimo Redentor <br />

acessado em 10/02/2010.


óquias e centros de peregrinação de romeiros, e à pregação de inúmeras missões em diversas<br />

localidades do território brasileiro. Uma atuação destacada até mesmo na literatura de<br />

João Guimarães Rosa:<br />

Por fim, no porém, passados anos, foi tempo de missão, e chegaram no<br />

arraial os missionários. Esses eram dois padres estrangeiros, p’ra fortes e<br />

de caras coradas, bradando sermão forte, com forte voz, com fé braba. De<br />

manhã à noite, durado de três dias, eles estavam sempre na igreja, pregando,<br />

confessando, tirando rezas e aconselhando, com entusiasmados<br />

exemplos que enfileiravam o povo no bom rumo. A religião deles era alimpada<br />

e enérgica, com tanta saúde como virtude; e com eles não se<br />

brincava, pois tinham de Deus algum encoberto poder 2 .<br />

A pastoral missionária é a principal atividade dos redentoristas, é a ação essencial<br />

que lhes outorga a identidade de “missionários filhos de Santo Afonso”. Nas chamadas<br />

Santas Missões, evento extraordinário e sacramental na vida das comunidades, o método<br />

utilizado foi desenvolvido por Afonso de Ligório, pautado no anúncio do Cristo Redentor,<br />

na devoção a Nossa Senhora, nos sacramentos e mandamentos da Igreja Católica e na conversão<br />

individual das almas. Foi seguindo o método afonsiano que a Província do Rio de<br />

Janeiro expandiu sua obra missionária na primeira metade do século XX, tornando-se, nas<br />

décadas de 1940 e 1950, “a unidade redentorista que, em termos numéricos, teve o maior<br />

engajamento missionário e, geograficamente falando, atuou numa imensa e extensa parte<br />

do território nacional” 3 .<br />

Todavia, no contexto do aggiornamento da Igreja Católica, fomentado principalmente<br />

pelos desdobramentos do Concílio Vaticano II (1962-65), a Província do Rio promoveu<br />

mudanças em sua pastoral missionária. O tradicional método das Santas Missões<br />

foi substituído por uma nova metodologia que teve como objetivo principal a formação de<br />

Comunidades Eclesiais de Base. Dois projetos foram elaborados: primeiro surgiu a Ação<br />

Missionária, um evento extraordinário dividido em três etapas; depois vieram as Missões<br />

2 ROSA, 1994, p. 310-311. Em seus relatos, Guimarães Rosa não cita explicitamente os redentoristas, mas,<br />

sem dúvida alguma, é sobre esses confrades que o escritor se refere. A região do Grande Sertão Veredas faz<br />

parte da área de atuação dos redentoristas da Província do Rio de Janeiro, a quem Rosa tinha grande apreço.<br />

Numa correspondência datada em 26 de agosto de 1963, endereçada ao padre João Batista Boaventura Leite<br />

CSsR, Guimarães Rosa escreveu: “Guardo recordações viva e profunda admiração pelos filhos de Santo<br />

Afonso Maria de Ligório, principalmente por esses, nossos, sólidos missionários, de Belo Horizonte e Curvelo,<br />

da Província holandesa. Aí, na igreja de São José, ajudei missa, comi mangas e nêsperas da chácara, no<br />

tempo dos bons padres João Batista, Godofredo Strijbos, Henrique Brandão, Jerônimo, Clemente, Cornélio,<br />

Sebastião, Ferreira, Guilherme, Paulo e outros – todos magnificamente esplêndidos de vigor limpo e exata<br />

irradiação espiritual, só com sua presença e exemplo atraindo a gente para a devoção e o amor às coisas da<br />

religião”. Essa carta nos foi gentilmente cedida pelo padre Boaventura Leite, que a guarda em seu arquivo<br />

particular.<br />

3 WERNET, 1997, p. 302.<br />

13


Inseridas, de caráter ordinário que consiste numa experiência de inserção numa paróquia<br />

por um tempo determinado. São esses renovados métodos missionários, com os meandros<br />

de sua elaboração e os resultados de sua execução, que ocupam o centro das análises realizadas<br />

nas páginas dessa dissertação de mestrado.<br />

A idéia de estudar as missões redentoristas dessa Província nas décadas de sessenta<br />

e setenta começou a ser pensada em 2007 durante minhas atividades de pesquisa para a<br />

conclusão do curso de história pela Universidade Federal de Viçosa. Naquela ocasião, pesquisava<br />

a formação das Comunidades Eclesiais de Base na paróquia de Nossa Senhora da<br />

Conceição em Porto Firme-MG, circunscrita à Arquidiocese de Mariana. Foi quando descobri<br />

que as primeiras CEBs nessa cidade surgiram por intermédio da Ação Missionária<br />

dos redentoristas no início de 1970 4 . Ao procurar informações sobre essas missões, percebi<br />

que elas ainda estavam por ser analisadas de um ponto de vista acadêmico. Encontrei um<br />

único e sucinto registro na obra de Augustin Wernet, intitulada Os Redentoristas no Brasil,<br />

e produzida por encomenda dos próprios redentoristas por ocasião da comemoração do<br />

centenário das fundações nesse país. Em mais de mil páginas divididas nos três volumes<br />

dessa obra, apenas sete trazem (poucas) informações sobre a Ação Missionária e as Missões<br />

Inseridas da Província do Rio 5 .<br />

Diante dessa lacuna, duas perguntas me instigavam: 1) o que levou a Província do<br />

Rio de Janeiro a substituir o tradicional método das Santas Missões por um novo modelo?<br />

e 2) se esses missionários se tornaram formadores de CEBs, porque então não aparecem na<br />

literatura que trata desse fenômeno religioso no Brasil? A partir de então, resolvi dedicar<br />

meu mestrado ao estudo dessas novas modalidades de missões, e, inevitavelmente, surgiram<br />

outras perguntas: em que consistem os novos métodos missionários? Qual a diferença<br />

substancial em relação ao método tradicional? Qual o perfil das Comunidades Eclesiais de<br />

Base formadas por esses missionários? Seria a Teologia da Libertação a orientação teológica<br />

nos novos métodos? Como e onde aconteceu a implementação dessas novas missões?<br />

E de que forma essa proposta foi assimilada pelas comunidades missionadas?<br />

A busca pelas repostas teve início com um trabalho no arquivo da Província do Rio.<br />

Atas de reuniões, relatórios das missões, crônicas, correspondências e textos de circulação<br />

interna foram as principais fontes analisadas, tendo sempre em vista que tais documentos<br />

representam a visão dos redentoristas sobre nosso objeto de estudo. O recorte temporal<br />

4 SCHIAVO, 2007.<br />

5 WERNET, 1997, p. 316-322.<br />

14


adotado inicia-se na década de sessenta, tendo como referência o Concílio Vaticano II,<br />

abarcando as décadas de setenta e oitenta, quando aconteceram as principais experiências<br />

da Ação Missionária e das Missões Inseridas. O fato de tratarmos de um acontecimento<br />

recente, do qual muitos protagonistas ainda estão vivos e atuantes, nos permitiu utilizar a<br />

metodologia da História Oral 6 e realizar entrevistas temáticas com missionários e leigos,<br />

em busca de suas lembranças sobre as missões redentoristas. A memória é uma reconstrução<br />

seletiva do passado, e “cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória<br />

coletiva” 7 ; ter acesso às lembranças de uma pessoa permite-nos conhecer uma parte, mesmo<br />

que ressignificada, de seu de passado, “um passado que nunca é aquele do indivíduo<br />

somente, mas de um indivíduo inserido num contexto familiar, social, nacional” 8 . Vale<br />

ressaltar que todas as entrevistas foram realizadas durante nossas visitas aos conventos<br />

redentoristas e às comunidades missionadas, um contato fundamental para conhecermos<br />

um pouco melhor a realidade vivida tanto pelos confrades quanto pelos leigos.<br />

Para compreender o contexto eclesiológico e sócio-político no qual estava inserida<br />

a Província do Rio quando optou por renovar seu método missionário, foram utilizados<br />

documentos oficiais da Igreja Católica, como os produzidos pela CNBB – principalmente o<br />

Plano de Pastoral de Emergência (1962) e o Plano de Pastoral de Conjunto (1965) –, os<br />

textos conciliares do Vaticano II e as Encíclicas Papais de João XXIII e Paulo VI, além da<br />

literatura sobre Igreja Católica, Teologia da Libertação, Comunidades Eclesiais de Base,<br />

ditadura militar no Brasil, guerra fria e movimentos de contracultura.<br />

Se as questões contextuais são primordiais numa reflexão histórica, em nosso caso<br />

também foi de suma importância analisar as especificidades que envolvem a Província<br />

Redentorista do Rio, que atravessou, na década de 1960, a mais intensa crise de sua história<br />

centenária. Crise esta que significou uma considerável redução do número de confrades,<br />

desarticulação das equipes missionárias, supressão de todos os seminários de formação e<br />

alguns conventos, além de conflitos e divergências entre confrades. Um período de instabilidade<br />

que potencializou a necessidade de mudança e renovação, isto é, de uma nova postura<br />

e atitude que pudessem reconduzir a Província a uma atuação missionária mais proeminente,<br />

sem macular sua identidade missionária. Naquele contexto, os Planos de Pastoral de<br />

6 Segundo Jorge Lozano, fazer história oral significa produzir conhecimentos históricos a partir da visão e<br />

versão dos atores sociais e não simplesmente ordenar os relatos das experiências dos indivíduos. LOZANO,<br />

In.: FERREIRA & AMADO, 2002.<br />

7 HALBWACHS, 2006, p. 69.<br />

8 ROUSSO, In.: FERREIRA & AMADO, 2002, p. 94.<br />

15


Emergência e de Conjunto representavam as novas diretrizes para a Igreja Católica no Brasil,<br />

com o objetivo de colocá-la em sintonia com as inovações conciliares; foi nesses Planos<br />

que os redentoristas encontraram os principais referenciais metodológicos para o nascente<br />

projeto missionário de formação de Comunidades Eclesiais de Base.<br />

Nas décadas de sessenta e setenta, a Província do Rio de Janeiro afinou seu discurso<br />

ao da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, recebeu influências da Teologia da<br />

Libertação e aderiu ao movimento de formação de comunidades de base; mas as CEBs<br />

suscitadas pelos missionários assumiram características diferentes daquelas geralmente<br />

descritas na literatura como grupos ‘politizados’, engajados numa militância políticosocial.<br />

O teor das missões redentoristas, desde os tempos de Santo Afonso, é querigmático,<br />

e isso não se perdeu com as novas metodologias. Sem uma orientação partidária ou uma<br />

vinculação a algum tipo de movimento social institucionalizado, aqueles confrades desempenharam<br />

uma campanha para formação de comunidades católicas seguidoras dos mandamentos<br />

da Igreja, com seus dogmas e sacramentos.<br />

Os redentoristas são, por excelência, os herdeiros do carisma afonsiano. São eles os<br />

guardiães e propagadores do legado de Afonso de Ligório, e uma análise sobre a ação pastoral<br />

desses confrades, impreterivelmente, deve levar em conta a maneira como os ensinamentos<br />

do fundador são adaptados aos novos tempos. Por isso, no primeiro capítulo dessa<br />

dissertação nosso objetivo é elucidar quais características são preservadas e incorporadas<br />

Santo Afonso, demonstrando como o carisma é definido pelos próprios redentoristas. Além<br />

disso, no intuito de situar a Província do Rio na história da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor, foi desenvolvida uma discussão sobre sua fundação no Reino de Nápoles, sua<br />

expansão pela Europa, bem como a chegada, consolidação e desenvolvimento da missão<br />

holandesa no Brasil.<br />

O segundo capítulo está subdividido em três partes. A primeira é uma contextualização<br />

da década de 1960 voltada para questões sociais, políticas e religiosas. Na segunda<br />

efetuamos uma análise detalhada sobre os Planos de Pastoral de Emergência e de Conjunto,<br />

que representam as orientações oficiais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil<br />

para o catolicismo brasileiro. A terceira e última é dedicada à crise enfrentada pela Província<br />

do Rio nos anos sessenta, atentando para suas causas e consequências.<br />

No terceiro capítulo, abordamos o processo vivenciado pelos redentoristas para a<br />

mudança na metodologia das missões, com os conflitos internos e a adesão da Província à<br />

pastoral de conjunto. Os objetivos e métodos da Ação Missionária e das Missões Inseridas<br />

16


são pensados em comparação com as Santas Missões, destacando as diferenças e semelhanças<br />

entre esses distintos projetos.<br />

No capítulo quarto, efetuamos primeiramente um debate com a literatura sobre as<br />

Comunidades Eclesiais de Base e a Teologia da Libertação, pontuando as discussões consideradas<br />

mais importantes para essa pesquisa. Em seguida, analisamos o perfil das CEBs<br />

formadas pelos redentoristas, contrapondo o teor da campanha empregada por esses confrades<br />

com o modelo descritos nos livros e artigos analisados. E, por ultimo, tecemos algumas<br />

considerações finais na intenção de que esse trabalho possa contribuir com as reflexões<br />

históricas e sociológicas sobre o catolicismo brasileiro em tempos de aggiornamento.<br />

17


Mais que os vigias que guardam a manhã<br />

espere Israel pelo Senhor,<br />

porque junto ao Senhor se acha a misericórdia;<br />

encontra-se nele copiosa redenção.<br />

[Copiosa apud eum redemptio].<br />

Salmo 130, versículo 7,<br />

lema da Congregação do Santíssimo Redentor


E<br />

CAPÍTULO I<br />

Congregação do Santíssimo Redentor:<br />

história e carisma<br />

studar um período recente na história da Congregação do Santíssimo Redentor não<br />

nos isenta da responsabilidade de situá-la em sua trajetória histórica, uma vez que as<br />

principais atividades desenvolvidas no presente se sustentam e justificam na – e pela – tradição<br />

histórica preservada por esse instituto, principalmente no que se refere ao carisma<br />

(Charismata) do fundador Afonso Maria de Ligório.<br />

No chamado “senso comum”, a palavra carisma é comumente utilizada como sinônimo<br />

de simpatia, popularidade ou mesmo contágio emocional. Assim, um charmoso apresentador<br />

de programas televisivos, um cantor com boa presença de palco, um professor de<br />

agradável retórica ou mesmo um político cuja ética aprovamos, todos eles, pela linguagem<br />

corrente, podem ser considerados carismáticos. No entanto, esses indivíduos não são necessariamente<br />

pessoas com quem partilhamos suas íntimas e subjetivas convicções políticas,<br />

culturais e/ou religiosas, pois “não nos sentimos inclinados a permitir que um indivíduo<br />

popular fixe por nós nossa linha de ação” 1 .<br />

Enquanto conceito sociológico, o carisma pode ser definido “como uma relação de<br />

poder fortemente assimétrica entre um guia inspirado e uma coorte de seguidores que reconhece<br />

nele e em sua mensagem a promessa e a realização antecipada de uma nova ordem,<br />

a que aderem com convicção mais ou menos intensa” 2 . Esse reconhecimento na mensagem<br />

do guia – ou líder carismático – pelos seus seguidores não advém de exposição midiática<br />

ou campanhas publicitárias, mas se consolida na crença de que o portador do carisma<br />

assim o é por inspiração divina, extraordinária, supranatural e, conseguintemente, supra-racional.<br />

Por isso,<br />

1 BOUDON; BOURRICAUD, 1993, p. 48.<br />

2 Ibidem, p 49.<br />

19


o portador [do carisma] toma a tarefa que lhe é adequada e exige obediência<br />

e um séquito em virtude de sua missão. Seu êxito é determinado pela<br />

capacidade de consegui-los. Sua pretensão carismática entra em colapso<br />

quando sua missão não é reconhecida por aqueles que, na sua opinião,<br />

deveriam segui-lo. Se o aceitam, ele é o senhor deles – enquanto souber<br />

como manter essa aceitação, “provando-se”. Mas não obtém seu “direito”<br />

por vontade dos seguidores, como numa “eleição”, mas acontece o inverso:<br />

é o dever daqueles a quem dirige sua missão reconhecê-lo como seu<br />

líder carismaticamente qualificado 3 .<br />

O carisma pode se manifestar em diferentes personalidades como profetas, líderes<br />

religiosos, guerreiros, políticos, ou mesmo em artistas, sem, contudo, obedecer uma lógica<br />

racionalizada de escolha. Segundo Max Weber – um dos principais pensadores dedicados à<br />

discussão sociológica desse conceito – “o líder carismático ganha e mantém a autoridade<br />

exclusivamente provando sua força na vida”. No caso do profeta, deve realizar profecias e<br />

milagres; o líder religioso deve provar sua íntima relação com o Deus que representa; o<br />

guerreiro deve realizar feitos heróicos, e assim por diante. A missão do líder deve ser colocada<br />

à prova, “fazendo que todos os que se entregam fielmente a ele se saiam bem. Se isso<br />

não acontecer, ele evidentemente não será o mestre enviado pelos deuses” 4 .<br />

Mas o carisma “genuíno”, diz Weber, é uma força revolucionária que renuncia “ao<br />

compromisso com toda ordem externa em favor da glorificação exclusiva do autêntico espírito<br />

profético e heróico” 5 . O portador do carisma não o é por nomeação, promoção ou<br />

ordenação; não se sustenta em disposições jurídicas, não se submete às instituições burocráticas<br />

e não está a serviço da tradição. Ao contrário, “comporta-se de maneira revolucionária,<br />

invertendo todos os valores e rompendo soberanamente com todas as normas tradicionais<br />

ou racionais” 6 :<br />

“[…] em vez da piedade diante dos costumes antiquíssimos e por isso sagrados,<br />

exige o carisma a sujeição íntima ao nunca visto, absolutamente<br />

singular, e portanto divino. Neste sentido puramente empírico e nãovalorativo,<br />

é o carisma, de fato, o poder revolucionário especificamente<br />

‘criador’ da história” 7 .<br />

Todavia, esse caráter revolucionário do líder carismático não é algo presente na bibliografia<br />

de Afonso de Ligório. O carisma afonsiano não se define pelo sentido sociológi-<br />

3<br />

WEBER, 1982, p. 285.<br />

4<br />

Ibidem, p. 287.<br />

5<br />

Idem, 1999, p. 326.<br />

6 Ibidem, p. 327.<br />

7 Ibidem, p. 328.<br />

20


co que Weber atribui ao termo, mas pela definição de Charismata consolidada na tradição<br />

católica. Segundo o Catecismo da Igreja de Roma, “os carismas são graças do Espírito<br />

Santo que, direta ou indiretamente, têm uma utilidade eclesial, pois são ordenados à edificação<br />

da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo” 8 . É essa “graça do Espírito<br />

Santo” que teria sido concedida a Afonso de Ligório para a “edificação da Igreja” que<br />

ele tanto defendeu com tamanha obediência aos seus superiores e dedicação aos chamados<br />

“pobres e desprovidos da palavra de Deus” 9 . É em função do carisma de Santo Afonso que<br />

os redentoristas assumiram a pastoral missionária como principal atividade dessa congregação,<br />

sendo as Santas Missões a razão maior da fundação, consolidação e expansão da<br />

obra redentorista.<br />

A consolidação do carisma em uma instituição duradoura depende das ações praticadas<br />

pelo seu portador. Por outro lado, a autenticidade e longevidade de tal instituição<br />

estão intimamente ligadas à legitimidade atribuída aos sucessores do líder carismático e à<br />

maneira como estes preservam os ensinamentos e princípios estabelecidos pelo fundador. E<br />

no caso dos institutos católicos, “a vida religiosa seria uma missão especial na Igreja, uma<br />

força de renovação da Igreja e um sinal do reino de Deus para o mundo de acordo com o<br />

carisma próprio dos fundadores” 10 .<br />

Por tudo isso, a história da Congregação do Santíssimo Redentor, com todas as suas<br />

obras missionárias, se sustenta e se justifica no legado de Afonso de Ligório e, mais do que<br />

isso, na maneira como seus sucessores preservam esse carisma, reinterpretando-o à luz dos<br />

novos tempos.<br />

8 VATICANO. Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000. Primeira Parte. Segunda Seção.<br />

Capítulo Terceiro. Artigo 9, parágrafo 2, § 799, p. 231.<br />

9 As expressões “pobres”, “desamparados”, “desprovidos da palavra de Deus”, “abandonados espiritualmente”<br />

são correntes no discurso eclesiástico e, em muitos casos, se referem aos leigos que não estariam devidamente<br />

atendidos pela Igreja Católica, ou submetidos a ela. Nos livros sobre Afonso de Ligório e os redentoristas,<br />

como veremos a seguir, são esses os adjetivos atribuídos aos fiéis missionados por esse santo e seus<br />

seguidores.<br />

10 COMBLIN, 2000, p 23.<br />

21


Santo Afonso e o carisma missionário<br />

Para compreendermos o carisma de Afonso de Ligório, bem como sua importância<br />

para a Congregação do Santíssimo Redentor, faz-se necessário enveredarmos pelas páginas<br />

dos livros de história dessa congregação, principalmente aqueles dedicados à biografia<br />

desse santo 11 , no intuito de percebermos quais características da vida do fundador foram<br />

preservadas e propagadas pelos redentoristas. Mais importante que comprovar a veracidade<br />

histórica dos fatos narrados é compreender como Santo Afonso é definido por seus seguidores,<br />

isto é, quais adjetivos são atribuídos ao pioneiro dessa congregação que legitimam<br />

as ações de seus congregados.<br />

O primeiro biógrafo de Afonso foi um de seus amigos confrades, Antônio Benedetto<br />

Tannoia (1726-1808), redentorista “cuja missão era precisamente iniciar os jovens nos<br />

usos e costumes do instituto”, ou seja, “o mestre dos noviços” 12 . Os três tomos de sua obra<br />

“Della vita ed Istituto del ven. servo di Dio Alfonso M. de Liguori”, publicada entre os<br />

anos de 1798 e 1802, é uma das principais referências utilizadas pelos outros biógrafos<br />

que, posteriormente, se dedicaram à tarefa de estudar e relatar os feitos realizados pelo<br />

líder carismático dos redentoristas.<br />

Entre os principais estudiosos de Santo Afonso de Ligório, além de A. B. Tannoia,<br />

os mais citados nos livros sobre a congregação são os redentoristas: Augustin Berthe, com<br />

a publicação francesa de “Saint Alphonse de Ligouri” em 1900; Giuseppe Cacciatore, com<br />

duas importantes obras: “La spiritualitá di S. A. di Liguori” de 1943, e “S. Alfonso de Liguori<br />

e il giansenismo” de 1945; Raimundo Telleria, autor do livro “Santo Afonso Maria<br />

de Ligório” publicado em dois volumes no ano de 1951; e o francês Théodulo Rey-<br />

Mermet, com sua obra intitulada “Afonso de Ligório: uma opção pelos abandonados”,<br />

publicada pela primeira vez em 1982.<br />

Se os seus 90 anos de vida (1696-1787), dedicados principalmente à Igreja Católica,<br />

à congregação por ele fundada e aos “pobres” de seu tempo, foram suficientes para que<br />

Afonso fosse reconhecido como um grande líder carismático, depois de seu falecimento<br />

outras qualidades lhes foram oficialmente acrescidas como a de Santo católico (1839),<br />

11 Em 1788, oito meses após a morte de Afonso Maria de Ligório, abriu-se o processo no Vaticano com vistas<br />

à sua canonização. Sua beatificação aconteceu em setembro de 1816. No dia 26 de maio de 1839, Afonso<br />

foi canonizado pelo então Papa Gregório XVI, tornando-se um santo da Igreja Católica.<br />

12 REY-MERMET, 1984, p. 600.<br />

22


doutor da Igreja (1871) e patrono dos confessores e moralistas (1950) 13 . Da mesma forma,<br />

as biografias desse santo se complementam na tarefa de reinterpretar o carisma afonsiano à<br />

luz dos novos contextos históricos, variando nas escolhas dos fatos mais ou menos importantes,<br />

na ênfase conferida às suas obras ou mesmo nos adjetivos a ele atribuídos, sempre<br />

no intuito de enaltecer a vida e a obra de Afonso Maria de Ligório.<br />

Sendo essas biografias complementares, utilizaremos como principal referência, para<br />

analisarmos a imagem de Santo Afonso resguardada pelos redentoristas, a obra mais<br />

atual do já mencionado Théodulo Rey-Mermet. Este biógrafo é um dos redentoristas que<br />

contribuem com o Instituto Histórico Redentorista, criado em 1948 com a finalidade de<br />

promover pesquisas históricas sobre as origens, a evolução e as várias atividades da Congregação<br />

e dos seus membros, incluindo o fundador. O livro Afonso de Ligório: uma opção<br />

pelos abandonados foi publicado em 1982 por ocasião das comemorações dos 250 anos de<br />

fundação da Congregação do Santíssimo Redentor. Em suas volumosas páginas, o autor<br />

desenvolve uma consistente contextualização histórica sobre o Reino de Nápoles, onde<br />

nasceu Afonso de Ligório. Além disso, Mermet discorre, de forma perspicaz, sobre a formação<br />

familiar, intelectual e religiosa; suas variadas façanhas como missionário, padre e<br />

bispo da Igreja de Roma; seus esforços para fundar e consolidar a Congregação Redentorista;<br />

e o reconhecimento do carisma afonsiano por parte dos leigos católicos, dos confrades<br />

redentoristas e da Cúria Romana.<br />

Napolitano setecentista, Afonso Maria de Ligório é descrito por Rey-Mermet – e<br />

também por outros biógrafos – como um homem essencialmente preocupado com os “pobres<br />

e abandonados espiritualmente”. Como um legítimo portador de carisma, seria dotado<br />

de grande inteligência e muitos dons – pintor, arquiteto, músico, gramático, aritmético,<br />

lingüista, escritor, entre outros.<br />

Em sua juventude freqüentava constantemente o Oratório dos Jerônimos de Nápoles,<br />

local onde se conservavam e cultivavam as principais tradições musicais daquele reino;<br />

compôs aproximadamente cinqüenta canções “onde não aparecia o Deus vingador tão freqüente<br />

nos cânticos franceses da mesma época” 14 . Como lingüista é tido como um dos<br />

grandes criadores da língua italiana, “da mesma forma que Lutero se esforçou por criar<br />

uma língua alemã acessível a todos, Santo Afonso também falou e escreveu num italiano<br />

13 Cf. REY-MERMET, 1984.<br />

14 DELUMEAU, Jean. Prefácio da Biografia de Santo Afonso escrita por Théodule Rey-Mermet.1984, p. 9.<br />

23


simples e direto, ‘comestível’ do norte ao sul do país” 15 . Como escritor, é autor de importantes<br />

obras da literatura católica como Os Exercícios da Missão, O Caminho da Salvação<br />

e da Perfeição, Homo Apostolicus, As Glórias de Maria, A Prática do Amor a Jesus Cristo,<br />

A Preparação para a Morte, Visitas ao Santíssimo Sacramento, e principalmente a Teologia<br />

Moral. “Em número de edições santo Afonso ganha de longe de Shakespeare: o primeiro<br />

teve cerca de 20.000 edições em mais de 70 línguas; o segundo 10.602 edições<br />

(1961), é verdade que em 77 línguas” 16 .<br />

Além disso, Ligório doutorou-se em direito romano e napolitano aos dezesseis anos<br />

de idade, tornando-se um respeitado advogado do Reino de Nápoles, talentoso, dedicado e<br />

racionalista. “Nos limites do possível,” dizia ele, “sempre busquei antepor a razão à autoridade;<br />

e quando a razão me convenceu, não hesitei em contradizer numerosos autores” 17 .<br />

Mas, dez anos depois, alguns descontentamentos com a profissão o teria levado a abandonar<br />

a advocacia e assumir, definitivamente, sua vocação religiosa. Esse abandono é retratado<br />

como certo repúdio de Afonso contra a hipocrisia, a desonestidade e o protecionismo<br />

dos tribunais de Nápoles. A fagulha teria sido um processo judicial que Ligório perdera –<br />

injustamente, segundo consta – defendendo os interesses do Duque de Orsini contra o príncipe<br />

de Toscana 18 .<br />

Oriundo da nobreza napolitana, filho primogênito de Dom Giuseppe de Ligório,<br />

capitão das galeras reais, Afonso abriu mão de todas as regalias e heranças familiares para<br />

assumir uma vida humilde e missionária. Mas o abandono de sua carreira e a adesão à vida<br />

religiosa lhe rendeu o descontentamento e a repreensão de seu pai. Naquele tempo, no reino<br />

de Nápoles, vigorava o direito de primogenitura, e por esse direito “o primogênito era o<br />

herdeiro-mor dos bens paternos e, após a morte do pai, era constituído chefe e continuador<br />

da nobre linhagem. Tornando-se sacerdote, Afonso devia renunciar a esse direito. Era a<br />

isso que se opunha Dom Giuseppe” 19 :<br />

15 Ibidem.<br />

16 Ibidem.<br />

17 LIGÓRIO, apud REY-MERMET, 1984, p. 496.<br />

18 REY-MERMET, op cit., p. 125-136.<br />

19 MICHELOTTO, 1982, p. 08.<br />

A clientela afluíra, o dinheiro também (…). Deus me mostrou que tudo é<br />

vaidade afora servi-lo e amá-lo (…). Meu pai está muito decepcionado.<br />

Esperava de mim, coitado, que eu fizesse a fortuna e a glória da família!<br />

24


E que tempestades desencadeou contra minha vocação. Graças a Deus, eu<br />

as superei e eis-me a caminho do sacerdócio 20 .<br />

Nesse episódio, conforme os relatos de Rey-Mermet, o carisma afonsiano começa a<br />

manifestar-se, “ele rompe com sua classe e com sua cultura; desce sobre o ‘planeta’ dos<br />

pobres e desprovidos de socorros espirituais. Afonso encarna-se para sempre nos abandonados<br />

de seu tempo” 21 . E sua dedicação àqueles considerados como “desprovidos de auxílio<br />

espiritual” seria canalizada na prática das missões. Não obstante a todos os seus feitos,<br />

a virtude mais salientada por todos que se esforçaram em estudá-lo é, sem dúvida, sua dedicação<br />

às obras missionárias. Ainda como seminarista, Ligório iniciou seu trabalho na<br />

Congregação dos Clérigos Seculares da Propaganda, comumente conhecida como Missões<br />

Apostólicas 22 , passando a pregar inúmeras missões em todo o Reino de Nápoles 23 .<br />

Os conhecimentos adquiridos pelos trabalhos em conjunto com os missionários<br />

desse instituto são enfatizados pelo próprio Afonso em solicitação feita ao Sumo Pontífice,<br />

Papa Bento XIV, para aprovação apostólica da Congregação Redentorista que fundaria<br />

anos depois:<br />

Após muitos anos de exercício das missões como membro da Congregação<br />

das Missões Apostólicas, com sede na catedral de Nápoles, conhecendo<br />

o grande abandono em que jazem os pobres e principalmente os<br />

camponeses, em vastas regiões deste reino, […] para atender aos pobres<br />

camponeses espiritualmente mais abandonados, com missões, instruções<br />

e outros exercícios 24 .<br />

Em 1729, Afonso mudou-se para o “colégio dos chineses”, sede do instituto missionário<br />

liderado pelo padre italiano Mateus Ripa, que depois de 15 anos de missões na<br />

China voltara a Nápoles, acompanhado de quatro alunos e um mestre chinês, e fundara<br />

esse instituto com a finalidade de preparar missionários para a evangelização de países<br />

não-cristãos do continente asiático 25 .<br />

20<br />

LIGÓRIO, apud REY-MERMET, 1984, p. 161.<br />

21<br />

REY-MERMET, op cit., p. 280.<br />

22<br />

A Congregação dos Clérigos Seculares da Propaganda, ou Congregação das Missões Apostólicas, era também<br />

conhecida por Congregação da Propaganda. Fundada em 1646, adotou como finalidade a pregação da<br />

“missão para os infiéis”. Sobre essa congregação ver: REY-MERMET, op cit., p. 157; MICHELOTTO,<br />

1982, p. 09.<br />

23<br />

Cf. REY-MERMET, op cit., p. 157-184.<br />

24<br />

SUPPLEX LIBELLUS In: CSSR. Constituições da Congregação do Santíssimo Redentor. Roma, 2004. p.<br />

09-10. Disponível em < http://www.cssr.com/portugues/whoarewe/2004%20Constitutions-PR.shtml> acesso<br />

em 18 de abril de 2009.<br />

25<br />

REY-MERMET, op cit., p. 203-208.<br />

25


Morava também conosco Pe. Afonso de Ligório, padre muito estimado<br />

por seu nascimento, cavaleiro que é desta cidade, mas mais ainda por sua<br />

virtude e por suas qualidades de missionários. Tinha-se unido a nós desde<br />

os primeiros meses de minha instalação aqui com meus chineses (…).<br />

Mesmo que não tenha sido adscrito a nossa congregação, aqui vivia com<br />

o intuito de a ela agregar-se. Até nutria a intenção muito dedicada de ir<br />

pregar o Evangelho na China: é o que disse muitas vezes a seu diretor,<br />

padre Pagano. 26<br />

Depois de ordenado padre da Igreja Católica, Afonso realizou em Nápoles um trabalho<br />

conhecido como “Capelas da Noite”(Cappelle Serotine) 27 . Segundo Rey-Mermet,<br />

esse movimento envolveu vários leigos que, formando pequenos grupos de orações, reuniam-se<br />

em diversas capelas daquele reino, tornando-as um espaço de conversão e propagação<br />

da Boa Nova de Cristo. “Estes grupos de oração”, diz o biógrafo, “se parecem, pois,<br />

com os movimentos de Ação Católica, com nossos grupos de oração, com nossas fraternidades<br />

carismáticas e com as comunidades de base da América Latina” 28 .<br />

Segundo A. B. Tannoia – também biógrafo e contemporâneo de Afonso – o líder<br />

carismático dos redentoristas “dispensava a maior parte de sua atividade ao bairro do Mercado<br />

e do Lavinaio, onde vive a escória do povo napolitano. Sua alegria era encontrar-se<br />

no meio da ralé, daqueles que são denominados os Lazzaroni” 29 . Era esse povo miserável<br />

o público primordial das Capelas da Noite, e mais que isso, eram os leigos provenientes do<br />

subúrbio de Nápoles que se tornariam os principais propagadores daquela obra afonsiana.<br />

Afonso considera seus discípulos leigos suficientemente formados. Toma,<br />

então, a decisão de fazê-los, cada qual em seu arrebalde, os pivôs e<br />

animadores de múltiplos grupos limitados, que, através de toda a capital,<br />

reunirão lazzarelli e pessoas simples em oficinas ou em casas particula-<br />

26 Carta do padre Mateus Ripa, apud. REY-MERMET, 1984, p. 206. Afonso de Ligório teria manifestado,<br />

muitas vezes, seu desejo de pregar missões para povos não-cristãos, conforme registros oficiais da Congregação<br />

do Santíssimo Redentor: “Santo Afonso estava inflamado do desejo de pregar o Evangelho aos infiéis da<br />

África e da Ásia, como várias vezes escreveu em suas cartas, como também aos cristãos separados da Igreja<br />

Católica, tais como os Nestorianos da Mesopotâmia”. In: CSSR. Constituições da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor. Roma, 2004. p. 17. Disponível em < http://www.cssr.com/portugues/whoarewe/2004%20<br />

Constitutions-PR.shtml> acesso em 18 de abril de 2009.<br />

27 João Batista Michelotto denomina este movimento de “Obra das Capelas”, a saber: “Foi um movimento de<br />

verdadeira promoção humana: operários, vendedores, carroceiros, mendigos, se reuniam à noite, em algum<br />

canto ermo da cidade, para ouvir as instruções de Afonso e de outros sacerdotes que se empolgaram com o<br />

movimento. Os próprios leigos mais instruídos ajudavam-nos neste apostolado, pois a ideia de Afonso era<br />

fazer desses homens humildes não só bons cristãos, mas apóstolos também. Mais tarde, […] as reuniões<br />

começaram a se fazer nas muitas capelas que havia na cidade. Daí o nome de ‘Obra das Capelas’”. MICHE-<br />

LOTTO, 1982, p. 09.<br />

28 REY-MERMET, op cit., 197. Ver também: PAIVA, 2007, p. 70.<br />

29 TANNOIA, apud REY-MERMET, op cit., p. 190.<br />

26


es. Quanto a ele e seus irmãos padres estarão ora aqui, ora ali, para fazer<br />

o vínculo de união, confortar, assegurar os sacramentos 30 .<br />

Os leigos tornam-se, portanto, multiplicadores das Capelas da Noite, uma espécie<br />

de “agentes de pastoral” daquele tempo, cada qual a seu modo. O leigo Lucas Nardone, por<br />

exemplo, teria transformado um cômodo nos fundos de sua barbearia em um espaço de<br />

evangelização onde “manejava suas navalhas e funcionava como teólogo e mestre espiritual”.<br />

O senhor Barbarese, por sua vez, dedicou-se a instruir aos jovens iletrados as máximas<br />

do Evangelho; suas reuniões numa pequena sala haviam crescido a ponto de serem transferidas,<br />

a pedido do pároco local, para a capela da Confraria dos Barreteiros 31 .<br />

As “Capelas” não eram assembléias de magistrados, segundo os relatos dos biógrafos,<br />

mas um movimento de “conversão, de perseverança e de santidade”. E os animadores<br />

leigos assumiram, por assim dizer, as funções de catequistas da fé católica e mestres espirituais.<br />

“Esses grupos se tornaram um movimento de educação de base, de restauração social<br />

e de saneamento dos costumes: de ajuda mútua e partilha entre os pobres” 32 .<br />

As Capelas foram obra de Afonso com seus penitentes e de ninguém<br />

mais. Hoje (1798) elas são setenta e cinco e todos sabem quanto bem o<br />

povo delas usufrui. Têm como ‘assistentes’ padres zelosos e constituem a<br />

alegria mais cara dos arcebispos de Nápoles. Para participar dessas reuniões<br />

nada de oficiais a serem procurados, nada de formalidades de espécie<br />

alguma. E se aquele que nela entra é um vagabundo perdido aos vícios, a<br />

alegria é perfeita 33 .<br />

Esse trabalho realizado por padre Afonso com as Capelas da Noite é um evento de<br />

destaque nos livros sobre a vida desse santo e a história da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor, isso por ser significativo para expressar seu carisma e promover o reconhecimento<br />

de seus seguidores. Vale dizer que essa é uma obra apresentada como frutífera e<br />

duradoura, e teriam se proliferado mesmo após o falecimento de seu idealizador. Tannoia<br />

destaca setenta e cinco Capelas em 1798, Rey-Mermet complementa dizendo que ultrapassaram<br />

a casa das centenas, com cerca de 3 mil ‘capelistas’ em 1834. “Proibidos pela revolução<br />

de 1848, elas se reacenderão de suas próprias brasas e chegarão a seus trinta mil ‘irmãos’<br />

em 1894” 34 .<br />

30<br />

REY-MERMET, Op cit., p. 194.<br />

31<br />

Ibidem. p. 194.<br />

32<br />

Ibidem. p. 196.<br />

33<br />

TANNOIA, apud REY-MERMET, op cit., p. 196.<br />

34 REY-MERMET, Op cit., p. 197.<br />

27


Como um legítimo portador de carisma, Ligório não é descrito apenas como um<br />

missionário devotado aos mais “abandonados”, mas ele próprio, dotado de grande humildade,<br />

era desprendido de qualquer bem material. Não só por abrir mão de sua herança familiar<br />

e todas as regalias da magistratura, mas principalmente pela sua conduta durante a<br />

vida sacerdotal. Em todas as suas moradas escolhia os aposentos mais simples, a barba<br />

estava sempre por fazer e só usava batinas e túnicas surradas, tecidas em panos simples,<br />

mesmo nos eventos públicos, seja entre os pobres nas Capelas da Noite ou nas celebrações<br />

e assembléias com a presença da elite e realeza napolitana 35 . Ligório também é descrito<br />

como um clérigo que não se importava com títulos, nem mesmo os eclesiásticos. Foi nomeado<br />

bispo da Diocese de Santa Ágata dos Godos, em 1762, mas teria aceitado tal cargo,<br />

a contragosto, puramente por obediência ao então Papa Clemente XIII. E mesmo assim<br />

renunciou seguidas vezes ao bispado, tendo seu pedido aceito apenas em 1775 já no pontificado<br />

de Pio VI 36 .<br />

Esse desapego aos bens materiais e aos títulos de sua sociedade é uma importante<br />

característica apresentada pelos biógrafos de Afonso, o que reforça a noção de sua liderança<br />

carismática, pois, como afirma Max Weber, “para fazer justiça à sua missão, os portadores<br />

do carisma, o mestre bem como seus discípulos e seguidores, devem manter-se distantes<br />

dos laços deste mundo” 37 .<br />

Missionário e dedicado aos “pobres” de seu tempo, Afonso Maria de Ligório foi (e<br />

ainda é) reconhecido como um autêntico líder carismático, tanto pelos seus confrades redentoristas<br />

quanto pela Cúria Romana. O legado do carisma afonsiano – como seu método<br />

missionário e sua teologia moral, por exemplo – o colocou entre os nomes mais importantes<br />

da Igreja Católica Romana, não só do século XVIII, mas de todos os tempos, como bem<br />

atestou o historiador alemão e teólogo luterano Adolf Von Harnack (1851-1930):<br />

Na época mesma em que a Companhia de Jesus foi supressa, Deus suscitou um<br />

novo campeão de probabilismo e lhe assegurou para o futuro um triunfo com o<br />

qual humanamente não se podia contar: o fundador dos redentoristas, Afonso de<br />

Ligório, o teólogo romano mais influente desde a contra-reforma. Beatificado<br />

(1816), canonizado (1839), Doutor da Igreja (1871), Ligório é a exata antítese de<br />

Lutero e, no catolicismo romano, tomou o lugar de santo Agostinho (…). Se ele<br />

35 Ibidem.<br />

36 “Santíssimo Padre, eu tenho a honra de apresentar a Vossa Santidade, que feito bispo de Santa Ágata dos<br />

Godos no Reino de Nápoles com a idade de sessenta e seis anos, pude agüentar, com a ajuda de Deus, por<br />

treze anos, o fardo do episcopado; mas estou incapacitado de carregá-lo por mais tempo.” Trecho da quinta<br />

carta de renúncia ao episcopado, escrita por Afonso de Ligório ao Sumo Pontífice. Apud REY-MERMET, op<br />

cit., p. 656.<br />

37 WEBER, 1982, p. 286.<br />

28


fica muito aquém das probabilidades desabusadas do século XVII, aceitou, contudo,<br />

plenamente o seu sistema e em um número incalculável de questões – entre<br />

as quais o divórcio, o falso juramento, o homicídio – soube mudar o inaceitável<br />

em faltas veniais. Nenhum Pascal se levantou contra ele no século XIX; ao contrário,<br />

de ano em ano cresceu a autoridade de Ligório, o novo Agostinho. Ele<br />

reina hoje em todas as ordens, em todos os seminários, em todos os manuais de<br />

moral. 38<br />

Todo o envolvimento de Afonso de Ligório com as atividades missionárias da congregação<br />

da Propaganda e do Colégio dos Chineses, aliado a sua referida preocupação com<br />

os pobres e desprovidos dos ensinamentos católicos, expressada nas Capelas da Noite, serviram<br />

de estímulos para a fundação da uma Congregação que tivesse como finalidade esses<br />

mesmos propósitos. Todavia, um fato ficou oficialmente marcado na história dessa fundação:<br />

o encontro com os cabreiros em Scala 39 .<br />

Scala é uma região montanhosa do reino de Nápoles onde Afonso, por influência de<br />

seus confrades missionários, retirou-se em 1730 para uns dias de descanso e meditação.<br />

Em Santa Maria dos Montes, comunidade habitada por uma população muito pobre e roceira,<br />

Ligório teria se deparado com alguns cabreiros vivendo sob um considerável abandono<br />

espiritual. Esse idílico episódio é relatado como o início dos esforços de Santo Afonso<br />

para fundar a Congregação do Santíssimo Redentor:<br />

Até agora, evangelizei cidades e vilas populosas, providas de socorros<br />

espirituais, enquanto estes coitados vivem ao léu, sem ter quem lhes distribua<br />

o pão da Palavra de Deus. Sabem tanto de Deus e de religião quanto<br />

os rebanhos a eles confiados 40 .<br />

O carisma missionário de Santo Afonso será institucionalizado na Congregação do<br />

Santíssimo Redentor por ele fundada, e os redentoristas, portanto, serão os sucessores de<br />

sua obra, os guardiães do carisma afonsiano.<br />

38 REY-MERMET, op cit., p. 490.<br />

39 Esse contato de Afonso de Ligório com os pobres cabreiros de Scala é citado em todos os textos analisados<br />

que tratam da fundação da Congregação do Santíssimo Redentor.<br />

40 LIGÓRIO, apud MICHELOTTO, 1982, p 10.<br />

29


A gênese da Congregação do Santíssimo Redentor<br />

Congregação do Santíssimo Salvador foi o primeiro nome dado ao instituto que ficaria<br />

conhecido como os Redentoristas. A fundação aconteceu em 1732 através de um ato<br />

litúrgico celebrado numa manhã de domingo do dia 09 de novembro, na catedral de Scala.<br />

Durante as solenidades, aquele nascente instituto foi colocado sob a proteção do Santíssimo<br />

Salvador, fato este que influenciara na escolha do seu primeiro nome 41 . E nessa história<br />

da fundação redentorista, dois membros da Igreja Católica se destacaram como amigos<br />

influentes e decisivos na vida do fundador: Monsenhor Tomás Falcóia (1663-1743) e Madre<br />

Maria Celeste Crostarosa (1696-1755).<br />

Tomás Falcóia foi um napolitano ordenado padre em 1687 na Congregação dos Pios<br />

Operários. Chegou ao bispado em 1730, quando assumiu a diocese de Castellamare. Sua<br />

amizade com Ligório remonta aos tempos do “Colégio dos Chineses”, e a zelosa preocupação<br />

missionária de ambos os religiosos tratou de estreitar os laços entre eles 42 . Em Scala,<br />

numa missão pregada no ano de 1720, Falcóia conheceu Maria Celeste Crostarosa, tornando-se<br />

seu diretor espiritual. Naquela ocasião, Crostarosa e suas irmãs passavam por dificuldades<br />

no mosteiro de Marigliano, e depois do contato com Falcóia, transferiram-se para<br />

o mosteiro de vida contemplativa em Scala, o qual ficou sobre a responsabilidade desse<br />

religioso 43 .<br />

Em torno desse mosteiro Falcóia conheceu Maria Celeste Crostarosa.<br />

Crostarosa e mais duas de suas irmãs estavam em dificuldades no mosteiro<br />

de Marigliano e, depois de uma palestra do Padre Falcóia, elas o tomam<br />

como diretor espiritual. Começa aqui uma bonita história, com momentos<br />

difíceis, porém com traços reveladores dos desígnios amorosos de<br />

Deus para estas três pessoas: Falcóia, Crostarosa e Afonso 44 .<br />

Três meses depois de seu primeiro contato com os cabreiros de Scala, Afonso de<br />

Ligório voltou àquela região para pregar a novena da Exaltação da Santa Cruz, e foi nessa<br />

ocasião que Crostarosa revelou-lhe as visões que tivera sobre a criação de um instituto<br />

41<br />

Cf. NETO, 2007, p. 63; MICHELOTTO, 1982, p. 13; PAIVA, 2007, p. 74.<br />

42<br />

Cf. MICHELOTTO, op cit., p. 11; PAIVA, op cit., p. 71.<br />

43<br />

Cf. REY-MERMET, 1984, p. 235-254. Ver também PAIVA, op cit; NETO, op cit.<br />

44 PAIVA, op cit., p. 71.<br />

30


missionário dedicado à evangelização das almas mais abandonadas e carentes 45 . Segundo<br />

as revelações da Madre, Afonso seria o grande responsável por essa fundação.<br />

O primeiro passo foi dado em 13 de maio de 1731, quando, a pedido de Dom Falcóia,<br />

Ligório teria voltado a Scala e orientado Maria Celeste Crostarosa na fundação de<br />

uma congregação feminina que adotou o nome de ordem do Santíssimo Redentor, que ficara<br />

conhecida por Redentoristinas. Faltava, então, a criação do ramo masculino dessa congregação,<br />

o que só aconteceu em 1732 devido aos insistentes estímulos de Crostarosa e<br />

Falcóia. 46<br />

Embora sentisse que era necessário fazer alguma coisa por esses pobres<br />

camponeses abandonados e tivesse mesmo a ideia de fundar uma Congregação<br />

que se interessasse por eles, Afonso, em sua timidez natural e<br />

sua extrema humildade, não se julgava capaz de realizar, ele mesmo, essa<br />

obra. E se a realizou, foi-lhe necessário um forte incentivo por parte dum<br />

eminente religioso da congregação dos Pios Operários, Padre Tomás Falcóia,<br />

e duma santa religiosa do Mosteiro do Santíssimo Salvador de Scala,<br />

Sor Maria Celeste Crostarosa 47 .<br />

O instituto fundado por Afonso de Ligório foi oficialmente aprovado pelo Vaticano<br />

em 1749, quando teve seu nome alterado para Congregação do Santíssimo Redentor 48 . Antes<br />

disso, os esforços do fundador e seus confrades estiveram voltados para elaboração das<br />

Regras que regulariam a vida conventual e norteariam as atividades missionárias dos redentoristas,<br />

e essas regras seriam elaboradas a partir da finalidade desde Instituto, conforme<br />

o carisma do fundador:<br />

o único fim desta Congregação será continuar o exemplo de nosso Salvador<br />

Jesus Cristo pregando aos pobres a palavra divina, segundo o que disse<br />

de si mesmo: “O Pai me enviou para levar a Boa Nova aos pobres”(Lc<br />

4,18). Por isso os membros desta Congregação, submissos à autoridade<br />

dos bispos do lugar, empregar-se-ão totalmente em ajudar o povo disperso<br />

nos campos e nos vilarejos, principalmente os mais abandonados no<br />

plano espiritual, através de missões, instruções, catecismos, administra-<br />

45 Maria Celeste Crostarosa teria tido uma revelação divina, na qual viu nascer uma congregação masculina<br />

altamente dedicada a obras missionárias, e Afonso de Ligório, nessas visões de Crostarosa, seria o grande<br />

fundador dessa congregação. Cf. REY-MERMET, 1984, p. 257; MICHELOTTO, 1982, p. 11; PAIVA, 2007<br />

p. 72.<br />

46 Segundo Sante Raponi: “[…] Falcoia foi, para o novel Instituto Redentorista, o mediador entre as ‘revelações’<br />

de Crostarosa e o ‘intento’ afonsiano.” In: RAPONI, 1999, p. 08.<br />

47 MICHELOTTO, op cit., p. 11.<br />

48 “Mas o Instituto não terá mais o título de Santíssimo Salvador, para não haver confusão com os cônegos<br />

regulares do Santíssimo Salvador; o Instituto será a ‘Congregação do Santíssimo Redentor’. E assim teremos<br />

os ‘redentoristas”. Bula de Fundação da Congregação do Santíssimo Redentor, apud REY-MERMET, op cit.,<br />

p. 462.<br />

31


ções dos sacramentos, e particularmente voltando mais vezes aos lugares<br />

que pregaram a missão, para garantir a sua perseverança. 49<br />

Estavam lançadas as bases da Instituição responsável por assimilar e resguardar o<br />

carisma afonsiano, e será nas Santas Missões que os redentoristas alcançarão êxito nessa<br />

empreitada. O método utilizado será aquele proposto por Santo Afonso. “A finalidade precisa<br />

das missões”, escrevera Ligório, “é a conversão dos pecadores”, e o missionário deverá<br />

valer-se de sermões e instruções para os esclarecerem “sobre o mal do pecado, sobre a<br />

importância de sua salvação e sobre a bondade de Deus; então os corações se transformam,<br />

quebram-se os laços dos maus hábitos, e começam a viver como cristãos” 50 .<br />

As Santas Missões são eventos extraordinários que rompem com a ordem cotidiana<br />

dos leigos em prol de momentos de oração, reflexão, confissão, conversão e comunhão. A<br />

função do missionário é ir ao encontro dos pecadores, sempre munido de um temário previamente<br />

elaborado, onde constará toda a estrutura da missão com os horários definidos<br />

para cada atividade e os temas a serem abordados em cada conferência e sermão. O conteúdo<br />

dos temários pode variar diante das especificidades de cada contexto histórico, mas o<br />

caráter extraordinário se mantém como a principal característica das Santas Missões 51 . Em<br />

1768, Afonso de Ligório publicou um foglietto contendo “os cincos pontos mais importantes<br />

a serem inculcados no decorrer das missões: o amor a Jesus Cristo crucificado, a devoção<br />

à Mãe de Deus, a necessidade da oração, a fuga das ocasiões más e a ruína das almas<br />

que se confessam mal” 52 .<br />

Não obstante, para que a Congregação do Santíssimo Redentor pudesse realmente<br />

se consolidar como um instituto missionário era preciso superar as dificuldades impostas<br />

pelo regalismo que vigorava no reino de Nápoles 53 :<br />

devido às injunções políticas da época, era muito difícil fundar uma verdadeira<br />

Congregação religiosa, quando até as mais antigas Ordens estavam<br />

ameaçadas na sua existência. Bernardo Tanucci, ministro todopoderoso<br />

do reino de Nápoles, de 1734 até 1776, e outros ministros rega-<br />

49<br />

LIGÓRIO, apud REY-MERMET, 1984, p. 458.<br />

50<br />

LIGÓRIO, 1955, p. 8.<br />

51<br />

Voltaremos a esse tema, mais detalhadamente, no capitulo III dessa dissertação.<br />

52<br />

REY-MERMET, op cit., p. 366.<br />

53<br />

“Durante os séculos XVIII e XIX os católicos da Europa se cindiam em dois grupos: os chamados regalistas,<br />

galicanos ou jansenistas, que defendiam os interesses de uma igreja mais vinculada a sua nação, sob certa<br />

dependência do poder civil e com um cunho de ação marcadamente político, e os designados como católicos<br />

‘romanos ou ultramontanos’ que apregoavam uma adesão incondicional ao papa, dentro de uma Igreja de<br />

caráter universal, mas sob a orientação exclusiva da Santa Sé”. AZZI, 1974, p. 649.<br />

32


listas, eram inimigos, pelo menos politicamente, de tudo quanto era Ordem<br />

ou Congregação religiosa 54 .<br />

Mesmo sendo oficialmente reconhecidos pelo Vaticano, os redentoristas, por causa<br />

do regalismo régio, precisavam obter o Exequatur real, aprovação oficial do reino de Nápoles<br />

que lhes permitiriam funcionar efetivamente como uma congregação religiosa. No<br />

entanto, havia naquela época uma grande quantidade de institutos religiosos em todo o<br />

Reino, e o governo napolitano estava mais inclinado a suprimir os já existentes do que<br />

permitir novas instalações.<br />

A diocese de Nocera dei Pagani, sede da primeira casa redentorista, contava naquele<br />

período com uma população de quarenta mil habitantes distribuída num perímetro de 25<br />

quilômetros, e possuía “um clero diocesano copioso e com não menos que treze conventos<br />

de homens” 55 . Não havia interesse por parte do Rei de Nápoles, Fernando IV, em ampliar<br />

esse já elevado número, e sem esta aprovação o futuro da congregação estaria em risco, o<br />

que levou Afonso de Ligório e seus confrades a fundarem uma casa fora daqueles domínios.<br />

Assim, em 1773 foi criada em Sficelli, nos Estados Pontifícios, a primeira comunidade<br />

redentorista fora do reino de Nápoles, o que geraria um princípio de cisão na Congregação<br />

do Santíssimo Redentor 56 .<br />

Em 1777, os redentoristas já contavam com nove casas, sendo quatro delas sediadas<br />

nos Estados Pontifícios e, conseqüentemente, isentas da ingerência do governo napolitano.<br />

Contudo, após a deposição do ministro Bernardo Tanucci 57 , Afonso de Ligório e seus confrades<br />

conseguiram o tão necessário Exequatur real, aprovando um novo “regulamento<br />

interno” junto ao Rei de Nápoles em 1780. As comunidades dos Estados Pontifícios estavam<br />

fora desse novo “regulamento” que, por sua vez, delegava àquele monarca autoridade<br />

para intervir nos assuntos da congregação sempre que julgasse necessário e conveniente.<br />

Tais mudanças não foram bem vistas pela cúria romana, que acabou selando a separação:<br />

Pio VI governava então a Igreja. Decidido a não permitir que o Governo<br />

regalista de Nápoles se intrometesse em questões eclesiásticas, […] apro-<br />

54 MICHELOTTO, 1982, p. 20.<br />

55 REY-MERMET, 1984, p. 329.<br />

56 Cf. PAIVA, 2007, p. 78; MICHELOTTO, op cit., p. 29-35.<br />

57 Bernardo Tanucci foi um político de posturas anticlericais. Teria sido o grande responsável pela expulsão<br />

dos Jesuítas no reino de Nápoles, além de dificultar ao máximo a regulamentação da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor pelo Rei Fernando IV. Após sua deposição do cargo de ministro, em 1776, as relações entre<br />

redentoristas e governo napolitano se amenizaram, possibilitando a aprovação do “regimento interno” que<br />

regulamentava a existência da congregação naquele reino. Cf.: PAIVA, op cit., p. 78; MICHELOTTO, op<br />

cit., p. 35.<br />

33


vou o decreto da Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos, de 22 de<br />

setembro de 1780, o qual declarava que os membros do Instituto que moravam<br />

nas casas do reino de Nápoles não pertenciam mais à Congregação<br />

do SSmo. Redentor e, por isso, perdiam todos os privilégios em favor das<br />

missões, e mandava que se elegesse um Presidente para as casas dos Estados<br />

Pontifícios 58 .<br />

Essa contenda só foi sanada dez anos depois, quando o “regulamento interno” foi<br />

definitivamente abolido. A unificação se deu em 1793 quando o Governo Geral da Congregação<br />

foi estabelecido em Pagani, tendo como Superior Geral o padre Celestino Maria<br />

Cloce 59 . Porém, durante todo o período de divisão, as casas de Nápoles acabaram decrescendo.<br />

Sem o consentimento papal, as missões caíram em descrédito ocasionando uma<br />

crise financeira e o abandono de alguns missionários. Por outro lado, as casas dos Estados<br />

Pontifícios prosperaram significativamente com a fundação de mais quatro comunidades<br />

além do aumento no número de confrades 60 .<br />

Os redentoristas para além dos Alpes<br />

O padre Maurice De Meulemeester, historiador e ex-arquivista do Arquivo Geral<br />

Redentorista em Roma, divide a história da Congregação do Santíssimo Redentor em três<br />

períodos 61 . O primeiro, denominado cisalpino, corresponde à época da fundação da congregação<br />

e os impasses supramencionados entre as casas de Nápoles e dos Estados Pontifícios.<br />

O segundo, chamado de transalpino, refere-se ao momento em que o centro de vitalidade<br />

da obra redentorista deixou de ser as casas dos Estados Pontifícios em função da expansão<br />

dos herdeiros de Santo Afonso para regiões da Europa oriental e central, mais a<br />

fundação nos Estados Unidos da América. O último, por sua vez, foi chamado de romano<br />

por referir-se ao período no qual a congregação assumiu com maior definição as características<br />

ultramontana da Igreja Universal, transferindo seu centro administrativo geral para<br />

Roma.<br />

58<br />

MICHELOTTO, 1982, p. 39.<br />

59<br />

PAIVA, 2007, p. 81.<br />

60<br />

Cf. MICHELOTTO, op cit., p. 40-42.<br />

61 DE MEULEMEESTER, 1957, p. 40.<br />

34


Na expansão da obra redentorista destacou-se o nome de Clemente Maria Hofbauer<br />

(1751-1820) 62 . Depois de ingressar na congregação, em 1785, foi nomeado Vigário Geral<br />

para além dos Alpes, iniciando seu trabalho de fundação de novas casas a partir de Viena e<br />

Varsóvia. Os livros de história sobre o período transalpino e a vida de Hofbauer enfatizam<br />

as grandes dificuldades que ele e seus confrades teriam enfrentado para a execução dessa<br />

missão:<br />

[…] o regalismo, o jansenismo e o catolicismo iluminista, de modo geral,<br />

foram forças contrárias às tentativas de se fundarem residências redentoristas.<br />

Em todos os países, os conventos foram supressos, seus bens confiscados<br />

e até os ducados eclesiásticos não se interessaram por padres religiosos,<br />

sendo até proibida em muitos países a prática das Santas Missões<br />

63 .<br />

Mas, apesar desses empecilhos, a partir de 1815 a congregação redentorista começara<br />

a prosperar, consolidando suas casas na Áustria, Polônia, Alemanha, Bélgica, Holanda,<br />

chegando, inclusive, a romper as barreiras do Atlântico para criar instalações, nos EUA<br />

primeiramente e, anos depois, na América Latina 64 . Apesar de algumas particularidades 65 ,<br />

as Santas Missões continuaram sendo a principal referência dos redentoristas transalpinos,<br />

assim como eram para os cisalpinos 66 .<br />

Todavia, se o período cisalpino foi marcado pela divisão entre as casas do reino de<br />

Nápoles e as dos Estados Pontifícios, no transalpino a divisão mais uma vez acontecera,<br />

agora entre os redentoristas erradicados nas regiões italianas e aqueles situados além dos<br />

Alpes. Depois do falecimento de Clemente M. Hofbauer, em 1820, assumiu o cargo de<br />

62<br />

Clemente Maria Holbauer aparece nos livros de história da Congregação do Santíssimo Redentor como o<br />

grande responsável pela expansão dessa congregação para além dos Alpes. Gilberto Paiva, na página 80 da<br />

obra citada, diz que “entre os estudiosos redentoristas, é consenso que Clemente foi, para a expansão da Congregação,<br />

o que foi o apóstolo Paulo para o cristianismo”. Canonizado em 1909 por Pio X, ele compõe o<br />

‘quarteto’ dos santos redentoristas, a saber: Santo Afonso de Ligório, São Geraldo Majela , São João Neumann<br />

e São Clemente Hofbauer. Sobre a vida de Hofbauer ver: BONOTTI, 1979; HEINZMANN, 1995.<br />

63<br />

WERNET, 1995, p. 41.<br />

64<br />

Cf. MICHELOTTO. 1982; PAIVA, 2007; WERNET, 1995.<br />

65<br />

“Os transalpinos se destacaram por sua piedade simples, íntima e sólida, por sua austeridade e pela defesa<br />

da pobreza. Apesar da fidelidade ao Papa, característica dos redentoristas, não se pode afirmar que durante a<br />

vida de Hofbauer o ultramontanismo fosse traço marcante dos redentoristas transalpino”. WERNET, op cit.,<br />

p. 54.<br />

66<br />

O próprio Afonso de Ligório teria afirmado, certa vez, que as missões pregadas pelos transalpinos eram<br />

diferentes daquelas pregadas pelos cisalpinos: “Eu sei que lá as missões se pregam de uma forma diferente da<br />

nossa”. Por outro lado, constantemente eram enviados missionários transalpinos à Pagani – centro administrativo<br />

do ramo cisalpino dessa congregação – para estudar os métodos afonsiano de se pregar missões. Ver:<br />

OPPITZ, 1979, p. 184-199.<br />

35


Vigário Geral para além dos Alpes o padre José Armando Passerat, o que teria gerado certo<br />

descontentamento no Governo Geral da Congregação em Pagani 67 .<br />

As relações entre esse Governo Geral e aquele Vigário Geral, segundo Joseph Oppitz,<br />

não foram muito amistosas, o que teria provocado mais uma vez a divisão da Congregação<br />

do Santíssimo Redentor:<br />

Durante a década que decorreu entre 1830 e 1840, a confusão no sistema<br />

de governo na região transalpina aumentou muito. Os confrades que ali<br />

residiam recebiam ordens e licenças que eram emitidas ora por Pagani,<br />

ora provinham de Viena, nem sempre coincidentes. Chegou-se finalmente<br />

à embaraçosa e perplexa situação de o Padre Passerat fazer a nomeação<br />

de um superior para um convento e chegar de Pagani a nomeação de outro<br />

confrade para o mesmo posto, ao mesmo tempo 68 .<br />

Somente a partir da década de quarenta do século oitocentista esse impasse seria resolvido.<br />

Foi quando surgiu a proposta por parte dos transalpinos de dividir a congregação<br />

em províncias, o que aconteceu em 1841 com o decreto Presbyterorum Saecularium emitido<br />

pela Santa Sé. A Congregação do Santíssimo Redentor foi, então, dividida em seis províncias:<br />

Romana, Napolitana, Siciliana, Austríaca, Belgo-Holandêsa e Suíça. Na ocasião,<br />

Passerat foi mantido no cargo de Vigário Geral para além dos Alpes, sendo o último a assumi-lo,<br />

porque, após sua renúncia em 1848, os transalpinos solicitaram que fosse designado<br />

um provincial para assumir a província austríaca ao invés de outro Vigário Geral.<br />

Depois disso, em 1853, o então papa Pio IX transferiu a sede do Governo Geral para Roma<br />

através do decreto motu proprio 69 .<br />

Com a transferência da sede administrativa da Congregação do Santíssimo Redentor<br />

para Roma deu-se início àquele que De Meulemeester chamou de período romano da<br />

história redentorista, quando o ultramontanismo tornou-se paulatinamente hegemônico<br />

entre aqueles missionários 70 . Algumas décadas depois, mais especificamente em 1894,<br />

começar-se-ia a obra dos missionários herdeiros de Santo Afonso em terras brasileiras.<br />

67<br />

Cf. OPPITZ, 1979; MICHELOTTO, 1982; PAIVA, 2007.<br />

68<br />

OPPITZ, 1979, p. 194.<br />

69<br />

Cf. PAIVA, 2007, p. 82; MICHELOTTO, 1982, p. 76-77.<br />

70 WERNET, 1995, p. 40.<br />

36


A missão redentorista no Brasil<br />

Foi na última década do século XIX que a missão redentorista iniciou-se no Brasil,<br />

sendo duas as províncias da Europa que enviaram seus missionários para a realização desse<br />

feito. Da Baviera, na Alemanha, vieram os redentoristas que se instalaram nas dioceses de<br />

São Paulo e Goiás 71 . A diocese de Mariana-MG 72 , por sua vez, recebeu os missionários da<br />

Província Holandesa que foram instalados no curato da Glória, na cidade mineira de Juiz<br />

de Fora então pertencente à jurisdição eclesiástica marianense. Será sobre esta fundação<br />

holandesa que nos ateremos mais detalhadamente nesse capítulo.<br />

Os primeiros esforços para trazer ao Brasil a Congregação do Santíssimo Redentor<br />

são atribuídos a Dom Antônio Ferreira Viçoso (1787-1875), que esteve à frente da Diocese<br />

de Mariana entre os anos de 1844-1875, e era tido como um bispo reformador e admirador<br />

da teologia moral de Santo Afonso 73 . Mas somente no bispado de seu sucessor, Dom Antônio<br />

Maria de Sá e Benevides (1826-1896), se concretizaria a chegada desses missionários.<br />

Devido à enfermidade desse bispo, a administração da Diocese de Mariana ficara a<br />

cargo de seu coadjutor, Dom Silvério Gomes Pimenta (1840-1922), que fora discípulo de<br />

Dom Viçoso e seguidor de suas aspirações reformadoras 74 . Vários pedidos foram feitos,<br />

tanto à Santa Sé quanto ao Superior Geral da Congregação, para que se alcançasse sucesso<br />

nesse intento. Em uma das cartas enviadas ao Superior redentorista, datada de 07 de fevereiro<br />

de 1893, Dom Silvério escrevera:<br />

[…] portanto de novo rogo pelas entranhas de Vossa Misericórdia e peçovos<br />

o mais insistentemente possível que não tardeis vir em auxílio de<br />

nossa gente. Aqui a seara é copiosíssima, mas poucos, pouquíssimos até<br />

os operários. Podereis aqui fundar grandes colégios para a educação da<br />

juventude, ou seminários menores para a formação do clero, ou dedicarvos<br />

às sagradas missões nas cidades e vilas, ou dedicar-vos a quais quer<br />

outras tarefas que mais vos agradem 75 .<br />

A Diocese de Mariana, em função de sua vasta extensão territorial e o reduzido<br />

número de sacerdotes, encontrava dificuldades para executar o processo reformador –<br />

71<br />

Sobre a fundação da obra redentorista em São Paulo e Goiás ver: PAIVA, 2007.<br />

72<br />

A Diocese de Mariana só seria elevada a condição de Arquidiocese em 1906.<br />

73 Sobre Dom Viçoso ver: NETO, 1965; PIMENTA, 1920.<br />

74 Cf.: TRINDADE, 1939.<br />

75 Idem, 1929.<br />

37


normalmente chamado de Romanização 76 – em curso na Igreja Católica do Brasil na segunda<br />

metade do século XIX. Reforma essa que, segundo Riolando Azzi, teve como norte<br />

dois objetivos: 1) reformar o quadro eclesiástico no sentido de substituir um clericalismo<br />

de cunho liberal por outro mais ultramontano, e 2) a reforma do catolicismo popular de<br />

caráter devocional pelo modelo tridentino, mais clerical e sacramental 77 .<br />

Alguns autores atribuem às congregações e ordens religiosas um importante, estratégico<br />

e decisivo papel nesse processo reformador do catolicismo brasileiro oitocentista 78 ,<br />

estando os redentoristas inclusos nessa hipótese 79 . Numa carta pastoral editada em 25 de<br />

janeiro de 1895, Dom Silvério sinaliza que:<br />

a míngua sempre crescente e cada vez mais aterradora do clero nacional,<br />

deixando o nosso povo sem doutrina e sem sacramentos, e trazendo a<br />

perda de inúmeras almas, obrigou-me a empenhar todos os esforços para<br />

obter ordens e congregações que viessem animar e auxiliar o clero diocesano,<br />

viessem doutrinar o nosso povo, evangelizar os nossos pobres e<br />

contrabalançar tantos esforços que faz o espírito das trevas para levar-nos<br />

à perdição eterna. Das várias congregações e ordens que convidamos, foram<br />

os redentoristas os primeiros que de assento se resolveram a fixar suas<br />

tendas nos campos de Minas 80 .<br />

É importante destacar que os pedidos do bispo de Mariana foram atendidos pelos<br />

redentoristas holandeses, mas não sem a ressalva de que, aos redentoristas, caberiam apenas<br />

as atividades missionárias, como relatado na carta do provincial da Holanda, padre<br />

Jacob Meeuwissen, aos 12 de maio de 1893, em resposta a Dom Silvério:<br />

Eu, abaixo assinado, Superior da Província Holandesa da Congregação do<br />

Santíssimo Redentor, desejo comunicar algo sobre a futura entrada da<br />

nossa Congregação na diocese de Mariana.<br />

Como ficou claro das cartas ao Ilmo. Núncio Spolverini, V. Excia. Rogou<br />

insistentemente para que se enviasse os filhos de Santo Afonso para salvar<br />

as almas.<br />

Nosso Superior Geral se dirigiu a mim para que assumisse essa missão.<br />

Tendo implorado as luzes divinas, e ouvido o parecer de meus conselheiros,<br />

persuadi-me que a Divina Providência nos chama para cultivar essa<br />

76 “O projeto de romanização visava à substituição do modelo de cristandade colonial assentado num perfil<br />

medieval, mundano e social, pelo modelo de Igreja como ‘sociedade perfeita’ e hierarquizada, de caráter<br />

universal, sob orientação exclusiva da Santa Sé, de acordo com as determinações do Concílio de Trento”.<br />

CAMURÇA, In: PEREIRA; SANTOS, 2004, p. 217-218.<br />

77 Cf. AZZI, 1992.<br />

78<br />

OLIVEIRA, 1985.<br />

79<br />

AZZI, 1977.<br />

80<br />

TRINDADE, 1929, p. 113. (grifos meus)<br />

38


longínqua vinha do Senhor. Já foram designados os padres, R. P. Matias<br />

Tulkens e R. P. Francisco Lomeyer.<br />

Ao aceitar a missão não tenho nem eu nem os meus súditos outra intenção<br />

senão que o nosso instituto se estabeleça aí de acordo com as orientações<br />

da mente e do espírito de Santo Afonso, isto é, que os padres possam,<br />

sem escolas, sem seminários, sem cuidados paroquiais, ministrar ao<br />

povo as sagradas missões e exercer o sagrado ministério numa igreja própria<br />

81 .<br />

Nesse mesmo ano, os padres Matias Tulkens e Francisco Lomeyer desembarcaram<br />

no Brasil para conhecer suas futuras instalações e acertar os detalhes do início da missão<br />

redentorista, que aconteceu oficialmente no ano seguinte, 1894, após a chegada de novos<br />

missionários para reforçar aquela que seria a primeira equipe holandesa na Diocese de Mariana<br />

82 .<br />

Os primeiros anos em terras brasileiras foram muito árduos para os redentoristas<br />

holandeses. As dificuldades com a língua portuguesa e a estranheza com aquele universo<br />

cultural com que depararam – principalmente no que tange a religiosidade do povo brasileiro,<br />

expressada de uma forma bem diferente do que na Holanda – foram os primeiros<br />

empecilhos a serem superados 83 . Nas correspondências enviadas à Holanda, a incompreensão<br />

diante do modelo de catolicismo aqui encontrado é visível:<br />

Muitos sermões não são entendidos por causa do sotaque e por causa do<br />

barulho e da algazarra que o povo faz na igreja. Na Holanda, não se pode<br />

ter uma ideia desta situação. Muitas vezes, o pregador deve interromper o<br />

sermão para pedir silêncio. Os homens saem da igreja durante o sermão –<br />

uns para fumar um cigarro, outros para tomar um trago de pinga. O povo<br />

faz das missões uma festa à moda brasileira: foguetes, bandas de música e<br />

discursos. Melhor seria menos movimento interno e mais profundidade 84 .<br />

Essas dificuldades iniciais só foram sanadas após a aquisição de novas funções pelos<br />

redentoristas. É bem verdade, como salientado pelo provincial da Holanda em carta<br />

supracitada, que os missionários vieram para o Brasil com o intuito de se dedicarem à pregação<br />

de missões. Mas, com o quadro reduzido de sacerdotes aliado à grande demanda de<br />

81 TRINDADE, 1929, p 1137.<br />

82 Chegaram em 26 de abril de 1894 os padres Padres Geraldo Schrauwen, Teodoro Helsen, Afonso Mathysem;<br />

e os irmãos leigos Gregório Mulders, Felipe Winter e Doroteu Van Leent. Cf: NETO, 2007, p. 112.<br />

83 Cf. WERNET, 1995; NETO, 2007.<br />

84 APRJ. Cartas dos fundadores e primeiros missionários. Carta do Pe. Wayneburg do dia 18.08.1898. Apud<br />

WERNET, op cit., p. 162. Sobre essa questão Wernet, em obra citada, comenta que “alguns padres tiveram<br />

um elevado senso crítico e muitos missionários não esconderam sua decepção e seu inconformismo diante do<br />

catolicismo do povo brasileiro”.<br />

39


trabalhos na Diocese de Mariana, não faltaram incentivos por parte de Dom Silvério para<br />

que os holandeses assumissem também algumas atividades paroquiais 85 .<br />

No inicio houve grande resistência para aceitação de tais funções. As Regras e<br />

Constituições da Congregação eram bem claras quanto a isso: “diziam que a finalidade<br />

específica era a cura extraordinária de almas por meio de missões, retiros e trabalhos semelhantes,<br />

que se distinguiam dos trabalhos cotidianos ou normais de uma paróquia” 86 . Santo<br />

Afonso, o fundador da congregação, também não era favorável à aceitação, por parte dos<br />

redentoristas, de outras funções senão aquelas específicas da pastoral missionária, “para<br />

que não haja desvio do ministério das missões, ele proíbe qualquer trabalho fora da Congregação”<br />

87 .<br />

Somente depois de seis anos da missão holandesa no Brasil, os redentoristas consentiram<br />

em assumir a primeira paróquia na Diocese. Em 1900, na nascente capital mineira<br />

de Belo Horizonte, que na ocasião pertencia à jurisdição eclesiástica da Igreja marianense,<br />

foi colocada sob a administração dos missionários a paróquia de São José, localizada no<br />

centro daquela projetada cidade moderna. Esse foi um importante passo para a expansão da<br />

obra redentorista, o que transformaria a então missão Holandesa numa vice-província.<br />

A Vice-Província do Rio e sua expansão<br />

O carisma missionário herdado de Santo Afonso é a principal referência da Congregação<br />

do Santíssimo Redentor, e a formação de todos os confrades, de uma forma ou de<br />

outra, é orientada por esse carisma. Para ser um redentorista e assinar as iniciais CSsR é<br />

indispensável conhecer e vivenciar os ensinamentos do líder carismático, independentemente<br />

se sua práxis varie, de uma província à outra, de acordo com os contextos históricos<br />

vividos. Por outro lado, há de se considerar que as comunidades onde atuam os missionários,<br />

com suas especificidades culturais, seus ambientes religiosos e profanos, suas particularidades<br />

históricas, bem como as necessidades e anseios que delas emanam, muito contri-<br />

85 Cf. NETO, 2007; WERNET, 1995.<br />

86 WERNET, op cit, p. 57.<br />

87 REY-MERMET, 1984, p. 519.<br />

40


uem para modular o perfil de cada província e vice-província; da mesma forma que os<br />

responsáveis por cada fundação também deixam marcas de suas espiritualidades.<br />

Todos aqueles missionários que chegaram ao Brasil no final do século XIX e início<br />

do século XX se formaram na Europa durante o contexto em que a Congregação do Santíssimo<br />

Redentor se consolidava nas regiões fora da Itália. Desta forma, além do carisma de<br />

Santo Afonso – o qual os redentoristas se orgulham em exaltar e preservar – aqueles confrades<br />

também foram influenciados pela espiritualidade de Clemente Maria Hofbauer e<br />

José Armando Passerat, o grande responsável pela expansão transalpina e o continuador<br />

dessa obra, respectivamente. Hofbauer teria proporcionado à Congregação do Santíssimo<br />

Redentor uma maior proximidade com o catolicismo popular 88 em detrimento ao catolicismo<br />

mais racional do período iluminista, enquanto Passerat adotara uma linha mais tradicional,<br />

sempre atento aos dogmas e aos sacramentos, além do seu confesso ultramontanismo<br />

89 .<br />

Essa característica supostamente ‘ultramontana’, se analisada em sintonia com as<br />

palavras de Dom Silvério – quando comunicou aos seus fiéis que os redentoristas foram os<br />

primeiros a atender o seu pedido de congregações que “viessem doutrinar o nosso povo” 90<br />

– corrobora, em parte, com a historiografia que define a vinda da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor para o Brasil como parte do projeto de romanização da Igreja 91 . O “cerne”<br />

desse projeto, segundo Marcelo Camurça, era a “eliminação do caráter profano e social do<br />

culto religioso”, e a “substituição de crenças e práticas de uma religiosidade tradicional<br />

popular de beatos, rezadores e benzedeiras por outra perspectiva religiosa marcadamente<br />

doutrinal e sacramental” 92 . Todavia, a romanização não deve ser analisada somente a partir<br />

do projeto idealizado, deve-se também analisar cautelosamente os reflexos e conseqüências<br />

gerados pelo contato entre os agentes romanizadores e as comunidades católicas suposta-<br />

88 “Elementos típicos deste catolicismo popular foram: linguagem e estilo dos sermões acessíveis ao povo;<br />

uma profunda devoção mariana; o cultivo e a promoção de formas tradicionais de religiosidade como romarias<br />

e festas populares; a presença de elementos externos emocionais e sentimentais de religiosidade; cerimônias<br />

pomposas e edificantes, que tocavam o coração e a alma e não apenas a razão; a valorização da experiência,<br />

da simplicidade e da sabedoria em oposição à religião intelectualizada e sofisticada dos filósofos e<br />

teólogos e o amor e estima do povo simples e do camponês.” WERNET, 1995, p. 41.<br />

89 WERNET, op cit., p. 47.<br />

90 TRINDADE, 1929, p. 113.<br />

91 AZZI, 1997.<br />

92 CAMURÇA, In: PEREIRA; SANTOS, 2004, p. 218.<br />

41


mente romanizadas 93 . No caso específico dos redentoristas na Diocese de Mariana, peculiaridades<br />

do catolicismo popular do final do século XIX são, gradativamente, incorporadas<br />

às ações dos missionários holandeses, uma vez que a realidade local influencia em suas<br />

práticas e métodos e, mais do que isso, modifica suas características.<br />

Os redentoristas no Brasil tornaram-se especialistas em administração de Santuários,<br />

notadamente marcados pela devoção e veneração de santos e imagens 94 . Na província<br />

de São Paulo, os missionários alemães foram primordiais para que o Santuário de Aparecida<br />

se tornasse o maior centro de romarias do país, não só pela administração daquele templo,<br />

mas pela ‘propaganda’ realizada nas Santas Missões, que por muitas vezes levavam a<br />

imagem da padroeira do Brasil ao encontro dos povos missionados, divulgando e incentivando<br />

a prática devocional 95 .<br />

Em Minas Gerais, os missionários holandeses também aderiram à pastoral dos santuários.<br />

O Santuário do Bom Jesus do Matosinhos, em Congonhas do Campo-MG, foi a<br />

primeira instalação oferecida aos redentoristas, mas eles preferiram ficar no Morro da Glória<br />

em Juiz de Fora 96 . Em vários momentos, durante as primeiras décadas de trabalho, os<br />

missionários estiveram em Congonhas ajudando no jubileu que já reunia milhares de devotos,<br />

e em 1923 o Santuário de Bom Jesus do Matosinhos acabou sendo assumido pelos<br />

redentoristas. A resistência inicial diante daquele local de peregrinação e romaria se esvaiu<br />

com o tempo, talvez por influência de outro santuário, localizado em Curvelo-MG e cons-<br />

93 “Para uma análise mais complexa do evento catequético romanizador no Brasil dos séculos XIX e XX, é<br />

preciso considerar não só o projeto, a ideologia e a formação cultural religiosa de missionários e missionados,<br />

como um programa necessariamente a ser cumprido, com uma previsibilidade de antagonismo, embate e<br />

subjugação, mas observar esses atributos e estruturas na própria ação desse contato, que pode implicar em<br />

recuos, neutralizações do projeto original e também em combinações inesperadas dentro dele.” CAMURÇA,<br />

In: PEREIRA; SANTOS, 2004, p. 224.<br />

94 Ver figura 01, p. 46.<br />

95 O Padre João Gomes, missionário redentorista e autor do livro “Missões Populares”, relatou em várias<br />

passagens a prática da “propaganda” à Nossa Senhora Aparecida que acontecia nas missões. A título de curiosidade,<br />

um fato interessante teria acontecido na localidade chamada Arrozal de São Sebastião, e assim descrita<br />

por João Gomes: “[…] como o povo era muito devoto de São Sebastião, ficou com ciúmes de N. Sra.<br />

Aparecida. ‘Para que tanta festa?’ Perguntavam. ‘Vocês não são missionários, são propagandistas de N. Sra.<br />

Aparecida!’… Mas por fim pe. Estevão e Antônio [missionários redentoristas] convenceram tão bem o povo,<br />

que no fim todo mundo foi ajoelhar-se aos pés dela!” GOMES, 1982, p. 33. Os grifos são meus.<br />

96 Luciano Neto, em seu estudo sobre as missões dos redentoristas holandeses no Brasil, destaca uma resistência<br />

inicial dos missionários em aceitarem a administração do Santuário de Congonhas. Em 1896, o redentorista<br />

Padre Beks escreveu ao seu provincial na Holanda dizendo que “o Bispo Dom Silvério Gomes Pimenta<br />

ofereceu-nos este Santuário para ser nossa primeira fundação no Brasil. Ainda que eu não considere a<br />

nossa primeira fundação [Juiz de Fora] como sendo uma feliz escolha, agora estou satisfeito com a preferência<br />

dada ao Morro da Gratidão [Morro da Glória] e não a este lugar de romarias”. NETO, 2007, p. 148.<br />

42


truído pelos próprios redentoristas holandeses, onde imbuíram e fomentaram a devoção<br />

popular a São Geraldo Majela 97 .<br />

A cidade de Curvelo foi escolhida como a sede do convento redentorista para a expansão<br />

das Missões no norte de Minas Gerais. Os missionários lá se instalaram em 1906, e<br />

em 1912 deram início à construção do Santuário de São Geraldo, que se tornaria o primeiro<br />

templo católico no mundo dedicado a esse santo redentorista 98 . Antes disso, em 1903, os<br />

holandeses fundaram o primeiro convento da congregação no Rio de Janeiro, dando início<br />

à criação da vice-província.<br />

Diferente dos redentoristas Alemães, que chegaram ao Brasil já com o epíteto de<br />

vice-província brasileira, a fundação redentorista de proveniência holandesa foi oficialmente<br />

denominada por Missão Brasileira (Missio Brasiliana). Em 1903, com a elevação da<br />

Missão Brasileira à vice-província, a fundação dos holandeses tornou-se “Vice-Província<br />

Hollandico-Brasiliana”. Segundo o padre e historiador João Batista Boaventura Leite, somente<br />

a partir de 1935 o nome “Vice-Província do Rio de Janeiro” começou a figurar nos<br />

registros oficiais da Congregação do Santíssimo Redentor; naquele contexto, a sede do<br />

vice-provincialado já havia se transferido do Curato da Glória em Juiz de Fora-MG para o<br />

Convento Santo Afonso, situado na cidade do Rio de Janeiro, capital do país naquela ocasião<br />

99 .<br />

Em 1951, a obra redentorista procedente da Holanda foi elevada à condição de Província,<br />

iniciando um trabalho de abrasileiramento dos seus quadros administrativos. Antes<br />

disso, nos quarenta e sete anos de atividades como “vice”, foram fundados novos centros<br />

missionários em Teresópolis-RJ (1921), Campos-RJ (1923), Campanha-MG (1923), Garanhuns-PE<br />

(1947) e Coronel Fabriciano-MG (1948); e em 1933 foi assumida a administração<br />

do Santuário do Senhor do Bonfim em Salvador-BA 100 .<br />

Outro ponto importante sobre a expansão da Vice-Província do Rio refere-se às casas<br />

de formação de missionários brasileiros. Vele dizer que essa formação dos redentoris-<br />

97 São Geraldo Majela, canonizado em 1904, foi um irmão leigo redentorista contemporâneo de Santo Afonso<br />

de Ligório. Sobre São Geraldo ver: DELFINO, 1993.<br />

98 WERNET, 1997, p. 263-265.<br />

99 LEITE, 2003, p. 7-8. A sede da vice-província foi transferida para o Rio de Janeiro em 1907 e só retornou<br />

à cidade de Juiz de Fora-MG em 1951. Depois disso, em 1968, o provincialado foi transferido para a Casa de<br />

Retiros São José, em Belo Horizonte-MG, onde permaneceu até 1990 quando, mais uma vez, retornou a Juiz<br />

de Fora, sua primaz residência.<br />

100 As fundações de Teresópolis e Campanha foram supressas em 1923 e 1927 respectivamente. Com a criação<br />

da Província do Rio em 1951, as comunidades de Garanhuns ficaram sob a responsabilidade da Província<br />

Holandesa. Em 1950 o Santuário do Senhor do Bonfim deixou de ficar a cargo da Vice-Província do Rio. Cf.<br />

WERNET, 1996. Ver figura 02, 74.<br />

43


tas se dava em três etapas distintas. A primeira correspondia ao ginasial e colegial, chamada<br />

respectivamente de Juniorato e Juvenato, ou Seminário Menor. A segunda, denominada<br />

Noviciato, era destinada à preparação religiosa e iniciação na espiritualidade redentorista,<br />

culminando na profissão dos votos temporários. A terceira e última referia-se aos estudos<br />

de filosofia e teologia, e era denominada Estudantado, ou Seminário Maior 101 .<br />

Inicialmente, os holandeses não acreditavam muito na vocação dos brasileiros face<br />

ao trabalho missionário, julgando desnecessária a criação de um juvenato no Brasil. Quando<br />

deparavam com jovens que manifestassem sinais de vocação missionária, os enviavam<br />

ao juvenato de Aparecida do Norte, sob a administração dos redentoristas alemães. Somente<br />

em 1923 a Vice-Província do Rio fundou seu seminário menor, em Congonhas do Campo<br />

- MG, o que “significou para os holandeses uma reformulação no seu conceito de vocações<br />

nativas” 102 . O noviciato dessa vice-província tinha suas instalações em Juiz de Fora,<br />

mas funcionou timidamente nas primeiras décadas do século passado, um reflexo do ceticismo<br />

inicial dos holandeses com os possíveis redentoristas brasileiros. Somente a partir da<br />

década de 1930, essa segunda etapa de formação ganhou maior atenção daqueles congregados.<br />

Mas a maior dificuldade enfrentada pelos redentoristas, no que tange o seu processo<br />

pedagógico, era referente à formação filosófica e teológica dos novos missionários. Inicialmente<br />

eram enviados à Europa para concluírem os estudos, pelo menos até 1936 quando<br />

a Província de São Paulo fundou o estudantado de Tietê-SP e passou a acolher os seminaristas<br />

da Vice do Rio. Os redentoristas holandeses começaram a ministrar a última etapa de<br />

seu processo de formação somente a partir de 1945, quando fundaram o Seminário Maior<br />

de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Floresta, município de Juiz de Fora-MG 103 .<br />

O engajamento de leigos católicos em atividades religiosas também fizera parte do<br />

trabalho pastoral dos redentoristas que criavam, a partir das diligências missionárias e paroquiais,<br />

várias organizações como Arquiconfrarias, Pão de Santo Antônio, Ligas Católicas<br />

e Ação Católica, todas voltadas, de certa forma, para o engajamento dos fiéis na vida orgânica<br />

da Igreja. As Arquiconfrarias referiam-se às associações de piedade e devoção a Nossa<br />

Senhora do Perpétuo Socorro, padroeira das Santas Missões redentoristas. O Pão de<br />

Santo Antônio seria uma obra de caráter assistencialista, voltado para o amparo material e<br />

101<br />

WERNET, 1996, p. 54.<br />

102<br />

Ibidem, p. 38.<br />

103<br />

PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Relato das Crônicas do Início das Casas Redentoristas, mesmo<br />

daquelas que já foram supressas. Juiz de Fora, s/d (texto de circulação interna).<br />

44


espiritual dos pobres, tendo como finalidade maior a construção de orfanatos. Já a Liga<br />

Católica, segundo Wernet, teria como público alvo os fiéis do sexo masculino, com o objetivo<br />

de conduzi-los a uma vida cristã pautada nos sacramentos e solidificada na ortodoxia<br />

católica, sem, contudo, resumir-se às atividades de piedade e devoção, mas torná-la uma<br />

associação apostólica e social. A fundação de Ligas Católicas, na maioria das vezes, fazia<br />

parte das cerimônias de encerramento das Santas Missões. A Ação Católica, por sua vez,<br />

teria como propósito a re-cristianização da sociedade brasileira e a promoção de uma nova<br />

ordem cristã através da união e organização das associações católicas existentes 104 .<br />

Sobre a expansão da obra redentorista da Vice-Província do Rio na primeira metade<br />

do século XX, Augustin Wernet conclui que eles foram “guardiões de santuários, administradores<br />

de paróquias, promotores do clero, confessores de uma linha pastoral mais misericordiosa<br />

e arregimentadores do engajamento de homens na comunidade religiosa” 105 . Contudo,<br />

é importante frisar que, entre todas as funções assumidas pelos missionários, as Santas<br />

Missões sempre foram a prioridade.<br />

104 WERNET, 1996, p 129-133.<br />

105 Ibidem, p. 310.<br />

45


Santuário Nossa Senhora da Conceição Aparecida<br />

Manaus - AM<br />

Os redentoristas da Vice-Província de Manaus assumiram<br />

a paróquia de Nossa Senhora Aparecida em 1943, e pouco<br />

depois deram início à construção do templo católico que se<br />

tornaria, depois de sua inauguração em 1958, um grande<br />

centro de devoção à padroeira do Brasil. Em 2007 a igreja<br />

foi elevada à categoria de Santuário Católico.<br />

Fonte: www.redentoristanaamazonia.webnode.com.br<br />

Santuário do Bom Jesus dos Perdões<br />

Perdões - SP<br />

Construído em 1705, esse Santuário é majoritariamente<br />

frequentado por romeiros da região conhecida como<br />

Planalto Paulista. Em 1913, foi confiado ao cuidados da<br />

Província de São Paulo, mas os redentoristas<br />

permaneceram apenas sete anos a frente de sua<br />

administração, repassando-o para os missionários<br />

capuchinos em 1920.<br />

Fonte: WERNET, 1995.<br />

Santuário da Penha<br />

São Paulo - SP<br />

Nossa Senhora da Penha foi proclamada padroeira de São<br />

Paulo em 1796, mas a primeira capela erguida em sua<br />

homenagem é datada de 1667. Esse centro de devoção e<br />

peregrinação esteve sob os cuidados dos redentoristas da<br />

Província de São Paulo entre os anos de 1905-1967. O<br />

atual Santuário foi inaugurado em 1947, a 5km da capital<br />

paulista, numa colina conhecida como Monte da Penha.<br />

Fonte: WERNET, 1995.<br />

Santuário de Nossa Senhora Aparecida<br />

Aparecida - SP<br />

A devoção a Nossa Senhora Aparecida remonta ao século<br />

XVIII, quando pescadores encontraram a imagem no rio<br />

Paraíba. Os redentoristas da Província de São Paulo<br />

administram o santuário desde o final do século XIX,<br />

propagando a devoção mariana através das Santas<br />

Missões. Em 1929, Nossa Senhora Aparecida foi<br />

proclamada padroeira do Brasil, e em 1955 teve início a<br />

construção da atual Basílica, que se tornaria o terceiro<br />

maior templo católico do mundo. Sua inauguração<br />

aconteceu em 1980, durante a primeira visita do papa João<br />

Paulo II ao Brasil.<br />

Fonte: WERNET, 1995.<br />

Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro<br />

Campo Grande - MS<br />

Desde sua fundação, em 1938, a paróquia N. Senhora do<br />

Perpétuo Socorro ficou sob os cuidados dos redentoristas<br />

da Vice-Província de Campo Grande-MS. A Igreja,<br />

inaugurada em 1941,foi elevada a condição de Santuário<br />

católico em 1999 devido ao grande fluxo de devotos.<br />

Fonte: www.perpetuosocorrocampogrande.com.br<br />

Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro<br />

Curitiba - PR<br />

Santuário erguido pelos missionários da Província de<br />

Campo Grande que, em 1960, iniciaram uma novena<br />

semanal dedicada a N. S. do Perpétuo Socorro. O templo,<br />

inaugurado em 1969, é tido como um dos maiores centros<br />

de devoção no Parará. Atualmente são realizadas novenas<br />

todas as quartas feiras, com uma participação estimada<br />

em 35 mil devotos por semana.<br />

Fonte: www.perpetuosocorro.org.br<br />

Santuário Nossa Senhora do Rocio<br />

Paranaguá - PR<br />

A história da devoção a Nossa Senhora do Rocio se<br />

assemelha a de Nossa Senhora Aparecida pelo fato de<br />

uma “imagem milagrosa” ter sido encontrada por um<br />

pescador, na baia de Paranaguá, em 1648. A primeira<br />

igreja foi erguida em 1813, quando a região já era muito<br />

frequentada por romeiros. Em 1977, o papa Paulo VI<br />

declarou Nossa Senhora do Rocio padroeira do Estado do<br />

Paraná. O atual Santuário, inaugurado em 1920, está sob a<br />

administração dos redentoristas da Província de Campo<br />

Grande desde a década de 1970.<br />

Fonte: www.santuariodorocio.com.br<br />

Santuário de Nossa Senhora Mãe de Deus<br />

Porto Alegre - RS<br />

Em 1981, surgiu o projeto para construção de um Santuário<br />

dedicado à padroeira do Rio Grande do Sul, Nossa<br />

Senhora Mãe de Deus, mas as obras só começaram<br />

efetivamente em 1994. Sua inauguração aconteceu em 20<br />

de agosto de 2000, e em janeiro de 2010 os redentoristas<br />

da Província de Porto Alegre assumiram sua<br />

administração.<br />

Fonte: www.santuariomaededeus.com.br<br />

AM<br />

Manaus<br />

Santuários administrados<br />

pelos Redentoristas<br />

no Brasil<br />

MS<br />

PR<br />

GO<br />

Trindade<br />

Campo Grande<br />

RS<br />

Curitiba<br />

SP<br />

Perdões<br />

São Paulo<br />

Porto Alegre<br />

Bom Jesus da Lapa<br />

Goiania<br />

Paranaguá<br />

Curvelo<br />

Congonhas do Campo<br />

MG<br />

Aparecida<br />

BA<br />

RJ<br />

Itabuna<br />

Porto Seguro<br />

Salvador<br />

Santuário de São Geraldo<br />

Curvelo - MG<br />

O Santuário foi erguido pelos missionários da Província do Rio de Janeiro<br />

com o intuito de propagar a devoção a Santo Geraldo pelas terras de<br />

Minas Gerais. A principal festa religiosa nesse Santuário, conhecida<br />

como “oitava de São Geraldo”, acontece desde 1917 e mobiliza a<br />

peregrinação de milhares de romeiros. Em 30 de abril de 1966, o<br />

Santuário de Geraldo recebeu o título de Basílica do então papa Paulo VI.<br />

Fonte: WERNET, 1996.<br />

Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro<br />

Campos dos Goytacazes - RJ<br />

A primeira fundação missionária da Província do Rio de Janeiro em<br />

Campos dos Goytacazes aconteceu em 1923, tornando-se um convento<br />

definitivo em 1950. A Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro foi<br />

inaugurada em 1955, sendo elevada a condição de Santuário em 1996.<br />

Fonte: www.provinciadorio.org.br<br />

Santuário de São Lázaro e São Roque<br />

Salvador - BA<br />

Construído em 1737, na capital soteropolitana, esse<br />

Santuário é marcado por uma forte influência da religião<br />

africana. As festas religiosas com maior participação dos<br />

devotos são: a festa de São Lázaro, no mês de janeiro; a<br />

festa de São Roque, em agosto; e a festa de São Benedito,<br />

na última segunda-feira de novembro. A administração está a<br />

cargo dos redentoristas da Vice-Província da Bahia.<br />

Fonte: www.redentoristas.com.br/redent_bahia.htm<br />

Santuário do Senhor do Bonfim<br />

Salvador - BA<br />

Foi colocado sob administração da então Vice-Província do<br />

Rio de Janeiro em 1933. Incumbidos pelo Arcebispo de<br />

Salvador de controlar os “excessos” da influência da cultura<br />

africana e coibir a tradicional festa de lavagem da Igreja do<br />

Bonfim, os redentoristas não conseguiram administrar<br />

efetivamente o Santuário. A forte ingerência da Irmandade do<br />

Senhor do Bonfim, com a qual os missionários tiveram<br />

muitas divergências, foi crucial para que os redentoristas<br />

encerrassem a fundação de Salvador em 1950.<br />

Fonte: WERNET, 1996.<br />

Santuário Bom Jesus da Lapa<br />

Bom Jesus da Lapa - BA<br />

Com mais de trezentos anos de existência (1691), é o local<br />

onde acontece a terceira maior romaria do Brasil, com a<br />

participação de centenas de milhares de peregrinos. Está<br />

localizado no centro de uma montanha calcária, localizada<br />

numa região de planície, com 93 metros de altura e 1.800 de<br />

comprimento. Seu interior é formado por grandes grutas que<br />

compõem o Santuário. A Vice-Província de Recife<br />

administrou esse Santuário de 1956 até 1972, quando o<br />

transferiu à Vice-Província da Bahia.<br />

Fonte: www.bomjesusdalapa.org.br<br />

Santuário Nossa Senhora da Piedade<br />

Itabuna - BA<br />

Esse recente Santuário foi construído pelos frades<br />

capuchinos e inaugurado em 1987. Em 2010, a convite do<br />

bispo Dom Ceslau Stanula, sua administração foi assumida<br />

pelos redentoristas da Vice-Província da Bahia, de<br />

proveniência polonesa.<br />

Fonte: www.redentoristas.com.br/redent_bahia.htm<br />

Santuário Nossa Senhora D'ajuda<br />

Porto Seguro - BA<br />

Também administrado pela Vice-Província da Bahia, esse<br />

Campos dos GoytacazesSantuário<br />

é considerado o mais antigo centro de devoção<br />

mariana no Brasil, construído no primeiro século da<br />

colonização portuguesa. Além de local de devoção, é<br />

também um movimentado ponto turístico de Porto Seguro.<br />

Suas atividades se dividem entre um período de romarias, de<br />

agosto a outubro, e outro de turismo, entre dezembro e<br />

março.<br />

Fonte: www.redentoristas.com.br/redent_bahia.htm<br />

Santuário Basílica Divino Pai Eterno<br />

Trindade - GO<br />

A Província de Goiás administra o Santuário de Trindade<br />

desde 1903, quando ainda estava vinculada à então Vice-<br />

Província de São Paulo. A festa da romaria de Trindade teve<br />

início na década de quarenta do século XIX. Em 1943, foi<br />

lançada a pedra fundamental do novo santuário, que passou<br />

a abrigar a novena e a festa do Divino Pai Eterno a partir de<br />

1974. Em novembro de 2006 o papa Bento XVI concedeu ao<br />

Santuário o título de Sacrossanta Basílica.<br />

Fonte: WERNET, 1995.<br />

Santuário Mãe do Perpétuo Socorro<br />

Goiânia - GO<br />

Em 1894, os redentoristas alemães assumiram a paróquia<br />

de N. Sª da Conceição na antiga e extinta cidade de<br />

Campinas-GO. No final da década de 1950, iniciou-se a<br />

novena semanal a N. Sª do Perpétuo Socorro, que ganhou<br />

tamanha proporção nas décadas seguintes a ponto da Igreja<br />

de N. Sª da Conceição receber também o título de Santuário<br />

Mãe do Perpétuo Socorro. Atualmente estima-se uma<br />

participação semanal de aproximadamente 16 mil devotos.<br />

Fonte: www.matrizdecampinas.org.br<br />

Santuário Senhor Bom Jesus do Matosinhos<br />

Congonhas do Campo - MG<br />

Erguido em 1773, abriga um dos maiores jubileu de Minas<br />

Gerais. Sua administração foi submetida à Província do Rio<br />

em 1923. Em 1957, o papa Pio XII concedeu a esse templo o<br />

título de Basílica Menor. Em 1975, o Santuário foi devolvido à<br />

Arquidiocese de Mariana.<br />

Fonte: WERNET, 1995.<br />

figura 01<br />

Santuários administrados pelos Redentoristas no Brasil


Os eventos são, pois, todos novos.<br />

Quando eles emergem,<br />

também estão propondo uma nova história.<br />

Não há escapatória.<br />

Milton Santos, 2008


D<br />

CAPÍTULO II<br />

Os Redentoristas no Contexto Conciliar:<br />

aggiornamento, planejamento pastoral e crise<br />

esde a chegada, em 1894, dos primeiros missionários holandeses herdeiros do carisma<br />

de Santo Afonso até o início da segunda metade do século XX, a obra redentorista<br />

no Brasil vivenciou um período de considerável expansão. As atividades primordiais<br />

eram as Santas Missões, mas outras funções também foram assumidas: paróquias, santuários,<br />

seminários de formação sacerdotal, edição de jornais, rádios difusoras; as primeiras<br />

décadas novecentistas representaram prosperidade para a Província do Rio de Janeiro. Por<br />

outro lado, a década de 1960 foi, sem dúvida alguma, o seu período de maior turbulência.<br />

Redução no número de confrades, supressão de conventos e todos os seminários, além das<br />

incertezas quanto ao futuro das missões populares foram as principais conseqüências da<br />

“grande crise”. Os motivos são uma somatória de fatores de ordem interna, específicos da<br />

Província, e de ordem externa, conforme a conjuntura eclesiástica, política, social e cultural<br />

nos anos sessenta.<br />

No âmbito eclesiástico, o catolicismo romano vivenciou um processo de muitas<br />

transformações, um tempo de aggiornamento. A Igreja Católica foi convocada em concílio<br />

pelo Papa João XXIII para repensar sua relação com o mundo e consigo mesma. Na avaliação<br />

do Sumo Pontífice era preciso um olhar atento a suas estruturas internas para renovar<br />

sua pastoral e trilhar novos caminhos; mas era também indispensável um olhar para fora,<br />

para o mundo moderno que parecia cada vez mais complexo e incerto quanto ao futuro da<br />

humanidade 1 . No Brasil, as mudanças conciliares colocaram em pauta um novo planejamento<br />

pastoral no intuito de reorganizar as bases institucionais da Igreja, colocando-a em<br />

sintonia com as orientações do Concílio Vaticano II (1962-65). A Província Redentorista<br />

do Rio de Janeiro, por sua vez, procurou se adequar às novas diretrizes pastorais que passa-<br />

1 Cf. ALBERIGO, 2006.<br />

48


am a vigorar no catolicismo brasileiro, num esforço duplo de acompanhar as mudanças da<br />

Igreja Católica e, ao mesmo tempo, superar a “grande crise” que ameaçava sua existência.<br />

Segundo Milton Santos, “os eventos são, simultaneamente, a matriz do tempo e do<br />

espaço” 2 , porque são eles que “criam o tempo” e (re)configuram a ordem social. Na história<br />

da Igreja Católica nos últimos cinquenta anos, o Concílio Vaticano II é possivelmente o<br />

evento de maior amplitude, representando, de certa forma, um novo tempo do catolicismo.<br />

O aggiornamento fomentado pelo Concílio significou o desencadear de outros eventos<br />

singulares, promovendo mudanças na liturgia, na catequese e na pastoral da Igreja, pois “os<br />

eventos não se dão isoladamente”, e um “conjunto de eventos é também um evento, do<br />

qual os eventos singulares que o formam são elementos” 3 . No Brasil, a preconizada pastoral<br />

de conjunto é um dos elementos, ou eventos singulares, que compõem o Vaticano II,<br />

contribuindo com seu prolongamento.<br />

Esse Concílio Ecumênico foi um acontecimento que reuniu o mais alto escalão da<br />

hierarquia católica em suas quatro sessões, mas o Vaticano II enquanto evento histórico é<br />

muito mais amplo do que as reuniões em Roma, sua universalidade e duração envolvem<br />

uma soma de ideias, iniciativas e acontecimentos que abarcam um espaço temporal maior,<br />

renovando, em alguma medida, o modo de fazer, de organizar ou de entender a realidade.<br />

Assim como o Concílio de Trento (1545-1563) inaugurou uma nova fase do catolicismo,<br />

com a alcunha de Igreja Tridentina e com uma dimensão temporal que extrapola os limites<br />

do século XVI, o Concílio Vaticano II também representa um novo momento histórico,<br />

com uma “duração organizacional” que vai além das sessões conciliares:<br />

Podemos admitir que, ao lado de uma duração natural, o evento histórico<br />

também pode ter uma duração organizacional. A duração natural deriva<br />

da natureza original do evento, de suas qualidades individuais, de sua estrutura<br />

íntima. Mas, podemos, também, prolongá-lo, fazendo-o durar além<br />

de seu ímpeto próprio, mediante um princípio de ordem. Em vez de<br />

ser deixado a si mesmo, altera-se o seu processo natural. Como também é<br />

possível limitar ou reduzir sua existência, amputando o seu período de<br />

ação, mediante um recurso organizacional 4 .<br />

Se a “duração natural” do Vaticano II pode ser limitada às sessões conciliares em<br />

Roma, ou mesmo aos textos lá produzidos, sua “duração organizacional” tem uma abrangência<br />

temporal, e histórica, muito maior, pois está relacionada com a leva de “eventos<br />

2 SANTOS, 2008, p. 145.<br />

3 Ibidem, p. 154.<br />

4 Ibidem, p. 149.<br />

49


singulares” que o sucedem, como, por exemplo, os Planos de Pastoral da CNBB, a Conferência<br />

Episcopal de Medellín, a formação e proliferação das Comunidades Eclesiais de<br />

Base e o surgimento da Teologia da Libertação. Cada evento singular tem sua dinâmica<br />

própria, sua especificidade, mas está imbricado ao evento histórico que possibilitou seu<br />

surgimento, seja reinterpretando-o, modificando-o, atualizando-o, ampliando ou reduzindo<br />

seus limites.<br />

Todavia, é importante frisar que as transformações vivenciadas pelo catolicismo na<br />

década de sessenta e anos ulteriores não se processaram unicamente por questões internas à<br />

Igreja. A elaboração e execução do Concílio Vaticano II, bem como todos os esforços para<br />

implementar as novas orientações conciliares, foram, em grande medida, condicionados e<br />

influenciados por questões de ordem social, política, econômica e cultural do mundo moderno.<br />

A ordem social, por exemplo, esteve altamente questionada pelo que se convencionou<br />

chamar de “movimentos de contracultura”, normalmente desencadeados por organizações<br />

juvenis com forte teor de contestação ao establishment. Com diferentes formatos em<br />

vários países do mundo, esses movimentos encontraram na música folk e no rock’n roll<br />

uma potente amplificação para os diversos protestos marcados pela ousadia, irreverência e<br />

militância.<br />

Segundo Martteo Guarnaccia, “o primeiro lugar em que a mistura entre poesia, drogas<br />

e música pop conseguiu dar vida a um movimento contracultural gigante” 5 foi Amsterdã,<br />

capital de uma Holanda considerada, na década de 1960, como uma “ilha de bem-estar<br />

e tranqüilidade”, sem guerras, segregação racial e conflitos sociais exacerbados. Num local<br />

onde aparentemente não havia nenhum motivo concreto para protestar contra a ordem estabelecida,<br />

surgiu um movimento de inspirações anarquistas chamado Provos, com o objetivo<br />

de contestar “a própria existência da ordem constituída” 6 . Em sua carta de apresentação,<br />

os integrantes desse movimento se alto denominam como “alguma coisa contra o capitalismo,<br />

o comunismo, o fascismo, a burocracia, o militarismo, o profissionalismo, o dogmatismo<br />

e o autoritarismo” 7 .<br />

As atitudes dos Provos tiveram, em certa medida, grande influência da Internacional<br />

Situacionista 8 , uma agremiação supranacional de intelectuais, filósofos, cineastas, arquitetos,<br />

artistas e ativistas-políticos que surgiu na Europa no final da década de 1950 co-<br />

5<br />

GUARNACCIA, 2004, p. 13<br />

6<br />

Ibidem. p. 15.<br />

7<br />

Carta de apresentação dos Provos datada de junho de 1965. Apud GUARNACCIA, op cit., p. 15.<br />

8 Sobre a Internacional Situacionista ver: JACQUES, 2003.<br />

50


mo uma verdadeira difusora de concepções adversas ao sistema capitalista, à “sociedade do<br />

automóvel” 9 , à vida cotidiana, ao modernismo e, enfim, à “sociedade do espetáculo” 10 .<br />

Liderados pelo francês Guy-Ernest Debord, os situacionistas tornaram-se um movimento<br />

de grande expressão nos anos sessenta, pontuando questões ligadas à arte, urbanismo e<br />

política, sobretudo incentivando movimentos revolucionários, “culminando na determinante<br />

e ativa participação situacionista nos eventos de Maio de 1968 em Paris” 11 .<br />

Entre os movimentos de contracultura da década de 1960, o Maio de 68 na França e<br />

o movimento hippie nos Estados Unidos foram, talvez, aqueles que mais se popularizaram<br />

e influenciaram em outros países movimentos de protestos contra o establishment. O primeiro<br />

iniciou-se no meio estudantil francês e rapidamente se espalhou entre a classe operária,<br />

gerando greves e insurreições contra o governo de Charles de Gaulle. O segundo nasceu<br />

no seio de uma sociedade norte-americana cada vez mais insatisfeita com os desastrosos<br />

resultados da Guerra do Vietnã. O jargão “sexo, drogas e rock’n roll” tornou-se um<br />

slogan desse movimento contracultural que alcançou grande destaque midiático e conquistou<br />

simpatizantes em grande parte do mundo ocidental 12 .<br />

Esse cenário de contestações e protestos está intimamente ligado à conjuntura política<br />

internacional marcada pela bipolarização do mundo, protagonizada pelos Estados Unidos<br />

da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), e a consequente<br />

guerra fria entre os capitalistas norte-americanos e os comunistas soviéticos que<br />

disputavam a hegemonia do globo, fazendo com que gerações inteiras vivessem “à sombra<br />

de batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer<br />

momento, e devastar a humanidade” 13 . É certo que os beligerantes EUA e URSS não chegaram<br />

a um confronto direto, mas suas disputas política, econômica e ideológica, aliada a<br />

uma desenfreada “corrida armamentista”, promoveram conflitos indiretos entre essas duas<br />

9 Sociedade do Automóvel foi uma expressão muito utilizada pelos situacionistas para descrever e criticar a<br />

lógica de urbanização que condicionava os planejamentos urbanos – e a vida das pessoas – ao avanço progressivo<br />

do uso do automóvel e ao arbítrio da lógica industrial. Um modelo de sociedade definida pelos situacionistas<br />

como de “consumidores hidrocarburodependentes, mimados pelos traficantes de petróleo: as companhias<br />

petrolíferas, que criam e moldam governos, estilos de vida, espaços urbanos e paisagens geográficas<br />

conforme suas necessidades”. JACQUES, op cit., p. 13.<br />

10 A Sociedade do Espetáculo é o título da principal obra de Guy Debord que tece uma ferrenha crítica à<br />

sociedade capitalista que, conforme o autor, transforma a dura realidade da vida real em uma “imensa acumulação<br />

de espetáculos” que imergem os indivíduos numa lógica de consumo e de aparências. De caráter subversivo,<br />

esse livro provoca os leitores a agir contra qualquer forma de controle do sistema, e foi considerado<br />

um grande estimulador das manifestações de ‘maio de 68’. DEBORD, 1997.<br />

11 JACQUES, op cit., p. 15.<br />

12 Sobre o Maio de 68 na França e o Movimento Hippie nos EUA, ver: KURLANSKY, 2005.<br />

13 HOBSBAWM, 1995, p. 224.<br />

51


potências, como a Guerra da Coréia (1950-1953) e a Guerra do Vietnã (1962-1975), além<br />

de situações delicadas e, porque não dizer, deploráveis como a construção do Muro de Berlim<br />

(1961) e a Crise dos Mísseis em Cuba (1962).<br />

Nesse conturbado contexto histórico, a Igreja Católica Romana se encontrava diante<br />

de um grande desafio: se adaptar à era moderna. De um lado o comunismo ateu, inimigo<br />

declarado antes mesmo das guerras mundiais; do outro um capitalismo cada vez mais contestado<br />

por sua ineficiência em sanar as injustiças sociais que afetava sociedades inteiras,<br />

principalmente nos países subdesenvolvidos. Como se não bastasse, questões como o avanço<br />

tecnológico, novas formas de divisão do trabalho e a aparente “secularização” do<br />

mundo moderno foram combinações que “convidaram a Igreja a tomar consciência de que<br />

se encontrava diante de um mundo novo, perante o qual devia representar os valores da<br />

igualdade universal, da pobreza, da justiça, da paz e da unidade cristã” 14 , mas para isso era<br />

“necessário que enfrentasse uma renovação de grande profundidade” 15 .<br />

É importante dizer que a teoria da secularização, ou desencantamento do mundo<br />

nos termos de Max Weber, não se confirmou na prática. Segundo Sérgio da Mata, o termo<br />

“secularização” originou-se no vocabulário eclesiástico e se transformou em conceito político-jurídico<br />

ao longo do século XVII, mas “sofreu, posteriormente, um processo de metaforização”,<br />

passando a designar “o suposto refluxo da religião face às modalidades profanas<br />

de socialização e construção simbólica do mundo”, o que faz dela um “mito” 16 . Apesar<br />

dessa teoria ter sido defendida por importantes sociólogos como Weber e Simmel, e apesar<br />

de ser uma ideia corrente no meio eclesiástico, o mundo moderno não se secularizou, não<br />

houve um refluxo da religião, ela não desapareceu e, menos ainda, não existe nenhuma<br />

evidência histórica de que isso possa vir a acontecer.<br />

O mundo moderno – com toda sua pluralidade ideológica, política, social, cultural –<br />

potencializou não o declínio e desaparecimento da religião, mas o prosperar de novas formas<br />

de religião que não se esgotam nas igrejas e sobrevivem fora dos domínios eclesiásticos.<br />

Mais do que isso, parece se confirmar a tese de Ernst Troeltsch de que “a história espiritual<br />

e religiosa dos últimos séculos deu origem a uma cultura religiosa que, mais cedo ou<br />

mais tarde, tende a repudiar o autoritarismo eclesiástico” 17 . Ao invés de “uma oposição<br />

especial à religião e às coisas religiosas”, o que Troeltsch detectou foi “uma recusa especí-<br />

14 ALBERIGO, 2006, p. 189.<br />

15 Ibidem. p. 187.<br />

16 MATA, 2010, p. 79.<br />

17 MATA, 2008, p. 242.<br />

52


fica do modelo eclesiástico e uma aversão à forma da Igreja e aos pressupostos da Igreja”<br />

18 .<br />

Uma dura realidade para a Igreja de Roma que, diante desse quadro, aspirava por<br />

mudanças pastorais, litúrgicas e eclesiológicas que a colocasse em sintonia com os “novos<br />

tempos”. Giacomo Martina 19 considera que tais aspirações se intensificaram no período<br />

posterior à Segunda Guerra Mundial e só se efetivaram com a realização do Concílio Vaticano<br />

II (1962-65), que “assinalou não só o fim de uma época, mas possivelmente, do ponto<br />

de vista conciliar, o primeiro ato de nova fase, em que o binômio espiritual/temporal tem<br />

novo equacionamento” 20 .<br />

O Vaticano II foi convocado em 1959 pelo papa João XXIII para ser um acontecimento<br />

de “transição de época” – conforme afirmou Giuseppe Alberigo 21 – que introduzisse<br />

a Igreja numa fase nova de seu caminho. Na Encíclica Ad Petri Cathedram, de 29 junho de<br />

1959, escreveu o Sumo Pontífice que “os sagrados pastores do orbe católico” estavam sendo<br />

convocados para “tratarem dos graves problemas da religião, principalmente para se<br />

conseguirem o incremento da fé católica e a saudável renovação dos costumes no povo<br />

cristão e para a disciplina eclesiástica se adaptar melhor às necessidades dos nossos tempos”<br />

22 .<br />

Aos “padres conciliares” foi dada a missão de repensarem não somente questões internas<br />

da Igreja (ad intra), mas também sua relação com o mundo exterior (ad extra). Decerto,<br />

o Concílio abordou muitos aspectos do catolicismo romano, desde tradições e sacramentos<br />

à liturgia e pastoral, inserindo na pauta da Igreja Católica os problemas sociais,<br />

políticos, econômicos e culturais do mundo moderno, seguindo, de certa forma, as orientações<br />

de João XXIII no discurso de abertura do Vaticano II:<br />

É nosso dever não só conservar este tesouro precioso [tradição e dogmas<br />

da Igreja], como se nos preocupássemos unicamente da antiguidade, mas<br />

também dedicar-nos com vontade pronta e sem temor às obras que nossa<br />

18<br />

TROELTSCH apud MATA, 2008, p.246.<br />

19<br />

MARTINA, 1997.<br />

20<br />

SOUZA, 2004, p. 244.<br />

21<br />

ALBERIGO, 2006, p. 187.<br />

22<br />

Papa João XXIII. Encíclica Ad Petri Cathedram, de 29 junho de 1959. Disponível em: <br />

acessado em 28/01/2010.<br />

53


época exige, prosseguindo assim o caminho que a Igreja percorre há vinte<br />

séculos 23 .<br />

Muitas mudanças aconteceram em decorrência do Vaticano II. O ecumenismo e o<br />

diálogo com outras religiões tornaram-se mais aflorados, assim como se acentuou a responsabilidade<br />

de bispos e padres para com os problemas “mundanos” de seus fiéis 24 . Introduziu-se<br />

a noção de Igreja como povo de Deus, e os leigos ganharam mais autonomia nos<br />

assuntos da ecclesia. Na liturgia, o antigo missal publicado por Pio V quatro séculos antes<br />

foi substituído por um novo livro litúrgico trazendo renovações nas diversas partes da missa<br />

católica 25 , que deixou de ser realizada exclusivamente nos templos sagrados, podendo<br />

acontecer desde salões de reuniões até em campo aberto, conforme a necessidade de localidade<br />

ou data religiosa. Foi permitido o uso de língua vernácula nas celebrações eucarísticas<br />

e matrimoniais, em orações e cânticos, nas administrações de sacramentos e demais<br />

atos litúrgicos até então realizados somente em latim, língua oficial da Igreja. O calendário<br />

foi renovado “dividindo com mais clareza o ano litúrgico, deslocando corajosamente algumas<br />

festas, eliminando alguns santos pouco conhecidos ou discutidos, e introduzindo o<br />

culto de outros, mais representativos da universalidade da Igreja” 26 .<br />

Contudo, para que as mudanças preconizadas pelo Concílio pudessem ser efetivadas<br />

foi necessário um planejamento pastoral que adaptasse as Igrejas locais às novas orientações.<br />

Na América Latina, a tentativa de traduzir o Vaticano II para a realidade desse continente<br />

tem como referência a Conferência Episcopal de Medellín (1968), quando uma<br />

parcela significativa da Igreja latino-americana definiu sua “opção preferencial pelos pobres”,<br />

adotando a nascente Teologia da Libertação como referencial teológico para sua<br />

atuação pastoral. Para Oscar Beozzo:<br />

a verdadeira raiz espiritual de Medellín, sua fecundidade e perenidade,<br />

reside no fato de que, pela primeira vez na história da América Latina, a<br />

Igreja aqui presente tomou a palavra em plenitude, uma palavra inspirada<br />

profética, gesto decisivo para quem sempre escutou a palavra que lhe era<br />

dirigida ou imposta de fora. E tomou a palavra através de um auscultar<br />

paciente, humilde e dinâmico da realidade do povo latino-americano 27 .<br />

23 Discurso de Sua Santidade Papa João XXIII na Abertura Solene do SS. Concílio. Disponível em:<br />

acessado em 28/01/2010.<br />

24 BEOZZO, 1993, p. 07.<br />

25<br />

MARTINA, 1997, p. 335.<br />

26<br />

Ibidem, p. 336.<br />

27<br />

BEOZZO, op cit., p. 120.<br />

54


Essa “realidade” a que Beozzo se refere tem a ver, dentre outras coisas, com o subdesenvolvimento<br />

da América Latina e os reflexos da guerra fria nos anos sessenta. A revolução<br />

cubana de 1959, liderada por Fidel Castro e Ernesto Che Guevara, intensificou a “ameaça<br />

vermelha” em todo continente, deixando em alerta o bloco capitalista liderado pelos<br />

norte-americanos. Ao mesmo tempo em que serviu de inspiração para a esquerda revolucionária<br />

da América, despertou a atenção daqueles que entendiam o comunismo como mal<br />

a ser combatido, gerando inquietude tanto nas elites nacionais quanto nas forças armadas<br />

de vários países, além de boa parte da hierarquia eclesiástica Católica. “O exemplo de Fidel<br />

inspirou os intelectuais militantes em toda parte da América Latina”, e Cuba “passou a<br />

estimular a insurreição continental, exortada por Ernesto Che Guevara, o defensor da revolução<br />

latino-americana” 28 .<br />

Essa ameaça comunista serviu de álibi para os vários golpes militares ocorridos no<br />

continente americano que alastraram-se pelas décadas subseqüentes à de 1960, atingindo<br />

países como Chile, Argentina, Uruguai e Brasil. Nesse último, as Forças Armadas – com<br />

considerável apoio da sociedade civil 29 – tomaram o poder em 1964 sob o argumento de<br />

estarem defendendo a pátria do “inimigo externo” 30 que adentrava-se no país através dos<br />

herdeiros políticos de Getúlio Vargas, que se deslocavam para a esquerda e ofereciam democratização,<br />

reforma agrária e ceticismo em relação à política norte americana 31 .<br />

Uma vez no poder, os militares implementaram a chamada Doutrina de Segurança<br />

Nacional e Desenvolvimento, que tornou-se um importante instrumento de consolidação de<br />

uma estrutura estatal destinada a facilitar o desenvolvimento capitalista. Em nome do anticomunismo,<br />

esta doutrina intensificou a segurança interna através de uma implacável série<br />

de perseguições aos opositores do regime, com prisões arbitrárias, torturas e supressão da<br />

liberdade de expressão 32 . Foi nesse contexto que a Conferência Nacional dos Bispos do<br />

Brasil (CNBB) definiu seu planejamento pastoral para inserir a Igreja do Brasil no aggiornamento<br />

do Vaticano II.<br />

28<br />

HOBSBAWM, 1995, p 427-428.<br />

29<br />

Sobre o apoio da sociedade civil aos militares no golpe de 1964 ver: AARÃO REIS FILHO, 2005; COR-<br />

DEIRO, 2009.<br />

30<br />

Cf. D’ARAÚJO; CASTRO; SOARES, 1994.<br />

31<br />

HOBSBAWM, 1995, p 429.<br />

32<br />

Sobre a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento, ver: ALVES, 2005.<br />

55


A CNBB e o planejamento pastoral na década de 1960<br />

No começo dos anos sessenta, sob as expectativas geradas pela convocação do<br />

Concílio Vaticano II, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil 33 , em parceria com a<br />

Conferência dos Religiosos do Brasil 34 , iniciava uma nova fase de seu planejamento pastoral<br />

com o intuito de alinhavar as ações do clero dentro de um esforço conjunto que pudesse<br />

“contemplar as atividades básicas internas à vida da Igreja e as orientações oficiais relativas<br />

à projeção da Igreja no campo econômico e social” 35 . O primeiro resultado dessa iniciativa<br />

foi o Plano de Pastoral de Emergência (PPE), aduzido pelo episcopado brasileiro na<br />

V Assembléia Geral da CNBB, reunida no Rio de Janeiro em 1962, às vésperas da primeira<br />

sessão conciliar. Poucos anos depois os bispos do Brasil apresentaram o Plano de Pastoral<br />

de Conjunto (PPC), desta vez por ocasião da VII Assembléia que aconteceu em Roma<br />

no ano de 1965, durante a última sessão do Concílio.<br />

A importância de uma ação pastoral planejada foi enfatizada pelo Papa João XXIII<br />

quando, em 1961, endereçou uma carta 36 ao Conselho Episcopal Latino Americano (CE-<br />

LAM) solicitando aos bispos a elaboração de planos de pastoral que levassem em consideração<br />

as especificidades da Igreja Católica nesse continente que, na visão do Sumo Pontífice,<br />

encontrava-se diante de “quatro perigos mortais”: 1) o naturalismo, que desviava os<br />

leigos de uma vida cristã; 2) o protestantismo, que se expandia de forma considerável; 3) o<br />

espiritismo, que se difundia com “ares de endemia”; 4) e o comunismo marxista, cada vez<br />

mais influente nos meios universitários e sindicais.<br />

A inspiração dos bispos brasileiros para planejar e coordenar as ações que a Igreja<br />

no Brasil deveria assumir na década de sessenta foi, por eles, creditada às palavras de João<br />

33<br />

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) é uma instituição fundada em 14 de outubro de<br />

1952 e formada por todos os bispos do país (diocesanos, auxiliares e titulares) mais os prelados das Igrejas<br />

orientais católicas. Sua finalidade, entre outras coisas, é planejar, orientar e dar unidade aos trabalhos pastorais<br />

da Igreja Católica Romana no Brasil, além de favorecer e articular as relações entre as Igrejas particulares<br />

desse país e a Santa Sé.<br />

34<br />

A Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), fundada em 11 de fevereiro de 1954, é uma instituição de<br />

caráter nacional composta pelos institutos católicos de vida consagrada, masculinos e femininos. Entre suas<br />

finalidades destaca-se seu papel de animação e incentivo à vocação religiosa, sua função de articulação entre<br />

ordens e congregações católicas e sua parceria com a CNBB.<br />

35<br />

MARCHI, 2001, p. 272.<br />

36<br />

Carta de João XXIII ao Episcopado da América Latina. Publicada pela Revista Eclesiástica Brasileira, vol.<br />

22, fasc. 2, junho de 1962.<br />

56


XXIII 37 , e o Plano de Pastoral de Emergência, em função das orientações da Cúria Romana,<br />

foi dividido em duas partes, uma destinada à pastoral e outra às questões econômicosociais<br />

38 . A primeira priorizou os problemas internos da Igreja, dedicando-se especificamente<br />

à necessidade de se introduzir uma pastoral de conjunto e renovar as paróquias, o<br />

Ministério Sacerdotal e os educandários. Mas a segunda parte parece não ter sido discutida<br />

pela V Assembléia Geral dos bispos, ou, pelo menos, não foi redigida; no lugar do texto<br />

sobre as questões econômico-sociais foram apresentadas uma sucinta declaração de três<br />

páginas, e uma mensagem à sociedade brasileira, ambas elaboradas três meses depois, não<br />

pela Assembléia, mas pela Comissão Central da CNBB 39 .<br />

Oscar Beozzo utilizou o adjetivo “falência” para simplificar a incapacidade do PPE<br />

em apresentar um planejamento consistente sobre a “atuação da Igreja no campo econômico<br />

e social” 40 . Decerto, a referida Declaração da Comissão Central da CNBB 41 resume-se<br />

em: denunciar os “exploradores da miséria, especialmente os comunistas, que só têm a<br />

lucrar com o desespero, a desordem e o caos”; a condenar a todos os que “se sintam, em<br />

consciência, responsáveis pela aflição do povo”; a saudar, “com alegria, as Reformas de<br />

base que passaram a ser anseio de todos os responsáveis – Poderes da República, Partidos<br />

Políticos, Classes Dirigentes”; e, por fim, anunciar que “em breve sugeriremos, a propósito<br />

de Reformas 42 tidas, com razão, como inadiáveis, não indicações técnicas que nos escapam,<br />

mas diretrizes doutrinárias, aplicadas a nosso tempo e a nosso meio”.<br />

37 O texto do Plano de Pastoral de Emergência inicia-se com a afirmação: “essa Assembléia teve como inspiração<br />

de seus trabalhos o atendimento a um apelo do Santo Padre, dirigido ao Episcopado Latino-Americano,<br />

em carta de dezembro de 1961”. Logo em seguida, os bispos enfatizam que: “Sua Santidade o Papa João<br />

XXIII pediu que se elaborasse um plano de trabalho para a Igreja na América Latina; um plano que atendesse<br />

às especiais condições da Igreja neste Continente e que indicasse as medidas a serem tomadas, a curto e a<br />

longo prazo, no campo específico da ação pastoral da Igreja e também no que lhe cabe como atuação no<br />

campo econômico-social”. p. 13.<br />

38 CNBB. Plano de Pastoral de Emergência Para a Igreja do Brasil. 2ª edição. São Paulo: Paulinas, 2004. p<br />

29. “De acordo com o que nos foi sugerido pela Santa Sé, voltaremos as vistas para uma Parte Pastoral e para<br />

uma Parte Econômico-Social”. (nas próximas referências ao Plano abreviaremos a citação para PPE.)<br />

39 No início da terceira parte do PPE, com o subtítulo: O Plano de Emergência: parte econômico-social, lê-se:<br />

“No plano econômico-social, a Assembléia da CNBB examinou especialmente o que se vem fazendo por<br />

meio do Movimento de Educação de Base (MEB), das Frentes Agrárias e do trabalho de Sindicalização Rural,<br />

da Formação de Líderes e da Aliança Eleitoral pela Família. A Assembléia aprovou e recomendou o que<br />

se vem fazendo nestes diversos campos, mas não emitiu nenhum documento especial”. Os grifos são meus.<br />

40 BEOZZO, 1982, p 494.<br />

41 Essa declaração, como já frisado, ocupa apenas três das 106 páginas de PPE (excluso os anexos), situandose<br />

entre a 97-99. (É importante dizer que utilizamos a 2ª edição do plano, publicada em 2004 com formatação<br />

diferente da primeira edição de 1962).<br />

42 O texto se refere, sem entrar em detalhes, às reformas “Agrária, Tributária, Bancária, Universitária, Eleitoral,<br />

Administrativa”. (todas iniciadas com letras maiúsculas).<br />

57


A Mensagem 43 , por sua vez, esclarece que a Comissão Central da CNBB, “julgou<br />

de seu dever levar à Nação uma palavra de esclarecimento e um apelo”. Nos esclarecimentos,<br />

os bispos afirmam que estão cientes do “clamor das massas que, martirizadas pelo espectro<br />

da fome, vão chegando, aqui e acolá, às raias do desespero”; que “a situação do País<br />

tem se agravado” devido a “irresponsabilidade, a ganância, a frouxidão moral” promovidas<br />

por “ideologias anticristãs e anti-humanas”; mas que a Igreja “nunca deixou de pregar a<br />

doutrina do Evangelho” e “de clamar por uma ordem social baseada nos princípios da verdade<br />

revelada e das normas da justiça e da eqüidade”; e por isso “Ela saberá seguir o seu<br />

caminho, sem se desviar nem para o duro e esmagador ateísmo do comunismo, nem para o<br />

maleável e frouxo ateísmo de um sistema capitalista não menos condenável”.<br />

Todavia, diante do esclarecido, a Comissão Central se isenta de apresentar um planejamento<br />

de ação pastoral que levasse a Igreja a interceder, de modo prático, em favor de<br />

seus fiéis, resumindo-se a enumerar cinco apelos aos vários segmentos da sociedade: 1)<br />

aos Bispos, Sacerdotes e Leigos, para se empenharem “à execução do Plano de Emergência”;<br />

2) aos Poderes da República, para que correspondam “às esperanças do Povo, que<br />

deseja e reclama um Governo firme” que inspire o “respeito e a confiança que precedem<br />

do Direito da Lei e da Autoridade”; 3) às Forças Produtoras do País, para que compreendam<br />

“a gravidade da situação” e busquem “os verdadeiros fins do Capital e do Trabalho,<br />

que não podem servir apenas aos interesses de grupos privilegiados, mas ao bem de toda a<br />

comunidade”; 4) às Famílias, aos Estudantes e aos Operários, para que não se deixem “iludir<br />

ou influenciar pela calculada agitação dos que nada querem além do agravamento indefinido<br />

dos males que nos afligem”, e sim unam forças “numa ação vigilante e enérgica pela<br />

restauração dos pontos fundamentais que asseguram a estabilidade da ordem social, isto é,<br />

respeito às pessoas e instituições, moralidade nos costumes e senso de responsabilidade”; e<br />

por último 5) aos Órgãos de Comunicação, para que ajudassem o Brasil a reencontrar, “acima<br />

de diferenças de grupos ou de ideologias”, o caminho para a “paz e prosperidade de<br />

uma Pátria livre e autenticamente cristã”.<br />

As orientações da Santa Sé para que a Igreja assumisse uma posição mais incisiva<br />

quanto às questões econômicas e sociais foram adotadas de forma modesta no Plano de<br />

Pastoral de Emergência, e isso se deve, em alguma medida, à conjuntura política do país<br />

que, em 1962, vivenciava as conseqüências provocadas pela renúncia de Jânio Quadros,<br />

pela desconfiança a João Goulart e pela instabilidade de um parlamentarismo em vigor.<br />

43 “Mensagem da Comissão Central da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil”, PPE, p 100-106.<br />

58


Além disso, o diagnóstico da CNBB sobre a Igreja no Brasil “repousava na ineficácia de<br />

suas estruturas tradicionais, sobretudo paróquias, em responder eficazmente às mudanças<br />

em curso na sociedade brasileira” 44 . Por tudo isso, o PPE dedicou-se com mais vigor à reestruturação<br />

de seu aparato administrativo, visando potencializar sua pastoral dentro de<br />

uma ação conjunta entre paróquias e dioceses.<br />

Um dos grandes problemas detectados pela CNBB era o isolamento de padres e<br />

bispos em suas respectivas Igrejas particulares. Um “isolamento de vida” – diz o Plano de<br />

Emergência – “espiritual, intelectual e humano” 45 , que fazia dos clérigos “franco atiradores”<br />

perdidos na imensidão e complexidade de suas paróquias 46 . Daí a necessidade de uma<br />

pastoral de conjunto que pudesse transformar essas ações isoladas em uma harmoniosa e<br />

articulada relação entre dioceses e paróquias, bispos e párocos. A diocese deve funcionar<br />

como “unidade fundamental da ação pastoral”, e as paróquias, como “célula orgânica da<br />

diocese”, devem se tornar “Igrejas Comunidades”; o pároco, por sua vez, “não pode, pois,<br />

realizar um ministério pessoal, mas colaborar por sua ação, no ministério do bispo nas linhas<br />

e nos limites por ele fixados” 47 .<br />

Sendo assim, o planejamento proposto pelo PPE visava, na base, uma renovação<br />

das paróquias, que não deveriam ser, unicamente, unidades administrativas, mas sim “comunidades<br />

de fé, de culto e de caridade”, inseridas “profundamente na pastoral diocesana”.<br />

A estrutura hierárquica da Igreja é destacada e reafirmada no Plano de Emergência: os párocos<br />

seriam os responsáveis pela organização dos leigos em comunidades e pela formação<br />

dos mesmos, mas sempre seguindo as diretrizes dos bispos, a quem juraram obediência<br />

incondicional por ocasião das ordenações. Nessa lógica, “a iniciativa e responsabilidade<br />

dos leigos ficam circunscritas à orientação dada pela Igreja, representada pelo pároco” 48 ,<br />

que “é um colaborador do bispo, alguém que participa de seu múnus pastoral” 49 .<br />

O Plano de Pastoral de Emergência não apresentou uma proposta que desse maior<br />

destaque ao laicato. Se nas sessões do Concílio Vaticano II – que, importante frisar, foram<br />

posteriores ao PPE – preconizou-se mais autonomia e responsabilidade aos leigos na Igreja,<br />

no referido Plano esse quesito é tratado timidamente. A Assembléia dos Bispos reco-<br />

44<br />

BEOZZO, 1982, p. 492.<br />

45<br />

PPE, p. 55-56.<br />

46<br />

Em 1962 havia, no Brasil, 4500 paróquias distribuídas em 166 circunscrições eclesiásticas. Cf. PPE, p. 5.<br />

47 Ibidem, p. 32<br />

48 Ibidem, p. 35.<br />

49 Ibidem, p. 32.<br />

59


nheceu a necessidade de, futuramente, complementar seu planejamento pastoral com um<br />

“plano para os leigos”, mas foram enfáticos ao afirmarem que o Ministério Sacerdotal “é o<br />

setor mais vital e decisivo” para a execução do PPE e sustentação da Igreja 50 . Os leigos,<br />

por conseguinte, não são convidados a se organizarem em comunidades ou mesmo a assumirem<br />

maiores responsabilidades em suas paróquias, mas é o pároco que deve organizar as<br />

comunidades de cristãos, ele é o “chefe” que tem a responsabilidade de delegar funções:<br />

“os leigos, que também são Igreja, e nela devem assumir as responsabilidades que lhes são<br />

peculiares e insubstituíveis, quase nada podem fazer sem a ação e animação de um autêntico<br />

ministério sacerdotal” 51 .<br />

Dada essa tamanha importância ao papel do clero, um dos pontos centrais do Plano<br />

de Emergência foi a renovação do Ministério Sacerdotal que, na avaliação da CNBB, enfrentava<br />

problemas quantitativos e qualitativos. Primeiro, porque a Igreja Católica no Brasil<br />

contava com um número de sacerdotes considerado pequeno para atender uma população<br />

em ritmo de crescimento 52 , e segundo, porque muitos desses sacerdotes não tinham a<br />

formação necessária para desempenharem, de forma “apostólica”, suas funções ministeriais:<br />

“muitos, pouco a pouco, tomam consciência da insuficiente preparação recebida no<br />

seminário e reconhecem-se pouco preparados para enfrentar a complexidade da situação”.<br />

Diante dessa realidade, o PPE apresenta alguns “princípios”, “requisitos”, “objetivos”, “esforços”<br />

e “etapas” para orientar o trabalho de renovação desse ministério, visando a já citada<br />

pastoral de conjunto, que seria conduzida pelos padres, não de forma isolada em suas<br />

paróquias, mas numa “colegialidade do sacerdócio” em sintonia com o apostolado dos bispos.<br />

Todavia, o Plano de Emergência é praticamente todo voltado para a pastoral ordinária.<br />

A renovação do Ministério Sacerdotal – que priorizou o clero secular e suas funções<br />

– está intimamente ligada à renovação paroquial, e a formação de Igreja comunidades é<br />

uma função delegada aos párocos em sintonia com seus respectivos bispos, não havendo<br />

uma definição do papel que o clero regular deveria desempenhar nessa renovação. O PPE<br />

não contempla a pastoral extraordinária da Igreja, e não há, dentro do planejamento traçado<br />

pela CNBB em 1962, nenhuma alusão às Missões Populares:<br />

50 PPE, p. 75.<br />

51 Ibidem, p. 58. Grifos meus.<br />

52 Em 1962, conforme os dados apresentado no PPE, o Brasil possuía uma população de 75.325.000 de habitantes,<br />

e contava com um número de 11.565 padres, sendo 6.939 regulares e apenas 4.626 seculares.<br />

60


Isto levou alguns a verem na missão popular antes um obstáculo do que<br />

um instrumento de renovação paroquial. A missão, segundo eles, viria<br />

apenas tumultuar um trabalho em profundidade, a longo prazo. A comunidade<br />

paroquial, com seus recursos próprios, será capaz de harmonicamente,<br />

em boa ordem, sem sobressaltos empreender a renovação desde as<br />

bases da evangelização e da conversão 53 .<br />

A tentativa de corrigir essa lacuna deixada pelo PPE veio dois anos depois, em<br />

1964, quando na VI Assembléia Geral da CNBB – reunida em Roma durante a terceira<br />

sessão do Concílio – efetivou a criação do Secretariado Nacional de Pastoral Extraordinária<br />

54 , com o intuito de fomentar uma “atualização” das missões populares de modo a adequá-las<br />

ao incipiente projeto de pastoral de conjunto e reestruturação paroquial. No impulso<br />

das “renovações” propostas pelo Plano de Emergência, o novo secretariado da CNBB<br />

parece ter nascido com o propósito de renovar, também, os métodos da pastoral extraordinária.<br />

Se o PPE foi o primeiro passo da Igreja Católica no Brasil rumo à pastoral de conjunto,<br />

a ausência da pastoral extraordinária nesse plano reflete, de certa forma, as dificuldades<br />

enfrentadas pela Missão Popular na década de 1960. No contexto de aggiornamento<br />

do Vaticano II foram muitos os institutos religiosos que entraram em crise. Mais adiante<br />

discutiremos esse assunto detalhadamente, por hora é importante dizer que essa crise teve<br />

altos reflexos nas missões populares, e sua superação – na visão do Secretariado Nacional<br />

de Pastoral Extraordinária – carecia de uma renovação nos métodos e no conteúdo de evangelização<br />

adotados pelos missionários:<br />

Havia o interesse de colocar tão poderosa força apostólica a serviço da<br />

Pastoral de Conjunto. Para isso era necessário fazer uma revisão em profundidade<br />

da chamada “missão tradicional”, tal qual se vinha pregando há<br />

séculos, à luz da Pastoral renovada, preconizada pelo PE 55 .<br />

Fazer essa “revisão da missão tradicional” significava, naquele momento, adequá-la<br />

ao PPE, e colocá-la a serviço da referida renovação paroquial e da almejada pastoral de<br />

53 NETTO, Pe. Virgílio Rosa. A Missão Popular e o Plano de Emergência para a Igreja do Brasil da CNBB.<br />

Palestra ministrada aos Redentoristas da Província de São Paulo por ocasião da Conferência Missionária de<br />

1964, em Tietê-SP. Disponível no Arquivo da Província de SP, documenta 96, Vol. III – Conferências Missionárias.<br />

1964, p. 393-394.<br />

54 Segundo o padre Virgílio Rosa Netto, a criação de um novo Secretariado Nacional da CNBB – o de Pastoral<br />

Extraordinária, muito se deve às sugestões da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB) elaboradas em<br />

1963 por ocasião do Encontro de Missionários do Nordeste. Ver NETTO, Op cit. p. 407. Padre Netto era o<br />

chefe do Departamento de Missões Populares da CRB, e considerado por muitos de seus contemporâneos<br />

como o principal articulador entre as duas Conferências Nacionais, a dos Bispos e dos Religiosos.<br />

55 NETTO, Op cit., p. 394.<br />

61


conjunto. A dimensão missionária, a partir de então, se faz mais presente no novo planejamento<br />

pastoral da Igreja no Brasil que ganhou outro capítulo em 1965: O Plano de Pastoral<br />

de Conjunto; nele haverá uma parte especificamente destinada à ação missionária, além de<br />

maior referência às ordens e congregações católicas.<br />

O PPC foi uma iniciativa da CNBB em aperfeiçoar o Plano de Emergência à luz<br />

das orientações conciliares. O próprio nome do novo plano trouxe em evidência o termo<br />

muito defendido no PPE, a pastoral de conjunto. Na verdade, os dois planos de pastoral<br />

são peças importantes de um mesmo processo de renovação da Igreja Católica no Brasil,<br />

no qual o primeiro “proporcionou à Igreja um novo dinamismo, novas estruturas, novas<br />

possibilidades de ação, e preparou o terreno propício para uma ampla renovação na linha<br />

do Concílio Vaticano II” 56 ; e o segundo, numa lógica de continuidade e aperfeiçoamento,<br />

teve como objetivo geral “criar meios e condições para que a Igreja no Brasil” se ajustasse,<br />

“o mais rápido e plenamente possível, à imagem de Igreja do Vaticano II” 57 .<br />

Para a realização desse objetivo geral, a CNBB elaborou um planejamento de atividades<br />

e diretrizes, aprofundou as reflexões do PPE conforme as perspectivas conciliares e<br />

priorizou a criação de órgãos técnicos e especializados para prestarem assessoria aos diversos<br />

segmentos envolvidos nesse processo de implementação do concílio no Brasil.<br />

Com o Plano de Emergência algumas iniciativas trouxeram benefícios para a renovação<br />

pastoral. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil reforçou seu arcabouço administrativo,<br />

criou sete Secretariados Regionais e definiu claramente as funções dos Secretariados<br />

Nacionais e das Comissões Episcopais. Também foi fundado, em 1962, o Centro<br />

de Estudos Religiosos de Investigações Sociais (CERIS) com o intuito de fornecer melhores<br />

subsídios à Igreja sobre a realidade social e religiosa do país. Com a elaboração do<br />

PPC, essa estrutura criada com o PPE foi acrescida de dois Institutos Superiores de Pastoral:<br />

Litúrgica (ISPAL) e Vocacional (ISPAV); além do Instituto de Previdência do Clero<br />

(IPREC) e do Instituto Nacional de Apostolado Leigo (INAL), todos com a função de contribuir<br />

na formação e informação da comunidade católica (padres, religiosos e leigos) prestando<br />

assessoria e promovendo cursos. Em 1969, ISPAL e ISPAV foram unificados ao já<br />

56<br />

CNBB. Plano de Pastoral de Conjunto 1966-1970. Rio de Janeiro: Dom Bosco, 1966. p. 13. (usaremos<br />

PPC nas próximas citações)<br />

57<br />

Ibidem, p 25.<br />

62


existem ISPAC – Instituto Superior de Pastoral Catequética (1958) – dando origem ao Instituto<br />

Nacional de Pastoral (INP) 58 .<br />

O Movimento por um Mundo Melhor (MMM) 59 também teve papel decisivo nesse<br />

processo de renovação pastoral. Muito citado no PPE, esse movimento realizou inúmeros<br />

cursos em todo país, o que “contribuiu para desbloquear o espaço eclesial brasileiro, preparando<br />

o terreno para as experiências pastorais inovadoras e pioneiras que se realizaram na<br />

década de 60” 60 . Essa dinâmica de cursos de formação e renovação pastoral foi perpetuada<br />

pelo PPC, deixando a cargo dos Institutos Superiores de Pastoral a tarefa de elaborar e disseminá-los<br />

pelas bases da Igreja, sempre seguindo as orientações conciliares e as diretrizes<br />

definidas pela CNBB.<br />

Seis linhas de trabalho foram definidas no Plano de Conjunto, a saber: 1) Promover<br />

uma sempre mais plena unidade visível no seio da Igreja Católica; 2) Promover a ação<br />

missionária; 3)Promover a ação catequética, o aprofundamento doutrinal e a reflexão teológica;<br />

4) Promover a ação litúrgica; 5) Promover a ação ecumênica; e 6) Promover a melhor<br />

inserção do povo de Deus. Para cada uma dessas linhas foram definidas as estratégias<br />

de execução, as atividades-fins e atividades-meios, bem como os agentes e órgãos especializados<br />

responsáveis pelas frentes de trabalho.<br />

O PPC não é apenas um plano para a Igreja do Brasil se atualizar perante as novas<br />

orientações conciliares, mais do que isso, ele é um planejamento detalhado de como a Igreja<br />

– e seus quadros – deveria direcionar suas ações dentro da pastoral de conjunto. Nesse<br />

ponto, as ordens e congregações religiosas são convocadas para participarem desse processo:<br />

“Uma questão de grande importância é a inserção das comunidades religiosas na Pastoral<br />

de Conjunto, diocese, regional e nacional. Seu encaminhamento em sólidas bases ecle-<br />

58 “Então os institutos entraram na área do programa de formação do pessoal. Já havia, anterior ao Plano, um<br />

Instituto Catequético (ISPAC), que data de 1958, e depois, como a liturgia era um ponto importante da renovação,<br />

fundou-se o Instituto de Liturgia (ISPAL), e os bispos acharam importante também formar o pessoal<br />

que era promotor de vocações. Criou-se o ISPAV. Mais tarde, o padre [redentorista Virgílio Rosa] Neto conseguiu<br />

fundir os três Institutos no INP”. BARROS, Raimundo Caramuru de. Entrevista concedida a Maria<br />

Carmelita de Freitas. Brasília, abril de 1992. In.: FREITAS, 1997, p. 421-440.<br />

59 O Movimento por um Mundo Melhor (Mondo Migliori) é de origem européia. Nasceu na Itália no segundo<br />

pós-guerra e se espalhou por vários países da Europa e América. O grande precursor do movimento foi o<br />

jesuíta italiano padre Riccardo Lombardi (1908-1979), que recebera do Papa Pio XII a missão de pregar ao<br />

povo um “apelo por um mundo melhor”. O Mondo Migliori foi oficialmente aprovado pela Cúria Romana<br />

em 1952, e sua primeira experiência no Brasil aconteceu na diocese de Natal, no final dos anos cinqüenta. A<br />

partir dos anos sessenta, o MMM se expandiu pelo território nacional – sob forte aprovação e incentivo da<br />

CNBB – como um importante instrumento de renovação pastoral. Segundo Faustino Teixeira, “deve-se a esse<br />

movimento um papel muito importante na renovação do clero brasileiro e na agilização da atividade pastoral.”<br />

TEIXEIRA, 1988, p. 111.<br />

60 TEIXEIRA, op cit., p. 111.<br />

63


siológicas é vital para a ação da Igreja no Brasil” 61 . Mas o ponto central desse chamado é o<br />

alerta para que a especificidade de cada uma dessas comunidades religiosas – o “carisma<br />

do fundador” que define a razão da existência de cada instituto católico – seja respeitada e<br />

preservada, mas também reinterpretada à luz dos tempos atuais para “uma melhor encarnação<br />

e adaptação da vida religiosa à nossa realidade” 62 . Isso significa que os institutos de<br />

carisma missionário, dentro do previsto para a ação missionária da pastoral de conjunto,<br />

deveriam atualizar seus métodos e adaptá-los à nova conjuntura eclesial e eclesiástica, mas<br />

sem perder a referência do carisma.<br />

A ação missionária no PPC, longe de ser uma parte destinada exclusivamente à<br />

missão extraordinária, abrange de forma ampla esse encargo da missionariedade da Igreja.<br />

Não há um método específico a ser seguido, o que é definido nessa linha de ação do PPC<br />

são os fins e os meios que devem ser alcançados: promover o “anúncio missionário da Palavra<br />

de Deus” e suscitar nas comunidades equipes de leigos para dar “testemunho missionário<br />

no engajamento temporal” 63 . Um trabalho que exige um conhecimento da realidade<br />

concreta dos grupos a serem missionados, e que também requer “respeito a seus autênticos<br />

valores, o diálogo, um testemunho pessoal e comunitário de Igreja, o anúncio explícito da<br />

mensagem em condições de ser entendida e de provocar uma conversão”, tanto pessoal<br />

quanto comunitária 64 .<br />

Aliás, a dimensão comunitária da Igreja também recebeu grande destaque no Plano<br />

de Pastoral de Conjunto. No PPE a paróquia foi convocada a se tornar uma Igreja comunidade,<br />

no PPC ela foi convidada a se descentralizar e formar comunidades de base onde os<br />

leigos tivessem mais autonomia, tal como evocado pelo concílio:<br />

61 PPC, p. 40.<br />

62 PPC, p. 90.<br />

63 Ibidem, p. 64-65<br />

64 Ibidem, p 64.<br />

65 Ibidem, p 38.<br />

Faz-se urgente uma descentralização das paróquias, não necessariamente<br />

no sentido de criar novas paróquias jurídicas, mas de suscitar e dinamizar,<br />

dentro do território paroquial, comunidades de base (como as capelas rurais),<br />

onde os cristãos não sejam pessoas anônimas que buscam um serviço<br />

ou cumprem uma obrigação, mas sintam-se acolhidos e responsáveis,<br />

e delas façam parte integrante, em comunhão de vida com Cristo e com<br />

todos os seus irmãos 65 .<br />

64


Em vários momentos do texto são feitas referências às “comunidades de base”, e a<br />

participação mais autônoma dos leigos deveria acontecer, dentre outras possibilidades,<br />

nessas comunidades. Suscitá-las passou a ser uma linha de ação importante para a pastoral<br />

de conjunto e assumida por vários segmentos da Igreja. Nos anos ulteriores ao PPC surgiram<br />

comunidades de base nos quatro cantos do país. Incentivadas por uns, reprimidas por<br />

outros, ganharam variadas configurações, se destacaram no âmbito religioso, social e político,<br />

tornaram-se objetos de pesquisas de sociólogos, antropólogos, historiadores e militantes<br />

66 .<br />

O Plano de Pastoral de Conjunto entrou em vigor em 1966, e a previsão de sua execução<br />

era de cinco anos. Laborioso e minucioso, o PPC possuía um planejamento de alto<br />

custo, tanto por recursos financeiros quanto de contingente humano. Para aplicá-lo à realidade<br />

brasileira foi necessário um grande esforço de muitos clérigos e leigos católicos. A<br />

Província Redentorista do Rio de Janeiro atendeu ao chamado da CNBB para que os institutos<br />

religiosos aderissem à pastoral de conjunto, mas essa adesão foi um processo difícil<br />

porque aqueles confrades enfrentavam a pior crise da história dessa Província.<br />

A Província do Rio e a crise dos anos sessenta<br />

A crise que sucedeu os anos conciliares não foi exclusividade dos redentoristas, ao<br />

contrário foi um fenômeno geral que afetou tanto o clero regular quanto o secular da Igreja<br />

de Roma, abalando as vocações sacerdotais e colocando em xeque, principalmente, a pastoral<br />

extraordinária e, conseqüentemente, os institutos religiosos a ela dedicados. O abandono<br />

do sacerdócio nas décadas de 60 e 70 alcançou proporções sem precedentes na história<br />

do catolicismo. Entre os anos de 1939 e 1963, que correspondem aos pontificados de<br />

Pio XII e João XXIII, a Santa Sé concedeu 563 dispensas do sacerdócio, o que corresponde<br />

a uma média pouco superior a 20 por ano. Entre 1964 e 1970 esse número sobe para<br />

13.139, alcançando a exorbitante média de 1877 por ano 67 . Na data de encerramento do<br />

Concílio, em 1965, havia em todo o mundo quase 315 mil religiosos de vida consagrada,<br />

em meados dos anos oitenta esse número encontrava-se reduzido a pouco mais de 200 mil;<br />

66<br />

Voltaremos a esse assunto no capítulo IV dessa dissertação.<br />

67<br />

MARTINA, 1997. p. 356.<br />

65


e entre as religiosas, no mesmo período, a redução foi de aproximadamente 25% das voca-<br />

ções. 68<br />

Os motivos de tamanha defecção no clero católico, segundo Giacomo Martina, não<br />

tem nenhuma ligação direta com o Concílio, ao contrário são conseqüências de fenômenos<br />

que abrangem toda a sociedade moderna e podem variar entre questões de ordem afetivas,<br />

perdas de valores fundamentais ao sacerdócio, esvaziamento espiritual, secularização, frustrações<br />

intelectuais ou disciplinares, contestação e rejeição à Igreja-instituição, ou mesmo<br />

discordância das regras e normas sacerdotais e/ou institucionais 69 . Nessa interpretação, a<br />

crise teria acontecido concomitante ao Concílio, mas não como efeito das renovações conciliares,<br />

como também atestou Dom Lélis Lara, redentorista e bispo emérito da Diocese de<br />

Itabira-MG:<br />

qualquer mudança profunda gera crise, mas a gente deve dizer que a crise<br />

não foi provocada pelo Concílio, a crise aconteceu junto com o concílio.<br />

O concílio veio estabelecer uma nova caminhada para a Igreja, abrir as<br />

janelas e as portas da Igreja, escancará-la para o mundo. Não é que o<br />

concílio tenha provocado isso. Interpretaram mal o Concílio Vaticano II,<br />

em muitas coisas. A crise foi um fenômeno daquele período. As pessoas<br />

não estavam preparadas para viver nesse novo tempo 70 .<br />

De fato, é pertinente dizer que a crise não foi provocada pelo Vaticano II, mas não<br />

podemos isentá-lo totalmente. Esse fenômeno que atingiu o catolicismo pós-conciliar tem<br />

raízes em problemas próprios da dimensão secular da sociedade novecentista dos quais o<br />

clero não estava imune, e “quando a Igreja abandonou a era tridentina e se lançou de cabeça<br />

na modernidade, o clero e os seminários foram arrastados para um turbilhão” 71 , ficando<br />

mais vulneráveis aos conflitos sociais e existenciais daquele contexto. Além disso, as transformações<br />

conciliares também promoveram uma “mudança profunda de perspectivas no<br />

ministério presbiteral”, o que gerou um “período de alteração da imagem e do papel dos<br />

presbíteros, com conseqüentes reflexos de incerteza para as pessoas, especialmente os próprios<br />

padres e os seminaristas” 72 . Para Augustin Wernet, muitos alimentaram a esperança<br />

de que o aggiornamento apresentasse “soluções efetivas para todos os problemas religio-<br />

68 Ibidem, p 341.<br />

69 Ibidem, p 326.<br />

70 LARA, Dom Lelis. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Coronel Fabriciano-MG, 16 de<br />

dezembro de 2009. Arquivo Digital (38 min.).<br />

71 SERBIN, 2008, p. 156.<br />

72 CNBB. Diretrizes Gerais da Ação Pastoral da Igreja: 1975-1978. p. 05. Disponível em , acessado em 17 de junho 2009.<br />

66


sos, eclesiais e pastorais do mundo moderno” 73 . Esperava-se um ‘milagre’ que não aconteceu:<br />

com o tempo, decepções cederam lugar às expectativas e certo desespero<br />

seguiu-se às esperanças; decepção e insegurança daqueles que se apegavam<br />

demasiadamente às tradições; decepção e frustração daqueles que<br />

apostavam demais nas inovações; desespero dos que esperavam o ‘milagre’<br />

74<br />

As ordens e congregações religiosas foram as mais atingidas pela crise. Redentoristas,<br />

franciscanos, salesianos, carmelitas, todos eles, em alguma medida, foram afetados.<br />

Para a Companhia de Jesus, por exemplo, os efeitos ganharam tamanha proporção a ponto<br />

de haver uma intervenção direta do papado de João Paulo II, em 1981, através do “comissariamento”<br />

da Companhia, isto é, a nomeação de um “delegado pontifício” com autoridade<br />

máxima para conduzir o processo de reorganização desse instituto, promovendo mudanças<br />

na cúpula administrativa e substituição de vários provinciais. Somente em 1983 os jesuítas<br />

puderam reunir uma nova “congregação geral” e eleger um novo Governo Geral 75 .<br />

Na Província Redentorista do Rio de Janeiro a redução no número de confrades foi<br />

significativa. Em 1960 eles contavam com um contingente de 162 membros entre padres e<br />

irmãos 76 , dez anos mais tarde já estavam reduzidos a 92 77 . Todavia, a crise de vocações e o<br />

abandono do sacerdócio não são os únicos fatores que explicam essa drástica diminuição.<br />

É importante lembrar que essa Província é de proveniência holandesa, e um dos efeitos<br />

práticos dessa descendência é que, no início da década de sessenta, a maioria dos padres e<br />

irmãos eram oriundos da Holanda. Nos anos de 1967-68, nada menos que 28 confrades<br />

holandeses deixaram a Província, uns regressaram aos Países Baixos, outros migraram para<br />

a Vice-Província do Recife 78 .<br />

73<br />

WERNET, 1997, p. 40.<br />

74<br />

Idem.<br />

75<br />

MARTINA, 1997, p. 341-342.<br />

76<br />

LEITE, 2003, p. 96.<br />

77<br />

WERNET, 1997, p. 51.<br />

78<br />

Documento intitulado “Resposta dos Missionários a uma Questão de Roma”, p. 01. APRJ. Fundo 01, D.<br />

Missões, cx 03. As fundações das casas redentoristas no nordeste do Brasil tiveram início em 1947 pelos<br />

esforços dos missionários holandeses da então Vice-Província do Rio do Janeiro. Com a elevação da “Vice<br />

do Rio” à categoria de Província, em 1951, as missões holandesas do nordeste também foram elevadas a<br />

condição de Vice-Província do Recife, ficando diretamente ligadas à Província materna da Holanda. Cf.<br />

WERNET, 1996.<br />

67


O padre João Boaventura Leite classificou o fato da maioria dos confrades serem<br />

holandeses como “um ponto fraco” da Província no início dos anos sessenta 79 . Um reflexo,<br />

sem dúvida, do posicionamento dos primeiros missionários que, resistentes quanto às vocações<br />

nativas, demoraram aceitar o ingresso de jovens brasileiros em seus quadros. Numa<br />

carta datada em 16 de agosto de 1904, o padre provincial da Holanda, Jacobus C. Meeuwissen<br />

foi enfático ao afirmar que:<br />

Não estamos a favor de um noviciado para brasileiros; nem para aceitálos;<br />

não devemos deixar estes elementos diferentes entrar em nossas comunidades;<br />

eles têm um caráter diferente e não nos acompanhariam em<br />

nosso trabalho. Caso um sacerdote quisesse entrar, não seria melhor encaminhá-lo<br />

à Província da Espanha que tem uma fundação em Portugal? 80<br />

Os holandeses criaram a primeira casa de formação no Brasil somente em 1923.<br />

Antes disso, os poucos brasileiros que passaram pela aprovação daqueles missionários eram<br />

enviados à Província Redentorista de São Paulo para iniciarem seus estudos. O resultado<br />

desse investimento tardio em vocações brasileiras é percebido em números: em 1935,<br />

dos 87 membros (56 padres, 28 irmãos e 3 estudantes professos) apenas cinco eram nativos;<br />

em 1946 havia 29 brasileiros entre os 65 padres, 30 irmãos e 16 seminaristas; em<br />

1955, quando a Vice-Província já tinha sido elevada à condição de Província e iniciado seu<br />

processo de abrasileiramento, esses redentoristas contavam com um contingente de 147<br />

membros, sendo 27 estudantes professos, 47 padres e 6 irmãos brasileiros; em 1958, sem<br />

contabilizar os que ainda estavam em fase de estudos, dos 93 padres e 38 irmãos mais da<br />

metade eram holandeses 81 .<br />

Essa constatada dependência de vocações holandesas é, de fato, um dos sintomas da<br />

“grande crise”. Depois de efetivada a ereção da Província do Rio de Janeiro, em 1951, a<br />

matriz da Holanda ficou desobrigada do envio de novos missionários, iniciando-se o processo<br />

de abrasileiramento e, gradativamente, a transferência dos cargos administrativos aos<br />

confrades nativos. O reduzido número de membros brasileiros foi determinante para que a<br />

autonomia provincial demorasse mais de meio século para acontecer 82 . Em 1946, um ano<br />

79 LEITE, op cit., p. 96.<br />

80 Carta do Provincial holandês Pe Jacobus C. Meeuwissen. Apud PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO.<br />

Memória Viva do Redentor – Flashes. Juiz de Fora, 1993, p. 23.<br />

81 Esses números foram extraídos de: LEITE, 2003, p. 59, 79, 94 e 96.<br />

82 Entre a fundação da missão holandesa no Brasil e sua elevação à condição de Vice-Província passaram-se<br />

dez anos (1893-1903), mas sua efetivação como Província autônoma só aconteceu em 1951, ou seja, 58 anos<br />

depois da chegada dos primeiros missionários.<br />

68


antes de assumir o vice-provincialato, o padre Lucas Veeger escreveu ao Superior Geral da<br />

Holanda manifestando sua opinião sobre a criação da Província: “não estou de acordo”,<br />

disse ele, “assim não receberemos mais padres da Holanda e isso será por enquanto necessário”.<br />

Além disso, esse redentorista apontou outro problema: “não teremos brasileiros<br />

capazes de serem superiores” 83 . Ao que parece, a desconfiança quanto às vocações nativas<br />

não tinha sido plenamente superada!<br />

Todavia, as décadas de 1940-50 representaram um período de grande expansão do<br />

apostolado redentorista holandês no Brasil, com um aumento no número de confrades e a<br />

criação de novas fundações; uma vitalidade que contribuiu para a criação de uma Província<br />

autônoma. Em 1947 aconteceu a fundação da casa de Garanhus no estado de Pernambuco,<br />

intensificando os trabalhos desses missionários no nordeste brasileiro, onde já atuavam no<br />

Estado da Bahia. Em Minas Gerais foram fundados mais quatro conventos: em Coronel<br />

Fabriciano, no Vale do Aço Mineiro (1948); em Três Corações (1952), Santa Rita do Sapucaí<br />

(1956) e Três Pontas (1960) no Sul de Minas. Em 1958 foi inaugurada a Casa de<br />

Retiros São José, em Belo Horizonte, que estava em construção desde 1951 84 .<br />

No ano de 1955 foi dado um “passo ousado” segundo o Pe. João Boaventura Leite<br />

85 ; a Província do Rio assumiu oficialmente a Vice-Província de Lima no Peru. Um novo<br />

encargo que significou, além dos trabalhos administrativos, o envio de missionários àquele<br />

país e a aceitação de seminaristas peruanos nas casas de formação no Brasil, que também<br />

passavam por um processo de ascensão. Em 1945 aconteceu a ereção canônica do Estudantado<br />

de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro na cidade de Juiz de Fora-MG, popularmente<br />

conhecido como Seminário da Floresta. Posteriormente, foram criados três Junioratos: um<br />

em Congonhas do Campo-MG (1952) – onde já funcionava o Juvenato de São Clemente<br />

desde 1923 – que levou o nome do fundador Santo Afonso; outro em Três Corações-MG<br />

(1953) devotado à Santa Terezinha; e o terceiro, o São José, em Santa Rita do Sapucaí-<br />

MG, que funcionou de 1956 a 1961, quando foi supresso temporariamente para ser reativado<br />

no ano de 1964 em novas instalações na cidade de Três Pontas-MG. O Noviciado,<br />

que antes funcionava em Juiz de Fora, foi transferido, em 1961, para outra recente fundação<br />

em Correia de Almeida, município de Barbacena-MG.<br />

83<br />

Carta do padre Lucas Veeger ao Provincial da Holanda, datada de 19 de maio de 1946. Apud LEITE, 2003,<br />

p. 75.<br />

84<br />

PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Relato das Crônicas do Início das Casas Redentoristas, mesmo<br />

daquelas que já foram supressas. Juiz de Fora, s/d (texto de circulação interna).<br />

85<br />

LEITE, 2003. p. 94-96.<br />

69


Todo esse processo de expansão entrou em retrocesso durante a crise dos anos sessenta,<br />

concomitante ao chamado abrasileiramento da Província. Foram necessários dez<br />

anos depois da Ereção Canônica para que o Governo Provincial fosse transferido definitivamente<br />

para os redentoristas brasileiros. Em 1961 o então padre José Gonçalves da Costa<br />

assumiu o provincialato, que por coincidência seria a administração mais curta da história<br />

da (Vice) Província, durando apenas seis meses 86 . Seu sucessor, o padre Luciano Jacques<br />

Penido, foi nomeado em 1962, sendo o primeiro provincial a enfrentar as conseqüências da<br />

grande crise. Em 20 de novembro 1967, durante o Capítulo Geral da Congregação em Roma,<br />

o padre Penido renunciou, deixando vacante o mais alto cargo da Província Redentorista<br />

do Rio de Janeiro até janeiro de 1968, quando o padre Alberto Ferreira Lima foi nomeado<br />

pelo Superior Geral da Congregação para exercer interinamente o provincialato até<br />

que se procedesse uma eleição direta pelos confrades. “Destarte o Pe Lima se tornou o último<br />

Provincial nomeado por Roma e o primeiro a ser eleito pela própria Província” 87 .<br />

Coube aos brasileiros administrarem a Província durante aqueles turbulentos anos<br />

maculados pela crise de vocações, pela saída da maioria dos holandeses, pelo enfraquecimento<br />

das atividades missionárias, pela supressão de quase todas as recentes fundações.<br />

Em Congonhas do Campo, o Juvenato de São Clemente e o Juniorato de Santo Afonso<br />

cessaram suas atividades em 1964, mas a presença dos redentoristas nessa cidade perdurou<br />

até 1975 quando devolveram à Arquidiocese de Mariana a administração da paróquia local<br />

e do Santuário do Senhor Bom Jesus. Em 1965 foi a vez do Noviciado de Correia de Almeida<br />

fechar suas portas; três anos depois, sob os reflexos financeiros da crise, a Província<br />

vendeu suas instalações – abaixo do valor venal do imóvel, segundo consta 88 – findando em<br />

definitivo a presença daqueles confrades em Barbacena. Os Junioratos de Santa Terezinha<br />

em Três Corações e São José em Três Pontas fecharam simultaneamente em 1968, e o Seminário<br />

Maior da Floresta, onde aconteciam os cursos de Filosofia e Teologia, foi se exte-<br />

86 O motivo de um provincialato tão curto não tem nenhuma relação com a “falta de capacidade” dos brasileiros<br />

insinuada anos antes pelo Padre Lucas Veeger. Muito pelo contrário. José Gonçalves da Costa gozava de<br />

um grande prestígio entre os redentoristas, foi o primeiro brasileiro a se ordenar no Seminário de Congonhas,<br />

onde lecionou por três anos (1939-42), e pioneiro, entre os nativos, a assumir um cargo de reitor na então<br />

Vice-Província do Rio (1948 foi nomeado reitor da casa de Coronel Fabriciano, e em 1958 assumiu a reitoria<br />

na casa do Rio de Janeiro); também chegou a ser Superior das Missões, Ecônomo Provincial, construtor e<br />

diretor da Casa de Retiro São José em Belo Horizonte. Sua saída repentina do cargo de Provincial deve-se ao<br />

fato de ter sido, em junho de 1962, nomeado bispo auxiliar do cardeal do Rio de Janeiro, Dom Jaime de Barros<br />

Câmara. Dois anos depois, Dom Gonçalves tornar-se-ia Secretário Geral da CNBB.<br />

87 Cf. PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Memória Viva do Redentor – Flashes. 1993, p. 07.<br />

88 WERNET, 1997, p. 12.<br />

70


nuando até ser transformado, no início dos anos setenta, em uma casa de encontros e retiros<br />

89 .<br />

O fechamento de todos os seus seminários reflete a intensidade da crise na Província<br />

do Rio de Janeiro. O tradicional modelo de formação – no qual os seminaristas faziam<br />

todos os estudos num regime de “confinamento” – foi substituído, gradativamente, por um<br />

novo método baseado nas Comunidades Vocacionais (CV’s) 90 ; Mas, entre o falecimento<br />

do antigo modelo e a efetivação do novo sistema de formação instaurou-se uma lacuna de<br />

mais de quinze anos sem ordenações. O lugar das tradicionais Santas Missões Populares na<br />

Igreja do Vaticano II ainda era uma incógnita, e a figura do missionário redentorista estava<br />

em xeque:<br />

Sem uma ideia clara e uma imagem nítida e bem definida do ideal do religioso<br />

redentorista e de suas tarefas primordiais e específicas, nenhuma<br />

promoção vocacional pode ter êxito, tornando-se secundária a questão se<br />

os seminários tradicionais seriam mais ou menos apropriados do que as<br />

pequenas comunidades vocacionais. A ausência de indicação precisa do<br />

lugar e da função do missionário redentorista numa Igreja em mudança<br />

pesou muito na desorientação global dos religiosos 91 .<br />

A pastoral missionária é a principal atividade desses confrades, é a razão da existência<br />

da Congregação, é o carisma herdado do fundador Afonso de Ligório. Quando as<br />

missões populares entram em crise, a tradicional identidade do missionário também se torna<br />

alvo de questionamentos, o que gera desorientação no apostolado redentorista e intensifica<br />

a crise de vocações. No final dos anos sessenta a Província do Rio de Janeiro convivia<br />

com essa dura realidade: de um lado a incerteza quanto ao futuro das ordenações, do outro<br />

89 Cf. PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Relato das Crônicas do Início das Casas Redentoristas, mesmo<br />

daquelas que já foram supressas. Juiz de Fora, s/d (texto de circulação interna).<br />

90 As Comunidades Vocacionais (CV’s) compõe o principal pilar de sustentação do novo processo de formação<br />

da Província do Rio de Janeiro. Nelas os jovens seminaristas vivenciam o processo de formação religiosa<br />

redentorista, e realizam seus estudos em escolas laicas e/ou institutos educacionais confessionais. Na primeira<br />

fase dos estudos, até completarem o ensino médio, os jovens integram a Comunidade Vocacional de Santo<br />

Afonso. Na segunda, quando ingressam nos estudos de filosofia, passam a compor a CV São Clemente e<br />

vivenciar um processo de amadurecimento pessoal e afetivo. Depois de concluir a filosofia, o seminarista faz<br />

uma pausa nos estudos para um período chamado de Síntese Pessoal de Experiências Substantivas, uma espécie<br />

de ‘estágio’ para o apostolado missionário. O período do Noviciado é atualmente realizado juntamente<br />

com os vocacionados da Província de São Paulo no Seminário de Santa Terezinha em Tietê. Por último, os<br />

jovens noviços, após professarem os votos temporários de pobreza, castidade e obediência, ingressam em um<br />

curso de teologia e passam a integrar a CV Dom Muniz para concluir a preparação para a ordenação sacerdotal.<br />

Cf. Ratio Formationis da Província Redentorista do Rio de Janeiro.<br />

91 WERNET, 1997, p. 53.<br />

71


a defecção de muitos religiosos 92 ; aos que permaneceram ficou o desafio de reestruturar<br />

uma Província em crise e manter vivo o carisma missionário dos redentoristas. Reacendiase,<br />

por isso, o antigo debate sobre os trabalhos que não estivessem diretamente ligados à<br />

pastoral missionária.<br />

Santo Afonso fundou um instituto para se dedicar exclusivamente ao apostolado<br />

missionário: “para que não haja desvio do ministério das missões, ele proíbe qualquer trabalho<br />

fora da Congregação” 93 . Com base nessa orientação do fundador, o provincialato<br />

holandês definiu expressamente que os redentoristas que vieram para o Brasil no final do<br />

século XIX cuidassem apenas da pregação das missões populares 94 ; a administração de<br />

paróquias e santuários foi inicialmente rejeitada, mas gradativamente aceita pelos holandeses.<br />

Nos anos sessenta a Província do Rio chegou a ter dez paróquias e dois santuários sob<br />

sua responsabilidade, mas com a supressão de alguns conventos restaram ao encargo daqueles<br />

confrades um santuário e seis paróquias 95 . Garantir a manutenção dessas instalações<br />

sem comprometer o trabalho missionário tornou-se um ponto de grande discussão diante<br />

do reduzido número de confrades.<br />

Em 1968, a Província recebeu um questionário do Governo Geral em Roma com<br />

indagações sobre “os exercícios da missão popular”. A resposta 96 foi objetiva, sem rodeios:<br />

“não constituem nossa atividade principal, estamos longe disso, pois, dos 89 membros de<br />

nossa Província apenas sete trabalharam, nesse ano de 1968, no setor das Missões”. Uma<br />

“grande diminuição” da obra missionária é destacada com pesar pelos confrades, e a “principal<br />

causa” apontada por eles é o excesso de trabalhos paroquiais: “nossas paróquias absorvem<br />

praticamente a metade do pessoal da província. Aceitaram-se demais paróquias no<br />

passado”. Nesse mesmo documento, os redentoristas também relataram a saída de muitos<br />

92<br />

Além do já mencionado caso específico dos holandeses, a Província do Rio também perdeu muitos religiosos<br />

que abandonaram o sacerdócio ou passaram para o clero secular. Em 1967 a Província contava com um<br />

contingente de 108 padres e 48 irmãos, em 1972 esse número estava reduzido a 70 padres e 22 irmãos.<br />

WERNET, 1996, p. 51.<br />

93<br />

REY-MERMET, 1984, p. 519.<br />

94<br />

Ver capitulo I dessa dissertação.<br />

95<br />

As paróquias ligadas aos conventos supressos foram devolvidas às suas respectivas dioceses. Os conventos<br />

que sobreviveram à crise continuaram responsáveis pelas Igrejas a eles vinculadas, que correspondem às<br />

paróquias: da Glória, ligada à primeira fundação redentorista em Juiz de Fora-MG; Nossa Senhora do Perpétuo<br />

Socorro, fundada em 1969 próxima ao desativado Seminário da Floresta, também em Juiz de Fora; paróquia<br />

São José em Belo Horizonte; Santo Afonso de Ligório no Rio de Janeiro; São Sebastião em Coronel<br />

Fabriciano-MG; paróquia de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro em Campos-RJ – cuja Igreja foi elevada à<br />

Santuário em 1996; além do Santuário de São Geraldo em Curvelo-MG, que recebeu o título de Basílica em<br />

1966 pelo então Papa Paulo VI. Ver figura 02, p. 74.<br />

96<br />

Documento intitulado “Resposta dos Missionários a um Questionário de Roma”, p. 01. APRJ. Fundo 01,<br />

D. Missões, cx 03.<br />

72


eligiosos e as incertezas quanto a novas vocações, atestando a turbulência da crise que<br />

atravessavam: “a Província entrou mesmo em colapso!” (o grifo é do original). Em vários<br />

pontos dessa “resposta ao questionário de Roma” é enfatizada a necessidade de “redefinirem<br />

com urgência” os seus objetivos e retomarem a “pregação missionária aos pobres”<br />

conforme os “fins específicos e carismáticos da Congregação”. Nas palavras finais foram<br />

enfáticos:<br />

Somos porém de opinião que devemos reduzir ao menor número possível<br />

nossas paróquias e dar-lhes uma pastoral missionária como já estão tentando<br />

os confrades que trabalham em nossas paróquias. Voltemos nossos<br />

objetivos para a finalidade específica e carismática da Congregação e salvaremos<br />

a Província pela PREGAÇÃO DA PLAVRA DE DEUS AOS<br />

POBRES 97<br />

A superação da crise, na opinião de muitos daqueles redentoristas, passaria necessariamente<br />

por uma renovação das missões populares que salvaguardasse o carisma da Congregação<br />

e, ao mesmo tempo, introduzisse a Província do Rio de Janeiro na linha da pastoral<br />

de conjunto definida pela Igreja Católica no Brasil. Uma renovação que aconteceu, como<br />

veremos no próximo capítulo, mas não sem divergências e conflitos, pois mudar tradições<br />

não é um processo fácil.<br />

97 Ibidem. Grifos do original.<br />

73


MG<br />

Belo Horizonte<br />

8<br />

13<br />

14<br />

12<br />

4<br />

2<br />

9<br />

15<br />

3<br />

1<br />

6<br />

7<br />

RJ<br />

Rio de Janeiro<br />

BA<br />

5<br />

PE<br />

10<br />

Salvador<br />

11<br />

Recife<br />

1<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

Fundações da Província do<br />

Rio de Janeiro, Minas Gerais<br />

e Espírito Santo<br />

Juiz de Fora - MG<br />

1894 – Primeira fundação da missão holandesa: convento e Paróquia da Gloria.<br />

1945 – Ereção canônica do Estudantado de Nossa Senhora Perpétuo Socorro, conhecido<br />

como Seminário da Floresta<br />

1969 – Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no bairro da Floresta.<br />

* O Seminário da Floresta teve suas atividades supressas na década de 1970,<br />

tornando-se uma casa de encontros.<br />

Belo Horizonte - MG<br />

1900 – Convento e Paróquia São José<br />

1958 – Inauguração da Casa de Retiros São José, que estava em construção desde 1951.<br />

Rio de Janeiro - RJ<br />

1903 – Fundação do primeiro convento fora de Minas Gerais.<br />

1907 – Inauguração da Igreja e paróquia de Santo Afonso de Ligório.<br />

Curvelo - MG<br />

1906 – Fundação do centro missionário e convento<br />

1912 – Início da construção do Santuário de São Geraldo<br />

1966 – O Santuário recebe do título de Basílica de São Geraldo<br />

Campos dos Goytacazes - RJ<br />

1923 – Fundação do centro missionário<br />

1950 – Fundação do convento<br />

1955 – Inauguração da Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.<br />

1996 – Elevação da Igreja à Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.<br />

Coronel Fabriciano - MG<br />

1948 – Fundação do convento e administração da Paróquia de São Sebastião.<br />

1968 – Direção da Rádio Educadora de Coronel Fabriciano<br />

Fundações supressas<br />

Teresópolis - RJ<br />

1921 – Fundação do centro missionário<br />

1923 – Supressão do centro missionário<br />

Campanha - MG<br />

1923 – Fundação do centro missionário<br />

1927 – Supressão do centro missionário<br />

Congonhas do Campo - MG<br />

1923 – Fundação do convento e Juvenato São Clemente. Administração da Paróquia Nossa<br />

Senhora da Conceição e do Santuário do Bom Jesus do Matosinhos.<br />

1952 – Fundação do Juniorato Santo Afonso<br />

1964 – Supressão do Juvenato e Juniorato.<br />

1975 – Supressão da fundação de Congonhas. Paróquia e Santuário devolvidos à Arquidiocese<br />

de Mariana.<br />

10Salvador<br />

- BA<br />

1933 – Fundação do convento e administração do Santuário do Senhor do Bonfim<br />

1950 – Supressão do convento e devolução do Santuário à Arquidiocese de Salvador<br />

11Garanhuns<br />

- PE<br />

1947 – Fundação do convento redentorista.<br />

1951 – Com a ereção canônica da Província do Rio de Janeiro, a fundação de Garanhuns foi<br />

transfira aos cuidados da então criada Vice-Província de Recife.<br />

12Três<br />

Corações - MG<br />

1952 – Fundação do convento e administração da Paróquia Sagrado Coração de Jesus.<br />

1953 – Fundação do Juniorato Santa Terezinha<br />

1968 – Supressão do convento e Juniorato. A paróquia foi devolvida aos cuidados da Diocese<br />

de Campanha.<br />

13Santa<br />

Rita do Sapucaí - MG<br />

1956 – Fundação do convento e Juniorato São José. Administração da Paróquia de Santa Rita.<br />

1961 – Supressão das atividades redentoristas: convento, Juniorato e paróquia.<br />

14Três<br />

Pontas - MG<br />

1960 – Fundação do convento e administração da Paróquia Nossa Senhora D'Ajuda.<br />

1964 – Fundação do Juniorato São José.<br />

1968 – Supressão das fundações redentoristas.<br />

15Barbacena<br />

- MG<br />

1961 – Fundação do Noviciado São Clemente em Correia de Almeida, distrito de Barbacena.<br />

1965 – Supressão do Noviciado<br />

1958 – Encerramento definitivo da fundação redentorista<br />

figura 02<br />

Fundações da Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo


Enviada por Cristo a manifestar e a comunicar<br />

a todos os homens e povos a caridade de Deus,<br />

a Igreja reconhece que tem de levar a cabo<br />

uma ingente obra missionária.<br />

decreto conciliar Ad Gentes


O<br />

CAPÍTULO III<br />

A Pastoral Missionária Redentorista:<br />

conflitos, divergências e renovação<br />

Concílio Vaticano II inaugurou um novo tempo na história do catolicismo. Uma<br />

leva de mudanças vivenciadas pela Igreja Católica nas décadas de sessenta e setenta<br />

se fundamentavam, em grande medida, nos textos conciliares; buscam neles suas inspirações<br />

teológicas, adaptando-os aos interesses institucionais e às realidades de cada Igreja<br />

particular. O Plano de Pastoral de Conjunto da CNBB, a Teologia da Libertação e o fenômeno<br />

das Comunidades Eclesiais de Base são exemplos, no Brasil, de “eventos singulares”<br />

desencadeados pelo aggiornamento do Vaticano II enquanto evento histórico.<br />

A Província Redentorista do Rio de Janeiro aderiu significativamente à pastoral de<br />

conjunto e, consequentemente, ao evento conciliar. A principal inovação é percebida em<br />

seu método de missão, remodelado, segundo os missionários, “aos moldes do Vaticano II e<br />

do PPC”. As Santas Missões, num primeiro momento, passaram a ser denominadas por<br />

Ação Missionária, com diferente metodologia de trabalho que introduziu novos temas à<br />

pauta das missões como, por exemplo, renovação paroquial e formação de comunidades de<br />

base. Num segundo momento, a Ação Missionária deu lugar às chamadas Missões Inseridas,<br />

isto é, uma nova modalidade missionária que se aproxima menos da pastoral extraordinária<br />

do que da ordinária.<br />

As mudanças no método missionário dos redentoristas foram condicionadas por fatores<br />

regidos pela universalidade do Concílio e seus desdobramentos, mas também por<br />

peculiaridades de uma Província em crise. Por isso se faz necessário, antes de analisar os<br />

novos métodos, dedicarmos à dinâmica interna desse instituto, situando-o dentro do evento<br />

Vaticano II e da Pastoral de Conjunto da Igreja Católica no Brasil.<br />

76


Conflitos e renovação<br />

A grande crise da década de 1960 representou, para a Província do Rio de Janeiro,<br />

um tempo de muitas incertezas. O fechamento de todos os seminários suscitou diversas<br />

dúvidas quanto ao futuro das vocações e a formação de novos missionários. A diminuição<br />

do número de confrades e a supressão de alguns conventos significaram uma considerável<br />

redução do escopo administrativo e pastoral da Província. A desarticulação das equipes<br />

missionárias, por sua vez, colocou em xeque a prosperidade das Santas Missões Populares,<br />

baluarte da identidade redentorista.<br />

Dos confrades que deixaram a Província – entre missionários, professores e administradores<br />

– Muitos eram destacadas lideranças e importantes referências desse instituto, o<br />

que fragilizou praticamente todas as frentes de trabalho. Para aqueles que permaneceram<br />

havia muitas perdas a se lamentar e muito “luto a ser guardado”. Um de nossos entrevistados<br />

assim descreveu o período de crise:<br />

[…] a tensão existe, e vai durar até a Missão reencontrar seu caminho, até<br />

as comunidades vocacionais e o estudo na Universidade comprovar sua<br />

eficácia. Percebe como é a crise? Ela vai assim até o pessoal chorar a destruição<br />

do seminário maior, chorar a perda de Congonhas, chorar a perda<br />

das Missões Populares; tinha muita coisa para perder, tinha que enterrar<br />

muita coisa, muito luto pra guardar 1 .<br />

Na memória dos que viveram os anos de crise ficaram lembranças de inevitáveis atritos<br />

e muitas desconfianças. Padre João Boaventura Leite relembra que “ficou áspera a<br />

vida, foram muitos conflitos, as assembléias e reuniões eram muito gritadas, muito tensas”<br />

2 . Na opinião de Padre Dalton, “enquanto existiu a crise tudo era atrito, tudo! o modo<br />

de viver em comum, a relação entre holandeses e brasileiros, entre os brasileiros mais velhos<br />

e os mais novos, do grupo de professores com o grupo de missionários; tudo era atrito”<br />

3 . As divergências também aparecem nos documentos do arquivo provincial: “existe a<br />

1<br />

ALMEIDA, Pe. Dalton Barros de. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Belo Horizonte-MG,<br />

07 de outubro de 2009. Arquivo Digital (58 min.).<br />

2<br />

LEITE, Pe. João Boaventura. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Juiz de Fora-MG, 23 de<br />

setembro de 2009. Arquivo Digital (69 min.).<br />

3<br />

ALMEIDA, Pe. Dalton Barros de. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Belo Horizonte-MG,<br />

07 de outubro de 2009. Arquivo Digital (58 min.).<br />

77


dificuldade do desconhecimento e da desconfiança por parte de alguns” 4 ; “há problemas<br />

pessoais, e alguns são sempre do contra!” 5 ; “quanto à vida de caridade, há muita mesquinharia<br />

e desigualdade no trato das pessoas, há uns que são ‘manjados’ porque há preconceitos<br />

contra eles” 6 .<br />

O “campo religioso” não é, definitivamente, um espaço harmônico. Ao contrário, é<br />

formado por enormes fontes de tensões: uma que opõe agentes especializados e a autoprodução<br />

dos leigos – em que haveria um “domínio prático” de um conjunto de esquemas<br />

de pensamento – e outra tensão derivada da oposição dos agentes especializados entre si –<br />

aqueles que seriam os detentores do domínio erudito de um corpus de normas e conhecimento<br />

explícitos – no atendimento das demandas dos leigos, o que evidencia as diferenças<br />

internas ao corpo eclesiástico 7 .<br />

Por ocasião do I Encontro dos Missionários da Província do Rio de Janeiro (1964),<br />

foi realizada uma consulta às equipes missionárias para definir a pauta do evento 8 . Entre os<br />

temas sugeridos, os de maiores ênfases foram: finalidade das missões, pastoral de conjunto,<br />

renovação do método missionário e relacionamento entre os confrades. Esse último<br />

considerado por uma das equipes como de “capital importância e do qual não se pode fugir<br />

de tratar” 9 . Uma das cartas enviadas ao padre organizador do evento - datilografada e assinada<br />

por uma equipe de missionários – contém muitas críticas ao comportamento de alguns<br />

confrades, deixando explícita as divergências que, sem nenhuma dúvida, os religiosos<br />

preferem tratar internamente. Ao final da carta encontra-se uma pequena nota, escrito à<br />

tinta de caneta, dizendo:<br />

toda semelhança com pessoas de nosso conhecimento, será simples acaso.<br />

Estas sugestões se destinam ao Senhor. Portanto, para evitar mal entendidos,<br />

pedimos prudência de sua parte. Use, aproveite algumas coisas que<br />

achar aproveitáveis, copie essas coisas e depois... rasgue... lixo! 10<br />

4<br />

APRJ. Ata da Reunião dos Missionários, 1970. Fundo 01, D missões, caixa 04.<br />

5<br />

APRJ. Ata da Reunião dos Missionários, 1969. Fundo 01, D missões, caixa 04.<br />

6<br />

APRJ. Sugestões do Missionários ao Capítulo Provincial, 1969. Fundo 01 D, Missões, cx 03.<br />

7<br />

BOURDIEU, 2005.<br />

8<br />

Localizamos cinco cartas intituladas “sugestões para o Encontro Missionário”, todas endereçadas ao Padre<br />

Virgílio Rosa Neto, o organizador do evento. APRJ. Fundo 01, D missões, caixa 03.<br />

9<br />

APRJ. Sugestão para o encontro dos missionários (equipe de três pontas), s/d. Fundo 01, D missões, caixa<br />

03.<br />

10<br />

APRJ. Sugestão para o encontro dos missionários, s/d. Fundo 01, D missões, caixa 03.<br />

78


As dissensões que se acirravam entre alguns redentoristas naqueles tempos de crise<br />

estão relacionadas, em grande medida, às divergências teológicas, ideológicas e políticas<br />

quanto ao posicionamento da Província do Rio de Janeiro diante das orientações conciliares<br />

e das novas diretrizes pastorais da Igreja Católica no Brasil. Entremeio à tradição a ser<br />

preservada e às inovações a serem assimiladas instaurou-se um espaço de embates onde<br />

estava em jogo o perfil da vida conventual, o processo de formação das novas vocações e,<br />

principalmente, o método missionário que seria adotado.<br />

Sob forte influência do Concílio Vaticano II, costumes e práticas religiosas, bem<br />

como toda uma vivência eclesiástica, entraram em processo de mudança, e os religiosos<br />

mais adeptos às inovações se dedicaram com “certa predisposição” a esse processo 11 . Por<br />

outro lado, aqueles mais tradicionalistas, geralmente receosos ou mesmo resistentes, “entendiam<br />

talvez intelectualmente as propostas inovadoras, mas tinham dificuldades de assimilá-las<br />

inteira e existencialmente” 12 . Alterar hábitos e costumes centenários é um processo<br />

árduo, ainda mais quando questões consideradas por muito tempo imutáveis e inabaláveis<br />

começam a se transformar: a rigidez da vida conventual tornou-se mais flexível; o uso<br />

indispensável da batina foi, aos poucos, substituído pelo clergyman e trajes civis; os instrumentos<br />

e práticas de penitência e mortificação caíram em desuso; até mesmo a introdução<br />

de ‘música profana’ no repertório do coral e conjunto instrumental do Seminário da<br />

Floresta teria causado “estranheza a certos segmentos da Província” 13 . Segundo Dom Lélis<br />

Lara:<br />

as gerações de religiosos e eclesiásticos anteriores ao segundo Concílio<br />

Vaticano não receberam formação adequada aos novos tempos. Muitas<br />

vezes essa formação era condicionada pelas estruturas da vida clerical e<br />

religiosa. Essas estruturas ruíram. Acresce que o que era estático se abalou,<br />

muitos valores considerados absolutos se relativizaram e, então, numerosos<br />

sacerdotes e religiosas não tiveram condições ou oportunidade<br />

de passar por uma reciclagem que os adequasse às novas modalidades de<br />

vida eclesial e religiosa 14 .<br />

O turbilhão de mudanças proporcionadas pelo aggiornamento da Igreja, somado às<br />

baixas conseqüentes da crise vivida pela Província, desenharam um cenário de inevitáveis<br />

conflitos entre os confrades ‘remanescentes’, e não apenas de ordem relacional, mas tam-<br />

11<br />

WERNET, 1997, p. 225.<br />

12<br />

Ibidem.<br />

13<br />

PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Intercâmbio. nº 112, ano XXXIV, 1995, p. 35.<br />

14 Ibidem, p. 36.<br />

79


ém pessoal, ocupacional e, porque não dizer, existencial: se os seminários fecham as portas,<br />

o que restou àqueles dedicados quase exclusivamente à formação? Se os brasileiros<br />

assumem a administração da Província, como ficam os holandeses que por gerações estiveram<br />

no controle? E o que dizer dos missionários que presenciaram o declínio das Santas<br />

Missões Populares e o seu descrédito no próprio meio eclesiástico? E quanto aos reitores e<br />

párocos das casas supressas?<br />

No contexto pós-conciliar, com todos os seus conflitos e incertezas, desencadeou-se<br />

um longo processo de revisão do caminho percorrido, readaptação ao novo ambiente provincial<br />

e reorientação das diretrizes pastorais. Em muitos momentos os redentoristas da<br />

Província do Rio se reuniram para avaliações, reciclagens e planejamentos. Em 1968 aconteceu<br />

a Primeira Assembléia da Província do Rio de Janeiro, na casa de Retiros São José,<br />

em Belo Horizonte-MG, com o tema: “Estrutura e Organização da Província”, as noções<br />

de atualização e modificação das estruturas, a essa altura, já eram predominante entre os<br />

confrades 15 . A atualização teológica e renovação do sistema missionário foram temas muito<br />

debatidos no I Encontro dos Missionários Redentoristas da Província do Rio de Janeiro<br />

em 1964 16 e na sua segunda edição em fevereiro de 1965. Mas o evento de maior proporção<br />

nos tempos de crise foi o I Capítulo Provincial (1968-1970).<br />

Segundo a Cúria Romana, “o papel mais importante na adaptação e renovação da<br />

vida religiosa pertence aos próprios institutos, que devem desempenhá-lo especialmente<br />

através dos Capítulos Gerais” 17 , que são assembléias representativas, de autoridade suprema<br />

e extraordinária, realizadas pelas ordens e congregações da Igreja Católica para deliberarem<br />

sobre questões internas e específicas de cada instituto. Em 1966, através da Carta<br />

Apostólica Eclesiae Sanctae, o Papa Paulo VI determinou que os institutos de vida religiosa<br />

organizassem um Capítulo Geral Especial para se atualizarem face às orientações conciliares<br />

do Vaticano II. Para tal feito, as ordens e congregações deveriam realizar uma ampla<br />

consulta aos seus congregados, principalmente por meio de Capítulos (vice) Provinciais: “a<br />

cooperação de todos os membros é necessária para renovar a vida religiosa em si, para pre-<br />

15 PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Memória Viva do Redentor – Flashes. Juiz de Fora, 1993. p. 15.<br />

16 O I Encontro dos Missionários Redentoristas da Província do Rio de Janeiro, em 1964, foi um espaço de<br />

estudos sobre as missões redentoristas e a já preconizada necessidade de renovação do método missionário.<br />

Seu principal organizador foi o padre Virgílio Rosa Netto, que teve atuação de grande destaque na Província<br />

do Rio, na CRB e na CNBB.<br />

17 PAULO VI. Motu Proprio Eclesiae Sanctae, 1966. Disponível em: < http://www.vatican.va/holy_father/<br />

paul_vi/motu_proprio/documents> acessado em julho de 2010.<br />

80


parar o espírito dos Capítulos, para realizar as obras dos Capítulos, observar fielmente a lei<br />

e as normas aprovadas pelos Capítulos” 18 .<br />

No caso da Província do Rio de Janeiro, o I Capítulo Provincial não se estruturou<br />

diretamente em função do Capítulo Geral Especial da Congregação do Santíssimo Redentor,<br />

mas adotou temáticas específicas à realidade vivida por aqueles redentoristas no período<br />

pós-conciliar, tornando-se um espaço de debate, avaliação e planejamento. As três primeiras<br />

sessões aconteceram em outubro de 1968, janeiro e agosto de 1969. Posteriormente,<br />

o conjunto dessas três sessões recebeu o nome de Capítulo Experimental, e um ‘novo’ I<br />

Capítulo Provincial aconteceu em 1970, novamente em três sessões: fevereiro, maio e setembro<br />

19 . Entre os temas debatidos destacam-se: vida comunitária e apostólica, promoção<br />

vocacional, formação sacerdotal e projeto missionário. Nessa ocasião, definiu-se a implantação<br />

das Comunidades Vocacionais como alternativa para substituir o derrocado modelo<br />

de seminário-internato, e reforçou-se a tendência cada vez mais crescente na Província em<br />

aderir às diretrizes do Plano de Pastoral de Conjunto (PPC) e, consequentemente, ao modelo<br />

de catolicismo pautado nas comunidades de base.<br />

Apesar de Augustin Wernet afirmar que a Província do Rio de Janeiro “fez um esforço<br />

significativo para por em prática as diretrizes do PPC e inovar a pregação das Santas<br />

Missões dentro do novo esquema pastoral” 20 , é importante ressaltar que tal ‘esforço’ não<br />

foi unanimidade entre os confrades, e sua hegemonia só foi alcançada na década de 1970<br />

depois de muitos conflitos e debates. Isso quer dizer que as inovações teológicas e metodológicas<br />

assumidas por essa Província nos anos pós-conciliares devem ser analisadas com<br />

base na premissa teórica defendida por Scott Mainwaring de que “a mudança dentro da<br />

instituição resulta do conflito entre grupos com diferentes concepções de fé” 21 . Tais conflitos<br />

foram eminentes entre aqueles redentoristas – pelo menos na segunda metade da década<br />

de 1960 – e as decisões penderam para a adesão às linhas pastorais do PPC e a renovação<br />

do método missionário.<br />

18 PAULO VI. Motu Proprio Eclesiae Sanctae, 1966. Disponível em: < http://www.vatican.va/holy_father/<br />

paul_vi/motu_proprio/documents> acessado em julho de 2010.<br />

19 “O que tivemos até o ano passado em matéria de Capítulo Provincial ficou sendo conhecido com o nome<br />

de ‘Capítulo Experimental’. Agora, sim, no triênio que começa teremos o ‘Primeiro Capítulo Provincial’”<br />

PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Intercâmbio. nº 2, ano X, 1970.<br />

20 WERNET, 1977, 316.<br />

21 MAINWARING, 1989, 21.<br />

81


A Província do Rio e a pastoral de conjunto<br />

O Plano de Pastoral de Emergência (1962) e o Plano de Pastoral de Conjunto<br />

(1965) representam, no caso brasileiro, dois importantes elementos de um mesmo evento: o<br />

aggiornamento da Igreja Católica. À Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) –<br />

entidade máxima da hierarquia católica brasileira – coube a responsabilidade de coordenar<br />

a elaboração e execução de ambos os planos; uma tarefa que envolveu vários agentes entre<br />

bispos e padres, religiosos e leigos, teólogos e pastoralistas. A Conferência dos Religiosos<br />

do Brasil (CRB), por sua vez, também desempenhou um papel de grande importância em<br />

todos os estágios dessa renovação pastoral.<br />

Criada em 1954 durante o I Congresso dos Religiosos do Brasil, a CRB logo assumiu<br />

uma dupla função: constituiu-se como um “fator de dinamização e articulação das<br />

numerosas ordens e congregações religiosas presentes e atuantes no país”, e exerceu a função<br />

de “interlocutora dos religiosos, seja com a CNBB, seja com outras instâncias da Igreja<br />

no âmbito nacional e internacional” 22 . O entrosamento entre essas duas Conferências foi<br />

primordial para o planejamento pastoral da década de 1960 23 , e os redentoristas do Brasil,<br />

especialmente a Província do Rio de Janeiro, tiveram uma destacada participação na formação<br />

da CRB, na parceria com a CNBB e na implementação dos Planos de Emergência e<br />

de Conjunto.<br />

Em 1964, o redentorista Dom José Gonçalves foi escolhido sucessor de Helder<br />

Câmara como Secretário Geral da CNBB. Congregado da Província do Rio 24 , D. José teria<br />

sido eleito “pelo grupo mais conservador dos bispos, com a missão expressa de tirar da<br />

Conferência todo o pessoal ligado a D. Helder” 25 que era considerado por muitos como um<br />

“bispo de esquerda” e um perigo eminente às pretensões dos militares que acabara de instaurar<br />

um governo ditatorial no Brasil – que, diga-se de passagem, foi avalizado pela maio-<br />

22<br />

FREITAS, 1997, p. 75<br />

23<br />

Dom Helder Câmara, primeiro Secretário Geral da CNBB (1952-1964), destacou a parceria com a CRB e<br />

sua importância na implementação do novo plano de pastoral: “posso afirmar que há da parte da CNBB atitude<br />

de inteira confiança na CRB e dela precisamos para executar nosso Plano de Emergência. É bom pensar<br />

que estamos caminhando na via da caridade. As duas Conferências estão maduras para este entrosamento de<br />

forças” CÂMARA, 1965, p. 531.<br />

24<br />

Dom José Gonçalves foi um redentorista de grande prestígio na Província do Rio de Janeiro. Ver nota 85<br />

do capítulo II.<br />

25<br />

BARROS, Raimundo Caramuru de. Entrevista concedida a Maria Carmelita de Freitas. Brasília, abril de<br />

1992. In.: FREITAS, 1997, p. 423.<br />

82


ia do episcopado brasileiro, pelo menos nos primeiros anos. Todavia, segundo Raimundo<br />

Caramuru de Barros 26 , “D. José era um homem honesto, muito correto, com quem se podia<br />

realmente conversar”, ele demonstrou ser aberto ao diálogo e, por isso, não impediu que o<br />

PPC fosse assumido pela Igreja Católica brasileira 27 .<br />

Não obstante à presença de D. José Gonçalves na secretaria geral da CNBB, outro<br />

grande redentorista da Província do Rio, o padre Tiago Gerardus Cloin, já havia se destacado<br />

como uma importante liderança da CRB. Antes mesmo da fundação oficial da Conferência<br />

dos Religiosos, já se arquitetava nos bastidores a criação de um Departamento de<br />

Missões Populares 28 que pudesse articular os trabalhos missionários praticados pelas ordens<br />

e congregações. O então provincial do Rio de Janeiro, padre Gregório Wuts, esteve<br />

diretamente inserido nesse processo, estabelecendo um diálogo com o Superior Geral de<br />

Roma, padre Guilherme Gaudreau, e o então Secretário Geral da CRB, padre Irineu Leopoldino<br />

de Souza 29 . Nos bastidores de toda articulação, a chefia do novo departamento foi<br />

confiada à Província Redentorista do Rio de Janeiro, e o padre Tiago Gerardus Cloin indicado<br />

pelo provincialato, conforme carta de padre Wuts ao secretariado da Conferência:<br />

No princípio do ano conversamos sobre a fundação do Departamento das<br />

Missões Populares na CRB, manifestando Vossa Revma. o desejo de confiar<br />

esse Departamento à nossa Congregação, quando, depois do Congresso,<br />

será definitivamente formada a Diretoria própria. Aceitei a proposta.<br />

[…] Queremos propor-lhe o R. P. Tiago Cloin, provavelmente já<br />

conhecido pelo sr. como professor do nosso seminário em Floresta. Por<br />

26<br />

Raimundo Caramuru de Barros, a pedido de Dom Helder Câmara, assumiu o Secretariado Especial da<br />

CNBB criado em 1962 exclusivamente para cuidar do Plano de Pastoral de Emergência. Na construção do<br />

Plano de Pastoral de Conjunto, foi o coordenador de todo o processo de consulta aos regionais, e um dos<br />

principais redatores do plano. Ver FREITAS, 1997.<br />

27<br />

BARROS, Raimundo Caramuru de. Entrevista concedida a Maria Carmelita de Freitas. Brasília, abril de<br />

1992. In.: FREITAS, op cit., p. 424.<br />

28<br />

Encontramos referências sobre a criação do referido Departamento em correspondências entre os redentoristas<br />

provinciais de Rio de Janeiro e São Paulo, datadas de 1953: “[…] Quanto ao Departamento de Missões<br />

Populares de que fala V.R. acho muito de boa a idéia. […]. Por enquanto posso dizer que, sendo para maior<br />

glória de Deus e da CSSR a salvação das almas, sendo para aumentar sempre mais o intercâmbio das idéias e<br />

movimento missionários e a união das nossas forças, para tudo isso estaremos sempre prontos a colaborar na<br />

medida de nossas forças”. APRJ. Carta do Provincial de São Paulo ao Provincial do Rio. 23/01/1953. Fundo<br />

01, D Missões, cx 03.<br />

29<br />

O padre salesiano Irineu Leopoldino de Souza foi o primeiro Secretário Geral da CRB (1954-1959) e nome<br />

influente na fundação dessa instituição católica (cf. FREITAS, 1997). Em 1955 escrevera ao pe. Gregório<br />

Wuts, provincial do Rio, expressando sua vontade de levar adiante a idéia do Departamento das Missões<br />

Populares: “Durante nossa viagem à Roma, tivemos ocasião de estar com o Revmo. Pe. Geral, Guilherme<br />

Gaudreau, com o qual conversamos sobre a organização do Departamento de Missões Populares, no Brasil.<br />

Conhecemos a Revista sobre a matéria e desejaríamos entrar em conversações com V. Remcia. ou outra<br />

pessoa indicada, sobre a possibilidade daquela fundação” APRJ. Carta do Secretário Geral da CRB, Pe.<br />

Irineu Leopoldino de Souza, SDB, ao provincial do Rio, Gregório Wuts 06/12/1955. Fundo 01, D Missões,<br />

cx 03.<br />

83


ocasião do Congresso teremos oportunidade de falar sobre o assunto. Peço-lhe<br />

o favor de ainda não tratar publicamente sobre a escolha. 30<br />

O anúncio oficial da criação do Departamento das Missões Populares aconteceu em<br />

1956, durante o II Congresso dos Religiosos do Brasil. Esse novo órgão se consolidou como<br />

o setor da CRB que melhor contribuiu para inserção da pastoral extraordinária no planejamento<br />

pastoral da década seguinte, e o padre Tiago Cloin se tronou, nos dizeres de<br />

Maria Carmelita de Freitas, o grande mentor, dinamizador e articulador da Conferência dos<br />

Religiosos, principalmente depois de 1959, quando assumiu o posto de Secretário Geral 31 :<br />

com a mudança de pessoa, o que se pretendia era, de fato, a mudança de<br />

orientação nos rumos da Conferência. O novo Secretário Geral, Pe Tiago<br />

Cloin, CSsR, contava com o beneplácito da CNBB e do Núncio Apostólico.<br />

Foi eleito precisamente para potencializar duas frentes julgadas prioritárias:<br />

o entrosamento com a CNBB e a participação dos religiosos na<br />

pastoral de conjunto da Igreja do Brasil 32 .<br />

O sucessor do pe. Tiago no Departamento das Missões Populares foi o padre Virgílio<br />

Rosa Netto, mais um influente redentorista da Província do Rio de Janeiro. Pe. Netto<br />

destacou-se como um habilidoso articulador entre CRB e CNBB, participou de duas sessões<br />

do Concílio Vaticano II e tornou-se um árduo defensor da renovação nos métodos das<br />

Santas Missões. Foi ele um dos principais responsáveis pela criação, em 1964, do Secretariado<br />

Nacional de Pastoral Extraordinária da CNBB 33 , órgão que ficou sob sua chefia. Percorreu<br />

praticamente todos os regionais do país organizando encontros, proferindo palestras<br />

e articulando a pastoral de conjunto. Além disso, foi decisivo para a criação do Instituto<br />

Nacional de Pastoral (INP) em 1969, onde formou o primeiro núcleo de estudos entre os<br />

teólogos que, na década seguinte, se destacariam como expoentes da Teologia da Libertação.<br />

Conforme Raimundo Caramuru de Barros, a primeira proposta do Plano de Pastoral<br />

de Conjunto enviada aos bispos da CNBB previa a criação de um Centro de Reflexão Teológica,<br />

ou seja, um espaço de estudos sistemáticos sobre a teologia do Vaticano II. Mas a<br />

30<br />

APRJ. Carta do provincial pe. Gregório Wuts ao Secretário Geral da CRB, pe. Irineu Leopoldino de Souza.<br />

08/07/1956. Fundo 01, D Missões, cx 03.<br />

31<br />

Padre Tiago esteve à frente da Secretaria Geral da CRB até 1967, quando foi ordenado bispo e designado<br />

para a Diocese de Barra - BA onde trabalhou até 1976, ano de seu falecimento.<br />

32<br />

FREITAS, 1997, p. 76<br />

33<br />

Voltado mais especificamente para a pastoral ordinária, o Plano de Pastoral de Emergência deixou muitas<br />

lacunas quanto à pastoral extraordinária da Igreja. O Secretariado Nacional de Pastoral Extraordinária foi<br />

uma tentativa da CNBB, em parceria com a CRB, para suprir essa lacuna e aproximar os institutos religiosos<br />

de carisma missionário das novas diretrizes pastorais. Ver capítulo II dessa dissertação.<br />

84


Assembléia dos Bispos vetou a proposta e, em seu lugar, reforçaram a criação de Institutos<br />

de Pastoral que pudessem oferecer cursos de “atualização e reciclagem”, no intuito de preparar<br />

as lideranças que colocariam em prática o PPC 34 . Todavia, com o reflexo da crise de<br />

vocações dos anos sessenta, “muitas (arqui)dioceses, ordens e congregações religiosas enviaram<br />

aos cursos, em grande parte, seus membros em crise vivencial”, gerando grandes<br />

dificuldades aos Institutos, pois não estavam preparados para tal demanda. “Foi quando o<br />

Padre Rosa [Netto] assumiu e pensou em reavivar a antiga idéia do Centro de Reflexão” 35 .<br />

Com o apoio do padre jesuíta Marcelo de Carvalho <strong>Azevedo</strong>, presidente da CRB<br />

entre os anos de 1968 e 1977, padre Netto unificou os Institutos de Pastoral da CNBB em<br />

uma única sigla, INP, e transformou o novo “Instituto Nacional de Pastoral” em um dos<br />

principais centros de estudos teológicos da Igreja Católica brasileira naquela época. Sob<br />

sua coordenação, o INP reuniu eminentes teólogos brasileiros em torno de uma proposta<br />

clara: estudar os documentos conciliares, sistematizar as discussões e repassá-las às comunidades<br />

eclesiástica e eclesial. Dos estudiosos, teólogos e pastoralistas que compuseram os<br />

quadros desse Instituto destacaram-se, entre vários outros, nomes como Leonardo Boff 36 ,<br />

João Batista Libâneo 37 , Carlos Mester 38 , Frei Betto 39 , Madre Luzia Ribeiro de Oliveira 40 ,<br />

Tereza Cavalcanti 41 e Luiz Alberto Gomèz de Souza 42 .<br />

34<br />

Em 1965 já existia o Instituto Superior de Pastoral Catequética (ISPAC), e foram criados o Instituto Superior<br />

de Pastoral Litúrgica (ISPAL), Instituto Superior de Pastoral Vocacional (ISPAV), Instituto de Previdência<br />

do Clero (IPREC) e o Instituto Nacional de Apostolado Leigo (INAL). Ver capítulo II.<br />

35<br />

BARROS, Raimundo Caramuru de. Entrevista concedida a Maria Carmelita de Freitas. Brasília, abril de<br />

1992. In.: FREITAS, 1997, p. 439.<br />

36<br />

Leonardo Boff é um dos maiores expoentes da Teologia da Libertação no Brasil. Frei Franciscano, professor<br />

de teologia, chefe editorial da Revista Vozes e escritor, foi condenado pelo Vaticano – em função de seu<br />

engajamento com a TdL – a um ano de “silêncio obsequioso”, em 1985, e deposto de todas as suas funções<br />

editoriais e de magistério. Em 1992, na iminência de uma nova condenação, abandonou o sacerdócio católico<br />

e se auto promoveu ao estado leigo. Ao terminar seu doutorado em teologia na Universidade de Munique-<br />

Alemanha, Boff retornou ao Brasil em 1970 e logo compôs a equipe de teólogos do INP, o qual ele estima ser<br />

“o maior nicho de criatividade e de reflexão de teologia católica junto à CNBB que na época funcionava no<br />

Rio de Janeiro”. BOFF, Leonardo. Entrevista concedida a Sérgio R. Coutinho; Pedro R. de Oliveira & William<br />

C. de Andrade. Brasília, 22 de abril 2003. Disponível em: Revista memória e caminhada / Programa de<br />

Pesquisa e Documentação das Comunidades Eclesiais de Base. Brasília: UCT, nº 06, junho de 2004.<br />

37<br />

O padre João Batista Libâneo é membro da Companhia de Jesus, teólogo doutorado pela Pontifícia Gregoriana<br />

de Roma, professor de teologia, escritor com mais de 150 publicações (entre livros e capítulos de livros<br />

sobre teologia, eclesiologia e pastoral). Retornou ao Brasil em 1968 após dez anos de estudos na Europa,<br />

dedicou-se ao magistério e à pesquisa teológica, atuou por muitos anos na assessoria do INP, CRB, CNBB e<br />

CEBs, e tornou-se um eminente teólogo da Teologia da Libertação.<br />

38<br />

O carmelita Frei Carlos Mesters é holandês radicado no Brasil desde 1949. Teólogo e exegeta, formou-se<br />

em teologia pela Pontifícia Universidade Santo Tomás de Aquino e em ciências bíblicas pelo Institutum<br />

Biblicum de Roma. Ligado à Teologia da Libertação, popularizou o método de estudo bíblico chamado “triângulo<br />

hermenêutico”, embasado no tripé: realidade-bíblia-comunidade. Em 1979 foi um dos fundadores do<br />

Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), uma associação ecumênica formada por pessoas de diferentes denomina-<br />

85


É importante frisar que a criação do Instituto Nacional de Pastoral (1969) é posterior<br />

à Conferência Episcopal de Medelín (1968), quando a Igreja Católica latino-americana<br />

propôs uma leitura do Concílio Vaticano II a partir da realidade sócio-política do continente<br />

e consolidou sua “opção preferencial pelos pobres”. As Comunidades de Base foram<br />

adotadas como modelo de organização dos leigos, e o projeto da pastoral de conjunto, por<br />

conseguinte, se fortaleceu na Igreja do Brasil, pelo menos na sua dimensão comunitária. A<br />

reflexão sobre a formação de pequenas comunidades eclesiais se intensificou entre o ‘grupo<br />

do INP’, e a reflexão teológica – pautada em grande medida nos documentos do Concílio<br />

e de Medelín – culminou na Teologia da Libertação.<br />

Com relação à pastoral extraordinária, padre Virgílio Rosa Netto tornou-se um árduo<br />

defensor da mudança no método missionário. Em sua opinião, as Santas Missões já<br />

não correspondiam às exigências da modernidade e precisavam de uma profunda reformulação<br />

para se adequar à preconizada pastoral de conjunto. Ao invés dos regrados métodos e<br />

temários, próprios das ‘missões metódicas’, deveria haver uma “diversidade de esquemas e<br />

de métodos na maneira de apresentar a única mensagem de Salvação do Evangelho ao<br />

mundo que estava cada vez mais pluralista, com situações diversas e variáveis” 43 . Os institutos<br />

religiosos especializados em missões – e constantemente convocados a aderirem à<br />

pastoral de conjunto – deveriam preservar o carisma missionário herdado dos fundadores,<br />

ções cristãs, com a finalidade de expandir o estudo bíblico entre comunidades cristãs a partir do método ‘triângulo<br />

hermenêutico’.<br />

39 Frei Betto é dominicano de Belo Horizonte, estudou filosofia, teologia, antropologia e jornalismo. Já atuou<br />

na assessoria das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e da Pastoral Operária no ABC Paulista, foi consultor<br />

do Movimento dos Sem-Terra (MST), coordenador da Articulação Nacional de Movimentos Populares e<br />

Sindicais (ANAMPOS) e da Central de Movimentos Populares (CMP), participou significativamente na<br />

fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT). É autor de 51<br />

livros, entre eles: “Fidel e a Religião”, “A Noite em que Jesus Nasceu”, “O que é Comunidades de Base” e<br />

“Batismo de Sangue”.<br />

40 Madre Luzia Ribeiro de Oliveira é uma das fundadoras do Convento de Nossa Senhora das Graças em<br />

Belo Horizonte, foi prioresa e depois abadessa do convento até 1982. Além de sua participação na assessoria<br />

do INP, Madre Luzia destacou-se pela atuação junto à CRB, principalmente na coordenação do Programa de<br />

Formação para Contemplativas (PROFOCO).<br />

41 Tereza Maria Pompéia Cavalcanti é professora do departamento de teologia da PUC-RIO e colaboradora<br />

do CEBI, atuando na assessoria de cursos bíblicos e na publicação de materiais. Formada em filosofia, psicologia<br />

e ciências da religião, é também mestre e doutora em teologia pela mesma PUC-RIO. É militante católica<br />

desde os anos 60 com atuação destacada no INP, CEBs e Teologia da Libertação.<br />

42 O sociólogo Luiz Alberto Gómez de Souza foi, por vários anos, diretor do Centro de Estatísticas e Investigações<br />

Sociais (CERIS). Militante da Juventude Universitária Católica (JUC), compôs a equipe de assessores<br />

de Dom Helder Câmara no Concílio Vaticano II e na Conferência Episcopal de Medellín. Atualmente é diretor<br />

do Programa de Estudos Avançados em Ciência e Religião da Universidade Candido Mendes. Publicou,<br />

entre outros livros e artigos, “A JUC: os estudantes católicos e a política”, “Classes Populares e Igreja nos<br />

Caminhos da História” e “Do Vaticano II a um Novo Concílio?”.<br />

43 NETTO, 1964, p. 381.<br />

86


mas o método de pregação deveria ser revisado. Segundo padre Netto, os missionários não<br />

podiam se contentar com o que ele chamou de “bagagem de sermões e conferências compostos<br />

há cinquenta anos ou mais por veneráveis antepassados, com veneração copiados e<br />

decorados no segundo noviciado ou no tirocínio pastoral” 44 ; ao contrário, teriam que se<br />

empenhar no estudo das novas orientações teológicas, catequéticas e litúrgicas para promoverem<br />

“a necessária renovação de estratégia e método, da maneira de apresentar o eterno<br />

conteúdo de salvação da pregação missionária” 45 .<br />

Nas suas funções de secretário do Departamento das Missões Populares na CRB,<br />

chefe do Secretariado Nacional de Pastoral Extraordinária na CNBB e coordenador do Instituto<br />

Nacional de Pastoral, padre Netto foi, sem dúvida, um influente articulador entre as<br />

diversas ordens e congregações religiosas no Brasil. Mas isso não significa que aqueles<br />

institutos que, no período pós-conciliar, se empenharam na renovação de seus métodos<br />

missionários em consonância com o PPC, o fizeram unicamente por incentivo desse padre<br />

ou dos órgãos que ele representava. É preciso analisar a situação de cada instituto bem como<br />

suas especificidades naquele contexto de crise de vocações e aggiornamento. No caso<br />

da Congregação do Santíssimo Redentor, pode-se dizer que a Província do Rio de Janeiro<br />

aderiu mais significativamente às propostas de renovação, enquanto a Província de São<br />

Paulo, por exemplo, se manteve moderada face às mudanças que, por ventura, pudessem<br />

descaracterizar as Santas Missões Populares.<br />

Em 1964, durante a 11ª Conferência Missionária da Província Redentorista de São<br />

Paulo, o padre Virgílio Netto proferiu uma palestra intitulada “A Missão Popular e o Plano<br />

de Emergência para a Igreja do Brasil”, na qual abordou temas relacionados ao Concílio<br />

Vaticano II, à pastoral de conjunto e à necessidade de atualização das Missões Populares.<br />

Nessa Conferência Missionária, todas as palestras foram gravadas e, posteriormente, transcritas<br />

e arquivada 46 . É interessante notar que havia um espaço de debates no final da fala<br />

de cada palestrante, mas o tema apresentado pelo padre Netto não foi discutido pelos confrades.<br />

Terminada sua fala, iniciou-se a palestra seguinte com o tema: “Teologia da Pregação<br />

de Conversão”. Ao final, quando iniciaram as perguntas, veio o primeiro comentário:<br />

“não foram feitas perguntas ao padre Virgílio Netto, temos alguns questionamentos”; e a<br />

44 Ibidem, p. 413.<br />

45 Ibidem, p. 414.<br />

46 “Toda a exposição das teses e os debates foram gravados em dez quilômetros de fita, e, depois, pacientemente<br />

passados para o papel e, heroicamente, datilografado e mimeografado”. Arquivo Redentorista de São<br />

Paulo. Documenta 96. Vol. III. Conferências Missionárias 1913-1964. Documentação sobre a 11ª Conferência<br />

Missionária da Província de São Paulo (16 1 23 de julho de 1964) Tietê. p. 262.<br />

87


esposta do Provincial foi direta: “não precisamos debater o tema do padre Netto porque<br />

estamos todos de acordo com ele” 47 .<br />

Longe de representar uma concordância com as propostas de renovação das Santas<br />

Missões, o que aconteceu foi a iniciativa da coordenação do evento de evitar o debate sobre<br />

uma questão que não fora bem acolhida entre os missionários – ou, pelo menos, entre<br />

as lideranças da Província de São Paulo. Um historiador da província paulista, padre Júlio<br />

Brustoloni, ao escrever sobre as “Etapas do Desenvolvimento das Santas Missões na Província<br />

de São Paulo”, classificou o período pós-conciliar como um tempo ‘desfavorável’ às<br />

missões tradicionais, principalmente pela renovação em andamento 48 . Segundo pe. Brustoloni,<br />

na Província de São Paulo:<br />

dois grupos divergentes discutiam a renovação das Santas Missões. Um<br />

deles propunha suspender a pregação das Santas Missões durante algum<br />

tempo para estudar e adaptá-las às normas do ‘aggiornamento’ do Vaticano<br />

II. O outro grupo, liderado pelo pe José Carlos de Oliveira (pe. Carlinhos)<br />

49 , propunha continuar pregando as Santas Missões no método tradicional<br />

enquanto se processasse o estudo e a renovação necessária. Essa<br />

proposta do pe Carlinhos, e de boa parte dos missionários, prevaleceu 50 .<br />

No processo interno de disputas e debates sobre o posicionamento a ser adotado pela<br />

Província de São Paulo prevaleceu a manutenção da pregação missionária aos ‘moldes<br />

tradicionais’ em detrimento à opção de pausar as missões até que se efetivasse a atualização<br />

do método. Uma disputa acirrada na qual podemos aplicar o velho clichê atribuído a<br />

Maquiavel de que “os fins justificam os meios”:<br />

para dar mais ênfase à ideia de continuar pregando as Santas Missões, [pe<br />

Carlinhos] apresentou à assembléia uma lista enorme de pedidos de missão<br />

que em grande parte já caducara. Bom estratagema este, embora não<br />

muito honesto e transparente, mas que forçou a equipe a continuar pre-<br />

47 Arquivo Redentorista de São Paulo. Documenta 96. Vol. III. Conferências Missionárias 1913-1964. Documentação<br />

sobre a 11ª Conferência Missionária da Província de São Paulo (16 1 23 de julho de 1964) Tietê.<br />

p. 466.<br />

48 “O tempo do pós-concílio Vaticano II foi muito desfavorável às Santas Missões, porque erroneamente os<br />

agentes pastorais privilegiaram os movimentos de grupos e desprezaram os de massa como totalmente superados.<br />

Foi o impacto da ‘avalanche de renovação conciliar’ mal entendida”. BRUSTOLONI, 2006a, p. 56.<br />

49 José Carlos de Oliveira, vulgo padre Carlinhos, foi chefe superior das missões na Província de São Paulo<br />

na década de 1960. Em 1975 assumiu o cargo de superior provincial, comandando o provincialato até 1979<br />

quando foi ordenado bispo e designado à Diocese de Rubiataba-GO.<br />

50 BRUSTOLONI, 2006a, p. 59. O padre João Pereira Gomes, outro historiador da Província de São Paulo,<br />

também abordou esse tema em seu livro Missões Populares: “Duas ideias divergentes evidenciavam-se: parar<br />

um ou dois anos para uma renovação profunda das missões, através de muito estudo, ou fazer aos poucos a<br />

renovação, entremeando estudos e missões? Apesar de algumas tentativas em contrário, prevaleceu a segunda<br />

opinião”. Gomes, 1982, 139.<br />

88


gando as Santas Missões já agendadas e outras que seriam pedidas, sem<br />

interrompê-las 51 .<br />

No contexto influenciado pelo aggiornamento do Vaticano II, palavras como “mudança”,<br />

“atualização” e “renovação” estiveram presentes em praticamente toda conjuntura<br />

eclesiástica. Todavia, a dicotomia entre o ‘grupo dos adeptos às inovações’ e o ‘grupo daqueles<br />

contrários às mudanças’ é demasiadamente superficial para analisarmos o catolicismo<br />

da década de sessenta. A necessidade da Igreja Católica se adaptar ao mundo moderno<br />

foi amplificada pelo Concílio e a ideia de mudanças esteve cada vez mais hegemônica,<br />

mas o cerne das divergências no meio eclesiástico não se resumia entre ‘favoráveis’ e<br />

‘contrários’, ou ‘progressistas’ e ‘conservadores’; o que estava em disputa era a definição<br />

da intensidade das mudanças e o que deveria ser atualizado, renovado e/ou preservado.<br />

O grupo ‘defensor’ da manutenção das Santas Missões se sobressaiu entre os redentoristas<br />

de São Paulo, mas a Província não se absteve de repensá-las à luz das diretrizes<br />

pastorais pós-conciliar, tentando adaptá-las às exigências dos ‘novos tempos’. Todavia, a<br />

renovação aconteceu de forma modesta, sem grandes mudanças e sem descaracterização<br />

das missões tradicionais. A pré-missão, por exemplo, foi adotada como processo de preparação<br />

das missões e o temário sofreu algumas atualizações teológicas, mas “os atos diários<br />

da missão continuaram praticamente os mesmos: missas da manhã com instrução, missa<br />

dos casais, dos jovens, missãozinha das crianças, visita ao Santíssimo, o terço da noite, os<br />

grandes sermões e as conferências, as procissões luminosa e de N. Senhora” 52 .<br />

Na Província do Rio de Janeiro, por sua vez, a renovação das Santas Missões aconteceu<br />

com maior intensidade. Durante a crise dos anos sessenta, o tradicional método missionário<br />

acabou sendo reelaborado a partir das seis linhas de ações do Plano de Pastoral de<br />

Conjunto 53 ; o entrosamento dessa Província com a CRB e CNBB, a assessoria do padre<br />

Virgílio Rosa Netto e os cursos dos Institutos de Pastoral foram fundamentais para as mudanças.<br />

O PPC, na avaliação de Oscar Beozzo 54 , foi um plano demasiadamente técnico com<br />

estratégias de execução e distribuição de tarefas. Sua aplicação dependia diretamente da<br />

51<br />

BRUSTOLONI, 2006a, p. 59.<br />

52<br />

Ibidem, p. 62.<br />

53<br />

O PPC definiu seis linhas de ações prioritárias para a pastoral de conjunto: 1) Promover uma sempre mais<br />

plena unidade visível no seio da Igreja Católica; 2) Promover a ação missionária; 3) Promover a ação catequética,<br />

o aprofundamento doutrinal e a reflexão teológica; 4) Promover a ação litúrgica; 5) Promover a ação<br />

ecumênica; e 6) Promover a melhor inserção do povo de Deus. Ver capítulo II dessa dissertação.<br />

54<br />

BEOZZO, 1982.<br />

89


atuação dos responsáveis por cada frente de trabalho, e os Institutos de Pastorais ficaram<br />

no encargo de ‘formar lideranças’ através dos seus diversos cursos de catequese, liturgia,<br />

teologia, enfim, de evangelização 55 . Os cursos do ISPAC e INP são citados pelos missionários<br />

redentoristas como o espaço privilegiado que tiveram para se adaptarem às inovações<br />

conciliares da década de sessenta 56 . Em 1969, ao final de um curso do Instituto Nacional<br />

de Pastoral, os confrades da Província do Rio de Janeiro elaboraram uma espécie de ‘monografia<br />

de conclusão de curso’ definida por eles como uma revisão do trabalho até então<br />

realizado 57 . A avaliação dos cursistas é um tanto quanto pessimista com relação à suas<br />

próprias ações, e a projeção futura é altamente embasada nas diretrizes do PPC:<br />

Essas reflexões, baseadas naquilo de negativo que hoje descobrimos, são<br />

antes uma revisão construtiva, uma tomada de consciência, são antes um<br />

trampolim para o futuro 58 .<br />

[…]<br />

A estruturação de nossa Ação Missionária procurará ser fiel às diretrizes<br />

do Plano de Pastoral de Conjunto. [Com o objetivo de] criar meios e condições<br />

para que a Igreja no Brasil se ajuste o mais rapidamente e plenamente<br />

possível à imagem do Vaticano II, pela mediação visível da Igreja<br />

59 .<br />

Esse trabalho apresentado ao INP está estruturado em três partes. A primeira é uma<br />

profunda reflexão sobre a formação sacerdotal que receberam nos seminários da Província,<br />

uma crítica aguda ao rigorismo de um modelo que, naquele ano de 1969, já estava fadado<br />

ao desaparecimento. Na avaliação dos próprios missionários, a formação que receberam<br />

55 No período pós-conciliar, os cursos oferecidos pelo ISPAC, ISPAL, ISPAV e INP tinham a finalidade de<br />

capacitar agentes pastorais para a implementação do PPC. “Seu objetivo é formar pessoal especializado de<br />

nível superior nestes vários setores de ação da Igreja”. PPC, p. 136.<br />

56 Tanto nas entrevistas quanto nos documentos do arquivo provincial, os cursos realizados pelos confrades<br />

nos Institutos de Pastoral são muito destacados. Termos como ‘reciclagem’, ‘atualização’, ‘renovação’, ‘formação’<br />

e ‘capacitação’ são os mais utilizados para caracterizar tais cursos. É difícil precisar exatamente<br />

quantos confrades da Província do Rio de Janeiro participaram efetivamente desse processo de formação, o<br />

certo é que os missionários diretamente envolvidos na renovação das Santas Missões realizaram pelo menos<br />

um dos vários cursos oferecidos. Entre eles destacamos os padres Geraldo Ferreira Lima, Jésus Ferreira de<br />

Assis, Mauro Carvalhais de Oliveira, Zelândio Portes e Braz Delfino Vieira. Cf. PROVÍNCIA DO RIO DE<br />

JANEIRO. Memória Viva do Redentor: Missões. Juiz de Fora, 1998. (edição e circulação interna).<br />

57 Participaram desse curso os padres Virgílio Rodrigues, Lúcio Pinho, Jésus Ferreira de Assis, Zelândio<br />

Portes e Mauro Carvalhais de Oliveira. O trabalho de conclusão de curso foi realizado em grupo e denominado:<br />

“Reflexões da Equipe dos Missionários Redentoristas”. No início do texto lê-se: “Terminado o curso no<br />

Instituto Nacional de Pastoral (INP), agradecidos pela dedicação dos professores que nos abriram novas pistas<br />

para uma pastoral nos dias de hoje, nós, missionários redentoristas, fizemos a nós mesmos uma pergunta<br />

fundamental: como encarar agora o nosso trabalho missionário? Para responder a esta pergunta fizemos uma<br />

revisão do nosso trabalho até hoje”. ASSIS, In.: PROVÍNCIA REDENTORISTA DO RIO DE JANEIRO,<br />

1998, p. 43.<br />

58 Ibidem, p. 49.<br />

59 Ibidem, p. 60.<br />

90


era inadequada à atuação num mundo complexo e de muitos desafios: “aburguesados na<br />

vida conventual, para pregar a homens lutando pela subsistência” 60 . Uma autocrítica que,<br />

certa ou errada, questionava alguns padrões tradicionais da vida conventual e sinalizava<br />

para a necessidade de mudanças:<br />

são algumas falhas em nossa formação que deixaram marcas profundas.<br />

Há, é claro, o inverso da medalha; há muitos princípios válidos que nos<br />

foram transmitidos (disciplina de vida, amor ao ideal, espírito apostólico,<br />

fidelidade à verdade, etc), mas estes princípios foram muitas vezes ofuscados<br />

por uma estrutura de vida despersonalizante que nos impedia de aprofundá-los.<br />

[…].<br />

De todas essas reflexões, uma conclusão se impõe: precisamos de uma<br />

contínua reeducação, num espírito de fé profundo que nos dê coragem para<br />

superar as crises provocadas pela queda das proteções e fórmulas mágicas<br />

para encher o vazio das inseguranças e incertezas 61 .<br />

Membros de uma Província em crise, esses missionários avaliam a “estrutura de vida<br />

despersonalizante” – isto é, o ‘isolamento do mundo’ proporcionado pelo rígido sistema<br />

de formação – como um empecilho às suas ações pastorais, ao mesmo tempo em que sustentam<br />

suas esperanças nas inovações do Concílio Vaticano II e, consequentemente, na<br />

pastoral de conjunto. Todavia, para superarem as limitações e atuarem dentro das diretrizes<br />

do PPC, era preciso conhecer a ‘realidade’ vivida pelos leigos. Por isso, a segunda parte do<br />

referido ‘trabalho de conclusão de curso’ é dedicada à análise da “situação do homem do<br />

campo”, o público-alvo das missões redentoristas:<br />

optamos, em nossa ação missionária, pelas regiões do interior, principalmente<br />

de Minas Gerais. Precisamos, então, em primeiro lugar, ter uma visão<br />

panorâmica da situação humana e religiosa do povo do interior. Para<br />

isto nos ajudam grandemente os dados da sociologia e a nossa própria<br />

experiência 62 .<br />

Nesse estudo sobre a “situação humana e religiosa do povo do interior”, os pontos<br />

positivos elencados são honestidade, generosidade, dedicação à família, gratidão, espírito<br />

de justiça e, principalmente, anseio de libertação: “está latente o anseio de libertação, de<br />

60 Ibidem, p. 48. “[…] fomos formados num mundo pacato, aburguesado, onde tudo era facilitado. Segregados<br />

do mundo, afastados da família aos 11 anos, protegidos de todos os modos possíveis, despreocupados de<br />

problemas financeiros ou familiares, para depois trabalhar num mundo angustiado de problemas de todo<br />

gênero. […] Formados em espírito de obediência cega, que tirou muitas vezes a responsabilidade pessoal,<br />

enfrentaríamos um mundo de contestação e questionamentos”.<br />

61 Ibidem, p. 49.<br />

62 Ibidem, p. 50.<br />

91


melhoria de vida, de participação social” 63 . Esse anseio seria fruto da opressão e exclusão<br />

identificadas como os pontos negativos na vida desses leigos; uma “situação humana de<br />

subdesenvolvimento”, marcada pela fome, doença, ignorância, pobreza, escravidão econômica,<br />

escravidão social e escravidão política. Tudo isso em consonância com uma igualmente<br />

“situação religiosa de subdesenvolvimento”, diagnosticada na religião: de tradição,<br />

“alimentada por muitas e muitas práticas religiosas, mas sem um ato consciente e de<br />

engajamento vital; de promessas, marcada pelo “caráter interesseiro” de permuta; de crendices,<br />

“fortificada numa mentalidade supersticiosa e medrosa”; e de fatalismo, “com uma<br />

imagem fatalista de Deus que lhe tira toda responsabilidade dinâmica e construtiva” 64 .<br />

Uma leitura pessimista, sem dúvida, que relega o povo a uma situação de alienação e inferioridade<br />

da qual devem se libertar – ou serem libertados 65 :<br />

com uma mentalidade mais conscientizada, mais avançada a respeito de<br />

religião, etc., trabalharemos entre homens de religião ainda muito primitiva.<br />

A grande dificuldade, portanto, será nos identificarmos com este povo,<br />

procurando sentir com fidelidade o seu nível religioso, para juntos<br />

partirmos para uma evolução sem imposições, sem queimar etapas 66 .<br />

Diante dessa desenhada conjuntura, a terceira e última parte é dedicada à Ação Missionária<br />

dos redentoristas, que consiste num novo método de missão embasado nas seis<br />

linhas de ações do Plano de Pastoral de Conjunto, tendo como um dos grandes desafios<br />

“sair de uma mentalidade individualista para uma mentalidade comunitária” 67 . A renovação<br />

paroquial e a formação de comunidades de base se tornam objetivos centrais das novas<br />

missões que, além de um novo método, adotam também a nomenclatura do PPC: “usamos<br />

o termo Ação Missionária e não ‘Missões’, pois nos parece mais rico de conteúdo, dizendo<br />

mais aquilo que pretendemos” 68 .<br />

É importante destacar que a renovação do método missionário não se processou exclusivamente<br />

no curso do INP. Ao contrário, ela aconteceu gradativamente ao longo da<br />

segunda metade da década de sessenta, fruto dos Encontros Missionários, das reuniões de<br />

avaliações, dos cursos do ISPAC e, por que não dizer, da influência do padre Virgílio Rosa<br />

63 Ibidem, p. 57<br />

64 Ibidem, p. 54-55.<br />

65 “O povo precisa de motivações religiosas, pois sua própria estrutura religiosa alienante e subdesenvolvida<br />

é um dos empecilhos ao seu desenvolvimento humano”. Ibidem, p. 65.<br />

66 Ibidem, p. 58.<br />

67 Ibidem, p. 62.<br />

68 Ibidem, p. 58. Grifo do original.<br />

92


Netto, destacado incentivador da atualização das missões aos moldes da pastoral de conjunto.<br />

A Ação Missionária redentorista<br />

Atualizar as missões redentoristas e adaptá-las ao Plano de Pastoral de Conjunto<br />

significou, num primeiro momento, revisar as bases do método missionário utilizado pelos<br />

confrades da Província do Rio de Janeiro e substituí-lo por algo novo, renovado. Como<br />

resultado dessa revisão surgiu a nova metodologia que manteve o caráter extraordinário<br />

das Santas Missões, mas modificou seus objetivos e formato das pregações.<br />

As Santas Missões Populares surgiram “para responder à necessidade da instrução<br />

religiosa e da reforma dos costumes, promovida pelo Concílio de Trento (1545-1563)” 69 ,<br />

seu grande diferencial é a utilização de métodos específicos de pregações, o que as tornou<br />

também conhecidas como Missões Metódicas 70 . Datar precisamente o nascimento dessas<br />

missões é algo tão difícil quanto apontar um único responsável pelo seu surgimento. Para<br />

Carmelo Conti Gulia, conceituado estudioso do assunto, elas representam “uma forma de<br />

pastoral extraordinária, nascida como resposta às exigências do tempo, em ambientes diversos,<br />

com características diversas, formada gradualmente e sempre em evolução” 71 .<br />

Será no decorrer dos séculos XVI e XVII que as Santas Missões – ou Missões Metódicas<br />

– se consolidarão como pastoral extraordinária da Igreja Católica e herdeiras das<br />

“pregações itinerantes”, isto é, as típicas missões medievais embasadas no carisma pessoal<br />

dos pregadores que, fazendo uso de uma linguagem popular, moral e alheia aos esquemas<br />

doutrinários da época, percorriam várias localidades do continente europeu convidando os<br />

leigos à penitência. Disseminadas pelas ordens mendicantes e por expoentes do catolicismo<br />

medieval, como São Domingos de Gusmão (1170-1221), São Francisco de Assis (1182-<br />

1226), Santo Antônio de Pádua (1191-1232), São Vicente Ferrer (1350-1419) e São Bernadino<br />

de Sena (1380-1444), essas pregações foram um modelo de missão no qual os mis-<br />

69 GUGLIA, 1992, p. 6.<br />

70 “Na história das missões populares, os métodos, isto é, os diversos modos de organizar o conjunto da atividade<br />

missionária, para obter a conversão dos corações e a renovação da comunidade eclesial, tiveram importância<br />

primária”. GUGLIA, op cit., p. 5.<br />

71 Ibidem, p. 15.<br />

93


sionários não seguiam um método específico e previamente elaborado, como aconteceu no<br />

período que sucedeu o Concílio de Trento 72 .<br />

As pregações itinerantes eram eventos de um só dia, que coincidiam com datas litúrgicas<br />

específicas (advento, quaresma, dias festivos), e tinham sempre um “pregador carismático”<br />

como organizador e principal referência. As Missões Metódicas, por sua vez,<br />

eram mais “institucionalizadas”, não se condicionavam às datas litúrgicas e aconteciam em<br />

um período de tempo pré-definido –uma semana, dez dias, ou mesmo um mês inteiro dependendo<br />

da localidade missionada – e, ao invés de um líder carismático, eram executadas<br />

por um grupo organizado de missionários “com distinção de funções e diversidade de ministério”<br />

73 . Essa prática metódica de pregação missionária se tornou um dos principais<br />

meios de propagação e implementação do modelo tridentino de Igreja.<br />

Segundo Louis Châtellier , o Concílio de Trento (1545-1563) pautou-se em dois objetivos<br />

centrais: o combate contra os protestantes e a renovação da Igreja Católica. Por isso<br />

a utilização das expressões Contra-Reforma e Reforma Católica 74 . Opondo-se às reformas<br />

de Lutero e Calvino, que defendiam a Bíblia como a única fonte de fé em Cristo, os bispos<br />

em Trento reafirmaram a importância da tradição católica e a eminência dos “ensinamentos<br />

dos padres da Igreja e dos próprios bispos, a par dos textos sagrados” 75 . Além disso, confirmaram<br />

o poder dos intercessores – a Virgem Maria e os Santos – e ressaltaram a prática<br />

dos sete sacramentos (batismo, confissão, eucaristia, crisma, matrimônio ou ordenação,<br />

extrema-unção) como condição para se alcançar a graça da salvação; o Concílio de Trento<br />

imprimiu à Igreja Romana um caráter mais sacramental.<br />

Um dos pontos centrais dessa Reforma Católica referia-se à instrução tanto dos leigos<br />

quanto dos padres. As dioceses foram orientadas a criarem seminários para formação<br />

sacerdotal – os padres da Igreja deveriam ser conhecedores da doutrina, da tradição e dos<br />

sacramentos para instruírem devidamente seus fiéis. Os leigos, que também deveriam conhecer<br />

melhor sua religião, precisavam ser catequizados dentro da doutrina católica; o estudo<br />

do catecismo da Igreja tornou-se, gradativamente, mais difundido, “era preciso que<br />

todos fossem nele instruídos e capazes de daí retirarem as conseqüências para a sua vida<br />

quotidiana” 76 .<br />

72<br />

Ibidem, p. 11-13.<br />

73<br />

Ibidem, p. 16.<br />

74<br />

CHÂTELLIER, 1995, p. 27.<br />

75 Ibidem, p. 28.<br />

76 Ibidem, loc cit.<br />

94


As missões extraordinárias pregadas ao estilo metódico foram, por pelo menos três<br />

séculos, o principal instrumento de propagação dessa reforma católica tridentina, e a Ação<br />

Missionária, por sua vez, pretendia ser para o Concílio Vaticano II o que as Santas Missões<br />

foram para o Concílio de Trento, conforme descrito pelos próprios missionários: “queremos<br />

promover a divulgação do Concílio Vaticano II como as Missões Populares foram o<br />

grande órgão de divulgação do Concílio de Trento. Queremos levar a Igreja do Vaticano II<br />

até os mais longínquos rincões” 77 .<br />

Para alcançar esse objetivo, uma equipe de missionários da Província Redentorista<br />

do Rio de Janeiro avaliou ser preciso mudar o método missionário para adequá-lo às diretrizes<br />

do segundo Concílio Vaticano. Se as Santas Missões foram importantes para a Igreja<br />

tridentina, é porque as metodologias utilizadas foram elaboradas em consonância com as<br />

exigências do Concílio de Trento. Da mesma forma, era preciso elaborar um novo método<br />

que estivesse em sintonia com o Concílio do século XX, pois o método tradicional, na opinião<br />

desses confrades, seria insuficiente para a “divulgação do Vaticano II”. Alguns missionários<br />

concluíram que as Santas Missões não proporcionavam uma conversão duradoura,<br />

por isso precisavam ser atualizadas.<br />

É importante destacar que essa avaliação não foi exclusividade dos redentoristas da<br />

Província do Rio. Se o Plano de Pastoral de Conjunto (1965) representa a ‘visão oficial’ da<br />

Igreja Católica no Brasil, podemos então afirmar que essa Igreja oficialmente reconheceu<br />

uma debilidade das Missões e incentivou sua renovação. Em nível global, a década de<br />

1960 representou a pior crise das Santas Missões desde a adoção dos métodos; sua credibilidade<br />

foi abalada gerando em todo o universo católico uma significativa onda de desconfiança<br />

quanto a sua eficiência na evangelização 78 . Além disso, embora nessa referida crise<br />

tenha se intensificado as críticas quanto aos resultados das Santas Missões, esse questionamento<br />

existe desde os primórdios dessa pregação extraordinária, e a “insistente acusação<br />

de fogo de palha” esteve presente em diversos contextos 79 .<br />

Na Província do Rio, as mudanças no método missionário ganharam grandes proporções<br />

no final da década de 1960, mas a revisão da metodologia utilizada é uma prática<br />

77<br />

APRJ. Propostas da Equipe Missionária Redentorista de congonhas ao Regional Leste II. s/d. Fundo 01, D<br />

missões, caixa 04.<br />

78<br />

Cf. GULIA, 1992; MARTINA, 1997; GOMES, 1982; BRUSTOLONI, 2006a;<br />

79 Cf. GUGLIA, op cit., p. 25.<br />

95


constante desde as primeiras décadas de pregação no país 80 . Em 1913, por exemplo, o provincial<br />

holandês escreveu aos reitores dos conventos no Brasil reiterando que “ficou determinado<br />

que se realizasse uma deliberação sobre se, por ensejo das alteradas circunstâncias<br />

do tempo, não se apresentavam como úteis e convenientes algumas novas medidas em<br />

prol da grande obra das missões” 81 . No Congresso Missionário de 1955, a revisão do método<br />

deu início à prática da pré-missão 82 , e em 1957, em outro Congresso Missionário,<br />

mais uma vez se discutiu os métodos:<br />

os trabalhos das Missões exigem tal aperfeiçoamento que nos leva a contar<br />

com a nova mentalidade do povo e aproveitar os novos recursos dos<br />

tempos modernos, o que não constitui prejuízo ao espírito próprio da nossa<br />

congregação. Os métodos devem ser adaptados às circunstâncias, local,<br />

horário do povo atingido pelas Missões. Estudar ao fim do ano os resultados<br />

obtidos. Não adaptar-se é trair a vocação redentorista 83 .<br />

No caso da Ação Missionária, dois documentos do final da década de 1960 84 explicam<br />

os detalhes do novo método e os motivos das mudanças. Ambos foram redigidos pelos<br />

principais mentores desse projeto, os padres Geraldo Ferreira Lima, Jésus Ferreira de Assis<br />

e Braz Delfino Vieira – que na época compunham a equipe missionária do convento de<br />

Congonhas do Campo. O primeiro texto, chamado de “Proposta da Equipe Missionária de<br />

Congonhas ao Regional Leste II”, é um esboço minucioso das ‘novas’ missões que estavam<br />

sendo oficialmente adotadas na Província do Rio de Janeiro e apresentadas a esse Regional<br />

da CNBB – que abarca os estados de Minas Gerais e Espírito Santo. No segundo,<br />

com o título de “Ação Missionária, nos Moldes do Vaticano II e do PPC, de Acordo com a<br />

Nossa Peculiaridade”, encontramos a metodologia do novo projeto, com a justificativa e a<br />

estrutura de todas as fases das missões atualizadas.<br />

80 O estudo do padre Boaventura Leite sobre os (vice)provincialatos da (vice)Província do Rio de Janeiro<br />

destaca a preocupação de quase todos os superiores provinciais com a revisão e atualização das Missões.<br />

LEITE, 2003.<br />

81 APRJ. Carta do Provincial aos reitores no Brasil. 1913. Fundo 01, D Missões, cx 03.<br />

82 “Recomenda-se insistentemente fazer alguns meses antes da Missão uma pré-missão que consistirá sobretudo<br />

em enquadrar o laicato (por meio das Associações ) na propaganda e preparação da Missão”. APRJ.<br />

Relatório do Congresso Missionário de 1955. Fundo 01, D Missões, cx 03.<br />

83 APRJ. Relatório do Congresso Missionário de 1957. Fundo 01, D Missões, cx 03.<br />

84 Os dois documentos não estão datados, mas dois pontos dos textos nos levam a crer que ambos foram editados<br />

entre 1968 e 1969. Primeiro por citarem o curso do ISPAC de 1968, e segundo por se tratar de um<br />

projeto que se iniciaria no final de 1969.<br />

96


Tomando por base o método ver-julgar-agir, incentivado por João XXIII e adotado<br />

oficialmente pela CNBB 85 , a Ação Missionária transformou as missões redentoristas da<br />

Província do Rio de Janeiro em uma atividade de três etapas distintas, com um espaçamento<br />

de dois a três meses entre elas. A primeira (ver) seria o período de “preparação” para se<br />

conhecer a realidade do local missionado e criar entre os leigos um “clima de interesse pela<br />

missão, levando à reflexão sobre os problemas religiosos, e sociais, despertando angústia e<br />

desejo de solução” 86 . Com aproximadamente uma semana de duração, esta etapa inicial<br />

contaria com momentos de orações, palestras e reuniões com o pároco e vários segmentos<br />

da sociedade (família, jovens, crianças, trabalhadores assalariados, desempregados, etc.),<br />

para organizar a comunidade em grupos de base e identificar as “lideranças atuantes”, formando<br />

equipes de trabalhos 87 que colaborariam durante todas as fases da missão.<br />

Na segunda etapa (julgar) 88 , com duração de quinze dias, inicia-se a fase da chamada<br />

“proclamação dinâmica e global do ministério de Cristo e sua Igreja” através das<br />

missas diárias, sermões, novenas e conferências. As reuniões com os grupos e equipes de<br />

trabalho também estão previstas, mas, assim como nas Santas Missões, essa etapa é o momento<br />

de pregação – da Palavra de Deus, dos Sacramentos da Igreja (principalmente eucaristia<br />

e confissão) e da devoção a Nossa Senhora. A principal inovação, no entanto, referese<br />

aos objetivos centrais e, consequentemente, ao conteúdo das mensagens. Enquanto no<br />

método tradicional a “finalidade direta é a conversão individual dos fiéis”, no novo método<br />

o objetivo principal será a “conversão comunitária e a renovação paroquial”. Nas Santas<br />

Missões, os sermões exerciam uma “pressão psicológica no nível de consciência dos indivíduos”<br />

89 ; na Ação Missionária, eles deveriam enfatizar temas como vida eclesial, comunidades<br />

de base e engajamento dos leigos nas ações pastorais da paróquia.<br />

85<br />

“Todo este trabalho de formação de militantes deve ser feito por meio da ação na vida e a partir da vida,<br />

dentro do método: de ver-julgar-agir, insistentemente recomendado pelo Santo Padre na encíclica Mater et<br />

Magistra”. PPE, p. 49. A metodologia do ver-julgar-agir foi sistematizada nos trabalhos da Ação Católica e<br />

tornou-se um método muito utilizado pela Igreja latino-americana em seus processos de avaliação, planejamento<br />

e execução de ações pastorais. Cf: SOUZA, 2004.<br />

86<br />

APRJ. Ação Missionária, nos Moldes do Vaticano II e do PPC, de Acordo com a Nossa Peculiaridade. s/d.<br />

fundo 01, D Missões, cx 4. p. 4. (nas próximas referências a este documento abreviaremos a citação para<br />

Ação Missionária)<br />

87<br />

Equipes de coordenação, oração, liturgia, catequese, infra-estrutura, associações religiosas.<br />

88<br />

Ação Missionária, p. 6-9.<br />

89<br />

“Toda ‘pedagogia’ que ocupa o centro dos sermões, dos ‘novíssimos’ do homem repetidos nas missões<br />

(morte, juízo, inferno, paraíso), gerava uma pressão psicológica no nível de consciência dos indivíduos – o<br />

pecado mortal, o pavor do inferno –, motivando uma auto-repressão pessoal que a teologia moral da época<br />

chamava de ‘mentalidade escrupulosa’, mas que daria um material e tanto para uma interpretação foucaultiana<br />

à maneira de vigiar e punir”. CAMURÇA, In: PEREIRA; SANTOS, 2004, p. 224.<br />

97


Na terceira e última etapa (agir) 90 , definida como o “aprofundamento noético do<br />

ministério de Cristo e sua Igreja”, os missionário retornariam à localidade missionada para<br />

mais uma semana de missão, desta vez com o objetivo de colaborar mais especificamente<br />

com a “incipiente renovação paroquial”. Ao invés dos tradicionais sermões, o novo método<br />

propõe para essa etapa – além das celebrações litúrgicas e momentos de orações – a realização<br />

de reuniões, palestras, círculos bíblicos e cursos intensivos. A finalidade seria fomentar<br />

a reestruturação da paróquia através da criação de conselhos paroquiais e comunidades<br />

de base, além de proporcionar um maior engajamento dos leigos nas ações pastorais<br />

e sociais da Igreja e da sociedade.<br />

Os métodos missionários de cada ordem e congregação católicas possuem peculiaridades<br />

próprias do carisma de cada um desses institutos, mas as várias ‘modalidades’ de<br />

missões são elementos constitutivos de eventos específicos e, por isso, também possuem<br />

características comuns que nos permitem interpretá-las como um todo, num determinado<br />

contexto. Assim, tanto as Santas Missões quanto a Ação Missionária surgiram como “eventos<br />

singulares” que compõe um evento mais amplo, o Concílio de Trento e o Concílio<br />

Vaticano II respectivamente. Isso significa que as Santas Missões, independente do método<br />

adotado por cada instituto, possuem a mesma ‘essência tridentina’ e, por isso, se assemelham<br />

em alguma medida 91 . Da mesma forma, a Ação Missionária é parte do processo de<br />

renovação dos métodos de missão relacionado às inovações conciliares da década de 1960,<br />

e, por mais autêntica que seja a metodologia elaborada pelos confrades da Província do<br />

Rio, ela se harmoniza à tendência universal de atualização dos métodos, da qual Conti Guglia<br />

aponta como “novidades mais características” o:<br />

prevalente interesse pela renovação da comunidade, mais que pela conversão<br />

individual e daí a mudança de toda a temática e do dinamismo da<br />

missão, propensa não tanto à conversão-confissão, quanto a instaurar um<br />

estilo de ‘comunhão e comunidade’ para formar paróquias missionárias<br />

que cheguem aos afastados, aos quais não chega a missão mesma, embora<br />

procure pregar a Palavra de Deus nos ambientes vitais: famílias, fábricas,<br />

escolas, clubes, etc 92 .<br />

90 Ação Missionária, p 10-12.<br />

91 “Como as demais missões católicas da época [início do século XX], a dos redentoristas em Minas Gerais<br />

tinham como centro da pregação a justiça e o perigo do castigo eterno no inferno em consequência de pecados<br />

mortais cometidos”. CAMURÇA, In: PEREIRA; SANTOS, 2004, p. 220. (grifos meus)<br />

92 GUGLIA, 1992, p. 62-63.<br />

98


No contexto do Concílio Vaticano II, essa mudança de objetivo, da conversão individual<br />

para a renovação da comunidade, tornou-se uma tendência geral na renovação da<br />

pastoral extraordinária, e, possivelmente, foi o ponto de maior discordância entre os confrades<br />

da Província do Rio 93 . A Ação Missionária intercalou o trabalho com pequenos grupos<br />

e as pregações para um grande público, mas enfatizou menos os tradicionais sermões<br />

do que as reuniões, cursos e conferências com grupos reduzidos. O padre Geraldo Ferreira<br />

Lima, um dos mentores do novo método, demonstrou-se a favor do trabalho com os pequenos<br />

grupos, mas era contrário ao abandono de uma das características das Santas Missões,<br />

a “pregação para as multidões”.<br />

Em 1966, padre Ferreira escreveu um pequeno artigo discutindo o problema da<br />

massificação nas Missões 94 , partindo da premissa de que “massificar é despersonalizar”.<br />

Ciente da nova tendência de trabalhar com pequenos grupos comunitários, padre Ferreira<br />

refuta a idéia de que a pregação para multidões seja atividade de massificação, defendendo<br />

que não é o número de ouvintes que determina a prática da “despersonalização”, mas a<br />

forma como o missionário se dirige ao seu público:<br />

É verdade que sempre devemos ter a preocupação, ao pregarmos, de<br />

conscientizar homens livres e cônscios, nunca forçando, desrespeitando e<br />

despersonalizando as pessoas. Mas isto não depende do número dos ouvintes<br />

ou de ações coletivas, mas de nosso modo de pregar e evangelizar,<br />

pois, como já dissemos, podemos massificar (talvez mais facilmente que<br />

uma multidão), um pequeno grupo de 40, 50 ouvintes e até só uma pessoa<br />

‘hipnotizando-a’ com o nosso modo de falar e abordar 95 .<br />

Assim, padre Ferreira destaca a importância de organizar pequenas comunidades de<br />

base, mas também defende a pregação para grandes públicos usando, inclusive, o próprio<br />

Concílio para justificar suas afirmações. “É importante constatarmos”, disse ele, “que o<br />

Vaticano II recomenda o apostolado tanto dos grupos como das multidões”, e que essa<br />

93 “anos atrás, quando se começou a falar que a missão devia caminhar para uma reforma das estruturas paroquiais,<br />

para que as conversões fossem duradouras e a missão não fosse ‘fogo de palha’, criou-se um impasse<br />

entre os missionários. De um lado uma reforma de estruturas paroquiais se fazia necessária, de outro lado<br />

esse trabalho parecia fugir à finalidade das missões, que visavam a conversão individual, a reforma do indivíduo”.<br />

Ação Missionária, p. 01.<br />

94 Esse documento não possui título. Suas cinco páginas datilografadas estão enumeradas, contendo, no final,<br />

a assinatura do Padre Geraldo Ferreira Lima, com a data de novembro de 1966. APRJ. Fundo 01, D Missões,<br />

cx 01. (por se tratar de uma discussão sobre massificação, citaremos este documento da seguinte forma:<br />

FERREIRA LIMA, Massificação.)<br />

95 Ibidem, p. 3.<br />

99


“reserva e falta de simpatia para com a pregação às multidões seja devido ao desconhecimento<br />

da quinta-essência da massificação, que é a socialização despersonalizante” 96 .<br />

A Ação Missionária pretendia abarcar ambas as formas de evangelização: pregação<br />

para grandes e pequenos grupos, mas “as pregações para multidões tomam um caráter subsidiário<br />

de facilitar os trabalhos dos grupos”, e “no caso de haver necessidade de opção<br />

entre grupos e multidões”, a opção será “sempre pelo grupo” 97 ; uma prioridade que, provavelmente,<br />

não foi avalizada pelo padre Geraldo Ferreira. Quando um grupo de confrades,<br />

capitaneado pelo padre Jésus Ferreira de Assis, avaliou ser necessário um tempo maior de<br />

missão para que o objetivo de formar comunidades de base fosse alcançado, aconteceu<br />

uma divisão da equipe missionária. Padre Geraldo Ferreira perseverou na “pregação para<br />

multidões”; na falta de uma equipe de trabalho, não conseguiu levar adiante a proposta da<br />

Ação Missionária em três etapas, mas deu continuidade ao modelo tradicional até 1988,<br />

um ano antes de seu falecimento. Padre Assis, por sua vez, liderou a equipe que aderiu às<br />

chamadas Missões Inseridas, que se tornou o modelo oficial da Província do Rio de Janeiro<br />

a partir da década de setenta.<br />

As Missões Inseridas<br />

Durante o processo de estudos e formatação do método adotado na Ação Missionária,<br />

o debate sobre a duração das missões esteve constantemente na pauta de discussão 98 . A<br />

ideia de se realizar uma experiência de “inserção” numa paróquia ganhou corpo entre os<br />

redentoristas, culminando nas Missões Inseridas 99 , uma modalidade de pastoral missionária<br />

mais flexível do ponto de vista metódico e mais centrada no objetivo de formar comunidades<br />

de base. A partir de um “contrato pastoral” firmado entre Província e diocese, os<br />

missionários assumiriam uma paróquia por um prazo determinado (normalmente entre dois<br />

96 FERREIRA LIMA, Massificação, p 5. Ao final do documento, padre Geraldo Ferreira Lima levanta a<br />

seguinte questão: “Será que haja alguém que não perceba que a recomendação do Concílio para o uso dos<br />

meios de comunicação social, ou das multidões, como subsídio valioso em propagar e firmar o reino de Deus,<br />

vale muito mais ainda para a evangelização pela pregação direta e pessoal às multidões?”<br />

97 ASSIS, In.: PROVÍNCIA REDENTORISTA DO RIO DE JANEIRO, 1998, p. 63.<br />

98 “O problema do tempo. A Ação Missionária é realizada dentro de um tempo limitado. Às vezes sentimos<br />

que um pouco mais de tempo seria necessário”. Ação Missionária, p. 59.<br />

99 Em dois relatórios produzidos na década de 1980 utilizou-se o termo “Trabalho Missionário” e “Fundação<br />

Missionária”, mas a expressão “Missões Inseridas” prevalece na maioria dos documentos sobre esse modelo<br />

de missão.<br />

100


a quatro anos), se responsabilizando pela parte administrativa e sacramental e organizando<br />

os leigos em pequenas comunidades.<br />

Ao contrário da Ação Missionária, quando primeiro definiu-se o método para depois<br />

colocá-lo em prática, as Missões Inseridas iniciaram sem uma metodologia específica,<br />

que foi sendo elaborada ao longo das experiências ulteriores. Em 1968, concomitante à<br />

criação do método em três etapas, a Província do Rio de Janeiro assumiu uma paróquia na<br />

periferia de Vitória-ES com a previsão de cinco anos para a permanência dos redentoristas.<br />

Em 1970, os missionários assumiram a paróquia de Mutum-MG 100 ; em 1972 foi a vez de<br />

Galiléia-MG, Divino das Laranjeiras-MG e Tumirintinga-MG; e em 1975 se instalaram em<br />

Belo Oriente-MG e Timóteo-MG 101 .<br />

A metodologia de trabalho foi sendo construída na prática, através da partilha de<br />

experiências entre os missionários. Diferente das Santas Missões e da Ação Missionária,<br />

que se caracterizam como evento extraordinário com um esquema de ação previamente<br />

elaborado, as Missões Inseridas se configuram mais como uma pastoral ordinária, com<br />

presença constante dos missionários entre os leigos, e sem um esquema rígido a ser seguido.<br />

Ao invés de um cronograma das atividades e um temário, os redentoristas dedicados à<br />

missão de inserção adotavam, como ponto de partida, o objetivo primordial – organizar a<br />

paróquia em comunidades de base – e algumas orientações como a “presença ordinária do<br />

missionário”, o “anúncio da palavra de Deus”, o “incentivo ao estudo da bíblia”, as “reuniões<br />

periódicas com os grupos de leigos”, a “criação ou desenvolvimento do espírito comunitário”<br />

e o “despertar lideranças leigas” 102 .<br />

Nos relatórios produzidos pelos missionários, a ausência de um método específico é<br />

constantemente justificada: um trabalho que pretende organizar os leigos em comunidades,<br />

levando em consideração a realidade local, não poderia dar certo se houvesse um método<br />

rígido. Nas palavras do padre Jésus Ferreira de Assis – considerado pelos redentoristas<br />

como um dos grandes incentivador das Missões Inseridas – “para formar comunidades de<br />

base não existe uma receita única, não existe um único método. Cada comunidade tem suas<br />

particularidades, cada uma exige um jeito próprio de trabalho, não dá pra ser de fora pra<br />

100 As missões em Mutum, que pertence à Diocese de Caratinga-MG, duraram apenas um ano. Segundo consta<br />

nos relatórios, a Congregação dos Sacramentinos, com sede nessa diocese, decidiu “cumprir uma promessa<br />

antigo feita ao bispo” e assumir os trabalhos nessa paróquia. APRJ.Trabalho Missionário – Província do Rio<br />

de Janeiro(vol.III). 1981,p. 28. Fundo 01, D Missões, cx 04.<br />

101 A relação das missões inseridas encontra-se na figura 03, p. 105.<br />

102 APRJ.Trabalho Missionário – Província do Rio de Janeiro(vol.I e III), 1981. Fundo 01, D Missões, cx 04.<br />

101


dentro” 103 . Essa ausência de um método e o perfil que nada se assemelha à pastoral extraordinária<br />

foram motivos que geraram grande desconfiança e descrédito por parte daqueles<br />

mais adeptos ao modelo tradicional:<br />

102<br />

A missão de inserção é um trabalho que procura brotar das bases, sem<br />

muito esquema rígido. Fazem parte de sua trajetória: a busca, o sentir o<br />

novo, experimentar, caminhar no ritmo do povo, contar o imprevisível...<br />

Isso, às vezes, gera a sensação do ‘sem rumo’, para quem começa a vê, de<br />

fora, o trabalho 104 .<br />

Comparando o modelo de inserção com o método tradicional, as diferenças se tornam<br />

evidentes. As Santas Missões eram eventos extraordinários normalmente com duração<br />

de dez a quinze dias (dependendo da localidade missionada), sempre seguindo o mesmo<br />

esquema. Conforme observou o padre Adriano Backx – responsável pela tradução das cartas<br />

e crônicas escritas pelos holandeses – “o sistema [Santas Missões], que é chamado de<br />

Santo Afonso (sic), não será modificado substancialmente até a década de sessenta” 105 . O<br />

que se explica pelo seu caráter metódico.<br />

Todas as missões eram previamente esquematizadas com atividades e horários definidos.<br />

Alvoradas, orações – matinais, vespertinas e noturnas –, sermões, celebrações eucarísticas,<br />

procissões, casamentos e batismos e, principalmente, confissões; eram essas as<br />

principais atividades desenvolvidas pelos missionários, tendo como objetivo primordial a<br />

conversão dos indivíduos:<br />

A finalidade precisa das missões é a conversão dos pecadores, e o missionário<br />

deverá valer-se de sermões e instruções para os esclarecerem sobre<br />

o mal do pecado, sobre a importância de sua salvação e sobre a bondade<br />

de Deus; então os corações se transformam, quebram-se os laços<br />

dos maus hábitos, e começam a viver como cristãos 106 .<br />

Os grandes sermões diários seguiam o temário afonsiano, abordando, impreterivelmente,<br />

o pecado mortal, a morte, o juízo final, o inferno, a confissão e a oração 107 . Além<br />

103<br />

ASSIS, Pe. Jésus Ferreira. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Juiz de Fora-MG, 12 de<br />

maio de 2009. Arquivo Digital (96 min.)<br />

104<br />

APRJ. Dossiê Missões. 1989, p. 2. Fundo 01, D Missões, cx 04.<br />

105<br />

Carta do Padre Adriano Backx, endereçada ao padre provincial Geraldo Oliveira, datada de 13 de junho de<br />

1989. Apud NETO, 2007, p. 124.<br />

106<br />

LIGÓRIO, 1955, p. 8.<br />

107<br />

“Além do sermão sobre o pecado mortal – no qual se demonstra a malícia do pecado, que nos torna inimigos<br />

de Deus – e dos três sermões sobre os Novíssimos: morte, juízo e inferno, que nunca devem ser omitidos,<br />

não se deixará de falar sobre a confissão, procurando-se demonstrar a enormidade do sacrilégio e a ruína<br />

causada à alma pelo pecado de se calarem faltas graves, voluntariamente, na confissão. […] Não se há de<br />

omitir também o sermão sobre a oração: isto é, sobre a necessidade de recorrermos a Deus para obter a graça


disso, as instruções sobre o catecismo e os mandamentos da Igreja eram indispensáveis<br />

conforme as orientações de Santo Afonso: “o que há de mais importante e de mais proveitoso<br />

para o povo numa Missão, é ensinar-lhe certas práticas, que o preservem dos vícios e<br />

os meios que o persuadam a uma vida perseverante no bem” 108 .<br />

Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, padroeira das missões redentoristas, também<br />

ocupa lugar de destaque no método tradicional, sempre com a presença de uma imagem,<br />

realização de procissões e reverências nos sermões: “imediatamente após o sermão sobre o<br />

inferno, se pregará sobre SS. Virgem, dizendo da confiança que devemos depositar nessa<br />

divina mãe; da necessidade de recorrermos à sua intercessão para vencermos as tentações,<br />

para morrermos bem” 109 .<br />

Aos missionários, além das pregações e instruções, cabia também a função de ministrar<br />

os sacramentos aos fiéis. Casar os concubinos, batizar os pagãos, distribuir eucaristia<br />

aos fiéis e confessar os pecadores eram o conjunto de práticas sacramentais considerados<br />

essenciais para se alcançar a “conversão individual das almas”. Esse caráter sacramental<br />

é claramente percebido nos relatórios e crônicas que medem o sucesso ou fracasso das<br />

Santas Missões pelo número de comunhões distribuídas, pela quantidade de matrimônios e<br />

batizados sacramentados e, principalmente, pelo total de confissões.<br />

Ao final das missões, uma prática que se tornou comum na Província do Rio de Janeiro<br />

foi a criação de organizações leigas como Arquiconfrarias, Pão de Santo Antônio,<br />

Ligas Católicas e Ação Católica 110 . Embora o método missionário tradicional não tenha<br />

reservado um lugar de destaque entre seus objetivos para a formação de grupos entre os<br />

fiéis, essa prática esteve presente na pastoral extraordinária redentorista ao longo de toda a<br />

primeira metade do século XX 111 . Nas cerimônias de encerramento das Santas Missões<br />

oficializava-se a(s) fundação(ões), umas com fisionomia devocional, como as Arquiconfrarias<br />

dedicadas à Virgem padroeira das missões; outras de caráter mais assistencialista, como<br />

o Pão de Santo Antônio; e também aquelas de maior engajamento social, como as Ligas<br />

Católicas e a Ação Católica.<br />

da perseverança e da eterna salvação. Indicar-se-á ao povo, nesse sermão, um método prático para se recomendar<br />

a Deus pela manhã e à noite, na Missa, na Comunhão, à visita ao SS. Sacramento e a SS. Virgem, e<br />

especialmente nas tentações que nos venham perturbar”. Ibidem, p. 143.<br />

108 Ibidem, p. 110.<br />

109 Ibidem, p. 144.<br />

110 Ver capítulo I.<br />

111 Ver. NETO, 2007; WERNET, 2006.<br />

103


Esse, com certeza, é o ponto de maior proximidade entre as missões metódicas dos<br />

redentoristas e as missões de inserção oficializadas pela Província do Rio na década de<br />

setenta. A grande diferença reside no fato de, nas Santas Missões, os fiéis serem convidados<br />

a participar de um formato de grupo ‘institucionalizado’, com perfis e objetivos previamente<br />

definidos, do qual o modelo era apresentado pelos missionários; e, nas Missões<br />

Inseridas, a formação de grupos-comunidade ter se tornado o objetivo central, mas com a<br />

intenção de suscitá-los entre os leigos de modo a dar-lhes autonomia suficiente para assumirem<br />

uma identidade que refletisse as especificidades locais, desde que não destoasse da<br />

tradição católica, é claro. Na Ação Missionária, vale lembrar, a organização dos leigos em<br />

grupos também é uma prática destacada, mais aperfeiçoada do que nas Santas Missões, e<br />

menos intensa se comparada com as Missões Inseridas.<br />

Esse “ponto comum” entre os três modelos de missões analisados estão em plena<br />

sintonia com o carisma da congregação. Além da pastoral extraordinária, Santo Afonso<br />

transmitiu aos redentoristas o legado das “Capelas da Noite” 112 , isto é, deixou aos seus<br />

‘herdeiros’ a prática da organização dos leigos em “comunidades” como um exemplo a ser<br />

seguido. Rey-Mermet, biógrafo de Ligório, ao estabelecer uma relação análoga entre eventos<br />

de tempos históricos distintos, compara as Capelas da Noite “com os movimentos de<br />

Ação Católica, com nossos grupos de oração, com nossas fraternidades carismáticas e com<br />

as comunidades de base da América Latina” 113 .<br />

O fato da Província do Rio de Janeiro ter aderido à Pastoral de Conjunto é fundamental<br />

para entendermos o novo modelo de missões, uma vez que os objetivos e estratégias<br />

foram construídos (e assumidos) pelos missionários em sintonia com o discurso oficial<br />

da CNBB nas décadas de sessenta e setenta. Por outro lado, não podemos nos esquecer que<br />

estamos lidando com uma instituição religiosa, e que seus membros, todos eles, foram<br />

formados sob a espiritualidade afonsiana para se tornarem os “guardiães” do carisma de<br />

Santo Afonso. Daí a importância de analisarmos como o novo modelo de missão foi colocado<br />

em prática e qual perfil de comunidade de base esses confrades fomentaram.<br />

112 Ver Capitulo I.<br />

113 REY-MERMET, 1984, p. 197. Ver também: PAIVA, 2007, p. 70.<br />

104


GO<br />

Goiânia<br />

DF<br />

SP<br />

Brasília<br />

São Paulo<br />

MG<br />

Belo Horizonte<br />

RJ<br />

Rio de Janeiro<br />

BA<br />

ES<br />

Vitória<br />

Ação missionária<br />

Porto Firme - MG<br />

Paróquia Nossa Senhora da Conceição<br />

Arquidiocese de Mariana<br />

Ação Missionária em três etapas: novembro de<br />

1969, março e julho de 1970<br />

Missões Inseridas<br />

Província do Rio de Janeiro<br />

Missões da década de 1970<br />

Vitória - ES<br />

Paróquia da Ressureição, bairro Goiabeiras<br />

Arquidiocese de Vitória<br />

Missões Inseridas 1968-1974<br />

Mutum - MG<br />

Paróquia São Manoel<br />

Diocese de Caratinga<br />

Missões Inseridas: 1970-1971<br />

Divino das Laranjeiras - MG<br />

Paróquia Divino Espírito Santo<br />

Diocese de Governador Valadares<br />

Missões Inseridas: 1972-1974<br />

Galiléia - MG<br />

Paróquia São João Batista<br />

Diocese de Governador Valadares<br />

Missões Inseridas: 1972-1974<br />

Tumiritinga - MG<br />

Paróquia do Sagrado Coração de Jesus<br />

Diocese de Governador Valadares<br />

Missões Inseridas: 1972-1974<br />

Belo Oriente - MG<br />

Paróquia Nossa Senhora da Piedade<br />

Diocese de Itabira e Coronel Fabriciano<br />

Missões Inseridas: 1975-1982<br />

Timóteo - MG<br />

Paróquia Nossa Senhora de Nazaré<br />

Diocese de Itabira e Coronel Fabriciano<br />

Missões Inseridas: 1975-1982<br />

Missões da década de 1980<br />

Montanha - ES<br />

Paróquia Coração Imaculado de Maria<br />

Diocese de São Mateus<br />

Missões Inseridas: 1982-1985<br />

Santa Maria de Itabira - MG<br />

Paróquia Nossa Senhora do Rosário<br />

Diocese de Itabira e Coronel Fabriciano<br />

Missões Inseridas: 1982-1987<br />

Grão Mongol - MG<br />

Paróquia Santo Antônio<br />

Arquidiocese de Montes Claros<br />

Missões Inseridas: 1985-1987<br />

Taiobeiras e Rio Pardo de Minas - MG<br />

Paróquia de São Sebastião<br />

Diocese de Montes Claros<br />

Missões Inseridas: 1988-1991<br />

Missões das décadas de 90 e 2000<br />

Conceição do Castelo - ES<br />

Paróquia Nossa Senhora da Conceição<br />

Diocese de Cachoeiro do Itapemirim<br />

Missões Inseridas: 1996-2001<br />

Aracruz - ES<br />

Paróquia São João Batista<br />

Diocese de Colatina<br />

Missões Inseridas: 2006 - 2008<br />

Cariacica - ES<br />

Paróquia Sagrada Família<br />

Arquidiocese de Vitória-ES<br />

Missões Inseridas: 2001-atual.<br />

As missões em Cariacica tiveram seu contrato<br />

pastoral prorrogado por trinta anos, tornando-se<br />

um centro missionário redentorista para<br />

atendimento do Estado do Espírito Santo.<br />

figura 03<br />

Missões Inseridas da Província do Rio de Janeiro


Nos últimos cinquenta anos,<br />

manifestou-se na Igreja,<br />

tanto quanto na sociedade civil,<br />

uma grande aspiração comunitária.<br />

(José Comblin, 1970)


N<br />

CAPÍTULO IV<br />

Organização de Base na Igreja Católica:<br />

CEBs, Teologia da Libertação e Missões Inseridas<br />

a década de 1960, durante o processo de elaboração dos planos de pastoral – de<br />

Emergência e Conjunto –, a CNBB diagnosticou como frágil e ineficiente a estrutura<br />

paroquial do catolicismo brasileiro, apresentando como antídoto a criação de ‘comunidades<br />

de base’ que pudessem revitalizar as paróquias e dar novo dinamismo à ação pastoral.<br />

A ideia não era exatamente substituir o modelo paroquial por algo novo, pautado em<br />

comunidades eclesiais nas quais os leigos seriam os protagonistas. Diferentemente, planejou-se<br />

o revigoramento da paróquia, sendo as comunidades de base pequenas células que<br />

garantiriam sua sobrevivência estando a ela vinculadas e subordinadas.<br />

No modelo organizacional da Igreja Católica, a paróquia é concebida como o alicerce<br />

elementar e indispensável de sua ação pastoral 1 , mas a avaliação dos bispos brasileiros<br />

sobre os quadros paroquiais nos anos sessenta era consideravelmente pessimista. Acreditava-se,<br />

não sem razão, que a maioria das paróquias desenvolvia suas atividades pastorais<br />

de forma isolada uma das outras e eram menos “comunidades paroquiais” do que “agências<br />

de administração de sacramentos” 2 . Uma característica demasiadamente administrativa<br />

que não passava despercebida aos olhos e sentimentos dos fiéis, tampouco o papel do<br />

pároco como “administrador de sacramentos que resolve o problema da salvação individual”<br />

3 . Num contexto em que, no catolicismo, se repensava o lugar do leigo na Igreja (povo<br />

de Deus), a atividade paroquial no Brasil era considerada, em muitos casos, uma ação isolada<br />

e impotente 4 , além de deficitária no atendimento aos seus próprios paroquianos 5 ; en-<br />

1<br />

Uma boa discussão conceitual e historiográfica sobre a paróquia encontra-se no livro Paróquia e Comunidade<br />

no Brasil organizado por Fernando Torres-Londoño (1997).<br />

2<br />

Cf. COMBLIN, 1970, p.579.<br />

3<br />

CORSO, In: TORRES-LONDOÑO, 1997, p. 171.<br />

4<br />

“A paróquia isolada na sua ação é tão impotente para fazer com que os princípios cristãos penetrem no<br />

mundo ambiente, quanto o é, em grande parte, para mudar os hábitos da coletividade praticante”. CNBB.<br />

Plano de Pastoral de Emergência Para a Igreja do Brasil. 2ª edição. São Paulo: Paulinas, 2004, p. 113. Grifo<br />

do original.<br />

107


quanto que a religiosidade popular desenvolvia-se sem o devido acompanhamento – ou<br />

controle – das paróquias 6 .<br />

Nessa conjuntura, a revitalização da estrutura paroquial tornou-se um dos pontos<br />

chaves do planejamento pastoral para adaptação da Igreja Católica no Brasil aos ditames<br />

do Concílio Vaticano II. Em 1965, por exemplo, a Campanha da Fraternidade teve como<br />

lema: “faça de sua paróquia uma comunidade de fé, culto e amor”. A temática sobre comunidades<br />

de base ganhou amplo espaço na pauta do catolicismo brasileiro 7 , e a organização<br />

de pequenos grupos de leigos surgia como possibilidade viável para renovar os quadros<br />

paroquiais e redefinir o papel do laicato na Igreja. Não se pretendia – pelo menos do ponto<br />

de vista institucional – criar comunidades plenamente autônomas e sim pequenas células<br />

que pudessem dar nova dinâmica à Igreja Católica, mas que estivessem submetidas à administração<br />

paroquial tal como as paróquias estavam (ou pelo menos deveriam) subordinadas<br />

às suas respectivas (arqui)dioceses. A Pastoral de Conjunto, enquanto planejamento de<br />

ação, foi uma iniciativa de articulação harmônica entre todas as instâncias organizacionais<br />

da Igreja Católica no Brasil – CNBB, Regionais, (arqui)Dioceses, paróquias –, e as pequenas<br />

comunidades de leigos seriam a base de toda essa estrutura, numa posição hierarquicamente<br />

inferior às demais instâncias.<br />

Com uma planejada ação de formação de pequenas comunidades de base, a Igreja<br />

Católica no Brasil criou uma situação favorável para a consolidação de movimentos leigos<br />

ligados direta ou indiretamente a sua jurisdição: em várias regiões do país floresceram pastorais<br />

sociais, organizações e movimentos (de operários, negros, mulheres, pescadores,<br />

campesinos, etc) submetidos à interferência direta da Igreja ou por ela incentivados 8 . As<br />

Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) são, provavelmente, o melhor exemplo desse modelo<br />

de catolicismo pautado na organização de pequenos grupos de leigos.<br />

5 “A preocupação do Episcopado volta-se especialmente para as paróquias. ‘Nossas paróquias, sempre admitindo<br />

exceções, estão longe de atingir todo o território paroquial’”. Ibidem, p. 20.<br />

6 “A Igreja pode estar canonicamente presente sem o estar psicológica e sociologicamente. Assim, descobrimos<br />

que certas paróquias da diocese, nas suas próprias instituições, se achavam ausentes de boa parte da<br />

população”. Ibidem, p. 110.<br />

7 “Faz-se urgente uma descentralização das paróquias, não necessariamente no sentido de criar novas paróquias<br />

jurídicas, mas de suscitar e dinamizar, dentro do território paroquial, comunidades de base (como as<br />

capelas rurais), onde os cristãos não sejam pessoas anônimas que buscam um serviço ou cumprem uma obrigação,<br />

mas sintam-se acolhidos e responsáveis, e delas façam parte integrante, em comunhão de vida com<br />

Cristo e com todos os seus irmãos ” . CNBB. Plano de Pastoral de Conjunto 1966-1970. Rio de Janeiro: Dom<br />

Bosco, 1966. p 38.<br />

8 Cf. DOMEZI, In: TORRES-LONDOÑO, 1997.<br />

108


Sobre as CEBs nos ateremos mais detalhadamente a seguir, por hora é importante<br />

dizer que o modelo de comunidades de base idealizado no planejamento pastoral da CNBB<br />

ganhou novas tonalidades ao se deparar com as inúmeras especificidades locais das Igrejas<br />

particulares. Questões de ordem política, econômica, social e cultural se amalgamam ao<br />

universo religioso dos fieis católicos, propiciando o surgimento de comunidades – ou grupos<br />

– com características diversificadas e, em certa medida, inclassificáveis. Segundo Luis<br />

Alberto Gómez de Souza, as Comunidades Eclesiais de Base “não se constituíram em um<br />

movimento nacional, mas como uma rede flexível e diversificada de iniciativas” 9 , elas<br />

“surgiram em várias regiões do país com diferentes fisionomias e a partir de problemas<br />

específicos, foram crescendo, na diversidade, sem receitas prefixadas em manuais, sem<br />

institucionalização tradicional, ligadas à história das Igrejas locais” 10 . Isso significa que a<br />

formação das CEBs não obedeceu, necessariamente, uma diretriz de caráter nacional tampouco<br />

continental, algumas nem mesmo dedicaram-se a discussões políticas, tornando-se<br />

grupos de oração e louvor sem nenhum engajamento social.<br />

As características (ou identidades) de cada comunidade de base variam de acordo<br />

com as especificidades locais, mas também são devedoras do modelo idealizado e implementado<br />

pelas paróquias e dioceses. Os diferentes tipos de “campanhas” exercidas pelos<br />

agentes de pastoral contribuíram, em alguma medida, na formação diversificada dos vários<br />

perfis de CEBs constituídos. A antropóloga Marjo de Theije, ao estudar o que ele chamou<br />

de “catolicismo liberacionista” 11 da década de 1980 em Garanhuns-PE, utiliza a categoria<br />

campanhas católicas para exemplificar diferentes estratégias, métodos e objetivos adotados<br />

pelos agentes especializados – clérigos ou não – nas empreitadas de organização dos<br />

leigos nas bases da Igreja Romana no Brasil. Com o sugestivo título Tudo que é de Deus é<br />

bom, a autora alerta-nos para o fato dos fiéis católicos, quando convencidos pelos eclesiásticos<br />

que determinada diretriz – ação, postura ou modelo de organização – é “vontade de<br />

Deus”, tendem a adotá-la, mesmo que parcialmente ou com resistências.<br />

9<br />

SOUZA, 2004, p. 31.<br />

10<br />

Ibidem, p. 114.<br />

11<br />

Muitos autores utilizam o termo progressista para se referirem ao modelo de catolicismo preconizado<br />

pelos teólogos da Libertação. Não obstante, Theije pertence ao grupo de pesquisadores que, em função do<br />

significado político da palavra, consideram o uso de tal conceito inadequado (ou insuficiente) para esse tipo<br />

de análise. Mesmo reconhecendo que “no Brasil, o termo progressista é muito usado para denotar uma forma<br />

de catolicismo que se baseia na Teologia da Libertação”, essa antropóloga prefere utilizar a expressão liberacionista<br />

para se referir a esse catolicismo tão chamado de progressista. THEIJE, 2002, p. 22.<br />

109


Essa perspectiva analítica não exclui, nem mesmo subestima, a capacidade dos leigos<br />

em desenvolverem modos de organização e visões de mundo destoantes das orientações<br />

eclesiásticas. A religiosidade popular, geralmente herdeira de “tradições vivas” 12 ,<br />

delimita formas ou estilos de catolicismo que, no universo católico, coabitam, de maneira<br />

harmoniosa ou conflitante, com o(s) modelo(s) dogmático e canônico proposto pela Santa<br />

Sé. Como afirmou Scott Mainwaring, ao estudarmos uma instituição complexa como a<br />

Igreja Católica, não podemos desconsiderar os institutos eclesiais, os agentes pastorais, os<br />

movimentos leigos organizados e os demais católicos que não tomam parte nos movimentos<br />

organizados, mas compõem a base da Igreja. “Embora estejam sob o controle formal da<br />

hierarquia, esses outros níveis adquirem certa autonomia, influenciam a Igreja e exercem<br />

um efeito independente na política” 13 . Apesar de sua estrutura verticalizada e dos plenos<br />

poderes dos bispos e arcebispos abaixo do Papa, peculiaridades locais podem emergir e<br />

desenvolver características diferentes da linha mestra proposta pela hierarquia eclesiástica.<br />

Não obstante, sabe-se das dificuldades eminentes para o afloramento de qualquer modelo<br />

de Igreja diferente daquele defendido pelo (arce)bispado local. “Dada a estrutura hierárquica<br />

da Igreja Católica, movimentos que não recebem o apoio dos (arce)bispos permanecem<br />

relativamente isolados e são incapazes de modificar as tendências dominantes” 14 .<br />

Por conta disso, nem sempre as características de uma determinada CEB são frutos<br />

– apenas ou majoritariamente – das especificidades locais dessa mesma comunidade; o teor<br />

da campanha empregada pode, em alguma medida, definir o perfil desenvolvido pelos grupos<br />

de base ou, porque não dizer, atribuído a eles. Isso nos ajuda entender, em parte, o que<br />

aconteceu na Arquidiocese de São Paulo nas décadas de 1970-90. Sob a administração<br />

episcopal de Dom Evaristo Arns, auxiliado por Dom Luciano Mendes de Almeida, essa<br />

circunscrição eclesiástica foi, por muito tempo, modelo exemplar de organização de Comunidades<br />

Eclesiais de Base com significativa influência na mobilização e organização<br />

política, social e sindical naquela região. Contudo, depois da divisão geográfica dessa arquidiocese<br />

e da transferência de Dom Luciano para a Arquidiocese de Mariana, em 1988,<br />

as regiões paulistas retiradas da tutela de Dom Evaristo vivenciaram uma desaceleração<br />

desse modelo de organização de base, enquanto que, na circunscrição da igreja marianense,<br />

12 Utilizamos o conceito de tradição viva tal como definido por Roberto da Matta, a saber: “um conjunto de<br />

escolhas conscientemente elaboradas que passe de geração para geração, que permita individualizar ou tornar<br />

singular e única uma dada comunidade relativamente às outras”. DaMATTA, 1987, p. 48.<br />

13 MAINWARING, 1989, p. 28.<br />

14 Ibidem, p. 29.<br />

110


as pastorais sociais e as CEBs passaram por um processo inverso, ganhando maior destaque<br />

e vivacidade com a chegada do novo arcebispo.<br />

Decerto, as explicações sobre o apogeu e declínio das Comunidades Eclesiais de<br />

Base na arquidiocese de São Paulo não se resumem às ações e/ou orientações da hierarquia<br />

católica. Não podemos desconsiderar que a conjuntura sócio-política no final da década de<br />

oitenta é bem distinta daquela vivida pelos leigos nos anos setenta, da mesma forma que o<br />

cenário religioso muito se modificou com o visível crescimento dos movimentos pentecostais<br />

e carismáticos. Por outro lado, embora a Igreja Católica não detenha o ‘monopólio do<br />

sagrado’, o peso de sua instituição hierarquizada, bem como a influência de seus sacerdotes,<br />

revestidos simbolicamente de certo ‘poder concedido por Deus’, não devem ser minimizados<br />

nos estudos sobre o catolicismo. Desta forma, para compreendermos o fenômeno<br />

das CEBs no Brasil e suas diversidades fisionômicas é preciso atentarmos para as especificidades<br />

culturais e sociais das comunidades, para os contextos históricos distintos, como<br />

também para os diferentes modelos de “campanhas católicas” adotados pelos agentes pastorais.<br />

Comunidades ou Grupos: uma análise conceitual.<br />

Se Zygmunt Bauman 15 e José Comblin 16 estiverem certo, como acredito estarem,<br />

podemos afirmar que, na sociedade contemporânea, existe um grande anseio por uma vivência<br />

em comunidade. Mas, uma pergunta frequente que há décadas tem direcionado os<br />

estudos de muitos pensadores seria: o que é comunidade?<br />

Para além de seu significado, a palavra comunidade, segundo Bauman, carrega consigo<br />

sensações; “ela sugere uma coisa boa: o que quer que ‘comunidade’ signifique, é bom<br />

‘ter uma comunidade’, ‘estar numa comunidade’” 17 . Proteção, aconchego, intimidade, respeito…<br />

são adjetivos comumente atribuídos ao tipo de relação entre membros de uma comunidade,<br />

nela encontraríamos a segurança que tanto almejamos para nossas vidas. E todas<br />

essas “boas sensações” que a palavra manifesta não se restringe ao imaginário coletivo<br />

15 BAUMAN, 2003.<br />

16 COMBLIN, 1970.<br />

17 BAUMAN, op cit., p. 7.<br />

111


ou ao chamado senso comum. Nas definições sociológicas, com todo o rigor epistemológico<br />

que lhes é peculiar, o termo em questão tende a expressar algo, digamos, aprazível.<br />

Ferdinand Tönnies (1855-1936), respeitado sociólogo alemão contemporâneo e amigo<br />

de Max Weber, é considerado o primeiro grande estudioso do assunto e, com certeza,<br />

o mais citado entre seus sucessores. Na sociologia tönnesiana, a comunidade (Gemeinschaft)<br />

é pensada sempre numa relação de oposição à sociedade (Gesellschaft), tendo a primeira<br />

um desenvolvimento natural, caracterizado por proximidade e intensionalidade; enquanto<br />

a segunda, de caráter artificial, é assinalada por refração e extensionalidade:<br />

112<br />

Em teoria, a sociedade (Gesellschaft) consiste em um grupo humano que<br />

vive e habita lado a lado de modo pacífico, como na comunidade (Gemeinschaft),<br />

mas, ao contrário desta, seus componentes não estão ligados<br />

organicamente, mas organicamente separados. Enquanto, na comunidade,<br />

os homens permanecem essencialmente unidos, a despeito de tudo que os<br />

separa, na sociedade eles estão separados, apesar de tudo que os une 18 .<br />

Assim, para Ferdinand Tönnies, o termo sociedade é adequadamente usado para situações<br />

em que as relações se dão de forma impessoal e mecânica, normalmente reguladas<br />

por leis que emanam do Estado e com o predomínio de um pensamento utilitarista e individualista.<br />

Por outro lado, o termo comunidade é apropriado para situações nas quais as<br />

relações tenham um cunho pessoal e orgânico, regidas pelos costumes e crenças, numa<br />

lógica em que o bem estar coletivo esteja sempre acima de interesses individuais; em outras<br />

palavras, a comunidade tönnesiana é o local onde cabem todas aquelas ‘boas sensações’<br />

supracitadas:<br />

Tudo o que é confiante, íntimo, que vive exclusivamente junto, é compreendido<br />

como a vida em comunidade. A sociedade é o que é público, é<br />

o mundo. […] a comunidade é a vida comum, verdadeira e durável; a sociedade<br />

é somente passageira e aparente. E, numa certa medida, pode-se<br />

compreender a comunidade como um organismo vivo, e a sociedade como<br />

um agregado mecânico e artificial 19 .<br />

Por analogia podemos associar o par comunidade/sociedade de Ferdinand Tönnies<br />

com os conceitos casa/rua tal como definidos por Roberto DaMatta 20 . Para esse antropólogo,<br />

a casa “demarca um espaço definitivamente amoroso onde a harmonia deve reinar sobre<br />

a confusão, a competição e a desordem”, é o lugar onde convivemos com “a nossa gen-<br />

18<br />

TÖNNIES, 1995, p. 252.<br />

19<br />

Idem, 1973, p. 97.<br />

20<br />

DaMATTA, 1984, p. 23-33.


te”, onde somos “únicos e insubstituíveis”, onde triunfam a honra, o respeito e o amor. Já a<br />

rua representa o espaço da disputa, “o mundo exterior que se mede pela ‘luta’, pela competição<br />

e pelo anonimato cruel de individualidades e individualismos”, é o perigoso espaço<br />

da insegurança, carente de “amor, consideração, respeito e amizade”. A casa de DaMatta,<br />

assim como a comunidade de Tönnies, representa o espaço da boa relação, da intimidade,<br />

onde comprometimento e respeito derivam dos tradicionais e bons costumes, ao passo que<br />

a rua e a sociedade representam a arena dos negócios, da concorrência, onde as relações<br />

são artificiais, racionalizadas e, porque não dizer, hostis.<br />

Mas, embora existam similitudes entre as distintas conceituações de Tönnies e Da-<br />

Matta, é importante dizer que esse antropólogo utiliza os termos casa e rua num sentido<br />

metafórico para designar espaços e formas de relações concretas e peculiares no Brasil,<br />

enquanto que aquele sociólogo emprega os conceitos de comunidade (Gemeinschaft) e<br />

sociedade (Gesellschaft) como tipos-ideais, não havendo, necessariamente, uma correspondência<br />

concreta no mundo real. Brand Arenari, inclusive, questiona a tradução literal<br />

dos termos alemães para o português, e sugere que a “Gemeinschaft seja entendida como a<br />

idealização e isolamento de padrões de comportamento que desfrutam de afinidades eletivas<br />

e que estão mais próximas à vida em comunidade, e o mesmo ocorre com a Gesellschaft<br />

em relação à sociedade” 21 .<br />

A Gemeinschaft tönnesiana, como tipo-ideal, não é exatamente uma forma especifica<br />

e estática de organização de pessoas em uma dada localidade geográfica, mas sim tipos<br />

de condutas e sentimentos, ou formas de sociabilidades, que norteiam as relações sociais.<br />

Assim, as relações entre membros de uma mesma família, teoricamente, seriam norteadas<br />

pelos preceitos de uma comunidade, o que não significa total ausência de padrões típicos<br />

da Gesellschaft; da mesma forma que, no espaço público da sociedade, as relações racionalizadas<br />

entre indivíduos podem apresentar atributos de uma Gemeinschaft, mesmo que não<br />

sejam predominantes. Isso quer dizer que, na dimensão do real, no plano concreto e material<br />

da vida das pessoas, não existe uma forma pura, correlata ao tipo ideal da Gemeinschaft<br />

de Ferdinand Tönnies. Como afirmou Zygmunt Bauman:<br />

21 ARENARI, 2007, p. 43<br />

113<br />

“comunidade é o tipo de mundo que não está, lamentavelmente, a nosso<br />

alcance – mas no qual gostaríamos de viver e esperamos vir a possuir”, [e<br />

mais do que isso, ela] “é nos dias de hoje outro nome do paraíso perdido


114<br />

– mas a que esperamos ansiosamente retornar, e assim buscamos febrilmente<br />

os caminhos que podem levar-nos até lá” 22<br />

Muito provavelmente, os clérigos, teólogos e agentes especializados da Igreja Católica<br />

que planejaram a revitalização das paróquias a partir da formação de comunidades de<br />

base não estavam preocupados com a definição sociológica do conceito de comunidade.<br />

Mas, com certeza, essas ‘pequenas células’ idealizadas estavam revestidas de todas as ‘boas<br />

sensações’ que a palavra comunidade carrega. O modelo de inspiração não era uma Gemeinschaft<br />

e sim a comunidade bíblica dos cristãos nos Atos dos Apóstolos – embora ambas<br />

tenham semelhante caráter romântico e utópico.<br />

Para José Comblin, religioso atento às discussões sociológicas, o principal substrato<br />

da comunidade é o grupo, e por isso esse seria um conceito mais adequado àquele modelo<br />

de organização de base preconizado pela hierarquia católica: “um grupo é uma coletividade<br />

identificável, estruturada, contínua de pessoas sociais que desempenham papéis recíprocos<br />

conforme normas sociais, interesses e valores comuns na procura de fins comuns” 23 . Nesta<br />

definição, um grupo autêntico e bem constituído, teoricamente, teria maior correspondência<br />

com a Gemeinschaft do que com a Gesellschaft.<br />

Os grupos sociais podem ser classificados como primários ou secundários, dependendo<br />

do tipo de relações sociais desencadeadas. Quanto mais personificadas forem as<br />

ações dos indivíduos no grupo, mais primário ele seria, ou seja: nessa classificação as relações<br />

entre os sujeitos se constroem e se sustentam no âmbito pessoal, “o que está implicado<br />

na relação responde a múltiplos aspectos da personalidade do outro”, e a “resposta a<br />

uma pessoa determinada não é transferível a outros sujeitos” 24 . Nos grupos secundários, ao<br />

contrário, as relações são relativamente impessoais e a unidade entre os sujeitos se dá menos<br />

por laços de proximidade e familiaridade do que por algum tipo institucionalizado de<br />

normas, regulamentos e/ou leis.<br />

No início dos anos setenta Comblin defendia a ideia de que o movimento comunitário<br />

na Igreja Católica havia se realizado “quase que exclusivamente nas associações constituídas<br />

fora dos quadros paroquiais”, e eventualmente atingia “as pequenas minorias de<br />

militantes sem atingir as maiorias de leigos”. A palavra comunidade, por assim dizer, “acabou<br />

designando justamente esses pequenos grupos de tipo bem específico, como se eles<br />

22<br />

BAUMAN, 2003, p. 9.<br />

23<br />

COMBLIN, 1970, p. 574.<br />

24<br />

Ibidem, p. 575.


fossem a única possibilidade de realização concreta do imenso movimento de aspiração<br />

comunitária” 25 . No universo paroquial, uma experiência concreta de vida comunitária – ou<br />

vivência em grupo – limitava-se na maior parte das vezes a pequenos grupos de lideranças,<br />

e as preconizadas comunidades de bases significavam, no final da década de 60 e início da<br />

década de 70, um misto de esperança e receio: de um lado a expectativa de avanços na dimensão<br />

comunitária da Igreja Católica, do outro a possibilidade de resumir-se em grupo de<br />

militantes:<br />

115<br />

O movimento das comunidades de base oferece finalmente perspectivas<br />

novas. Mas a própria ideia de comunidade de base ainda é indeterminada.<br />

Não se sabe ainda se a comunidade de base não será finalmente canalizada<br />

para o tipo de grupo de militantes. A comunidade de base é a nova<br />

formulação desse movimento comunitário cuja afirmação se renova constantemente<br />

neste século XX 26 .<br />

Dois desafios foram diagnosticados: 1) fazer com que o movimento comunitário<br />

não seja apenas o movimento de uma “elite paroquial” – militantes, lideranças, coordenadores,<br />

administradores, ministros; 2) relacionar os grupos de elites com o conjunto dos<br />

leigos – ou povo de Deus, para usarmos uma expressão conciliar. O movimento das comunidades<br />

de base era uma alternativa possível – talvez a principal delas naquele contexto –<br />

para superar esses desafios desde que, na avaliação de José Comblin, tivessem “clara consciência<br />

dos seus objetivos e plena liberdade para se desenvolver de acordo com as verdadeiras<br />

necessidades e aspirações dos homens modernos” 27 .<br />

No entanto, a expressão plena liberdade não é das mais adequadas numa instituição<br />

hierarquizada como a Igreja Católica Romana. É verdade que os fiéis – ou pelo menos um<br />

grupo específico deles – ganharam mais autonomia no catolicismo institucional, apesar de<br />

não fazerem parte da hierarquia eclesiástica. O Concílio Vaticano II determinou que a Igreja<br />

é o povo de Deus, estimulando, assim, maior participação de seus fiéis. Todavia, numa<br />

perspectiva institucional, o leigo não faz parte da Igreja: paradoxalmente, o leigo está na<br />

Igreja mas não é a Igreja; por mais que se tenham aumentado suas atribuições na história<br />

recente do catolicismo, seu poder de decisão e interferência dentro da Igreja Instituição é<br />

muito limitado. O termo fiel é normalmente utilizado para se referir aos que professam<br />

25 Ibidem, p. 579.<br />

26 Ibidem, p. 580.<br />

27 Ibidem, p. 580. O grifo é meu.


uma religião; significa aquele que tem fé, perseverante, constante; mas também significa<br />

aquele que cumpre, que segue, que obedece.<br />

A autonomia – ou plena liberdade – dos leigos na Igreja deve ser analisada com<br />

cautela. Seus limites, em geral, se encerram nos próprios grupos de base. Na hierarquia da<br />

estrutura organizacional católica – CNBB, Regionais, (arqui)dioceses, paróquias, grupos<br />

de base – a liberdade dos fiéis se restringe, na maioria absoluta das vezes, aos seus pequenos<br />

grupos de atuação. É evidente que um ou outro leigo – aqueles mais próximos e de<br />

confiança dos clérigos – desfrutam de maior autonomia dentro da instituição, mas o povo<br />

de Deus, de forma geral, é dependente (submisso?) dos padres e bispos que determinam os<br />

limites da autonomia de seus fiéis e o quão ela é conveniente.<br />

A Igreja Católica não é uma instituição liberal e/ou democrática 28 , e nunca se dispôs<br />

realmente a ser; considerá-la como tal seria um erro analítico. Por mais que a ‘bandeira’<br />

em defesa da autonomia dos leigos tenha sido encampada pelos adeptos da Teologia da<br />

Libertação – ou, pelo menos, por uma parte deles – essa nunca foi uma tônica oficial no<br />

catolicismo. Além disso, mesmo entre os grupos ligados à TdL e defensores dessa pseudo<br />

autonomia, o “autoritarismo” eclesiástico esteve constantemente presente. Theije, por exemplo,<br />

detectou em sua pesquisa que as reuniões e assembléias promovidas pelos ‘liberacionistas’,<br />

na maioria das vezes, eram mera formalidade para dar sustentáculo ao que já<br />

estava previamente decidido pelas lideranças 29 . Os grupos de base deveriam ser células que<br />

dessem maior vitalidade às paróquias, mas sua autonomia sempre foi limitada. Quando<br />

deram sinais de alcançá-la não faltaram reações de boa parte da hierarquia para cerceá-los.<br />

Comunidades (Grupos) de Base e Comunidades Eclesiais de Base<br />

A paróquia, além de seu aparato administrativo, é também um espaço simbólico de<br />

influência católica em um determinado território que, inevitavelmente, possui uma variedade<br />

de fiéis de diferentes classes, estamentos e partidos. Por isso, organizar nela grupos<br />

de base que possam potencializar o movimento comunitário na Igreja pressupõe, pelo me-<br />

28 Uma crítica – severa por sinal – ao caráter institucional e impositivo da Igreja Católica foi desenvolvida<br />

por Leonardo Boff em seu livro Igreja: carisma e poder (2005).<br />

29 THEIJE, 2002.<br />

116


nos em teoria, formar grupos diferentes entre si na proporção das especificidades, e identidades,<br />

dos leigos. Soma-se a isso, dialeticamente, o tipo de campanha empregada e os modelos<br />

idealizados pelos clérigos e agentes de pastoral.<br />

Desta forma, numa paróquia onde o vigário seja, digamos, mais afeito à religiosidade<br />

carismática, a tendência é que ele crie laços de afinidade e confiabilidade com aquelas<br />

pessoas que comunguem, em alguma medida, de suas concepções e visões de mundo e,<br />

mais do que isso, se esse pároco colocar-se a serviço do movimento comunitário em questão,<br />

empenhando-se por organizar sua paróquia em grupos de base, é bem provável que a<br />

campanha adotada incentive a formação dos chamados grupos de orações. Mas isso não<br />

significa que nessa hipotética paróquia todos os grupos de base desenvolvam características<br />

carismáticas. Alguns podem, por questões internas ou externas, assumirem, por exemplo,<br />

o perfil proposto pela Teologia da Libertação, e o grau de incentivo ou repressão que<br />

sofreriam varia em cada situação específica. A homogeneidade não é uma característica do<br />

catolicismo. Diante de uma realidade heterogênea, uma paróquia organizada em pequenas<br />

células deve(ria) proporcionar espaços que contemplem – ou pelo menos comportem –<br />

suas diversidades.<br />

Se os grupos sociais, como sugere Comblin, se formam em função de “papéis recíprocos<br />

conforme normas sociais, interesses e valores comuns na procura de fins comuns”<br />

30 , podemos então deduzir que apostolados, conferências, associações, pastorais – da<br />

juventude, da família, da criança, do menor, etc. – podem sim se constituir como grupos de<br />

base de uma paróquia. O objetivo específico de cada uma dessas instâncias seria o elemento<br />

primordial para reunir um conjunto de pessoas com afinidades (vocações) comuns para<br />

determinadas funções. Uma vez reunidos, cada um desses grupos teria, em potencial, as<br />

condições necessárias para se tornarem uma “comunidade” e desempenhar a almejada função<br />

de dinamizar a paróquia.<br />

O cenário se torna ainda mais complexo quando os grupos – ou comunidades de base<br />

– estão circunscritos em uma determinada localidade, seja ela um bairro, uma vila, um<br />

povoado, na zona rural ou urbana. O elemento aglutinador estaria condicionado à proximidade<br />

geográfica e não necessariamente a um objetivo específico, um interesse comum ou<br />

uma finalidade claramente definida. Se esses últimos fatores mencionados não existirem,<br />

um grupo de base simplesmente limitado a uma localidade geográfica – caso ele venha se<br />

constituir – entraria facilmente no rol dos “inclassificáveis”.<br />

30 COMBILN, 1970, p. 574.<br />

117


No planejamento pastoral da década de sessenta, as comunidades de base idealizadas<br />

não tinham as características adquiridas pelas Comunidades Eclesiais de Base – ou a<br />

elas atribuídas – nas décadas de setenta e oitenta. A pretensão de organizar os leigos em<br />

grupos não era inicialmente direcionada para a formação de núcleos politizados que pudessem<br />

militar na dimensão sócio-política da sociedade, esta seria talvez uma conseqüência. O<br />

objetivo primordial era fomentar entre os fiéis uma vivência comunitária norteada por<br />

princípios cristãos, coisa que a paróquia, em seu modelo tradicional, não conseguia proporcionar.<br />

Os leigos reunidos numa celebração eucarística ou participando de festas religiosas<br />

não se constituem como grupo, da mesma forma que a distribuição dos sacramentos,<br />

por si só, não forma comunidades. Daí a necessidade de formar grupos de base.<br />

Não obstante, o movimento comunitário, na prática, adquiriu características diferentes<br />

do modelo idealizado. As campanhas católicas para fomento de grupos de bases não<br />

aconteceram de forma linear. As diferentes concepções teológicas e ideológicas de seus<br />

agentes proporcionaram uma variedade de estratégias e objetivos, da mesma forma que as<br />

especificidades social, cultural e religiosa de cada localidade condicionaram as diversidades<br />

nas campanhas. O resultado desse movimento comunitário pode ser compreendido, em<br />

parte, por uma análise semântica: as comunidades de base idealizadas no planejamento<br />

pastoral dos anos sessenta passaram a ser conhecidas como Comunidades Eclesiais de Base.<br />

Na década de setenta, a imagem das CEBs na memória coletiva já estava atrelada à Teologia<br />

da Libertação, tornando-se sinônimo de grupos politicamente engajados. Com isso,<br />

os grupos de bases – ou comunidades de base – frutos do movimento comunitário que sucedeu<br />

o Concílio Vaticano II, quando conscientemente assumiam uma identidade diferente<br />

ou divergente das orientações teológicas da TdL, muitas vezes refutavam – ou lhes eram<br />

negado – o “rótulo” de CEBs. Como sugeriu Afonso Gregory, “nem sempre são Comunidades<br />

Eclesiais de Base aquelas que assim são chamadas, como também podem existir<br />

muitas experiências desse gênero sem que sejam conhecidas ou chamadas de Comunidades<br />

Eclesiais de Base” 31 .<br />

Três motivos são importantes para entendermos o caráter político adquirido pelas<br />

CEBs e sua eminente vinculação com a Teologia da Libertação na década de setenta: 1) a<br />

conjuntura sócio-política no Brasil, 2) a orientação teológica hegemônica na CNBB e 3) o<br />

tipo majoritário de literatura produzida sobre as CEBs.<br />

31 GREGORY apud TEIXEIRA, 1988, p. 345.<br />

118


O primeiro motivo destacado está intimamente relacionado às consequências dos<br />

chamados anos de chumbo. Com a Ditadura Política instaurada em 1964, os militares colocaram<br />

em prática a chamada Doutrina de Segurança Nacional, desencadeando uma repressiva<br />

ação denominada “Operação Limpeza” que, grosso modo, se resume na rígida repressão<br />

e expurgo de toda a forma de oposição ao Estado ditatorial – fosse ela declarada ou em<br />

potencial. Os poderes Legislativo e Judiciário ficaram submissos ao Executivo que suprimiu<br />

partidos políticos; censurou a imprensa, o teatro, a música e qualquer tipo de manifestações<br />

artísticas contrárias ao regime; desestabilizou movimentos sociais, estudantis e sindicais;<br />

exilou, torturou e assassinou inimigos políticos; nem mesmo a produção científica e<br />

intelectual escapou do crivo repressivo da ditadura: “manobras militares de busca e detenção<br />

foram conduzidas em universidades, sindicatos, ligas camponeses e nos muitos movimentos<br />

católicos de trabalhadores, camponeses e estudantes” 32 .<br />

As atrocidades cometidas pelo governo militar, principalmente depois de decretado<br />

o Ato Institucional nº5 33 , fez com que grande parcela da população brasileira, que inicialmente<br />

havia apoiado o golpe de 64, mudasse o posicionamento político, passando a encorpar<br />

as vozes, volta e meia silenciadas, de oposição ao regime ditatorial 34 . Todavia, estando<br />

os espaços tradicionais de articulações políticas (partidos, sindicatos, movimentos sociais,<br />

etc.) cerceados pelo governo, os quadros de base da Igreja Católica, principalmente as<br />

CEBs, tornaram-se, em muitas regiões, um importante espaço de organização sóciopolítica<br />

da população civil 35 .<br />

Faustino Teixeira apresenta duas definições de Comunidades Eclesiais de Base que,<br />

segundo ele, são as mais comuns: a primeira seria pequenos grupos de fiéis que se reúnem<br />

regularmente para refletir a palavra de Deus, como um grupo de base, uma célula eclesial<br />

menor (círculos bíblicos, clube de mães, grupos de reflexão, etc.); a segunda trata-se de um<br />

conjunto de grupos de uma paróquia, definidos por questões geográficas – bairros, povoa-<br />

32<br />

ALVES, 2005, p. 80.<br />

33<br />

Segundo Maria Helena Moreira Alves, “a consequência mais agravante do Ato Institucional nº5 foi talvez<br />

o caminho que ele abriu para a utilização descontrolada do Aparato Repressivo do Estado de Segurança Nacional.<br />

A este respeito foram cruciais as restrições impostas ao Judiciário e a abolição do habeas corpus para<br />

crimes políticos. […] O Estado de Segurança Nacional estava totalmente centralizado e isolado; o Estado<br />

corporificava-se no Executivo e a ele se circunscrevia. O AI5 deu origem a um Leviatã, antecipado pelo<br />

General Golbery do Couto e Silva em seus textos dos anos 50, um Estado hobbesiano que absorvia todo o<br />

poder.” ALVES, 2005, p. 162.<br />

34<br />

Sobre o apoio majoritário da sociedade civil aos militares no golpe de 1964, ver: AARÃO REIS FILHO,<br />

2005; CORDEIRO, 2009.<br />

35<br />

Cf.: PETRINI, 1984; OLIVERIA, 1979; LESBAUPIN, 2000.<br />

119


dos, assentamentos, etc. 36 . Mas um dos pontos de maior destaque nas definições de CEBs é<br />

a característica desses grupos em fazer uma reflexão dos textos bíblicos confrontando-os<br />

com a realidade cotidiana vivida pelos leigos 37 . Michel Löwy as define como pequenos<br />

grupos de leigos organizados nas paróquias, bairros, favelas, vilas e/ou comunidades rurais<br />

“que se reúnem para ler a bíblia e discuti-la à luz da sua própria existência” 38 . Para<br />

Regidor, é por causa dessa prática que as CEBs “constituíram o lugar de um processo de<br />

conscientização dos cristãos em face dos problemas sociais e eclesiais” 39 .<br />

Essa característica de interpretar a bíblia com base na realidade vivida pelos leigos<br />

fez delas um profícuo espaço de consolidação da Teologia da Libertação, que “tem como<br />

objetivo principal a libertação dos pobres e oprimidos face às mazelas do sistema<br />

capitalista neoliberal,” isso por ser “aquela que põe em confronto fé cristã e situação<br />

opressora” 40 . Marjo de Theije, de forma mais detalhada, define a TdL a partir de três<br />

pontos centrais 41 . O primeiro consiste na noção de que não se faz teologia separadamente<br />

dos contextos socioeconômicos e políticos que afligem a vida dos fiéis, isto significa que<br />

os pressupostos teológicos devem proceder da real conjuntura em que vive o povo de Deus.<br />

O segundo diz respeito à opção preferencial pelos pobres, entendendo que a desigualdade<br />

social gerada pelo capitalismo, que impõe uma situação de opressão aos pobres latinoamericanos,<br />

é algo construído historicamente pelo próprio homem e não pela vontade<br />

divina; assim, seria obrigação de todos, e principalmente da Igreja, romper as estruturas<br />

opressoras desse sistema em nome da “libertação dos oprimidos”. O terceiro ponto referese<br />

à salvação tão almejada pelos cristãos, que não seria um prêmio obtido após a morte,<br />

mas sim conquistada durante a vida terrena através de uma postura politicamente inspirada<br />

na humanidade de Cristo e refletida numa ação em defesa da vida em plenitude, em<br />

contraposição às agruras de um sistema opressor e excludente que afeta a vida das pessoas.<br />

É importante lembrar que, no Brasil, o Instituto Nacional de Pastoral da CNBB foi<br />

o principal núcleo de reflexão e sistematização da Teologia da Libertação 42 , que se tornou<br />

a principal corrente teológica na mais alta cúpula do catolicismo brasileiro nos anos seten-<br />

36<br />

TEIXEIRA, 1988, p. 305.<br />

37<br />

Cf.: MARINS, 1977; BETO, 1985; BARAGLIA, 1974; DUARTE, 1983, entre outros.<br />

38<br />

LÖWY, 1995, p. 46.<br />

39<br />

REGIDOR, In.: BOFF, 1996, p. 17.<br />

40<br />

BOFF, 1996. p 28.<br />

41<br />

THEIJE, 2002. p. 23.<br />

42<br />

Ver capítulo III.<br />

120


ta, o que justifica o segundo motivo das características politizadas das CEBs. A Conferência<br />

Nacional dos Bispos do Brasil, que apoiara o golpe militar em 1964, assumiu uma postura<br />

de oposição à ditadura tão logo os bispos se deram conta dos excessos cometidos pela<br />

repressão, dos assassinatos e torturas contra civis e, inclusive, membros do clero católico.<br />

Personalidades eminentes como Dom Helder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns, Dom<br />

Aloísio Lorscheider, Dom Pedro Casaldáliga, entre outros, se destacaram pela objeção ao<br />

governo militar, pelo incentivo às Comunidades Eclesiais de Base e pela proximidade com<br />

a TdL. O apoio da CNBB e de considerável parte do episcopado foi, com certeza, determinante<br />

para que muitas campanhas católicas de formação de CEBs se norteassem pela Teologia<br />

da Libertação.<br />

A década de setenta representa o momento de apogeu das Comunidades Eclesiais, e<br />

alguns estudiosos e/ou militantes defendem a tese de que o processo de multiplicação e<br />

amadurecimento dessas comunidades teria acontecido devido à influência da TdL e ao elaborado<br />

sistema de articulação nacional, que teve como objetivo fortalecer os laços entre as<br />

CEBs no Brasil, partilhar experiências, qualificar a militância política e definir planos de<br />

ações conjuntas 43 .<br />

Essa articulação nacional é entendida por alguns autores – principalmente os militantes<br />

– como benéfica à atuação política dos leigos católicos 44 . Todavia, em outras leituras<br />

essa mesma articulação é entendida como o momento crucial em que “a orientação das<br />

CEBs passa das mãos de seus promotores para aquelas de um grupo de ‘peritos’ em condições<br />

de dar, à ‘caminhada’, uma direção mais definida” 45 . Nessa perspectiva, o protagonismo<br />

dos leigos nas bases é colocado em xeque, uma vez que a (já contestada) autonomia<br />

dos fiéis é substituída por uma orientação que vem de cima, formulada pelos peritos – ou<br />

“intelectuais orgânicos” – que procuram “legitimar a manutenção do controle político por<br />

parte da hierarquia”, repetindo assim a “velha prática dos partidos políticos de esquerda,<br />

onde a cúpula de dirigentes fala em nome dos dirigidos” 46 .<br />

43 TEIXEIRA, 1988, p. 318-326. Os Encontros Intereclesiais das CEBs tornaram-se a principal referência<br />

dessa articulação nacional que proporcionou uma maior organicidade entre militantes Católicos ligados à<br />

TdL e potencializou as discussões políticas no meio eclesial, lançando, assim, as bases para a criação, na<br />

década de oitenta, do chamado “Movimento Fé e Política”, classificado por Ivan Antônio de Almeida – de<br />

forma ácida e contundente, diga-se de passagem – como a Síntese de uma Tragédia. ALMEIDA, 2000.<br />

44 TEIXEIRA, 1988; LIMA, 1979.<br />

45 BARAGLIA, 1991, p. 404<br />

46 ALMEIDA, 2000, p. 125.<br />

121


Que as Comunidades Eclesiais de Base exerceram alguma influência na organização<br />

sócio-política no Brasil é algo pouco contestado, e aqui reside o terceiro motivo pelo<br />

qual essas comunidades ficaram marcadas por um perfil politizado. Majoritariamente, a<br />

literatura produzida nas décadas de setenta e oitenta sobre as CEBs direcionam seus holofotes<br />

para a oposição ao regime militar, a participação na política partidária, nos movimentos<br />

sociais, na organização da sociedade civil. Embora a maioria dos autores ressalve – de<br />

forma sucinta normalmente – que elas não surgiram de um processo homogêneo, muito<br />

menos seguiram um padrão unívoco, e que muitas delas sequer aderiram ao modelo de<br />

comunidades politicamente engajadas; o que frequentemente destacaram com detalhe e<br />

insistência são aquelas que aderiram às orientações teológicas da Libertação e, consequentemente,<br />

se tornaram politizadas e militantes.<br />

Nas duas últimas décadas, novas publicações sobre o fenômeno das CEBs têm apresentado<br />

conclusões diferentes 47 , pois o distanciamento temporal ajuda a subtrair as contingências<br />

e revelar elementos muitas vezes invisíveis aos olhos dos contemporâneos. A<br />

influência da Teologia da Libertação, a oposição ao regime militar, a participação política<br />

na redemocratização do país, tudo isso são questões que estão presentes na historiografia<br />

das CEBs. Mas, muito provavelmente, não aconteceram plenamente em todo o país, muito<br />

menos daquela forma um tanto quanto romantizada que sugere algumas análises de cunho<br />

militante tão comum na década de setenta, isto é, como um movimento que nasceu nas<br />

bases da Igreja, por iniciativa dos leigos autônomos e conscientes de sua situação de opressão,<br />

da qual lutaram para se libertar 48 .<br />

Essa ênfase demasiada no perfil político das Comunidades Eclesiais de Base em<br />

muito contribuiu para ofuscar outros modelos de comunidades de base que se desenvolveram<br />

na Igreja Católica brasileira e não tiveram o merecido destaque na literatura sobre a<br />

história recente do catolicismo no Brasil.<br />

47 BURDICK, 1998; THEIJE, 2002.<br />

48 BETO, 1985; BOFF, 1981.<br />

122


Missões inseridas e CEBs: a campanha redentorista para organização de base<br />

A formação de comunidades de base foi um dos objetivos centrais nas missões redentoristas<br />

da Província do Rio de Janeiro nos anos ulteriores à década de sessenta, mas as<br />

comunidades fomentadas por esses missionários em muito difere daquele perfil politizado<br />

e majoritariamente encontrado na literatura sobre as CEBs. A campanha para a organização<br />

de base da Igreja Católica, tanto na Ação Missionária quanto nas Missões Inseridas,<br />

resultou no surgimento de muitos grupos-comunidades nas várias localidades missionadas,<br />

mas sem aquela fisionomia política característica nas Comunidades Eclesiais de Base.<br />

Em novembro de 1969, março e julho de 1970, os confrades redentoristas realizaram<br />

uma das primeiras experiências com o método em três etapas da Ação Missionária,<br />

colocando-o em prática na paróquia de Nossa Senhora da Conceição, em Porto Firme-MG.<br />

Pioneira na formação de CEBs na Arquidiocese de Mariana, esta paróquia é uma das poucas<br />

localidades que ainda na década de setenta aderiu ao movimento comunitário proposto<br />

pela CNBB, num período em que, nas orientações do arcebispado de Dom Oscar de Oliveira<br />

(1960-1988), não havia um claro incentivo à formação de comunidades de base na Igreja<br />

marianense 49 . Nessa Arquidiocese, as paróquias que investiram nesse modelo de igreja o<br />

fizeram por iniciativas isoladas de párocos e leigos ou por influência de agentes externos à<br />

igreja marianense 50 , como aconteceu em Porto Firme.<br />

O então pároco padre Theóphilo Lopes de Andrade é considerado um dos precursores<br />

do clero de Mariana no trabalho com Comunidades Eclesiais de Base. Já falecido, deixou<br />

viva na memória de seus paroquianos e colegas de sacerdócio a imagem de um homem<br />

circunspecto, atento às inovações conciliares e muito dedicado à organização de base nas<br />

paróquias onde exerceu seu ministério. Em Porto Firme, no ano de 1970, padre Theóphilo<br />

relatou no livro de tombo o trabalho desenvolvido com as CEBs, e os principais créditos<br />

foram atribuídos aos redentoristas:<br />

49 “Na memória das Comunidades Eclesiais de Base da Arquidiocese de Mariana, a hierarquia aparece como<br />

uma presença contraditória. Quando o ‘trem’ parece ter entrado nas trilhas, ‘força ocultas’ atropelam todo o<br />

processo. Padre Theóphilo se destaca como o grande incentivador de uma Igreja popular mesmo antes de se<br />

falar em CEBs em nossa Arquidiocese. De acordo com Geraldo Botelho, em 1968 eles já começaram a formar<br />

comunidades em Porto Firme. Mas, em pouco tempo, Padre Theóphilo saiu. Até hoje não se entende o<br />

porquê. O Pastoral, ano VII, nº 88, outubro de 1998, p. 10. Apud SCHIAVO, 2007.<br />

50 Cf. SCHIAVO, 2007; OLIVEIRA, 2005.<br />

123


124<br />

Ponto alto da vida pastoral da paróquia foram as missões redentoristas<br />

pregadas pelos padres Geraldo Lima, Padre Assis, Padre José Bosco e<br />

Padre Ribeiro. Conscientizaram profundamente o povo dentro do genuíno<br />

espírito do Vaticano II. […] Com a conscientização recalcada das missões<br />

sobre base comunitária, vivência fraternal de Igreja, abriu-se em<br />

Porto Firme largo campo para o funcionamento das Comunidades Eclesiais<br />

de Base. Sente-se hoje um clima de alegria fraternal, de vivência, de<br />

caridade e movimentação social, máxime das comunidades rurais, ao lado<br />

do desenvolvimento espiritual, litúrgico e promocional das mesmas comunidades<br />

51 .<br />

Entendemos o livro de tombo como uma espécie de caderno de memórias de uma<br />

paróquia, as quais chegam até nós pelo crivo de cada pároco, pois são eles que, a partir de<br />

suas prioridades enquanto administradores paroquiais, elegem os acontecimentos merecedores<br />

de relatos. No caso do padre Theóphilo, seus registros variam entre as influências do<br />

Concílio Vaticano II em sua paróquia, a importância das missões redentoristas na formação<br />

das CEBs e a participação das comunidades nas atividades paroquiais. Na festa da padroeira<br />

Nossa Senhora da Conceição, realizada no dia oito de dezembro de 1970, o ponto destacado<br />

como “singular” foi justamente a participação das comunidades:<br />

A festa da padroeira teve o sabor singular da influência das comunidades<br />

urbanas e rurais. Cada qual fazia a reza com seu pessoal próprio, orações<br />

comunitárias espontâneas, coroadeiras próprias e após o ato religioso um<br />

show por pessoas da comunidade responsável da reza (sic) 52 .<br />

É difícil mensurar a dimensão social e política das Comunidades Eclesiais de Base<br />

em Porto Firme, mas, na memória dos paroquianos e nos registros documentais, é no âmbito<br />

religioso que elas se destacam. Os redentoristas são lembrados como grandes incentivadores<br />

das CEBs, mas não há indícios de que tenham incentivado a participação política dos<br />

leigos, não era essa a tônica da campanha. Uma militância política das CEBs em Porto<br />

Firme só acontecerá a partir do final da década de oitenta, quando os protagonistas não<br />

eram mais aqueles fiéis missionados pelos redentoristas e sim uma nova geração de leigos<br />

influenciada pelo Movimento da Boa Nova, o MOBON 53 .<br />

51<br />

Livro de Tombo da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, Porto Firme-MG. p. 87.<br />

52<br />

Livro de Tombo da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, Porto Firme. p. 87.<br />

53<br />

O MOBON é um movimento iniciado por missionários Sacramentinos da Diocese de Caratinga-MG na<br />

década de setenta. Com forte inspiração da Teologia da Libertação, esses missionários dedicaram-se à formação<br />

de CEBs e à militância política (mais propriamente petista). Na segunda metade da década de 1980, vários<br />

leigos portofirmenses participaram ativamente dos encontros do MOBON, reproduzindo-os tanto em<br />

Porto Firme quanto nas localidades vizinhas. Ver SCHIAVO, 2007; OLIVEIRA, 2006.


No caso da Ação Missionária, a perseverança dos grupos-comunidades fomentados<br />

pelos redentoristas dependia, em grande medida, da atuação e incentivo do pároco local no<br />

período pós-missão, como em Porto Firme. Com as Missões Inseridas, a organização de<br />

base dos leigos passou a ser acompanhada pelos missionários por um período maior de<br />

tempo, num trabalho mais consistente e duradouro. Mas, assim como nas missões em três<br />

etapas, o modelo de inserção também não se configura como uma campanha para organização<br />

de militância político-social dos leigos. E isso não significa que as questões sociais e<br />

políticas estivessem de todo ausentes na pauta da campanha, a questão é como elas são<br />

apresentadas pelos missionários e recebidas pelos missionados.<br />

Nos relatórios sobre as Missões Inseridas, como não poderia deixar de ser, o que<br />

mais se comenta e avalia são as comunidades de base. Diferente daqueles produzidos sobre<br />

as Santas Missões – no qual os fiéis, completamente anônimos, aparecem como número<br />

nas estatísticas de distribuição dos sacramentos –, nesses relatórios sobre o modelo de inserção<br />

os leigos ganham nomes e vozes. Atendendo ao pedido dos confrades da Província<br />

54 , os missionários produziram uma coletânea de textos sobre a experiência em curso,<br />

com suas opiniões e impressões, mas também com a avaliação feita pelas próprias comunidades,<br />

através de reuniões, plenárias, assembléias e questionários 55 .<br />

Do ponto de vista institucional – que os missionários representam – a questão mais<br />

destacada em relação ao método de missão é exatamente a ausência de um “esquema pronto”,<br />

de um modelo que seja introduzido de “fora para dentro” sem levar em conta a realidade<br />

local 56 . Isso significa que o método de trabalho, o tipo de acompanhamento e as propostas<br />

sugeridas variam de comunidade a comunidade, dependendo do perfil de cada uma<br />

e do grau de envolvimento dos leigos. O cerne dessa campanha era querigmático, com o<br />

intuito de imputar às CEBs uma identidade católica, o que pressupõe participação na vida<br />

sacramental da paróquia, envolvimento com as pastorais da Igreja, obediência aos mandamentos,<br />

devoção à Virgem Maria e temor ao Deus Cristão. As questões sociais e políticas<br />

54 “Gostaria que a Equipe Missionária pusesse por escrito o programa estrutural da suscitação de CEBs (fases,<br />

etapas, formação de lideranças, tempos, prazos, com o método pastoral respectivo). Uma clareza objetivada<br />

do grupo facilitaria uma avaliação-revisão crítica do modelo, em vista ao aperfeiçoamento”. APRJ.<br />

Dossiê Missões. 1989, p. 2. Fundo 01, D Missões, cx 04. p. 4.<br />

55 Os missionários elaboravam questionários diversos para que fossem respondidos pelas comunidades. As<br />

perguntas são relacionadas aos trabalhos comunitários, todas de caráter avaliativo e abordando temas de<br />

ordem organizacional, religiosa, social e política.<br />

56 “O que é básico no sistema é exatamente não chegar com esquema pronto, mas auscultar a realidade, ouvir<br />

o povo, e só então ir fazendo propostas, com vistas a despertar em cada um, uma tomada de consciência de<br />

Igreja”. APRJ.Trabalho Missionário – Província do Rio de Janeiro(vol. I), 1981. Fundo 01, D Missões, cx<br />

04. p. 7. (nas próximas citações abreviaremos esse documento para Trabalho Missionário, volume e página).<br />

125


seriam secundárias na missão, ou melhor, seriam consequências ‘naturais’ da vivência comunitária.<br />

126<br />

E, interessante que essa tomada de consciência, que começa por libertar a<br />

pessoa no religioso, inevitavelmente, por força da própria dinâmica do<br />

trabalho, levará o Cristão, a tempo e a hora, a questionar o social e o político<br />

que não estiverem em conformidade com o Evangelho de Jesus Cristo.<br />

Atuação esta que jamais será marcada pelo velho ranço do partidarismo<br />

divisionista, do qual não consegue se libertar aquele que não se exorcizou<br />

de tudo o que constitui ameaça a seu ser e agir cristãos, e, ao invés<br />

de estabelecer o paralelo entre a realidade e as normas evangélicas, só<br />

conhece o paralelo entre a realidade e os próprios interesses ou interesses<br />

de um pequeno grupo de privilegiados 57<br />

Na avaliação dos missionários, havia, nas comunidades, uma “conscientização política<br />

de alguns” e uma “passividade política da maioria” 58 ; e a própria atuação desses confrades,<br />

no âmbito sócio-político, é muitas vezes entendida por eles mesmos como deficitária.<br />

Sobre as Missões Inseridas em Timóteo, por exemplo, o trabalho com os operários<br />

deixou algumas lacunas: “principalmente consideramos falho no sistema não ter contemplado<br />

com uma Pastoral adequada e especial o mundo operário que caracteriza nossa Diocese<br />

[de Itabira-Coronel Fabriciano] e, muito especificamente, esse nosso Vale do Aço” 59 .<br />

A conscientização política era uma das preocupações 60 , da mesma forma que também se<br />

preocupavam com a chamada “politicagem”:<br />

Numa comunidade necessariamente estará presente a política, mas nunca<br />

deveria estar a politicagem. Não existe um departamento que se chama<br />

política, outro que se chama religião. Não se pode desligar vida e religião.<br />

A religião perpassa toda a vida da gente, em todos os setores. Mas um<br />

problema sério para a vida da comunidade é o problema político. Política<br />

é ação daqueles que, representando o povo na administração da coisa pública,<br />

se empenham para o bem estar deste mesmo povo. Politicagem é<br />

ação daqueles que se aproveitam do povo, para se enriquecerem ou pro-<br />

57<br />

Trabalho Missionário, vol. I, p.9. (grifos do original). “Vivemos um momento de tensão: de um lado precisamos<br />

valorizar a comunidade, o esforço de alguns principalmente os dirigentes. Mas de outro lado precisamos<br />

ser compreensivos com aqueles que ainda não fizeram a caminhada que alguns já fizeram, e que vivem<br />

numa situação humana (financeira, moral, familiar, social, etc) muito difícil. Além disso, só uma comunidade<br />

bastante amadurecida, bastante consciente, tem condições para maiores exigências, porque tem condições e<br />

meios para dar acompanhamento e ajuda”. Trabalho Missionário, vol. II, p. 30.<br />

58<br />

Trabalho Missionário, vol. I, p. 5.<br />

59<br />

APRJ.Trabalho Missionário – Província do Rio de Janeiro(vol.I), 1981. Fundo 01, D Missões, cx 04. p. 9.<br />

60<br />

“É necessário criar interesse pela política: municipal, estadual, nacional, internacional. Porque os problemas<br />

do povo não vêm só da administração local, mas também da política estadual, nacional e internacional.<br />

Necessário também um diálogo franco, desarmado sobre a política. O amor deve superar nossas diferenças”.<br />

Trabalho Missionário, vol. II, p. 22.


127<br />

tegerem seu grupo político, sua família, ou aqueles que os ajudam a ficar<br />

mandando 61 .<br />

Não havia, nas Missões Inseridas, uma orientação político-partidária ou uma vinculação<br />

a algum movimento social institucionalizado. No mesmo contexto em que adeptos da<br />

Teologia da Libertação organizavam os Encontros Intereclesiais 62 e as CEBs – pelo menos<br />

na literatura – assumiam cada vez mais a alcunha de grupos políticos (ou politizados), os<br />

redentoristas criticavam o que chamam de “politicagem” e lançavam mão de uma campanha<br />

querigmática, de valorização da fé cristã e dos mandamentos da Igreja, com o discurso<br />

de respeitar as especificidades locais:<br />

procura-se maior nucleação possível, tendo em vista maior participação,<br />

maior responsabilidade, maior conscientização. Dentro desse critério, cada<br />

comunidade assume vida própria, caminhando à medida de suas possibilidades.<br />

Devem ser respeitadas as etapas do desenvolvimento, lento,<br />

com altos e baixos. Para dar tempo das comunidades descobrirem, sem<br />

imposição, sem cópias artificiais 63 .<br />

As comunidades que receberam as avaliações mais positivas são aquelas que demonstram<br />

boa participação dos leigos sem a presença do sacerdote. Esse era um dos objetivos<br />

da missão, e as técnicas adotadas eram variadas, algumas um tanto quanto inusitadas,<br />

como no caso de Belo Oriente:<br />

algumas comunidades ficaram meses, até um ano, sem a presença do padre,<br />

sem a celebração eucarística. Foi um teste. Em nenhuma houve decadência<br />

comunitária; pelo contrário houve crescimento, amadurecimento.<br />

Sentiram, mas se viraram. Foram amparadas pelo clima geral comunitário<br />

que os cerca 64 .<br />

As paróquias que receberam as Missões Inseridas da Província do Rio de Janeiro<br />

estão na periferia de centros urbanos como Timóteo, Vitória e Cariacica; ou nas regiões<br />

interioranas, bucólicas por assim dizer, como Galiléia, Grão Mongol, Conceição do Castelo,<br />

Rio Pardo de Minas e todas as demais. E nos relatos produzidos pelas comunidades<br />

“suscitadas” pelos redentoristas, a ênfase recai sobre fatores religiosos, sobre a participação<br />

comunitária nas atividades paroquiais, sobre os estudos bíblicos, os grupos de reflexão,<br />

61 Trabalho Missionário, vol. II, p. 21.<br />

62 Os encontros Intereclesiais das CEBs são eventos de caráter nacional organizados por membros do clero e<br />

agentes de pastoral, com o objetivo de criar uma maior articulação entre as CEBs no Brasil, partilhar experiências,<br />

qualificar a militância política e definir planos de ações conjuntas. Cf. TEIXEIRA, 1988, p. 318-326.<br />

63 Trabalho Missionário, vol. III, p. 22.<br />

64 Trabalho Missionário, vol. II, p 9.


a catequese e as pastorais, principalmente da juventude, da família e do dízimo. As questões<br />

de ordem social, quando aparecem nos registros, se referem a fatos localizados como a<br />

realização de mutirões, o cultivo de hortas comunitárias ou algum tipo de ação assistencialista<br />

e campanhas de donativos. As questões políticas são geralmente relatadas quando se<br />

tornam entraves para a organização da comunidade:<br />

128<br />

No tempo das eleições nossa comunidade piora, pois uns são da ARENA<br />

e outros do MDB; há discussões na rua e nos botequins; até ameaças há;<br />

uns se afastam, quando o dirigente é da ARENA, outros quando o dirigente<br />

é do MDB. Passada a época da política, as coisas voltam às boas<br />

em nossa comunidade (sic) 65 .<br />

No que se refere à conduta dos membros das comunidades – conforme percebemos<br />

nos relatórios em que elas se auto-avaliam – além das tradicionais e corriqueiras brigas de<br />

famílias e vizinhos, o que mais se questiona é a conduta cristã do leigo, ou melhor, a conduta<br />

católica: assiduidade nas celebrações e cultos, participação nos grupos de reflexão e<br />

estudo bíblico, empenho nos trabalhos pastorais, nos grupos de orações, etc. A postura dos<br />

leigos no campo social e político seria um mero reflexo de sua participação nas comunidades<br />

de base, e uma possível conduta “irregular”, do ponto de vista ético e moral, acaba<br />

sendo justificada pela (não) participação da vida comunitária.<br />

Todavia, se o perfil das Comunidades Eclesiais de Base – pelo menos em teoria – é<br />

definido pela própria comunidade de acordo com as especificidades locais, então esse perfil<br />

muda na mesma proporção em que se altera a conjuntura social, política, econômica,<br />

cultural e religiosa na vida dos leigos. Além disso, ao término das missões reacende-se a<br />

antiga discussão sobre a perseverança do trabalho dos missionários, que passa a depender –<br />

e muito – da postura adotada pelo ‘novo’ pároco. Numa instituição hierarquizada como a<br />

Igreja Católica, o corpo eclesiástico desempenha um papel fundamental, e as concepções<br />

teológicas, eclesiológicas e ideológicas dos padres são decisivas numa paróquia. São eles<br />

quem define as prioridades, com poderes de potencializar aquilo que considerarem fundamental<br />

e reprimir o que acharem inconveniente ou desnecessário.<br />

As Missões Inseridas em Belo Oriente duraram sete anos (1975-1982) e deixaram,<br />

na avaliação dos missionários, um saldo positivo para a paróquia Nossa Senhora da Piedade<br />

66 . Mas, depois da saída dos redentoristas, as Comunidades de Base ali formadas viven-<br />

65 Trabalho Missionário, vol. II, p. 26.<br />

66 Nos relatórios sobre as Missões Inseridas, a de Belo Oriente é a mais detalhada de todas. Entre erros e<br />

acertos, os missionários avaliaram positivamente os resultados desse trabalho. Durante essa pesquisa, visitei


ciaram um longo período de decadência. A linha pastoral adotada pelo padre sucessor dos<br />

missionários se difere da campanha empregada nas missões, e a falta de apoio ao modelo<br />

de Comunidades de Base promoveu uma desarticulação dos grupos leigos. Quando perguntamos<br />

a uma entrevistada sobre as CEBs de Belo Oriente, a resposta veio de forma irônica:<br />

129<br />

CEBs? O que é CEBs? A gente nem sabe mais o que é isso. Depois que<br />

os redentoristas foram embora as CEBs foram enfraquecendo até acabar.<br />

Muita coisa mudou! O nosso padre [pároco sucessor dos missionários]<br />

acha que tudo tem que ser do jeito dele, e como ele não gosta das CEBs,<br />

não dá apoio, o povo vai desanimando até que acaba tudo 67 .<br />

Entre os leigos mais velhos de Belo Oriente existe um grande saudosismo do tempo<br />

em que os redentoristas estiveram na paróquia. É claro que, quase três décadas depois, essa<br />

memória passou por um longo processo de ressignificação, e uma considerável insatisfação<br />

com o paroquiato atual acaba por supervalorizar o passado. A comparação entre o ‘antes’ e<br />

o ‘agora’ é algo inevitável, e, nas lembranças dos belo-orientinos, o período em que os<br />

missionários estiveram na paróquia representa o tempo das comunidades de base, dos grupos<br />

de reflexão e dos trabalhos coletivos; um tempo que não existe mais, alterado pela orientação<br />

pastoral de um paroquiato que não colocou as CEBs entre suas prioridades. Nas<br />

palavras do missionário padre Jésus Ferreira de Assis:<br />

As comunidades vão sendo influenciadas pela Igreja atual. As consequências<br />

são as do tempo. Os meninos que eu batizei em Belo Oriente,<br />

por exemplo, já estão com trinta anos, os jovens já estão casados. Então,<br />

se a Igreja avança, eles avançam juntos, se ela vai pra trás, eles vão também<br />

68 .<br />

Na memória das “CEBs redentoristas” o que se preservou foi muito menos uma fisionomia<br />

política do que sua identidade católica. Mesmo utilizando oficialmente a nomenclatura<br />

‘Comunidades Eclesiais de Base’ e fazendo referências à Teologia da Libertação e<br />

essa cidade, conversei com vários leigos, gravei algumas entrevistas, mas não tive acesso ao livro de tombo.<br />

Mesmo tendo agendado previamente minha visita, o padre Luiz Carlos Macedo não quis conversar pessoalmente<br />

comigo, e, por intermédio da secretária paroquial, disse que não seria possível consultar o livro de<br />

tombo porque contém informações confidenciais que, se viessem a público, poderia prejudicar seu trabalho à<br />

frente da paróquia. Mesmo dizendo que só me interessava os registros deixados pelos redentoristas, não obtive<br />

sucesso. Através das conversas com os leigos, percebi que o paroquiato do padre Luiz atravessava um<br />

período de crise, sendo muito questionado por seus paroquianos. A presença de um pesquisador de fora,<br />

interessado na memória e história da paróquia Nossa Senhora da Piedade de Belo Oriente, não foi vista com<br />

bons olhos pelo vigário.<br />

67<br />

LIMA, Delmira Lagário de. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Belo Oriente-MG, 26 de<br />

outubro de 2009. Arquivo Digital (49 min.)<br />

68<br />

ASSIS, Pe. Jésus Ferreira. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Juiz de Fora-MG, 12 de<br />

maio de 2009. Arquivo Digital (96 min.)


à “opção preferencial pelos pobres”, a campanha desses missionários não seguiu a diretriz<br />

de organização nacional, sugerida e encampada por lideranças nos Intereclesiais, e muito<br />

menos assumiram a postura ‘politizante’ canonizada na literatura. Fato esse que nos reporta<br />

aos argumentos de Luiz Alberto de Souza, quando afirma que:<br />

130<br />

Falar de Teologia da Libertação no singular já é uma certa imprecisão<br />

porque não existe uma única Teologia da Libertação, porém várias vertentes,<br />

com teólogos bem diferentes entre si. Todos têm talvez uma coisa<br />

em comum: uma certa maneira de fazer teologia a partir das práticas pastorais,<br />

da vida, do concreto e a partir dos pobres. Mas fora disso a diversidade<br />

é enorme. Essa é, aliás, uma das riquezas da Teologia da Libertação.<br />

69<br />

Na definição de CEBs adotada pelos redentoristas da Província do Rio 70 estão presentes<br />

aqueles traços típicos de “pequenos grupos que se reúnem não só para rezar, mas<br />

também para refletir a Palavra de Deus na vida”. Elas são classificadas como “uma nova<br />

forma de ser Igreja” que brotou do grande evento histórico que foi o Concílio Vaticano II.<br />

A atuação das CEBs “nas pastorais sociais, movimentos populares, associações de bairros,<br />

grupos de mulheres, sindicatos e na política”, é classificada como “caridade libertadora”.<br />

Além disso, na visão dos missionários, o trabalho com as CEBs é difícil, e muitas vezes<br />

minoritário, porque elas “se negam a criar um cristianismo fácil, onde Deus é chamado<br />

para resolver os problemas (doenças, desemprego, bebedeira, briga de família) diretamente,<br />

de forma mágica, sem uma participação da pessoa”. Entretanto, essa participação não se<br />

resume à militância sócio-política; como nos relatou padre Jésus Ferreira de Assis: “se toda<br />

proposta é mudança social, então você deixa de fazer caridade pra lutar pela justiça, pra<br />

fazer política; aí tá morrendo gente! (risos)” 71 .<br />

Um exemplo que bem ilustra o teor da campanha redentorista para formação de<br />

CEBs aconteceu nas Missões Inseridas em Montanha-ES entre os anos de 1983-85. O contrato<br />

de pastoral firmado com a Diocese de São Mateus estipulava uma presença de quatro<br />

anos dos missionários nessa cidade, mas as atividades foram suspensas um ano antes do<br />

69<br />

SOUZA, 2004, p. 203.<br />

70<br />

APRJ. Comunidades Eclesiais de Base: traços que identificam as CEBs, s/d. (texto de circulação interna).<br />

Fundo 01, D Missões, cx 01.<br />

71<br />

ASSIS, Pe. Jésus Ferreira. Entrevista concedida a <strong>Reinaldo</strong> <strong>Azevedo</strong> <strong>Schiavo</strong>. Juiz de Fora-MG, 12 de<br />

maio de 2009. Arquivo Digital (96 min.)


prazo, e os motivos desse desfecho foram relatados num documento endereçado ao bispo<br />

diocesano 72 :<br />

131<br />

[…] não está clara a nossa presença missionária na Diocese de São Mateus.<br />

Isto porque o objetivo fundamental de nossa ação missionária é a<br />

implantação de pequenas comunidades; e em São Mateus as comunidades<br />

já estão implantadas. […] a Diocese já caminha numa pastoral de conjunto,<br />

valoriza os leigos, forma seus líderes etc. E nossa opção é por áreas<br />

onde isto está por fazer 73 .<br />

A saída dos redentoristas de Montanha não se deve apenas ao fato das CEBs já existir<br />

naquela região, mas também por causa do modelo de campanha adotado pela Diocese<br />

de São Mateus, a qual Montanha é circunscrita. Na avaliação dos missionários, aquelas<br />

comunidades de base foram “implantadas de cima pra baixo”, com “muito de autoridade”,<br />

deixando a estrutura religiosa “um tanto opressora”. Já estava previamente definido o modelo<br />

de igreja que as CEBs deveriam assumir, e as lideranças, “desligadas de sua base”,<br />

atuavam com autoridade e autoritarismo, sem “pluralismo”, sem levar em conta “aquilo<br />

que não [estava] na linha traçada” 74 . Em outras palavras, a campanha de formação de comunidades<br />

de base em Montanha se baseava no protagonismo e na autonomia dos leigos<br />

apenas no plano do discurso, porque, na prática, o modelo já estava definido e era imposto<br />

pelas autoridades eclesiásticas e/ou pastorais, camuflado no argumento de conscientização<br />

que pode ser aqui traduzido como: quem não aderir, é alienado!<br />

A campanha na Diocese de São Mateus era direcionada à formação de CEBs com<br />

aquele perfil ‘politizado’ que lhes foi atribuído pela produção literária das décadas de setenta<br />

e oitenta. Um modelo em que “há uma acentuação exorbitante do ‘social’ e do ‘político’”,<br />

e “as orações, as motivações, as mensagens terminam quase sempre no social” 75 .<br />

Um modelo com o qual os missionários da Província do Rio não concordavam:<br />

Isto acaba criando na cabeça de alguns um tipo de cristianismo apenas<br />

como força de desenvolvimento terreno; acaba alguém pensando que mudando<br />

o sistema, tudo será resolvido. Não está ficando sempre claro que<br />

toda a luta, necessária!, no terreno social está também em vistas de uma<br />

72 Esse documento foi escrito, em 1985, pela equipe missionária que trabalhava em Montanha. Posteriormente<br />

ele foi publicado em PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO. Memória Viva do Redentor: Missões. Juiz de<br />

Fora, 1998. p.113-118. (edição e circulação interna). Ao citarmos esse documento usaremos a abreviação:<br />

Missões Inseridas em Montanha; e o número da página corresponderá ao texto original de 1985, que está<br />

disponível nos anexos dessa dissertação.<br />

73 Missões Inseridas em Montanha, p. 01.<br />

74 Ibidem, p. 02.<br />

75 Ibidem, p. 03.


132<br />

libertação integral, transcendente. Não se coloca sempre a pastoral social<br />

na sua devida extensão de caridade, em suas dimensões de assistir, promover<br />

e transformar. […] Está-se correndo o perigo de “identificar” a<br />

Pastoral Social com os movimentos populares (sindicato, Sem Terra,<br />

etc.). As radicalizações […] tem impedido o povo de entender a verdadeira<br />

e necessária dimensão sócio-política da Igreja 76 .<br />

A imposição arbitrária de um modelo de CEBs focado nas dimensões social e política<br />

suscitou vários questionamentos por parte dos redentoristas. Quando se perguntaram:<br />

“o modelo é libertador?”, a resposta foi incisiva: “na intenção certamente!”, mas na prática<br />

sugere a ideia de que “eu oprimo, para libertar!”. E, complementando o raciocínio, os missionários<br />

levantam a seguinte questão (na qual a resposta encontra-se implícita): “há opressão<br />

de todos os lados: social, política, econômica, familiar... um modelo de Igreja não poderá<br />

ser também uma opressão? Mais uma contra o povo!” 77 .<br />

As divergências entre o modelo de campanha adotado na Diocese de São Mateus<br />

(com forte teor político) e aquele proposto pelos redentoristas (mais querigmático) foi determinante<br />

para que as Missões Inseridas de Montanha terminassem antes do tempo. Mais<br />

do que isso, as Comunidades Eclesiais de Base suscitadas pela campanha redentorista não<br />

se enquadram naquele modelo “politizado” e “militante”, comumente encontrado nos livros<br />

sobre CEBs. Esse é um dos motivos que explicam o fato dos redentoristas não serem<br />

citados na literatura sobre a história recente do catolicismo, mais especificamente, sobre a<br />

chamada “igreja dos pobres”.<br />

76 Ibidem, p. 03.<br />

77 Ibidem, p. 04.


T<br />

Considerações Finais<br />

odas as atividades pastorais da Congregação do Santíssimo Redentor são, de alguma<br />

forma, inspiradas e justificadas no carisma afonsiano, que orienta toda a formação<br />

sacerdotal dos redentoristas, fazendo deles os principais responsáveis por sua preservação,<br />

atualização e propagação. O legado de Afonso de Ligório está presente nos documentos da<br />

Congregação, nas suas Constituições e Regras, nos livros sobre a história desse instituto.<br />

Na maioria das fontes documentais que utilizamos nessa pesquisa encontramos referências<br />

ao fundador da congregação; todos os confrades entrevistados, sem exceção, enalteceram<br />

Santo Afonso em algum momento, citando seus exemplos do passado para respaldar as<br />

ações dos redentoristas no presente.<br />

Isso significa que qualquer estudo sobre a congregação fundada por Afonso de Ligório,<br />

que não leve em conta a forma como esse carisma é (re)interpretado pelos redentoristas,<br />

será sempre incompleto e insuficiente. No caso específico da Província do Rio de<br />

Janeiro que analisamos nessa pesquisa, as mudanças no método e no objetivo das missões<br />

foram, sem dúvida, influenciadas por elementos externos, específicos de uma conjuntura<br />

eclesiológica condicionada pelos efeitos do Concílio Vaticano II, mas também receberam<br />

influências do carisma de Santo Afonso.<br />

A campanha redentorista para formação de Comunidades Eclesiais de Base foi elaborada<br />

em sintonia com as orientações conciliares, com a pastoral de conjunto preconizada<br />

pela CNBB e com as reflexões da Teologia da Libertação. Contudo, o teor querigmático do<br />

carisma afonsiano prevaleceu e sobressaiu na prática. No mesmo período em que muitos<br />

militantes, teólogos, historiadores, sociólogos e cientistas políticos destacavam o perfil<br />

político das CEBs, com sua oposição à ditadura militar e sua participação na organização<br />

de movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos (principalmente o PT); os redentoristas<br />

estavam empenhados na formação de comunidades de base, com a finalidade, mesmo<br />

que implícita, de imputar a elas uma “identidade católica”, devocional e sacramental, motivando<br />

os leigos a adotar uma vida comunitária de oração, penitência, temor a Deus e obediência<br />

aos mandamentos da Igreja.<br />

133


O processo de reformulação do método missionário se demonstrou árduo e conturbado.<br />

A crise desencadeada na Província do Rio nos anos sessenta gerou um período de<br />

conflitos, instabilidade e incertezas; as Santas Missões foram colocadas em xeque, e a identidade<br />

missionária daqueles redentoristas encontrava-se ameaçada. Foi nesse conturbado<br />

contexto que surgiu e se intensificou a necessidade de mudança e inovação; uma situação<br />

inusitada que, para muitos confrades, carecia de novos métodos e estratégias para ser<br />

superada.<br />

O Concílio Vaticano II, enquanto evento histórico, inaugurou um novo tempo do<br />

catolicismo, convidando a Igreja a tomar consciência de que precisava promover mudanças<br />

para se adaptar ao mundo moderno 1 . Mas a recepção e implementação das ‘orientações’<br />

conciliares variam de acordo com a realidade e necessidade de cada localidade, cada Igreja<br />

particular e cada instituto religioso. O Concílio, enquanto uma aspiração a um novo modelo<br />

de Igreja, proclamou a necessidade de mudanças, mas não propôs nenhum modo concreto<br />

de realizá-las 2 . Coube aos teólogos, às conferências episcopais, aos bispos em suas dioceses,<br />

às ordens e congregações católicas interpretá-lo e, de acordo com suas respectivas<br />

realidades, definir como, o que e o quanto das inovações conciliares seriam implementadas.<br />

O Plano de Pastoral de Conjunto representa a primeira das iniciativas do episcopado<br />

brasileiro para “promover a renovação da Igreja no Brasil, conforme a imagem da Igreja<br />

do Vaticano II” 3 . Foi com base nesse plano que os redentoristas definiram a metodologia e<br />

os objetivos das novas missões, assimilando a proposta de organizar nas paróquias pequenas<br />

comunidades que pudessem vitalizá-las e renová-las.<br />

As tradicionais Santas Missões redentoristas, pregadas com base no método e temário<br />

de Santo Afonso, foram o principal instrumento de preservação e propagação do carisma<br />

afonsiano durante os quase três séculos de existência da Congregação do Santíssimo<br />

Redentor. A Ação Missionária e as Missões Inseridas representam um novo jeito de pregar<br />

missões que, agregando novas técnicas e objetivos, modifica o método tradicional. Mudase<br />

o formato, mas se preserva o carisma como a referência essencial, reinterpretando-o nas<br />

novas práticas. Na Ação Missionária pregada em três etapas, a grande inovação é os trabalhos<br />

com pequenos grupos, reuniões e plenárias, com o objetivo de suscitar comunidades<br />

de base; o caráter extraordinário das Santas Missões é mantido, assim como os grandes<br />

1 ALBERIGO, 2006, p. 189.<br />

2 COMBLIN, 1970, p. 579.<br />

3 CNBB. Plano de Pastoral de Conjunto 1966-1970. Rio de Janeiro: Dom Bosco, 1966. p 26.<br />

134


sermões – com base nos temas definidos por Ligório – e a distribuição dos sacramentos.<br />

Nas Missões Inseridas, por sua vez, o evento extraordinário é substituído por um trabalho<br />

ordinário muito diferente do que acontece no modelo tradicional; a semelhança com a obra<br />

de Santo Afonso é deslocada das Santas Missões para as Capelas da Noite (Cappelle Serotine),<br />

“um movimento de educação de base, de restauração social e de saneamento dos costumes”<br />

4 .<br />

As missões redentoristas, como campanha para formação de Comunidades Eclesiais<br />

de Base, não enveredaram pela militância política. A Província do Rio não sofreu nenhum<br />

tipo de perseguição do regime militar, seus confrades não foram considerados ‘inimigos’<br />

da ditadura e muito menos taxados, pejorativamente, de comunistas, como ocorreu com<br />

inúmeros adeptos da Teologia da Libertação. Não estou dizendo que eles tenham sido condescendentes<br />

com o regime dos militares, e muito menos que concordassem com as práticas<br />

opressoras que existiram; o que pretendo enfatizar é que, no contexto em que a militância<br />

política das CEBs se destacava pela oposição à ditadura e questionamento ao status<br />

quo, a campanha dos redentoristas estava mais dedicada a questões religiosas do que qualquer<br />

outra coisa.<br />

Isso não significa que as comunidades de base formadas pelos missionários da Província<br />

do Rio estavam alheias às questões sócio-políticas, ou que nenhuma delas tenha<br />

assumido, em alguma medida, algum tipo de militância em movimentos sociais, sindicatos<br />

ou partidos políticos. Os redentoristas não eram contrários a tal postura. O que não existiu<br />

foi uma campanha com o objetivo central de fomentar essa militância entre as comunidades.<br />

Da mesma forma que muitas CEBs consideradas atuantes no cenário político nem<br />

sempre desempenharam efetivamente tal função 5 , outras podem ter assumido uma postura<br />

política, mesmo não sendo essa a orientação da campanha. Além disso, se a autonomia dos<br />

leigos dentro da “Igreja instituição” é algo questionável, sua atuação no espaço público, na<br />

ágora, não está condicionada – pelo menos em demasia – aos ensinamentos e orientações<br />

dos clérigos.<br />

A maioria absoluta da literatura sobre Comunidades Eclesiais de Base produzida<br />

nas décadas de setenta e oitenta priorizaram o perfil político e militante dessas comunidades,<br />

dando muito pouco – ou quase nenhum – destaque às iniciativas e experiências com<br />

4 REY-MERMET, 1984, p. 196. Capelas da Noite foi o nome dado ao trabalho que Afonso de Ligório realizou<br />

no subúrbio do Reino de Nápoles, organizando os leigos em grupos de oração e partilha, criando uma<br />

nova fisionomia no catolicismo napolitano. Ver primeiro capítulo dessa dissertação.<br />

5 Cf. THEIJE, 2002; BURDICK, 1996.<br />

135


outras fisionomias. Isso explica, em parte, porque os redentoristas não são citados entre os<br />

institutos religiosos que se empenharam na formação de CEBs. O planejamento pastoral da<br />

década de sessenta, com o objetivo de organizar os leigos em comunidades de base para<br />

revitalizar e dinamizar as paróquias, ganhou tonalidades diferentes nas décadas ulteriores<br />

de acordo com as especificidades de cada localidade, e o “modelo militante’ das CEBs não<br />

exemplifica todo aquele ‘movimento comunitário’.<br />

As comunidades (Gemeinschaften) de leigos católicos estão presentes em diversas<br />

dioceses no Brasil, e muitas vezes sem o epíteto de Comunidades Eclesiais de Base. A experiência<br />

de vida comunitária manifesta-se no catolicismo brasileiro sob variadas nomenclaturas:<br />

grupos de reflexão, grupos de orações, grupos de interseção, pastorais (da juventude,<br />

da família, da criança, operária, etc.), conferências, apostolados, ministérios, dentre<br />

outros. A proximidade geográfica é apenas um dos meios possíveis para a organização<br />

dessa multiplicidade de grupos-comunidades, que também se formam por afinidades temáticas,<br />

objetivos e interesses comuns, concepções religiosas, teológicas e/ou ideológicas.<br />

O fenômeno das comunidades de base no Brasil é aqui tratado como um ‘evento<br />

singular’ 6 do Vaticano II. Passados quase cinquenta anos do encerramento de sua última<br />

sessão, esse concílio continua presente 7 no catolicismo, e seu significado muda – ou se<br />

amplia – todas as vezes que a ele é agregado novos valores, seja pelo surgimento de outros<br />

eventos singulares ou pela reinterpretação daqueles anteriormente desencadeados pela força<br />

transformadora do evento histórico.<br />

6 SANTOS, 2008, p. 145.<br />

7 “O evento histórico é sempre presente, mas o presente não é obrigatoriamente o instantâneo. Daí decorre a<br />

idéia de duração, isto é, do lapso de tempo em que um dado evento, guardando suas características constitucionais,<br />

tem presença eficaz”. Ibidem, 148.<br />

136


Fontes<br />

1. Documentos da Província do Rio de Janeiro.<br />

Arquivo da Província do Rio de Janeiro, fundo 01, D missões, caixas 01, 02, 03, 04.<br />

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s/d;<br />

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Relatório do Capítulo Provincial, 1970;<br />

Relatório do Congresso Missionário de 1955;<br />

Relatório do Encontro Inter-Provincial dos Redentoristas do Brasil, 1985;<br />

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______. Intercâmbio. Ano X, nº 2, 1970.<br />

______. Intercâmbio. Ano XXI, nº 01, 1981.<br />

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foram supressas. Juiz de Fora, s/d.<br />

______. Uma Nova Evangelização Inculturada e Libertadora: missões populares. 1991, 30<br />

páginas.<br />

137


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Correspondências da Província Redentorista de São Paulo. Volume XXXIV, 1964.<br />

Correspondências da Província Redentorista de São Paulo. Volume XXXV, 1965.<br />

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138


5. Documentos Pontifícios ∗<br />

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140


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http://www.matrizdecampinas.org.br<br />

http://www.missoesredentoristas.com.br<br />

http://www.paieterno.com.br<br />

http://www.perpetuosocorro.org.br<br />

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SOARES, Paulo Célio. CEBs: A Construção de uma Nova Maneira de Ser Igreja, o nascimento<br />

e organização das comunidades eclesiais de base em Volta Redonda (1967 -<br />

1979). 2001. 234 f. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Severino Sombra,<br />

Vassouras.<br />

SORGENTINI, Hernán. Reflexión sobre la memória y autorreflexión de la historia. Revista<br />

Brasileira de História. São Paulo, v. 23, nº 45, p. 103-128, 2003.<br />

SOUZA, Jessé. Max Weber e a Singularidade da Racionalização Religiosa do Ocidente.<br />

Caminhos, Goiânia – GO, v. 3, n. 2, p. 173-195, julho/dezembro 2005.<br />

TEIXEIRA, Faustino Luiz Couto. As CEBs e os Desafios da Evangelização. Convergência.<br />

Ano XXIII, nº 216, p. 499-509, outubro 1988.<br />

TEIXEIRA, Paulo Couto. Comunidades Eclesiais de Base: A Renovação da Igreja? Convergência.<br />

Ano XIX, nº 177, p. 565-577, novembro 1984.<br />

154


Anexos<br />

1. Mapa das (vice) Províncias Redentoristas no Brasil<br />

2. Ilustração de documentos do Arquivo da Província do Rio de Janeiro<br />

3. Cronologia<br />

4. Documento sobre as Missões Inseridas de Montanha-ES, 1985.<br />

155


(Vice) Províncias Redentoristas do Brasil<br />

RJ, MG, ES<br />

Província do Rio de Janeiro<br />

Fundação 1894<br />

Procedência: Holanda<br />

SP<br />

Província de São Paulo<br />

Fundação: 1894<br />

Procedência: Alemanha<br />

GO, TO, DF<br />

Província de Goiás<br />

Fundação: 1894<br />

Procedência: Alemanha<br />

RS, SC, PA<br />

Província de Porto Alegre<br />

Fundação: 1920<br />

Procedência: Província de São Paulo<br />

MT, MS, PR<br />

Província de Campo Grande<br />

Fundação: 1930<br />

Procedência: Baltimore, EUA<br />

AM, AC, RO<br />

Vice-Província de Manaus<br />

Fundação: 1943<br />

Procedência: Saint-Louis, EUA<br />

CE, PI, MA<br />

Vice-Província de Fortaleza<br />

Fundação: 1960<br />

Procedência: Irlanda<br />

BA, SE<br />

Vice-Província da Bahia<br />

Fundação: 1972<br />

Procedência: Polônia<br />

PE, PB, RN, AL<br />

Vice-Província de Recife<br />

Fundação: 1951<br />

Procedência: Holanda<br />

figura 04<br />

(Vice) Províncias Redentoristas do Brasil


Ilustração<br />

documentos de arquivo<br />

Província do Rio de Janeiro<br />

figura 05<br />

Ilustração de documentos do arquivo da Província do Rio de Janeiro


Cronologia<br />

1696_ Nascimento de Afonso Maria de Ligório.<br />

1723_ Afonso de Ligório entra para o seminário em Nápoles.<br />

1726_ Ordenação sacerdotal de Afonso Maria de Ligório.<br />

1729_ Afonso mudou-se para o “colégio dos chineses”, administrado pela “congregação da<br />

Propaganda”.<br />

1730_ Primeira viajem de Afonso à Scala, em Santa Maria dos Montes, onde encontrou os<br />

cabreiros carentes da Boa Nova de Cristo.<br />

1731_ Fundação da Ordem do Santíssimo Redentor, mais conhecidas como “redentoristinas”.<br />

1732_ Fundação da Congregação Redentorista, sob o nome de Congregação do Santíssimo<br />

Salvador.<br />

1733_ Fundação casa redentorista em Sficelli, nos Estados Pontifícios, primeira comunidade<br />

redentorista fora do Reino de Nápoles.<br />

1738_ Fundação da casa redentorista em Ciorani.<br />

1742_ Fundação da casa redentorista em Pagani.<br />

1743_ Morte de Mons. Tomás Falcoia, primeiro Diretor Geral da então Congregação do<br />

Santíssimo Salvador.<br />

1743_ Primeiro Capítulo Geral (congregazione generale) para tratar da eleição do Superior Geral,<br />

do assunto dos votos religiosos e da elaboração da Regra definitiva da congregação.<br />

1744_ Fundação da casa redentorista em Dileceto, onde, futuramente congregou-se o irmão<br />

Geraldo Majella.<br />

1746_ Fundação da casa redentorista em Materdomini.<br />

1749_ O Irmão Geraldo Majella entra para a Congregação Redentorista, na casa de Dileceto.<br />

1749_ O papa Bento XIV aprova oficialmente a Regra e a Congregação, mudando-lhe o nome<br />

para ‘Congregação do Santíssimo Redentor, e nomeando Afonso de Ligório “Reitor Mor<br />

Perpétuo”.<br />

1755_ Falecimento do irmão Geraldo Majella e da Irmã Maria Celeste Crostarosa.<br />

1762_ Afonso de Ligório é ordenado Bispo da Igreja.<br />

1764_ Capítulo geral realizado em Nocera, nos Estados Pontifícios, para definir o texto das<br />

constituição do Instituto.<br />

158


1775_ Após o quinto pedido de renuncia ao bispado, Afonso de Ligório consegue a dispensa do<br />

Papa Pio VI.<br />

1780_ Aprovação do “regulamento interno” pelo reino de Nápoles, e separação entre as casas<br />

redentoristas desse reino e as dos Estados Pontifícios.<br />

1785_ Clemente Maria Holfbauer é ordenado padre redentorista e Vigário Geral para além dos<br />

Alpes.<br />

1787_ Falecimento Afonso de Ligório.<br />

1787_ São Clemente Hofbauer funda a primeira casa transalpina em Varsóvia.<br />

1788_ São Clemente Hofbauer nomeado Vigário Geral transalpino.<br />

1793_ Estabelecida a unificação das casas redentoristas do Reino de Nápoles e dos Estados<br />

Pontifícios.<br />

1820_ Falecimento de Clemente Maria Holfbauer.<br />

1831_ Fundação redentorista na Bélgica.<br />

1836_ Primeiro estudantado redentorista na Holanda.<br />

1839_ Canonização de Santo Afonso.<br />

1841_ Decreto Presbyterorum Saecularium que dividiu a Congregação em seis províncias:<br />

Romana, Napolitana, Siciliana, Austríaca, Belgo-Holandêsa e Suíça.<br />

1850_ Fundação da Província Norte-americana.<br />

1853_ Decreto do para Pio IX dividindo a congregação em duas: a napolitana e a transalpina.<br />

1853_ Decreto motu proprio que transferiu a sede do Governo Geral da congregação para Roma.<br />

1853_ Fundação das Províncias Alemãs e Belgo-holandesa.<br />

1869_ O Superior Geral Padre Nicolau Mauron, eleito no Capítulo Geral de 1850-53, conseguiu,<br />

finalmente, unificar a Congregação até então dividida em duas.<br />

1871_ Santo Afonso é proclamado Doutor da Igreja.<br />

1888_ Beatificação de Clemente Maria Holbauer, um dos grandes responsáveis pela expansão da<br />

obra redentorista para além dos Alpes.<br />

1893_ Chegada ao Brasil dos primeiros missionários redentoristas da Holanda – os padres R. P.<br />

Matias Tulkens e R. P. Francisco Lomeyer. – que iniciariam as missões redentoristas no<br />

Brasil.<br />

1894_ Chegada da equipe de missionários holandeses que somar-se-iam aos outros dois, dando<br />

inicio às missões redentorista na então Diocese de Mariana.<br />

1900_ Os redentoristas holandeses assumem a paróquia de São José em Belo Horizonte.<br />

1903_ Elevação da missão redentorista holandesa à Vice-Província.<br />

1903_ Fundação dos primeiros conventos no Rio de Janeiro.<br />

1904_ Canonização de São Geraldo, o irmão leigo redentorista.<br />

1906_ Fundação da casa redentorista em Curvelo (santuário São Geraldo)<br />

1907_ Transferência da sede do vice-provincialado de Juiz de Fora-MG para o Convento Santo<br />

Afonso no Rio de Janeiro.<br />

159


1908_ Canonização de São Clemente.<br />

1912_ Início da construção do Santuário de São Geraldo em Curvelo.<br />

1916_ Primeira missa celebrada no interior do Santuário de São Geraldo.<br />

1917_ Primeira celebração da “Oitava de São Geraldo” em Curvelo-MG. Esse evento anual<br />

tornou-se a principal data de peregrinação de romeiros ao Santuário de São Geraldo.<br />

1921_ Fundação redentorista em Teresópolis - RJ.<br />

1923_ Fundação redentorista em Congonhas do Campo (Juvenato, paróquia e Santuário Bom<br />

Jesus do Matosinhos).<br />

1923_ Fundação redentorista em Campos - RJ.<br />

1923_ Supressão da Fundação de Teresópolis.<br />

1924_ Fundação redentorista em Campanha-MG.<br />

1924_ Início oficial do Juvenato Redentorista em Congonhas-MG.<br />

1927_ Supressão da Fundação de Campanha -MG.<br />

1930_ O padre redentorista João Baptista Smits é nomeado o primeiro Diretor Espiritual de Todas<br />

as Ligas Católicas do Brasil, recebendo de Dom Leme o epíteto de “General da Liga Católica”.<br />

1933_ Aceitação do Santuário do Senhor do Bonfim-BA.<br />

1945_ Ereção Canônica da Casa-Estudantado de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro em Floresta,<br />

município de Juiz de Fora-MG.<br />

1947_ Fundação redentorista em Garanhuns-PE.<br />

1948_ Fundação redentorista em Coronel Fabriciano-MG, sendo nomeado o primeiro Reitor<br />

brasileiro na Vice-província do Rio de Janeiro, o padre José Gonçalves da Costa.<br />

1950_ Santo Afonso é proclamado patrono dos Confessores e Moralistas.<br />

1950_ Supressão da Fundação de Salvador - BA (Santuário Senhor do Bonfim).<br />

1951_ Ereção Canônica da Província Redentorista do Rio de Janeiro, e transferência do<br />

provincialado para o Convento da Glória em Juiz de Fora-MG.<br />

1952_ Fundação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB.<br />

1952_ Início das atividades do Juniorato de Santo Afonso em Congonhas do Campo-MG.<br />

1952_ Início oficial da Casa Redentorista do Sagrado Coração de Jesus em Três Corações-MG.<br />

Primeiras discussões sobre a pré-missão.<br />

1953_ Início das atividades do Juniorato de Santa Terezinha em Três Corações-MG.<br />

1954_ Fundação da Conferência dos Religiosos do Brasil – CRB.<br />

1954_ I Congresso dos Religiosos do Brasil.<br />

1954_ Missões no Rio de Janeiro em Preparação ao Congresso Eucarísticos (primeiras<br />

experiências de pré-missão).<br />

1956_ Fundação do convento e juniorato de São José em Santa Rita do Sapucaí-MG.<br />

1957_ Congresso dos Missionários Redentoristas em Floresta.<br />

160


1958_ Inauguração da Casa de Retiros São José em Belo Horizonte.<br />

1959_ posse na paróquia de Três Pontas-MG.<br />

1960_ fundação da comunidade redentorista em Três Pontas-MG.<br />

1960_ Missões gerais em Caratinga.<br />

1961_ Início das atividades do Noviciado de Correia de Almeida em Barbacena-MG.<br />

1961_ Supressão do convento e juniorato de São José em Santa Rita do Sapucaí-MG.<br />

1962_ Início do Concílio Vaticano II.<br />

1962_ Missões gerais em Petrópolis.<br />

1962_ Plano de Pastoral de Emergência.<br />

1963_ Missões gerais em Governador Valadares, Oliveira, Ouro Preto, Montes Claros.<br />

1964_ Encontro dos Missionários da Província do Rio.<br />

1964_ Início das atividades no Juniorato São José de Três Pontas-MG.<br />

1964_ Supressão do Juniorato de Santo Afonso em Congonhas do Campo-MG.<br />

1965_ Plano de Pastoral de Conjunto.<br />

1965_ Última sessão do Concílio Vaticano II.<br />

1966_ Supressão do Noviciado de Correia de Almeida em Barbacena-MG.<br />

1968_ Missões inseridas em Vitória - ES.<br />

1968_ Primeira Assembléia da Província Redentorista do Rio de Janeiro, acontecida na casa de<br />

Retiros São José, em Belo Horizonte-MG. Tema: “Estrutura e Organização da Província”.<br />

1968_ Primeiro Capítulo Provincial da Província do Rio de Janeiro, realizado na casa de Floresta,<br />

município de Juiz de Fora-MG.<br />

1968_ Supressão do Juniorato de Santa Terezinha em Três Corações-MG.<br />

1968_ Supressão do Juniorato São José de Três Pontas -MG.<br />

1968_ Transferência da sede do provincialado para o Convento de São José em Belo Horizonte.<br />

1968_ Venda da casa de Correia de Almeida em Barbacena-MG e retirada dos redentoristas dessa<br />

cidade.<br />

1969_ Ação Missionária em Porto Firme.<br />

1969_ Fechamento da Casa Redentorista do Sagrado Coração de Jesus em Três Corações-MG.<br />

1970_ Ação Missionária em Rio Novo, Rio Espera e Alto Rio Doce.<br />

1970_ Encerramento das atividades de formação do Seminário Maior de Nossa Senhora do<br />

Perpétuo Socorro em Floresta, Juiz de Fora-MG.<br />

1970_ Missões Inseridas em Mutum – MG.<br />

1972_ Missões Inseridas em Galiléia-MG.<br />

1972_ Missões Inseridas em Divino das Laranjeiras-MG.<br />

1972_ Missões Inseridas em Tumiritinga-MG.<br />

1975_ Fechamento da casa redentorista Senhor Bom Jesus em Congonhas-MG.<br />

161


1975_ Missões Inseridas em Belo Oriente-MG.<br />

1975_ Missões Inseridas em Timóteo-MG.<br />

1982_ Missões Inseridas em Montanha-ES. Equipe missionária formada pelo padre José Miguel<br />

do Líbano, Padre José Cândido Barbosa e o irmão Aníbal José de Assis.<br />

1982_ Missões Inseridas em Santa Maria de Itabira-MG.<br />

1985_ Missões Inseridas em Grão Mongol-MG.<br />

1988_ Missões Inseridas em Taiobeiras e Rio Pardo de Minas-MG.<br />

1989_ Capítulo Provincial.<br />

1990_ Transferência da sede do provincialado para o Convento da Glória em Juiz de Fora.<br />

1992_ Missões Inseridas em Aracruz-ES.<br />

1996_ Missões Inseridas em Conceição do Castelo-ES.<br />

2001_ Missões Inseridas em Cariacica-ES.<br />

162

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