História da Educação Brasileira II - UFPB Virtual
História da Educação Brasileira II - UFPB Virtual
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Palavras do professor-pesquisador<br />
Caro(a)s aprendentes,<br />
Após um breve período de repouso, espero que estejamos em<br />
ordem para a volta às aulas.<br />
Vocês começam com uma novi<strong>da</strong>de: um novo ensinante para<br />
o percurso <strong>da</strong> <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong>. De minha parte, que trabalharei<br />
com vocês a <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>II</strong>, estou ansioso para começar.<br />
Esta sua segun<strong>da</strong> Etapa no Percurso será para mim mais uma etapa<br />
no meu percurso docente, agora, também, como um Ensinante virtual.<br />
Ansioso ao mesmo tempo em que esperançoso, pois acredito<br />
que cresceremos muito nessa segun<strong>da</strong> Etapa do Percurso.<br />
Fiz o possível para tornar nossos textos claros, objetivos,<br />
compreensíveis, agradáveis, mas o possível é sempre pouco. Tenho<br />
certeza que vocês, estu<strong>da</strong>ndo-os com afinco, perceberão seus limites,<br />
apresentarão críticas, <strong>da</strong>rão sugestões, contribuindo para que nosso<br />
trabalho melhore a ca<strong>da</strong> dia e se aproxime ca<strong>da</strong> vez mais do impossível.<br />
Acho que é essa meta que buscamos alcançar quando fazemos as<br />
coisas com dedicação.<br />
Assim, acreditando que estamos todos comprometidos com esse<br />
objetivo, mãos à obra.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
134<br />
Prof. MSc. Osvaldo Barbosa Maia.
A cartografia do componente curricular <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
A segun<strong>da</strong> Etapa do nosso percurso se constitui de nove aulas, distribuí<strong>da</strong>s irregularmente.<br />
Teremos, inicialmente, um bloco de três aulas, em segui<strong>da</strong> quatro e, finalmente, duas aulas.<br />
As três primeiras aulas possuem caráter introdutório. Mesmo sabendo que vocês passaram<br />
por discussões a respeito, acredito não ser demais repetir aquilo que se constitui nos fun<strong>da</strong>mentos<br />
de quem trabalha com história <strong>da</strong> educação num curso de formação de professores. Por isso,<br />
insisti na compreensão do que vem a ser a história, a educação, a pe<strong>da</strong>gogia e quem trabalha<br />
com a história, o historiador. Finalmente, nessa mesma Uni<strong>da</strong>de, convido vocês, Aprendentes, a<br />
tentar superar aquela compreensão caduca de história como uma mera narrativa, que parte do<br />
passado em direção ao presente. Como digo nos textos, repetindo insistentemente, é o presente<br />
que interessa ao historiador. É esse presente que ele procura entender para, então, pensar o<br />
futuro, ou as possibili<strong>da</strong>des do futuro. Possibili<strong>da</strong>des porque, recorrendo ao passado, o historiador,<br />
melhor dizendo, nós, historiadores, aprendemos que nosso presente poderia ser diferente e,<br />
como ele está longe de representar a realização dos anseios <strong>da</strong> maioria <strong>da</strong> espécie humana,<br />
certamente não gostaríamos de vê-lo reproduzido. Ain<strong>da</strong> nessa Uni<strong>da</strong>de, vocês perceberão que,<br />
apesar <strong>da</strong>s muitas informações em forma de <strong>da</strong>tas e nomes de pessoas, o que é inevitável, pois<br />
trabalhamos com homens agindo no tempo, melhor dizendo, fazendo o tempo, não relegamos a<br />
outras áreas do saber o privilégio de analisar e de refletir sobre a história, cabendo-lhes assumir<br />
essas responsabili<strong>da</strong>des.<br />
Nas segun<strong>da</strong> e terceira uni<strong>da</strong>des, procederemos ao estudo <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação brasileira<br />
a partir <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1930 até os dias atuais. Tentamos ao máximo refletir sobre a história <strong>da</strong><br />
educação infantil, mas são precárias as informações de que dispomos para produzir material<br />
didático nessa área. Temos histórias <strong>da</strong> criança, <strong>da</strong> infância, mas não histórias <strong>da</strong> educação<br />
propriamente ditas, essa que se manifesta na escola, em relação ao infantil. Aqui e ali encontramos<br />
informações vagas, nesse sentido, na<strong>da</strong> sistematiza<strong>da</strong>s. Essa é uma história que ain<strong>da</strong> está por<br />
ser escrita. E vocês nem imaginam a contribuição que estão <strong>da</strong>ndo nesse sentido!<br />
Minha preocupação em atingir uma história <strong>da</strong> educação volta<strong>da</strong> para atender as<br />
necessi<strong>da</strong>des dos aprendentes de um curso de formação de professores para a educação infantil,<br />
como é seu curso de Pe<strong>da</strong>gogia, me obrigou a secun<strong>da</strong>rizar e mesmo abandonar determina<strong>da</strong>s<br />
discussões. Assim, vocês perceberão que deixamos de lado questões relativas ao ensino superior,<br />
à educação de adultos, à educação especial. Para esse fato, também concorreram a limitação do<br />
espaço (quanti<strong>da</strong>de de páginas) que nos é fornecido para a produção deste material e, assim<br />
como vocês reclamam o limitado espaço de tempo para realizar um curso universitário a contento,<br />
imaginem o tempo do docente para produzir um material didático específico, inovador, quando<br />
temos de responder a outros desafios na Universi<strong>da</strong>de. Essa última colocação que faço não<br />
pretende ser um pedido de desculpas, esperando sua condescendência, mas o reconhecimento<br />
de que deixamos lacunas que devem ser preenchi<strong>da</strong>s, para o que assumimos o compromisso,<br />
mediante suas críticas e sugestões que se manifestarão ao longo do nosso convívio, de aperfeiçoar<br />
este material em novas edições.<br />
Ain<strong>da</strong> insistindo na questão <strong>da</strong>s lacunas, vocês também perceberão que enfatizei bastante<br />
a história <strong>da</strong> educação, fugindo um pouco <strong>da</strong>quela história política, história dos eventos, a que<br />
vocês estão habituados a partir dos livros didáticos de história que circulam na educação básica.<br />
Não descarto a importância dessa história, também, embora existam aqueles que a desprezem,<br />
rotulando-a, simplesmente, de história tradicional, utilizando essa expressão em sentido pejorativo.<br />
Acho que ela é importante, ao menos para situar vocês no tempo, ain<strong>da</strong> que no tempo cronológico.<br />
E, para suprir essa carência, caso vocês a sintam, o conselho que lhes dou é retomar seus<br />
antigos manuais didáticos de história, preferencialmente os do ensino médio.<br />
Isto posto, espero que tenhamos uma grande experiência. Prof. MSc. Osvaldo B. Maia.<br />
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Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Croqui do Percurso<br />
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Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
UNIDADE I<br />
AULA 1: SOBRE A EDUCAÇÃO, A HISTÓRIA E O HISTORIADOR<br />
Um dos componentes curriculares do nosso percurso é a história <strong>da</strong> educação. Tenho<br />
certeza que você já não tem dúvi<strong>da</strong> quanto ao significado <strong>da</strong>s duas palavras que formam essa<br />
locução: história e educação. <strong>Educação</strong>, principalmente, por se tratar de uma palavra que está<br />
presente em todos os momentos do nosso percurso. Não apenas nos textos que lemos, nos<br />
debates de que participamos, nos desafios que são propostos, nas nomenclaturas dos componentes<br />
curriculares, bem como no próprio nome do nosso percurso. Afinal, é para o trabalho em educação<br />
que estamos nos formando.<br />
Assim, destrinchemos essa locução e, analisando as duas palavras que a compõem,<br />
comecemos pela segun<strong>da</strong>: educação.<br />
Com relação à há um ponto que não podemos perder de vista. Embora<br />
tenhamos claro que a educação esteja presente onde quer que nós, humanos, nos relacionemos<br />
uns com os outros e com a natureza, isto é, onde quer que se manifestem relações sociais, tanto<br />
no tempo (o tempo do lazer, do brincar, do orar, do estu<strong>da</strong>r) como no espaço (o espaço <strong>da</strong> família,<br />
<strong>da</strong> igreja, do clube de lazer, <strong>da</strong> escola), privilegiaremos o espaço-tempo escolar.<br />
Na TV-Escola existe um vídeo intitulado “A educação”, <strong>da</strong> série Ecce homo.<br />
Trata-se de uma excelente produção canadense de 1999. Observe a forma<br />
como o trabalho é apresentado: introduz com o levantamento de<br />
questionamentos sobre a educação atual; a seguir, procede a um histórico <strong>da</strong><br />
educação segundo a periodização clássica <strong>da</strong> história, isto é, considerando<br />
as i<strong>da</strong>des antiga, medieval, moderna e contemporânea; finalmente, retoma<br />
as discussões postas na introdução. Atente para a fala dos especialistas que<br />
figuram no texto, com destaque para Gaston Mialaret, um dos autores e<br />
organizadores do livro Tratado <strong>da</strong>s ciências pe<strong>da</strong>gógicas.<br />
Dizendo de outra forma, ain<strong>da</strong> que o ensinar e o aprender a sermos mais homens e mulheres,<br />
a caminharmos por essa trilha sem fim de , estejam presentes em todos os<br />
momentos de nossa vi<strong>da</strong> e pelos mais diferentes meios, logo, educação, nossa história <strong>da</strong> educação<br />
<strong>da</strong>rá maior ênfase à escola. Isso por vários motivos.<br />
Em primeiro lugar porque o ensinar e o aprender que encontramos no conjunto <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de,<br />
como brincar, <strong>da</strong>nçar, relacionar-se, soli<strong>da</strong>rizar-se, ser afetuoso, responsável, disciplinado, enfim,<br />
conviver, também se manifestam no interior <strong>da</strong> escola. Assim também o seu contrário, uma vez<br />
que nem todos têm a mesma compreensão dessas coisas, nem as pratiquem no mesmo nível.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Outro motivo é porque a formação que estamos recebendo volta-se para o trabalho na<br />
instituição escolar. Ain<strong>da</strong> que muitas pessoas tenham dúvi<strong>da</strong>s quanto a entender creche e préescola<br />
como fazendo parte <strong>da</strong> educação escolar, é bom lembrar que nosso trabalho é regido por<br />
uma lei de ensino, que nossa formação profissional volta-se para o magistério. Está na Lei de<br />
Diretrizes e Bases <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> Nacional (LDBEN), n. 9394/96:<br />
Art. 21- A educação escolar compõe-se de:<br />
I - educação básica, forma<strong>da</strong> pela educação infantil, ensino fun<strong>da</strong>mental e<br />
ensino médio;<br />
Art. 29 - A educação infantil, primeira etapa <strong>da</strong> educação básica, tem como<br />
finali<strong>da</strong>de[...]<br />
Art. 62 - A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em<br />
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universi<strong>da</strong>des<br />
e instituições superiores de educação, admiti<strong>da</strong>, como formação mínima para<br />
o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do<br />
ensino fun<strong>da</strong>mental, a ofereci<strong>da</strong> em nível médio, na mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de Normal.<br />
A palavra hominização pode ser explica<strong>da</strong> de duas maneiras, que não se<br />
excluem. Uma explicação é <strong>da</strong><strong>da</strong> pela biologia, outra, pelas ciências humanas e<br />
sociais. A internet oferece bons artigos que aju<strong>da</strong>m você a conhecer essas<br />
duas dimensões. Se você vai ao Google e escreve a palavra “hominização”,<br />
encontra o endereço:
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Ora, trabalhando, produzindo as coisas no tempo, nós, os<br />
homens também nos produzimos. Foi assim como entendeu o pensador<br />
e militante político italiano , ao afirmar que “A<br />
história é a disciplina que se refere aos homens, a tantos homens<br />
quanto possível, a todos os homens do mundo enquanto se unem<br />
entre si em socie<strong>da</strong>de, e trabalham, lutam e se aperfeiçoam a si<br />
mesmos”.<br />
Pelo que estamos vendo, há muita coisa pareci<strong>da</strong> entre educação Antonio Gramsci,<br />
e história. Não sei se isso está mexendo com sua cuca, mas veja<br />
bem: se fazendo a história, construindo-a, os homens também se<br />
nascido em Ales (22/01/<br />
1891) foi político, filósofo<br />
e cientista político,<br />
constroem, fazem-se mais homens e, se ensinando e aprendendo,<br />
fazendo educação, os homens também se constroem, veja quanta<br />
comunista e anti-fascista<br />
italiano. Preso pela polícia<br />
fascista (1926-1932),<br />
relação existe entre história e educação. Reflita a respeito.<br />
faleceu em Roma (27/04/<br />
1937).<br />
Reflita sobre isso também: se você se une em socie<strong>da</strong>de, trabalha, luta e se aperfeiçoa a si<br />
mesmo, quer dizer, participa dessa trilha de construção <strong>da</strong> história, você é um(a) historiador(a).<br />
Pode escrever isso: como aprendente nesse percurso ou como ensinante na sua escola, você<br />
também faz a história, você é um(a) historiador(a).<br />
Ocorre que a palavra historiador(a) ficou reserva<strong>da</strong> para indicar aquele(a) profissional que<br />
conhece o passado e fala sobre ele, que conta a história. Veja bem: se o(a) historiador(a) é<br />
quem conta história, ele(a) só pode contar o que sabe. Você concor<strong>da</strong>? Então, como ele(a) sabe,<br />
se aquilo de que ele(a) fala são coisas que, muitas vezes, pertencem a um passado distante, a<br />
um tempo em que ele(a) nem sonhava em nascer?<br />
Ora, ele(a) sabe porque estu<strong>da</strong>, pesquisa, recorre ao que chamamos fontes históricas, que<br />
são os vestígios do que os homens produziram no tempo. Veja o caso <strong>da</strong> educação escolar:<br />
edifícios e materiais escolares; registros de matrículas, freqüência, evasão e diplomados; leis e<br />
decretos de ensino, manuscritos de pe<strong>da</strong>gogos... E, por que não, suas experiências na prática<br />
docente, as representações de aprendentes e ensinantes sobre educação? Tudo isso e muito<br />
mais se constitui nas fontes para o conhecimento <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação.<br />
Uma vez conheci<strong>da</strong>, essa história é conta<strong>da</strong>. Na escola, sempre por meio <strong>da</strong> escrita. Seja<br />
na forma de livro, vídeo ou texto na internet. Digo mais: quem conta história se faz mais humano;<br />
quem escuta também. Foi o que eu aprendi quando li esse texto de Besselaar (1974, p. 04).<br />
O homem é um ‘animal histórico’ em mais de uma acepção <strong>da</strong> palavra. A tese<br />
é ilustra<strong>da</strong> pelo fato de ser apreciado, onde quer que haja seres humanos,<br />
um conto interessante, uma boa história. A criança escuta maravilha<strong>da</strong> um<br />
conto de fa<strong>da</strong>s, um homem primitivo ouve com espanto as canções de seus<br />
bardos, o adulto pertencente a uma fase mais adianta<strong>da</strong> de civilização lê<br />
absorto o seu romance. Na<strong>da</strong> mais humano que o desejo de ouvir uma ‘boa<br />
história’. Divertimento, fuga <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de ou mero passatempo? Às vezes, não<br />
passa disso (sobretudo numa cultura em que existe uma indústria de leitura).<br />
Muitas vezes, porém, o desejo revela um interesse mais profundo: o homem<br />
quer, pelo conto, entender um pouco melhor o mundo em que vive, tendo<br />
esperança de nele achar elementos aproveitáveis e significativos. O conto,<br />
além de aliviar a imaginação e de alimentar a vi<strong>da</strong> afetiva, desperta e nutre<br />
também a curiosi<strong>da</strong>de intelectual. Interessante, uma boa história” mas,<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
144
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
certamente, não será “um conto de fa<strong>da</strong>s”, uma história para crianças. Gostaria,<br />
mas não tenho jeito para isso. Então, deixo esse desafio para você.<br />
Espero que as três palavras que formam o título dessa nossa aula tenham ficado entendi<strong>da</strong>s,<br />
pois elas serão importantes para a história que vou lhe contar. Tentarei fazer dela “um conto”.<br />
Se não é uma história para crianaças, será uma história que tem a criança no centro <strong>da</strong>s<br />
atenções. Isso porque é uma história para pessoas que estão aprendendo a cui<strong>da</strong>r delas: você.<br />
Por não se tratar de uma história para crianças, até o começo é diferente. Não começarei<br />
por - Era uma vez..., mesmo porque a preocupação do historiador não está no passado, mas no<br />
presente. Como ensina Rodrigues (1969, p. 27):<br />
Deus não é dos mortos, mas dos vivos, porque, para ele, todos são vivos. A<br />
história também não é dos mortos, mas dos vivos, pois ela é reali<strong>da</strong>de presente,<br />
obrigatória para a consciência, frutífera para a experiência. A vi<strong>da</strong> e a reali<strong>da</strong>de<br />
são história, gerando passado e futuro[...]. O historiador, lembra Oliveira França,<br />
li<strong>da</strong> com defuntos, não para conhecer a morte, o passado, mas para conhecer<br />
a vi<strong>da</strong>[...].<br />
Assim, nossa história começará, na Aula 1 <strong>da</strong> Uni<strong>da</strong>de <strong>II</strong>, descrevendo a situação em que se<br />
encontram a criança e a educação infantil, hoje. A partir <strong>da</strong>í, formularemos perguntas que<br />
tentaremos responder de modo a compreender essa situação. São perguntas do tipo: por que a<br />
criança e a educação infantil se encontram nessa situação? Como essa situação foi construí<strong>da</strong>?<br />
Ela poderia estar diferente? O que podemos fazer para que esse quadro seja superado? É nesse<br />
momento que o passado entra em cena.<br />
A história que vou lhe contar é apenas um pe<strong>da</strong>ço <strong>da</strong> história. Pe<strong>da</strong>ço em vários sentidos.<br />
Em primeiro lugar, com relação ao tempo. Lembre-se que no percurso anterior (HEB I) você<br />
passeou pela história <strong>da</strong> educação brasileira desde o período colonial, passando pelo Império, até<br />
chegar ao final do que se convencionou denominar 1ª República. Dando continui<strong>da</strong>de, caminharemos<br />
de 1930 aos nossos dias.<br />
Pe<strong>da</strong>ço, também, porque a história que vamos contar é a <strong>da</strong> educação. Já vimos que a<br />
história se refere a tudo o que diz respeito ao homem, não apenas a educação. Porém, tentar <strong>da</strong>r<br />
conta de tudo seria impossível ou, como diz Faustão, “coisa pra louco, meu!”. Assim, o social, o<br />
político, o econômico não serão aprofun<strong>da</strong>dos, servindo como instrumento de contextualização,<br />
para situar o fenômeno educativo, fazendo entender que a educação não goza de autonomia,<br />
mu<strong>da</strong>ndo em função <strong>da</strong>queles fatores.<br />
Além de ser a história de um pe<strong>da</strong>ço do tempo (de 1930 aos dias de hoje) e <strong>da</strong> produção<br />
humana (educação), também o é de um pe<strong>da</strong>ço do mundo, o Brasil, mesmo reconhecendo não<br />
podermos isolar nossa história do restante do mundo. Desde que o Brasil foi inventado, sofre um<br />
processo de crescente integração ao resto do mundo, o que é bastante visível, hoje, com a<br />
globalização. Nossa história está conecta<strong>da</strong> com o mundo, inclusive no campo educacional.<br />
Basta observar a enxurra<strong>da</strong> de pe<strong>da</strong>gogos e educadores estrangeiros em nosso percurso. Por<br />
isso, teremos que nos reportar, de vez em quando, ao que ocorre para além de nossas fronteiras.<br />
Bem, essa é a história que vou lhe contar. Porém, antes de avançar em nossa trilha,<br />
façamos uma pausa para refletir e responder a um desafio.<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Quem construiu a Tebas de sete portas?<br />
Nos livros estão nomes de reis.<br />
Arrastaram eles os blocos de pedras?<br />
E a Babilônia várias vezes destruí<strong>da</strong> –<br />
Quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas<br />
Da Lima doura<strong>da</strong> moravam os construtores?<br />
Para onde foram os pedreiros, na noite em que<br />
A muralha <strong>da</strong> China ficou pronta?<br />
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.<br />
Quem os ergueu? Sobre quem<br />
Triunfaram os Césares? A decanta<strong>da</strong> Bizâncio<br />
Tinha somente palácios para seus habitantes? Mesmo<br />
Na legendária Atlânti<strong>da</strong><br />
Os que se afogavam gritavam por seus escravos<br />
Na noite em que o mar a tragou.<br />
O jovem Alexandre conquistou a Índia.<br />
Sozinho?<br />
César bateu os gauleses.<br />
Não levava sequer um cozinheiro?<br />
Filipe <strong>da</strong> Espanha chorou, quando sua Arma<strong>da</strong><br />
Naufragou. Ninguém mais chorou?<br />
Frederico venceu a Guerra dos Sete Anos.<br />
Quem venceu além dele?<br />
Ca<strong>da</strong> página uma vitória.<br />
Quem cozinhava o banquete?<br />
A ca<strong>da</strong> dez anos um grande homem.<br />
Quem pagava a conta?<br />
Tantas histórias.<br />
Tantas questões.<br />
DESAFIOS<br />
Perguntas de um operário que lê<br />
1) No corpo do texto, referimo-nos a Carlos Magno. Recorrendo a livros didáticos de história<br />
sobre a I<strong>da</strong>de Média, situe o tempo em que ele governou. Agora, recorrendo a livros de história<br />
<strong>da</strong> educação, apresente uma quadro <strong>da</strong> educação européia à época de Carlos Magno. Por último,<br />
numa folha de papel A4, reproduza um mapa <strong>da</strong> Europa, destacando o território que compunha o<br />
Império Carolíngio.<br />
2) Dado o poema de Bertolt Brecht:<br />
a) Destaque os nomes <strong>da</strong>s pessoas que são cita<strong>da</strong>s no poema (Caio Júlio César, Alexandre<br />
Magno, Filipe <strong>II</strong> <strong>da</strong> Espanha, Frederico <strong>II</strong> <strong>da</strong> Prússia), procure informações a seu respeito e<br />
escreva sobre elas. Recorra a livros didáticos de <strong>História</strong> e/ou à Internet. No caso <strong>da</strong> Internet,<br />
comece pelo Google (www.google.com.br), escrevendo o nome <strong>da</strong> pessoa que você quer encontrar.<br />
b) No espaço de uma folha de papel A4, reproduza o mapa-mundi (somente os contornos) e situe<br />
os nomes de lugares (as ci<strong>da</strong>des e seus respectivos países) que aparecem no poema de Brecht<br />
(Tebas, Babilônia, Lima, China, Roma, Bizâncio, Índia, Gália, Espanha, Prússia). Procure em livros<br />
didáticos de <strong>História</strong> e Geografia ou em Atlas históricos.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
146<br />
Bertolt BRECHT (Augsburg, 10/02/1898 - Berlim, 14/<br />
08/1956). Influente dramaturgo, poeta e encenador<br />
alemão do século XX. Anti-nazista, exilou-se, à<br />
época de Hitler, na Áustria, Suíça, Dinamarca,<br />
Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e, finalmente,<br />
nos Estados Unidos. Recebeu o Prêmio Lênin <strong>da</strong><br />
Paz em 1954.
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
c) Reproduza o mapa do Estado <strong>da</strong> Paraíba, circun<strong>da</strong>do pelos Estados que lhe fazem fronteira.<br />
Destaque os municípios de João Pessoa e o seu. A seguir, indique, no mapa, os municípios que<br />
fazem fronteira com o seu.<br />
d) Dados os nomes Antonio Gramsci, Bertolt Brecht e José Honório Rodrigues, escreva o mínimo<br />
de 10 linhas sobre ca<strong>da</strong> um. Não faltam informações na Internet.<br />
e) Reúna-se com seus colegas e discutam sobre os conceitos de história apresentados por<br />
Gramsci e Rodrigues. A seguir, com base nesses conceitos, analisem o poema de Brecht. Finalmente,<br />
produza (individualmente) um texto de uma lau<strong>da</strong> (fonte “times new roman”, tamanho 12, espaço<br />
1,5) sob o título “O que é história”, de modo que Gramsci, Rodrigues e Brecht estejam presentes<br />
nele, ain<strong>da</strong> que você não concorde com esses pensadores.<br />
Atenção!<br />
Aprendente, todos os desafios são importantes para o processo<br />
de ensino-aprendizagem. Contudo, para fins de avaliação, você<br />
deverá postar no AVA - Moodle as produções de texto<br />
correspondentes aos itens (d) e (e) do desafio 2. O valor deste<br />
desafio será de 10,0 pontos.<br />
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
AULA 2: A HISTÓRIA, O TEMPO E A PERIODIZAÇÃO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO<br />
Quantas vezes e em quais situações você já ouviu ou pronunciou a palavra história? Acho<br />
que até já perdeu a conta! Mas não estranhe, pois a palavra história tem muitos sentidos, pode<br />
ser emprega<strong>da</strong> em várias situações. Vejamos algumas delas.<br />
Você pode dizer que tudo é história, que ela tem a ver<br />
com tudo o que nós fazemos no tempo, independentemente de<br />
haver alguém para registrar e contar.<br />
Também pode dizer que ela é o estudo <strong>da</strong>s coisas que os<br />
homens fazem no tempo, coisa de especialistas, de pessoas<br />
que estu<strong>da</strong>m essas coisas - os historiadores.<br />
Você pode dizer, ain<strong>da</strong>, que história é aquilo que se conta<br />
para as criancinhas, tanto em casa, como pai ou mãe, ou na<br />
creche e na pré-escola, como profissional <strong>da</strong> educação, visando<br />
a acalmá-las (quem sabe, acalmar você!), colocá-las para dormir,<br />
ou para ensinar alguma coisa <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>.<br />
Também existe história de vi<strong>da</strong> que, por ser diferente em ca<strong>da</strong> pessoa, faz com que ela<br />
respon<strong>da</strong>, sob circunstâncias comuns, ao grupo de que faz parte (família, vizinhança, turma de<br />
bar) de modo diferente.<br />
Ia esquecendo: e quando a gente inventa uma história? Nesse caso, nem me atrevo a <strong>da</strong>r<br />
exemplos! Nisso vocês são doutores. Da<strong>da</strong>s essas possibili<strong>da</strong>des, há quem prefira, em alguns<br />
casos, falar em “estória”; em outros casos, história; em outros, ain<strong>da</strong>, <strong>História</strong>. Não acho que<br />
valha a pena aprofun<strong>da</strong>r essa discussão. É como se quiséssemos descobrir o sexo dos anjos. Para<br />
simplificar, utilizemos o termo único, história. Mesmo porque tem muita invencionice no caminho,<br />
coisa que o “H” procura esconder.<br />
Assim como história, tempo também é uma palavra<br />
que pode ser usa<strong>da</strong> em vários sentidos, quer dizer, é uma<br />
palavra polissêmica. E não é preciso que você faça muito<br />
esforço para compreender isso. Basta assistir à televisão<br />
na hora do noticiário para ouvir: “O tempo para amanhã<br />
será de sol, com a temperatura variando entre[...]”. Já<br />
dá para perceber que se trata de um tempo específico, o<br />
tempo meteorológico. Então você escuta falar em frio,<br />
calor, chuva, sol, umi<strong>da</strong>de relativa do ar. Enfim, é o tempo<br />
dos meteorologistas, embora ele tenha a ver com a história<br />
- alterações climáticas repercutem na produção de grãos<br />
que, por sua vez, podem trazer inflação, que gera<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
148<br />
Queima<strong>da</strong> ou “coivara”<br />
Está na Constituição: todo ato que prejudica a saúde pública e o meio ambiente é criminoso. Logo, queima<strong>da</strong><br />
é crime. Outra irregulari<strong>da</strong>de é que ela não atinge nem de longe os 20% de índice de cobertura florestal, como<br />
prevê o código. Além de criminosa é a causa de muitos males, a começar pelos problemas de saúde. Devido<br />
ao fato de elas coincidirem com a época mais seca do ano, agravam as doenças respiratórias e de pele. Fato<br />
este constatado por profissionais e estudiosos <strong>da</strong> saúde que vêm observando um considerável aumento no<br />
índice de moléstias como bronquite, asma alérgica, pneumonia e rinite. Fonte: http://www.paubrasil.org.br/<br />
Basta.htm
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desemprego, que provoca fome. Além disso, alterações climáticas já não são um fato estritamente<br />
natural.<br />
Outro tempo que não é o histórico, mas tem a ver com ele, é o , que<br />
nós representamos por meio do . Nesse ponto, temos que diminuir o passo<br />
porque muita gente mistura as bolas. Vejamos.<br />
Cronologia, cronômetro, cronograma etc.<br />
Essas palavras têm o mesmo prefixo grego,<br />
cronos, que, na língua portuguesa,<br />
traduzimos por tempo. Você sabe a origem<br />
<strong>da</strong> palavra cronos? Vai saber com um desafio<br />
que deixei para você. Por enquanto,<br />
contente-se com a imagem ao lado, em que<br />
o pintor espanhol, Francisco José de Goya<br />
Y Lucientes (30 de Março de 1746 - 16 de<br />
Abril de 1828), representou Cronos.<br />
Calen<strong>da</strong>s, no antigo calendário romano, eram o primeiro dia de ca<strong>da</strong><br />
mês quando ocorria a lua nova. Havia três dias fixos: as calen<strong>da</strong>s, as<br />
nonas (5º ou 7º dia, de acordo com o mês) e os idos (13º ou 15º dia,<br />
conforme o mês). Dos idos é que provém a expressão “nos idos de<br />
setembro” equivalente a “meadosde setembro”.<br />
Da palavra calen<strong>da</strong>s se originaram o termo calendário e a expressão<br />
calen<strong>da</strong>s gregas, representando um dia que jamais chegará, pois era<br />
inexistente no calendário grego.<br />
Ao lado, os calendários maia (alto) e asteca.<br />
Para saber mais, consulte:<br />
http://www.observatorio.ufmg.br/pas39.htm<br />
E assista ao vídeo no Pólo Municipal de Apoio<br />
Presencial de sua ci<strong>da</strong>de. Fale com o(a) mediador(a) pe<strong>da</strong>gógico(a).<br />
Sobre o calendário,<br />
acesse os links:<br />
www.observatorio.ufmg.br/<br />
pas39.htm.<br />
www.dec.ufcg.edu.br/<br />
biografias/DionisiM.html.<br />
Quando dizemos que estamos no ano 2008, estamos falando de tempo cronológico, não<br />
necessariamente histórico. Explico: imagine uma fotografia produzi<strong>da</strong> pela mesma pessoa, no<br />
mesmo ano, 2008, retratando o mesmo tema (uma transação econômico-financeira, por exemplo),<br />
em três lugares diferentes. A primeira, num grande centro financeiro norte-americano, como New<br />
York; a segun<strong>da</strong>, em sua pequena ci<strong>da</strong>de do interior paraibano; e a terceira, entre membros de<br />
uma comuni<strong>da</strong>de indígena brasileira do Alto Xingu. A palavra comum é transação, porém tudo o<br />
mais é diferente, não é?<br />
Talvez esse exemplo não esclareça muito porque diga respeito a uma ativi<strong>da</strong>de econômicofinanceira,<br />
logo, distante do nosso dia-a-dia profissional. Mas, tomemos como exemplo um fato<br />
<strong>da</strong> educação. Imagine, por exemplo, uma fotografia que revele um dia de ativi<strong>da</strong>des educacionais<br />
numa escola pública de Paris, Londres ou Amsterdã; nesse mesmo dia, uma foto tira<strong>da</strong> em uma<br />
escola pública de sua pequena ci<strong>da</strong>de do interior paraibano; por último, um ambiente de<br />
aprendizagem numa comuni<strong>da</strong>de indígena brasileira do Alto Xingu. Tem alguma diferença? Só tem.<br />
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Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Acho que você não tem mais dúvi<strong>da</strong>s: vivemos um mesmo tempo cronológico, mas tempos<br />
históricos diferentes. Então, por que levantamos esse problema? Porque, para trabalhar com a<br />
história, com a ação dos homens no tempo e o estudo sobre essas ações, precisamos de referências<br />
temporais palpáveis. Para isso, recorremos a uma invenção nossa, o tempo cronológico, expresso<br />
na forma de um calendário, mesmo que isso traga problemas. Dou um exemplo. Quando, no ano<br />
1500, os portugueses acharam esta parte do mundo a que deram o nome de Brasil, viviam um<br />
tempo histórico a que denominamos tempo de transição entre o e o capitalismo.<br />
Denominamos feu<strong>da</strong>lismo ao modo de produção que caracterizou a socie<strong>da</strong>de européia ocidental<br />
entre os Séculos V e XV<strong>II</strong>I. Embora não no mesmo nível em que se verifica no capitalismo, o<br />
feu<strong>da</strong>lismo conheceu ci<strong>da</strong>des, circulação de mercadorias a longa distância, trocas monetárias.<br />
Enquanto no feu<strong>da</strong>lismo a relação dominante de trabalho é a servidão, no capitalismo, é o<br />
assalariamento. Nascendo <strong>da</strong> crise do antigo mundo escravista, sofreu golpe de morte com a<br />
Revolução Industrial. Durante as déca<strong>da</strong>s de 1950 e 1960, muitos intelectuais brasileiros,<br />
militantes de partidos políticos de esquer<strong>da</strong> e defensores de uma revolução socialista no Brasil,<br />
alegavam que esta só poderia vingar numa socie<strong>da</strong>de que já fosse capitalista – o que não era<br />
o caso, para eles, do Brasil. Esses intelectuais viam o Brasil de então como uma socie<strong>da</strong>de<br />
ain<strong>da</strong> feu<strong>da</strong>l.<br />
Naquele mesmo ano, os primitivos habitantes desta terra ain<strong>da</strong> viviam sob a i<strong>da</strong>de <strong>da</strong> pedra.<br />
Portanto, o mesmo tempo cronológico, porém tempos históricos distintos. Acredito que a dificul<strong>da</strong>de<br />
que você sente em perceber essa diferença entre o tempo histórico e o cronológico é porque a<br />
história que lhe foi ensina<strong>da</strong> na escola básica consistia na memorização de fatos isolados que se<br />
sucediam numa linha do tempo, como na figura abaixo.<br />
Agora, leia a figura comigo.<br />
Dentre outras razões, para registrar suas ações no tempo, os homens estabeleceram um<br />
calendário. Para a cultura ocidental, cuja tradição ju<strong>da</strong>ico-cristã apresenta a história de forma<br />
linear, é fácil representá-lo. O princípio é simples: toma-se um segmento de reta. Não uma reta,<br />
porque esta não tem começo nem fim - tendendo de menos infinito para mais infinito. A lógica é<br />
a mesma utiliza<strong>da</strong> pelos ensinantes de matemática quando trabalham com os números relativos.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Eles traçam um segmento de reta, estabelecem um ponto qualquer como referência, atribuem-lhe<br />
o valor zero e, <strong>da</strong>í, chegam aos valores positivos e negativos.<br />
Em nosso caso, <strong>da</strong>remos àquele segmento de reta o nome de linha do tempo. Tomaremos<br />
um ponto qualquer como referência, o zero do matemático, a partir do qual situaremos o que<br />
aconteceu antes e depois <strong>da</strong>quele ponto. Que nome <strong>da</strong>r a esse ponto?<br />
Ora, o calendário que utilizamos foi elaborado por homens <strong>da</strong> igreja cristã, num tempo em<br />
que esta imperava sobre a socie<strong>da</strong>de européia ocidental. Eles convencionaram que aquele ponto<br />
representaria o momento do nascimento de Jesus Cristo, e os fatos históricos seriam <strong>da</strong>tados<br />
tomando como referência esse nascimento. Por isso, falamos em fatos que ocorreram antes de<br />
Cristo (a.C.) e depois de Cristo (d.C.). Nasceu, assim, o calendário cristão, sobre o qual são<br />
elabora<strong>da</strong>s periodizações <strong>da</strong> história, as quais também são convenções.<br />
Essas periodizações <strong>da</strong> história são úteis porque aju<strong>da</strong>m a nos situar no tempo, oferecem<br />
referências e têm uma grande importância didática. No entanto, não são construções ingênuas,<br />
como a que acabamos de ver. Há interesses envolvidos. Pense comigo: Por que tomar o nascimento<br />
do Cristo para o estabelecimento de um calendário? Por que a escrita foi toma<strong>da</strong> como indicativo<br />
do começo <strong>da</strong> história? Não havia história antes <strong>da</strong> invenção <strong>da</strong> escrita? Por que, na separação<br />
<strong>da</strong>s i<strong>da</strong>des históricas, foram escolhi<strong>da</strong>s aquelas <strong>da</strong>tas e não outras, aqueles fatos e não outros?<br />
Por que os nomes Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea? Por<br />
que I<strong>da</strong>de Moderna se ela não era tão moderna assim? Por que a<br />
I<strong>da</strong>de Contemporânea começa com a Revolução Francesa ou a<br />
? Por que contemporânea, se nós<br />
a vivemos há mais de duzentos anos do seu início?<br />
Quanto à importância <strong>da</strong> revolução industrial inglesa<br />
para a história <strong>da</strong> educação, vejamos o que diz Mário<br />
Manacor<strong>da</strong> (1989, p. 271-272), em seu livro, <strong>História</strong><br />
<strong>da</strong> educação: <strong>da</strong> Antigüi<strong>da</strong>de aos nossos dias. Depois<br />
de discorrer sobre os efeitos sociais <strong>da</strong>quela revolução,<br />
ele pergunta o que estará no lugar <strong>da</strong>quele<br />
aprendizado, forma típica de instrução <strong>da</strong>s massas<br />
produtivas artesanais até então, e ele mesmo responde:<br />
Revolução Industrial<br />
“Inicialmente na<strong>da</strong>. Os trabalhadores perdem a sua antiga instrução e na fábrica só adquirem<br />
ignorância. Em segui<strong>da</strong>, a evolução <strong>da</strong> ‘moderníssima ciência <strong>da</strong> tecnologia’ leva a uma substituição<br />
ca<strong>da</strong> vez mais rápi<strong>da</strong> dos instrumentos e dos processos produtivos e, portanto, impõe-se o problema<br />
de que as massas operárias não se fossilizem nas operações repetitivas <strong>da</strong>s máquinas obsoletas,<br />
mas que estejam disponíveis às mu<strong>da</strong>nças tecnológicas, de modo que não se deva sempre recorrer<br />
a novos exércitos de trabalhadores mantidos de reserva: isso seria um grande desperdício de<br />
forças produtivas. Em vista disso, filantropos, utopistas e até os próprios industriais são obrigados<br />
pela reali<strong>da</strong>de a colocarem o problema <strong>da</strong> instrução <strong>da</strong>s massas operárias para atender às novas<br />
necessi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> moderna produção de fábrica: em outros termos, o problema <strong>da</strong>s relações instruçãotrabalho<br />
ou <strong>da</strong> instrução técnico-profissional, que será o tema dominante <strong>da</strong> pe<strong>da</strong>gogia moderna.<br />
Tentam-se, então, duas vias diferentes: ou reproduzir na fábrica os métodos ‘platônicos’ <strong>da</strong><br />
aprendizagem artesanal, a observação e a imitação, ou derramar, no velho odre <strong>da</strong> escola<br />
desinteressa<strong>da</strong>, o vinho novo dos conhecimentos profissionais, criando várias escolas não só<br />
sermocinales, mas reales, isto é, de coisas, de ciências naturais: em suma, escolas científicas, técnicas<br />
e profissionais.”<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Os mesmos princípios que orientaram a periodização <strong>da</strong> história universal foram seguidos<br />
para a <strong>da</strong> história brasileira. Confira se não foi assim que você aprendeu quando estu<strong>da</strong>va na<br />
escola de ensino básico!<br />
Como no caso anterior, há muitas perguntas a serem feitas, mas deixo esse desafio para<br />
você.<br />
Já apresentamos duas possibili<strong>da</strong>des de periodização <strong>da</strong> história: uma de caráter geral, a<br />
história universal, e outra de caráter local, nacional. Você deve ter percebido que, em nenhuma,<br />
houve referência à educação. E você já refletiu, com base na aula anterior, sobre a relação que<br />
existe entre história e educação. Assim, não seria possível criarmos uma periodização <strong>da</strong> história<br />
que incluísse o fenômeno educativo? Mais ain<strong>da</strong>, uma periodização <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação?<br />
Dermeval Saviani é um estudioso <strong>da</strong> história e <strong>da</strong> filosofia <strong>da</strong> educação. Recentemente, ele<br />
escreveu dois textos referentes à matéria. No primeiro, intitulado “O legado educacional do ‘longo<br />
Século XX’ brasileiro”, <strong>da</strong>tado de 2004, em que o foco era a escola pública brasileira, ele ensaiou<br />
uma periodização <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação brasileira centra<strong>da</strong> na escola pública. Partindo <strong>da</strong><br />
compreensão do que seja escola pública, hoje, Saviani observou que suas primeiras manifestações<br />
<strong>da</strong>tavam <strong>da</strong> última déca<strong>da</strong> do Século XIX e construiu a seguinte periodização:<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Em agosto de 2005, veio à luz o novo texto: “As concepções pe<strong>da</strong>gógicas na história <strong>da</strong><br />
educação brasileira”. Dessa feita, o objeto de estudo de Saviani já não era a escola pública, mas<br />
as concepções pe<strong>da</strong>gógicas. Resultado: mu<strong>da</strong>-se o objeto, procede-se à nova periodização. Eila:<br />
Veja que estamos, como Saviani, tratando <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação brasileira. No entanto,<br />
estamos com objetos de estudo diferentes. Ele próprio, trabalhando com dois objetos, recorreu a<br />
duas periodizações. Nosso objeto, no entanto, não é a história <strong>da</strong> escola pública nem as<br />
concepções pe<strong>da</strong>gógicas, mas a história <strong>da</strong> educação infantil. Podemos ensaiar uma periodização?<br />
Deixo isso como desafio para você. Por enquanto, por motivos que passarei a explicar, adotaremos<br />
aquela periodização clássica <strong>da</strong> história do Brasil (figura), inserindo nela o fenômeno educativo.<br />
Primeiro, por já ser muito conheci<strong>da</strong>, acessível a todos porquanto é encontra<strong>da</strong> em qualquer<br />
manual didático de história de ensino fun<strong>da</strong>mental e médio. Sofreremos limites em nosso percurso,<br />
é ver<strong>da</strong>de, mas to<strong>da</strong> periodização tem seus inconvenientes. Aliás, se Mario Manacor<strong>da</strong> (1989),<br />
estudioso italiano <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação, apesar de crítico <strong>da</strong> história e <strong>da</strong> periodização oficiais,<br />
escreveu sua <strong>História</strong> <strong>da</strong> educação obedecendo, em grande parte e sem maiores constrangimentos,<br />
à periodização clássica <strong>da</strong> história geral (figura), por que não podemos fazê-lo?<br />
Em segundo lugar, aquela periodização já foi assumi<strong>da</strong> na primeira etapa do nosso percurso:<br />
história <strong>da</strong> educação no Brasil colonial, história <strong>da</strong> educação no Brasil imperial e história <strong>da</strong><br />
educação brasileira no Brasil <strong>da</strong> 1ª República. Assim, estamos diante de uma linguagem já bastante<br />
familiar.<br />
Por último - o que é mais importante -, a segun<strong>da</strong> etapa do nosso percurso começa em<br />
1930. Não só por convenção, mas por ser uma <strong>da</strong>ta por demais significativa, pois, se a ênfase<br />
que a Europa deu à educação infantil coincidiu com a eclosão <strong>da</strong> Revolução Industrial, isso a<br />
partir de fins do Século XV<strong>II</strong>I, o ano 1930, guar<strong>da</strong><strong>da</strong>s as proporções, assinala o ingresso do Brasil<br />
no rol do mundo urbano e industrial moderno. Esse fato repercutiria na nossa educação infantil?<br />
Façamos mais uma pausa para reflexão e respon<strong>da</strong>mos a novos desafios.<br />
153
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1 Aula 2 Aula 3<br />
Atenção!<br />
DESAFIOS<br />
1) Recorrendo a livros (que devem ser citados) e entrevistas (cujas perguntas formula<strong>da</strong>s devem<br />
ser apresenta<strong>da</strong>s) com pessoas mais velhas, recolha informações sobre a sua ci<strong>da</strong>de, as quais<br />
devem ser as mais varia<strong>da</strong>s: em relação a aspectos econômicos, sociais, políticos e educacionais.<br />
Com base nessas informações, represente, numa linha do tempo, uma periodização para a<br />
história <strong>da</strong> educação <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de. Seja criativo, invente, mas não deixe de definir o seu objeto<br />
de estudo (história <strong>da</strong> educação com ênfase na educação infantil). Construa sua linha do tempo<br />
no editor de texto e, logo abaixo, digite sua produção de texto conforme as orientações a seguir.<br />
2) No espaço equivalente a uma lau<strong>da</strong> (papel A4, configuração padrão, fonte “times new roman”<br />
11, espaçamento 1,5), redija um texto explicando como você construiu seu trabalho, justificando<br />
ca<strong>da</strong> fato que utilizou para proceder aos recortes temporais. Poste-o no AVA - Moodle.<br />
Se tiver dificul<strong>da</strong>des durante a realização dos<br />
desafios propostos, comunique-se com o(a)s<br />
mediadores(as) pe<strong>da</strong>gógico(a)s a distância por meio<br />
do AVA - Moodle (www.ead.ufpb.br).<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
154
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
AULA 3: 1930 - NOSSO PONTO DE PARTIDA?<br />
Dermeval Saviani,<br />
nascido em 1944,<br />
destaca-se como<br />
filósofo e historiador<br />
<strong>da</strong> educação<br />
brasileira. Dentre<br />
seus vários livros,<br />
alguns estão citados<br />
em nossas<br />
referências.<br />
Aula 2 Aula 3<br />
No ano de 1983, foi publica<strong>da</strong> a primeira edição do livro Escola e<br />
democracia. No capítulo I desse livro, intitulado “As teorias <strong>da</strong> educação<br />
e o problema <strong>da</strong> marginali<strong>da</strong>de”, seu autor, ,<br />
recorrendo ao estudioso <strong>da</strong> educação latino-americana, Juan Tedesco,<br />
afirmou que<br />
De acordo com estimativas relativas a 1970, cerca de 50%<br />
dos alunos <strong>da</strong>s escolas primárias desertavam em condições<br />
de semi-analfabetismo ou na<br />
maioria dos países <strong>da</strong> . Isso sem levar<br />
em conta o contingente de crianças em i<strong>da</strong>de escolar que<br />
sequer têm acesso à escola e que, portanto, já se encontram<br />
a priori marginaliza<strong>da</strong>s dela. (SAVIANI, 2003, p. 03)<br />
Analfabetismo potencial: diz respeito a uma situação em que a pessoa foi<br />
alfabetiza<strong>da</strong> e até freqüentou a escola por um bom tempo. Mas, se o ensino foi<br />
ruim, os poucos anos de escola foram alternados com anos de evasão, e essa pessoa<br />
não cultivou o hábito de ler e escrever, tendendo a esquecer o pouco que aprendeu<br />
estando, potencialmente, fa<strong>da</strong><strong>da</strong> a voltar à condição de analfabeta. É o mesmo que<br />
dizer alfabetizado(a) funcional, situação grave a que a Paraíba está submeti<strong>da</strong>. Em<br />
reportagem <strong>da</strong>ta<strong>da</strong> de 30 de setembro de 2007, o “Correio <strong>da</strong> Paraíba” revelou:<br />
“Entre jovens e adultos, a situação é mais grave, já que 21,9% dos paraibanos com<br />
i<strong>da</strong>des entre 15 e 18 anos estão fora <strong>da</strong> escola, e 64,4% dos jovens na faixa etária<br />
de 18 a 24 anos já abandonaram os estudos, o que tem colaborado com o aumento<br />
do número de alfabetizados funcionais, pessoas que, mesmo sabendo ler e escrever,<br />
não têm as habili<strong>da</strong>des de leitura, de escrita e de cálculo necessárias para garantir<br />
seu desenvolvimento pessoal e profissional.”<br />
Você sabe por que esse continente, do qual o Brasil faz parte, é denominado América<br />
Latina? Veja bem: América, em homenagem ao piloto florentino Américo Vespúcio,<br />
que acompanhou o descobridor Cristóvão Colombo em suas viagens a essa parte<br />
do mundo, inclusive, tocando em terras do atual Brasil, antes de Cabral. Latina<br />
porque, embora haja pequenos espaços onde se fala inglês ou holandês, na quase<br />
totali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s terras que se estendem do México à Terra do Fogo as pessoas falam<br />
línguas deriva<strong>da</strong>s do latim, como francês, espanhol e, no nosso caso, português.<br />
Para aprofun<strong>da</strong>r essa questão, veja um dos desafios propostas mais adiante.<br />
Veja bem: quando você está assistindo a um noticiário policial pela televisão e vê imagens<br />
de pessoas envolvi<strong>da</strong>s em assalto, assassinato, tráfico de drogas, você diz que se trata de<br />
bandidos, marginais. Não é assim? Você as considera marginais porque elas estão agindo de<br />
maneira erra<strong>da</strong>, à margem do que a socie<strong>da</strong>de e suas leis estabeleceram como regras de<br />
comportamento.<br />
Antes de continuar, eu poderia fazer uma pergunta só para instigar você: Essas pessoas<br />
são marginais ou agem <strong>da</strong>quela forma porque foram marginaliza<strong>da</strong>s? Pergunto isso porque o rótulo<br />
155
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
marginal é aplicado, em regra, para os que estão privados<br />
de direitos sociais fun<strong>da</strong>mentais, como saúde, moradia e<br />
educação. E mais: Que adjetivo você <strong>da</strong>ria aos<br />
privilegiados e poderosos, como empresários, oficiais<br />
militares, magistrados, que planejam, coman<strong>da</strong>m e<br />
acobertam muitos dos crimes praticados por aqueles<br />
marginalizados?<br />
Voltemos a Saviani. Depois de detectar o problema<br />
<strong>da</strong> marginali<strong>da</strong>de a que estão submeti<strong>da</strong>s muitas <strong>da</strong>s nossas<br />
crianças em relação à escola, ele, na condição de filósofo<br />
<strong>da</strong> educação, perguntou como as teorias educacionais<br />
se posicionavam sobre a questão. Daí então procedeu a<br />
um trabalho de pesquisa, em que identificou essas teorias<br />
e apresentou o que ca<strong>da</strong> uma dizia a respeito.<br />
Aula 2 Aula 3<br />
Em nosso caso, na condição de historiadores <strong>da</strong> educação, poderíamos abor<strong>da</strong>r a questão<br />
formulando outras perguntas. Senão vejamos: Por que tão grande número de crianças latinoamericanas<br />
está marginalizado <strong>da</strong> educação escolar? Desde quando as escolas foram cria<strong>da</strong>s na<br />
América Latina, essa situação sempre existiu ou podemos encontrar uma <strong>da</strong>ta para seu início?<br />
Podemos encontrar, na história <strong>da</strong> educação latino-americana, algum momento em que a socie<strong>da</strong>de<br />
agiu de modo concreto no sentido de superar esse problema?<br />
João Fragoso é um estudioso <strong>da</strong> história econômica brasileira. Na Internet, encontrei um<br />
artigo de sua autoria, intitulado “Para que serve a história econômica? Notas sobre a história <strong>da</strong><br />
exclusão social no Brasil”, em que ele relaciona economia e socie<strong>da</strong>de. Sua preocupação recai<br />
sobre o problema <strong>da</strong> exclusão social no Brasil, algo muito marcante na socie<strong>da</strong>de brasileira de<br />
nossos dias.<br />
Fragoso parte de um encontro de economistas e cientistas sociais, ocorrido em agosto de<br />
1999, “sob os auspícios do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplica<strong>da</strong>) [...] para discutir a<br />
desigual<strong>da</strong>de e a pobreza no Brasil, tendo por base as últimas PNADs (Pesquisa Nacional por<br />
Amostragem de Domicílios)”. O resultado desse encontro, mais tarde divulgado em livros, demonstrou<br />
que “o Brasil não seria um país pobre, sem recursos, mas sim, um país de pobres, com muitos<br />
pobres [pois] a pobreza de 53 milhões de pessoas, ou 34,1% <strong>da</strong> população do País em 1999/<br />
2000, seria decorrente <strong>da</strong> má distribuição <strong>da</strong> riqueza e não <strong>da</strong> falta dela”. Na ver<strong>da</strong>de, o Brasil<br />
encontrava-se, em 1999, “entre as maiores economias industriais no concerto <strong>da</strong>s nações [de<br />
modo que] 77% <strong>da</strong> população mundial possuíam uma ren<strong>da</strong> per capita menor que a do Brasil.<br />
Desigual<strong>da</strong>de social no Brasil<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
156
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
Aula 2 Aula 3<br />
Entretanto, apesar desse desempenho econômico invejável, a socie<strong>da</strong>de brasileira apresentava<br />
um dos maiores graus internacionais de concentração de ren<strong>da</strong> e de miséria absoluta.”<br />
Para escrever seu artigo, Fragoso não precisou perguntar se o problema <strong>da</strong> exclusão social,<br />
no Brasil de hoje, era fruto <strong>da</strong> inserção do País no sistema capitalista ou se vinha de mais longe,<br />
do início <strong>da</strong> colonização. Ele foi ao passado, sim, mas com outras preocupações. Partindo dos<br />
índices de concentração de ren<strong>da</strong> em 1999, no Brasil, e verificando que esse é um fenômeno<br />
recorrente na história brasileira, ele quis saber como, em diferentes contextos históricos, a<br />
concentração de ren<strong>da</strong> persistiu e como se deu a contínua recriação <strong>da</strong> exclusão social.<br />
A resposta que ele encontrou foi: a elite brasileira “vive atualmente em uma socie<strong>da</strong>de que<br />
possui mecanismos para preservar a concentração de ren<strong>da</strong>, os quais foram devi<strong>da</strong>mente testados<br />
e aprovados pelo tempo.” Ele encontrou também que essa mesma elite “não se sente responsável<br />
pelo problema <strong>da</strong> pobreza e <strong>da</strong> desigual<strong>da</strong>de. Ela transfere tais problemas para o Estado e, ain<strong>da</strong>,<br />
acredita que a solução seria o crescimento econômico combinado com maiores investimentos<br />
públicos na educação. Por conseguinte, a elite propõe uma fórmula em que a superação <strong>da</strong>queles<br />
problemas seria feita sem custos para os não-pobres.”<br />
Depois dessa conversa com Saviani e Fragoso, acredito ter chegado a hora de entrarmos<br />
na história <strong>da</strong> educação brasileira a partir de 1930, <strong>da</strong>ndo ênfase à educação infantil.<br />
Otaíza Romanelli foi uma estudiosa <strong>da</strong> educação brasileira. Seu<br />
livro, <strong>História</strong> <strong>da</strong> educação no Brasil (1930/1973), publicado em<br />
1978, nasceu de suas preocupações em relação à educação do seu<br />
tempo. Ela contou que seu trabalho se originou “de uma antiga<br />
preocupação [...] de compreender a trama <strong>da</strong>s relações existentes<br />
entre os fatores que atuam no sistema educacional e respondem<br />
pela maioria de seus problemas”. O campo de pesquisa de Romanelli<br />
foi a , onde ela observou a “inércia, revela<strong>da</strong><br />
em face <strong>da</strong>s inovações, e o tradicionalismo emperrante”. Suas<br />
observações permitiram-lhe confirmar o que ensinavam os livros de<br />
história <strong>da</strong> educação brasileira que ela consultou: “substancialmente,<br />
pouca coisa mudou na forma de encarar a educação que nos foi<br />
lega<strong>da</strong> pelos jesuítas”.<br />
Escola elementar,<br />
primária, de primeiras<br />
letras. Essas foram<br />
algumas <strong>da</strong>s<br />
denominações que a<br />
escola de ensino<br />
fun<strong>da</strong>mental recebeu<br />
antes <strong>da</strong> Lei 9394/96.<br />
Dificilmente, poderíamos fazer qualquer menção à educação brasileira nos<br />
dias de hoje sem nos referirmos a Portugal e aos jesuítas. Não estou falando<br />
em determinismo, mas não é possível destruir tão facilmente to<strong>da</strong> uma<br />
herança cultural, sobretudo quando ela continua a atender a interesses<br />
de hoje. Não se trata de aplaudir ou denegrir nosso passado, nossa história,<br />
mas de compreendê-los. O tempo passa. E tão depressa que, às vezes,<br />
pensamos que os dias, os meses, os anos tornam-se ca<strong>da</strong> vez mais curtos.<br />
Nossas cabeças, no entanto, mu<strong>da</strong>m muito mais devagar. Estamos há mais de 100<br />
anos <strong>da</strong> abolição <strong>da</strong> escravatura, mas continuamos estigmatizando o trabalho manual<br />
e as profissões técnicas; a persistência e o aprofun<strong>da</strong>mento <strong>da</strong>s desigual<strong>da</strong>des sociais<br />
que conhecemos nessa parte do mundo, desde a chega<strong>da</strong> dos europeus, está tão<br />
enraiza<strong>da</strong> entre nós que, sem nos questionarmos sobre seus condicionantes históricos,<br />
ain<strong>da</strong> acreditamos na possibili<strong>da</strong>de de superá-los por meio <strong>da</strong> educação escolar; ain<strong>da</strong><br />
que muitas pessoas não professem, hoje, o catolicismo romano, suas cabeças foram<br />
forja<strong>da</strong>s sob os ditames <strong>da</strong> igreja tridentina... (continuo depois).<br />
157
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
Aula 2 Aula 3<br />
A princípio, Romanelli pensou que a inércia e o tradicionalismo que ela observara seriam<br />
coisas de dentro <strong>da</strong> escola e que, eliminando-as, todos os problemas <strong>da</strong> educação escolar<br />
estariam resolvidos. Uma postura que costumamos chamar de . Porém, refletindo<br />
sobre o que observava e os livros que lia, Romanelli avançou, entendendo que a escola brasileira<br />
estava inseri<strong>da</strong> num <strong>da</strong>do contexto sócio-cultural, razão pela qual compreendeu o porquê <strong>da</strong><br />
visão e <strong>da</strong> prática educacionais dos jesuítas e de seus sucessores.<br />
Tente entender em que consiste o pe<strong>da</strong>gogismo, a partir de uma crítica<br />
que lhe é feita pelo economista <strong>da</strong> educação, o carioca Cláudio de Moura<br />
Castro, nascido em 1938, bastante conhecido como articulista <strong>da</strong> Revista<br />
Veja.<br />
“Nós temos uma casa para ser construí<strong>da</strong>, e em vez de construí-la, estamos<br />
soltando foguete para comemorar. A educação básica não precisa de<br />
computador, não precisa de grandes teorias pe<strong>da</strong>gógicas. Nenhum país<br />
de primeiro mundo tem, nos primeiros quatro anos, que são os mais críticos,<br />
na<strong>da</strong> além de um quadro-negro, giz, um bom professor que saiba ensinar,<br />
um livro didático que seja utilizado todos os dias em aula e disciplina rígi<strong>da</strong><br />
em sala.<br />
É assim que todos os países do mundo conseguiram resultados excelentes. Já, no Brasil,<br />
ficamos discutindo teoria pe<strong>da</strong>gógica, discutindo a teoria do defunto, o defunto que<br />
escreveu tal livro e que contradiz o outro defunto, que escreveu outra coisa. Tudo são<br />
grandes teorias. Os países que deram certo não usaram grandes teorias e até hoje não<br />
usam. Usam o que se aprendeu. Há uma cartilha para aprender a ler “Vovô viu a uva”,<br />
depois o conteúdo começa a fazer sentido etc. Por volta de dez anos atrás, a Inglaterra,<br />
que navegava nessa geléia geral de construtivismos e métodos globais, disse “Chega”.<br />
Agora tem programas e alternativas de livros, e o Ministério <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> Central de<br />
Londres diz como o tempo dos alunos é usado durante ca<strong>da</strong> aula e o que vai ser ensinado.<br />
Com isso, a educação <strong>da</strong> Inglaterra deu um grande salto. Deve-se fazer o arroz-comfeijão,<br />
os alunos devem, primeiramente, aprender a tabua<strong>da</strong> e o alfabeto. Nas escolas<br />
<strong>da</strong> Finlândia, que é o país que ficou em primeiro lugar no Pisa, não existem teorias<br />
mirabolantes. Lá eles têm professores que aprenderam a ensinar e que seguem um<br />
bom livro. Minha filha estudou em uma escola francesa, na Suíça, em que os alunos não<br />
podiam conversar durante a aula e também não podiam se mexer na cadeira. Nenhum<br />
país de primeira linha no Pisa perde tempo discutindo sobre os fogos de artifício <strong>da</strong>s<br />
teorias, nem oferece na sala de aula esse grau de liber<strong>da</strong>de que os educadores brasileiros<br />
acham que se deve oferecer.”<br />
F o n t e : h t t p : / / w w w . s e s c s p . o r g . b r / s e s c / r e v i s t a s /<br />
revistas_link.cfm?Edicao_Id=247&Artigo_ID=3858&IDCategoria=4248&reftype=2. Acesso em<br />
21.12.06<br />
Quanto ao referido contexto, Romanelli afirmou que a socie<strong>da</strong>de colonial brasileira estava<br />
marca<strong>da</strong> pela “predominância de uma minoria de donos de terras e senhores de engenho sobre<br />
uma massa de agregados e escravos”, e que os padres responsáveis pelo ministério <strong>da</strong> educação,<br />
os jesuítas, eram portadores de um conteúdo cultural que expressava o espírito <strong>da</strong> Contra-<br />
Reforma, o que explicaria o quadro educacional de então.<br />
Seguindo essa linha de raciocínio, Romanelli esperava que a mu<strong>da</strong>nça no contexto implicasse<br />
mu<strong>da</strong>nças na educação. De fato, não há como não perceber mu<strong>da</strong>nças no contexto sóciocultural<br />
brasileiro em vários momentos <strong>da</strong> sua história. Por exemplo, quando do processo que<br />
conduziu à Independência ou do que trouxe a República. Aliás, o próprio período colonial não deve<br />
ser visto como estático, pois conheceu diversos quadros sócio-culturais. Em nenhum desses<br />
quadros, verificou-se mu<strong>da</strong>nça sensível na educação.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
158
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
Aula 2 Aula 3<br />
Ocorre que muitos historiadores, identificando moderni<strong>da</strong>de com industrialização, dizem que<br />
o Brasil só ingressou nesse tempo histórico a partir de 1930, quando, dizem eles, teve início nossa<br />
Revolução. Assim, com a industrialização, vieram o crescimento demográfico e a intensificação<br />
do processo de urbanização - o que muitos intelectuais denominam moderni<strong>da</strong>de. A esse novo<br />
quadro deveria corresponder, esperava-se, uma nova educação, o que não aconteceu. É ver<strong>da</strong>de<br />
que a procura por escola aumentou, mas, como disse Romanelli, sua oferta era insuficiente, era<br />
baixo o rendimento escolar e acentua<strong>da</strong> a discriminação social. Ao mesmo tempo, essa escola<br />
não correspondia [...] às novas necessi<strong>da</strong>des sociais e econômicas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
brasileira, em vias de industrialização.<br />
Manifestou-se então uma inadequação entre o sistema educacional, de um<br />
lado, e a expansão econômica e as mu<strong>da</strong>nças sócio-culturais por que passava<br />
a socie<strong>da</strong>de brasileira do outro. É esta inadequação que define a defasagem<br />
entre a educação e o desenvolvimento brasileiro pós 1930.<br />
Agora pense comigo: nos três casos citados, Saviani, Fragoso e Romanelli partiram de<br />
preocupações com problemas do seu tempo, questionaram por que e como esses problemas<br />
foram gerados e, visando encontrar respostas sobre como superá-los, recorreram ao passado.<br />
Romanelli, que nos interessa mais de perto, ao observar a grande defasagem entre o quadro<br />
econômico-sócio-cultural de seu tempo e a situação em que se encontrava o sistema educacional,<br />
perguntou à história desde quando essa defasagem começou a acontecer. Então, percorreu<br />
aqueles períodos <strong>da</strong> história brasileira que você conheceu na etapa anterior - colônia, império e<br />
primeira república - só a encontrando a partir de 1930, quando teve início o que se convencionou<br />
denominar, segundo a periodização <strong>da</strong> história brasileira dita<strong>da</strong> pela política, de Segun<strong>da</strong> República.<br />
Em relação à pergunta que Romanelli formulou e para a qual buscava respostas, o ano de<br />
1930 guar<strong>da</strong> um grande significado. E para nós, cuja preocupação está em saber a partir de<br />
quando a criança ganhou importância na história <strong>da</strong> educação brasileira? Não só isso, mas<br />
também quais circunstâncias históricas geraram essa importância; qual concepção pe<strong>da</strong>gógica<br />
orientou a criação <strong>da</strong>s creches e pré-escolas; qual encaminhamento tem sido <strong>da</strong>do a esses<br />
equipamentos educacionais que atendem àquela criança e a quais interesses o discurso pela<br />
expansão <strong>da</strong>s creches e pré-escolas responde.<br />
Se falarmos de criança, em geral, essas pessoas que se encontram na faixa etária entre 0<br />
e 13 ou 14 anos de i<strong>da</strong>de, saberemos que, desde que existe escola, ou mesmo antes dela, como<br />
ocorria nas socie<strong>da</strong>des chama<strong>da</strong>s primitivas, a partir dos 7 anos, em média, a criança era afasta<strong>da</strong><br />
dos cui<strong>da</strong>dos maternos e encaminha<strong>da</strong> para outros ambientes de aprendizagem. Ocorre que a<br />
criança que nos interessa, que recentemente passou a ser chama<strong>da</strong> “criança pequena”, é a que<br />
se encontra na faixa etária entre 0 e 5 anos. Isso porque a Lei nº 11.274, sanciona<strong>da</strong> pelo<br />
Presidente <strong>da</strong> República em 06 de fevereiro de 2002, alterou o Artigo 32 <strong>da</strong> LDBEN, ao regulamentar<br />
o Ensino Fun<strong>da</strong>mental de nove anos, devendo a criança ingressar nele já aos seis anos de i<strong>da</strong>de.<br />
Com isso, a criança, a partir de seis anos de i<strong>da</strong>de, deixou de ser criança pequena, não tendo<br />
mais direito a creche ou pré-escola, devendo ingressar no ensino fun<strong>da</strong>mental.<br />
A partir de agora, faremos uma caminha<strong>da</strong> pela história <strong>da</strong> educação brasileira, desde 1930.<br />
Apesar <strong>da</strong> amplitude do título, história <strong>da</strong> educação, procuraremos privilegiar a história <strong>da</strong> educação<br />
infantil, com ênfase na história <strong>da</strong> educação <strong>da</strong> criança pequena. Uma tarefa difícil, por causa <strong>da</strong><br />
precarie<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s fontes históricas. Ademais, a educação <strong>da</strong> criança pequena só ganhou estatuto<br />
jurídico com o advento <strong>da</strong> Lei 9394/96.<br />
159
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
Aula 2 Aula 3<br />
Para começar essa caminha<strong>da</strong>, seria interessante que você fizesse uma leitura prévia sobre<br />
a Revolução de 1930 e seu significado histórico. Para tanto, recomendo qualquer livro didático de<br />
<strong>História</strong> do Brasil dirigido para o ensino médio. Embora disponhamos de bons livros didáticos,<br />
sugiro, como melhor, <strong>História</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de brasileira, de Francisco Alencar. Como a Revolução<br />
de 1930 envolveu, fortemente, o Estado <strong>da</strong> Paraíba, seria interessante complementar seu estudo<br />
com a leitura do livro <strong>História</strong> <strong>da</strong> Paraíba: lutas e resistência, de José Otávio de Arru<strong>da</strong> Mello.<br />
Na 9ª edição, de 2002, ver o Capítulo V.<br />
Muito importante como fonte histórica é o cinema. Por isso, recomendo o filme escrito e<br />
dirigido por Silvio Back, “A Revolução de 1930”. Trata-se de um rico documentário produzido em<br />
1980, que situa os movimentos anarquista, operário e tenentista além, evidentemente, do papel<br />
desempenhado pelas oligarquias no processo. Os comentários são feitos pelos renomados<br />
historiadores Bóris Fausto, Edgar Carone e Paulo Sérgio Pinheiro. É importante que você perceba,<br />
nesse filme, a crítica feita à história oficial sobre 1930.<br />
DESAFIOS<br />
1) Você é uma pessoa cui<strong>da</strong>dosa. Exemplo disso é que guardou um exemplar <strong>da</strong>quele mapa que<br />
lhe pedi no desafio “b” <strong>da</strong> aula 1. Agora, de posse de duas cópias desse mapa, vamos trabalhar:<br />
a) Olhe para o lado esquerdo desse mapa. O que você vê? O continente americano. Proce<strong>da</strong> à<br />
divisão político-administrativa desse continente, separe os países (nomeando-os e as suas<br />
respectivas capitais). Munido de lápis de cor, pinte, de uma cor, os países que falam línguas<br />
deriva<strong>da</strong>s do anglo-saxão e, de outra, os que falam línguas deriva<strong>da</strong>s do latim.<br />
b) Sobre a outra cópia do mapa, depois de haver procedido à divisão político-administrativa do<br />
continente americano e separado os países, identificando-lhes as respectivas capitais (novamente,<br />
para não esquecer), pinte, de uma cor, os países considerados desenvolvidos e, de outra, os<br />
subdesenvolvidos (também chamados periféricos, em desenvolvimento, do terceiro mundo,<br />
emergentes etc).<br />
2) Acredito que, assim, você tem duas versões para a expressão América Latina. Quais são elas?<br />
Comparando os resultados do seu trabalho com os dos seus colegas, produzam um texto em<br />
que vocês demonstrem sua compreensão sobre o que vem a ser América Latina.<br />
3) Marque um encontro com seus colegas de turma. Divi<strong>da</strong> com eles o seguinte desafio: selecionem<br />
cinco famílias, dentre as mais ricas, e cinco, dentre as mais pobres, que mantêm seus filhos em<br />
creches ou pré-escolas; a seguir, selecionem outras 5, dentre as mais ricas, e 5 dentre as mais<br />
pobres que não mantêm seus filhos em creche ou pré-escola, de modo que ca<strong>da</strong> membro do<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
160
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 1<br />
grupo não tenha mais que uma família a entrevistar. Feito isso, elaborem cinco perguntas<br />
comuns dirigi<strong>da</strong>s a ca<strong>da</strong> uma dessas famílias, objetivando conseguir informações sobre o significado<br />
<strong>da</strong> creche ou <strong>da</strong> pré-escola na vi<strong>da</strong> dessas pessoas. Finalmente, produzam um texto de uma<br />
lau<strong>da</strong>, anunciando os resultados dessa coleta de <strong>da</strong>dos. Em outra lau<strong>da</strong>, enviem-me as perguntas<br />
que vocês formularam. Dado importante: nenhuma família pode ser identifica<strong>da</strong>.<br />
Atenção!<br />
Aula 2 Aula 3<br />
Nesta aula, você deverá postar as produções em<br />
destaque nos itens (2) e (3). Estes desafios terão<br />
o valor de 10,0 pontos.<br />
Se tiver dificul<strong>da</strong>des durante a realização dos<br />
desafios propostos, comunique-se com o(a)s<br />
mediadores(as) pe<strong>da</strong>gógico(a)s a distância por meio<br />
do AVA - Moodle (www.ead.ufpb.br).<br />
161
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
UNIDADE <strong>II</strong><br />
AULA 4: O BRASIL FEZ SUA REVOLUÇÃO. COMO FICOU A EDUCAÇÃO<br />
INFANTIL?<br />
O ano de 1930 é considerado por muitos historiadores como bastante significativo na<br />
história do Brasil. Naquele ano, o País vivenciou um golpe de estado. Diga-se de passagem, não<br />
seria o primeiro nem o último. Aliás, como certa vez observou um historiador, isso é coisa comum<br />
em republiquetas latino-americanas.<br />
Não sei se você sabia, mas a abdicação de D. Pedro I, em 1831, foi parte de um golpe,<br />
assim como a assunção de seu filho, D. Pedro <strong>II</strong> (Golpe <strong>da</strong> Maiori<strong>da</strong>de), em 1840, e a proclamação<br />
<strong>da</strong> República, em 1889. Depois do golpe, que levou Getúlio Vargas ao poder, fato que ficou<br />
conhecido pelo nome de Revolução de 1930, tivemos outros: o próprio Vargas, golpista em 1930,<br />
deu outro em 1937. Houve um em 1945, que derrubou o mesmo Vargas, além de duas tentativas<br />
frustra<strong>da</strong>s, uma em 1954, e outra, em 1961 e, por último, o Golpe de 1964, cujos simpatizantes<br />
também o denominaram Revolução, como os de 1930.<br />
Ano 1831: Abdicação de D. Pedro I Ano 1840: Golpe <strong>da</strong> Maiori<strong>da</strong>de de D. Pedro <strong>II</strong><br />
Ano 1889: Proclamação <strong>da</strong> República Ano 1964: Golpe militar<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
Observe que, durante esse período <strong>da</strong> história, estamos<br />
diante de golpes de Estado, dos quais, mencionaremos três: 1930,<br />
1945 e 1964. Os historiadores que privilegiam os fatos <strong>da</strong> história<br />
política para periodizar a história do Brasil concor<strong>da</strong>m em encontrar<br />
aí dois períodos históricos: o primeiro, de 1930 a 1945,<br />
convencionaram denominar República Nova, ou Era Vargas, e o<br />
segundo, de 1945 a 1964, República Democrática ou República<br />
Populista. Para esses historiadores, entre 1964 e 1985, teríamos<br />
vivido sob a República dos Militares ou o Regime Autoritário e, <strong>da</strong>í<br />
aos dias de hoje, a Nova República, também denomina<strong>da</strong> República<br />
Contemporânea.<br />
Nesta Uni<strong>da</strong>de, abor<strong>da</strong>remos o período <strong>da</strong> história brasileira<br />
que se estende de 1930 a 1964. Aliás, por privilegiarmos o<br />
fenômeno educativo em nossa abor<strong>da</strong>gem histórica, não faremos<br />
como os historiadores que se dedicam às coisas <strong>da</strong> política, que<br />
estabelecem um corte em 1945. Pelo mesmo motivo, não<br />
consideraremos os anos 1930 e 1964 de maneira exata. Eles não<br />
<strong>da</strong>riam conta do fenômeno educativo. Como você deve lembrar,<br />
Saviani, estu<strong>da</strong>ndo a história <strong>da</strong> escola pública no Brasil, delimitou,<br />
entre 1931 e 1961, o período que ele denominou de<br />
“regulamentação nacional do ensino”, quando o Estado nascido de<br />
1930 “sinalizou na direção de se considerar a educação, em seu<br />
conjunto, como uma questão nacional”. Foi só em 1931 que se<br />
criou o Ministério <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> e Saúde Pública e se procedeu a<br />
uma reforma educacional de caráter nacional e, em 1961, foi<br />
promulga<strong>da</strong> nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases <strong>da</strong> <strong>Educação</strong><br />
Nacional.<br />
Se, no estudo sobre a história <strong>da</strong> escola pública no Brasil,<br />
Saviani relacionou a política educacional desenvolvi<strong>da</strong> no País entre<br />
1931 e 1961 ao ideário <strong>da</strong> Escola Nova, foi no artigo “As concepções<br />
pe<strong>da</strong>gógicas na história <strong>da</strong> educação brasileira” que ele tratou<br />
especificamente <strong>da</strong> Pe<strong>da</strong>gogia Renovadora, situando a emergência<br />
e predominância dessa concepção pe<strong>da</strong>gógica entre 1932 e 1969.<br />
Quanto à <strong>da</strong>ta inicial, ele a justificou, afirmando que<br />
O movimento dos renovadores ganha corpo com a fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> Associação<br />
<strong>Brasileira</strong> de <strong>Educação</strong> (ABE), em 1924, se expande com a realização <strong>da</strong>s<br />
Conferências Nacionais de <strong>Educação</strong>, a partir de 1927, e atinge plena<br />
visibili<strong>da</strong>de com o lançamento do “Manifesto dos Pioneiros <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> Nova”,<br />
em 1932.<br />
Quanto à <strong>da</strong>ta final desse período, 1969, ele diz que<br />
Muitos termos encontrados nesta Aula<br />
merecem uma discussão tão profun<strong>da</strong> que<br />
nos exigiria um espaço de que não dispomos.<br />
Por exemplo, pode-se mesmo afirmar que o<br />
Brasil é uma república? O que é uma<br />
república? É suficiente termos governos<br />
eleitos e temporários para termos uma<br />
república? Uma república se define por<br />
comparação a uma monarquia? O que é<br />
democracia? Basta haver eleições para termos<br />
um estado democrático? É possível imaginar<br />
um regime político dito democrático numa<br />
socie<strong>da</strong>de, inquestionavelmente, autoritária?<br />
Veja bem: A república brasileira entre 1945 e<br />
1964 é denomina<strong>da</strong> democrática ou<br />
populista. Democracia e populismo são a<br />
mesma coisa? O que é populismo? Getúlio<br />
Vargas era democrata ou populista? E nosso<br />
presidente atual? O que há de comum e de<br />
diferente entre Getúlio Vargas e nosso<br />
presidente atual? Vargas assumiu o poder,<br />
pela primeira vez, por meio de um golpe; em<br />
breve, deu um golpe dentro do golpe e<br />
implantou uma ditadura; a seguir, foi<br />
derrubado como ditador; tempos depois,<br />
voltou como democrata. Pasmem: aplaudido<br />
pelo mesmo partido comunista que ele tanto<br />
perseguira. Você não acha tudo isso muito<br />
confuso?<br />
Reflita sobre essas questões, recorrendo<br />
ao GOOGLE. Acesse as palavras<br />
Autoritarismo, Ditadura, Democracia,<br />
República, Populismo e outras tantas que<br />
essas sugerirem. Faça isso porque, adiante,<br />
tenho um desafio para você.<br />
No âmbito <strong>da</strong> educação escolar, procedeu-se ao ajuste do sistema de ensino<br />
à nova situação decorrente do golpe militar de 1964. Isso foi feito por meio <strong>da</strong><br />
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Aula 6 Aula 7<br />
Lei 5.540/68 e do Decreto 464/69, no que se refere à reforma do ensino<br />
superior, e pela Lei 5.692/71, no tocante aos ensinos primário e médio, que<br />
passaram a ser denominados de 1º e 2º graus. Em termos teóricos, buscouse<br />
imprimir uma nova orientação pe<strong>da</strong>gógica [produtivista] inspira<strong>da</strong> na “teoria<br />
do capital humano”.<br />
Dessa forma, situaremos esse período <strong>da</strong> história do Brasil, tendo como parâmetro a educação,<br />
entre os primeiros anos <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1930 e os últimos anos <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1960. Significa dizer<br />
que é difícil estabelecer uma <strong>da</strong>ta precisa para o começo e o fim de um período <strong>da</strong> história, em<br />
geral, e <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação entre nós, em particular. Tanto que, se tomássemos a educação<br />
infantil como parâmetro para estabelecer uma periodização <strong>da</strong> história <strong>da</strong> educação brasileira,<br />
dificilmente poderíamos considerar o início dos anos 1930 como ponto de parti<strong>da</strong> para um <strong>da</strong>do<br />
período, uma vez que o Estado que se constituiu, a partir de então, demorou a <strong>da</strong>r atenção à<br />
educação infantil, embora ele tenha criado o Ministério <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> e Saúde Pública, em 1931, e<br />
seu primeiro ministro, Francisco Campos, tenha procedido a uma ampla reforma educacional,<br />
conheci<strong>da</strong> como Reforma Francisco Campos.<br />
Por essa reforma, cujas principais medi<strong>da</strong>s se estenderam entre 1931 e 1932, Campos criou<br />
o Conselho Nacional de <strong>Educação</strong>, dispôs sobre a organização do ensino superior e adotou o<br />
regime universitário, organizou o ensino comercial, dispôs e consolidou as disposições sobre a<br />
organização do ensino secundário; mas o ensino primário, que corresponderia, hoje, à primeira<br />
etapa do nosso ensino fun<strong>da</strong>mental, não foi contemplado, assim como a educação infantil, que<br />
teria de esperar pelo novo ministro, Gustavo Capanema, que assumiria em julho de 1934.<br />
Assim como Campos, Capanema também procedeu a uma reforma educacional. Foram as<br />
“leis orgânicas de ensino”, também conheci<strong>da</strong>s como Reforma Capanema. Essa reforma abrangeu<br />
Os ensinos industrial e secundário (1942), comercial (1943), normal, primário<br />
e agrícola (1946), complementados pela criação do Serviço Nacional de<br />
Aprendizagem Industrial (Senai) (1942) e do Serviço Nacional de Aprendizagem<br />
Comercial (Senac) (1946). Por essas reformas, o ensino primário foi desdobrado<br />
em ensino primário fun<strong>da</strong>mental e ensino primário supletivo. Para o primário<br />
fun<strong>da</strong>mental, destinado a crianças entre 7 e 12 anos, foram previstas duas<br />
mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des: o ensino primário elementar com duração de quatro anos e o<br />
ensino primário complementar, de apenas um ano, acrescentado ao curso<br />
primário elementar. O ensino primário supletivo, com a duração de dois anos,<br />
destinava-se a adolescentes e adultos que não haviam tido a oportuni<strong>da</strong>de<br />
de freqüentar a escola na i<strong>da</strong>de adequa<strong>da</strong>. O ensino médio ficou organizado<br />
verticalmente em dois ciclos, o ginasial, com a duração de quatro anos, e o<br />
colegial, com a duração de três anos e, horizontalmente, nos ramos secundário<br />
e técnico profissional. O ramo profissional subdividiu-se em industrial, comercial<br />
e agrícola, além do normal que mantinha interface com o secundário (SAVIANI,<br />
2004, p. 37-38).<br />
Quanto à educação infantil, a atenção só veio com o Decreto-lei 8530, de 1946, parte <strong>da</strong><br />
Reforma Capanema. Esse Decreto-lei fez parte <strong>da</strong> Lei Orgânica do Ensino Normal, que entregou<br />
aos Institutos de <strong>Educação</strong> a responsabili<strong>da</strong>de pela formação dos profissionais do magistério<br />
primário e do ensino pré-escolar.<br />
Portanto, ain<strong>da</strong> que o Estado nascido com o golpe de 1930 tenha se preocupado com a<br />
educação infantil, essa preocupação só se manifestou, de forma legal, no ano 1946, que, embora<br />
fazendo parte do contexto, é uma <strong>da</strong>ta muito distante de 1930.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Quanto ao final desse possível período histórico <strong>da</strong><br />
educação infantil brasileira, iniciado sobre a reali<strong>da</strong>de<br />
cria<strong>da</strong> pelo golpe de 1930, também seria difícil fazê-lo<br />
coincidir com qualquer <strong>da</strong>s periodizações propostas por<br />
Saviani. Em primeiro lugar, porque foi somente a partir<br />
<strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1970 que se instituiu a educação préescolar<br />
para crianças de 4 a 6 anos. Ain<strong>da</strong> assim, em<br />
nível compensatório. O elevado índice de evasão escolar<br />
e de repetência <strong>da</strong>s crianças <strong>da</strong>s classes pobres, no<br />
então ensino de primeiro grau, levou o Estado a estimular<br />
essa mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de de ensino, visando a suprir as carências<br />
culturais existentes nas famílias <strong>da</strong>quelas crianças. Mas,<br />
supririam? Foi nessa mesma déca<strong>da</strong> de 1970 em que se<br />
adotou um modelo de expansão <strong>da</strong> pré-escola no<br />
Nordeste brasileiro, o chamado “educação pré-escolar<br />
de massa”, apoiado pelo Banco Mundial. Segundo esse<br />
modelo, cerca de 90 alunos eram postos em uma mesma<br />
sala de aula, sob a orientação de uma professora, que<br />
contava com a aju<strong>da</strong> <strong>da</strong>s mães. A intenção? Diminuir<br />
custos de infra-estrutura (90 alunos por sala) e de mãode-obra<br />
(as mães, como voluntárias, pessoas não<br />
habilita<strong>da</strong>s). Ao mesmo tempo, uma falsa idéia de<br />
participação.<br />
Apesar dos limites dessa compreensão de educação<br />
infantil, ela já apresentava alguma diferença em relação<br />
à concepção anterior, quando, pelo menos no que tange<br />
à educação infantil ofereci<strong>da</strong> aos segmentos subalternos<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, os filhos <strong>da</strong>s mães que trabalhavam na<br />
indústria e como emprega<strong>da</strong>s domésticas, não passava<br />
de meros postos de assistência.<br />
Tanta atenção <strong>da</strong><strong>da</strong> ao fenômeno<br />
educativo no Brasil, a partir de 1930, não<br />
era casual nem fruto <strong>da</strong> boa vontade de<br />
qualquer governante. Como refere Renato<br />
Ortiz, revolução industrial e moderni<strong>da</strong>de<br />
caminham juntas. Elas trazem consigo um<br />
processo de integração até então<br />
desconhecido: a constituição <strong>da</strong> nação.<br />
Diferentemente <strong>da</strong> noção de Estado (muito<br />
antiga na história dos homens), a <strong>da</strong> nação<br />
é fruto do Século XIX. Ela pressupõe que,<br />
no âmbito de um determinado território,<br />
ocorra um movimento de integração<br />
econômica (emergência de um mercado<br />
nacional), social (educação de ‘todos’ os<br />
ci<strong>da</strong>dãos), política (advento do ideal<br />
democrático como elemento ordenador <strong>da</strong>s<br />
relações dos partidos e <strong>da</strong>s classes sociais)<br />
e cultural (unificação lingüística e simbólica<br />
de seus habitantes) (ORTIZ, 1999, p. 78).<br />
Há muito o que se discutir, nesse texto,<br />
se o relacionarmos ao Estado brasileiro<br />
constituído a partir de 1930. Mas uma coisa<br />
é certa: a indústria chegou, e a música<br />
registrou, como na canção “Três apitos”, de<br />
Noel Rosa. Composta em 1933, foi grava<strong>da</strong>,<br />
pela primeira vez, em 1951, por Aracy de<br />
Almei<strong>da</strong>. Há gravação mais recente com<br />
Maria Betânia.<br />
Quando o apito/ Da fábrica de tecidos/ Vem<br />
ferir os meus ouvidos/ Eu me lembro de<br />
você.<br />
Mas você an<strong>da</strong>/ Sem dúvi<strong>da</strong> bem zanga<strong>da</strong>/<br />
Ou está interessa<strong>da</strong>/ Em fingir que não<br />
me vê.<br />
Você que atende ao apito/ De uma chaminé<br />
de barro/ Por que não atende ao grito tão<br />
aflito/ Da buzina do meu carro?<br />
Você no inverno/ Sem meias vai pro<br />
trabalho/ Não faz fé com agasalho/ Nem<br />
no frio você crê.<br />
Você é mesmo/ Artigo que não se imita/<br />
Quando a fábrica apita/ E você sabe por<br />
quê.<br />
Nos meus olhos você vê/ Como eu sofro<br />
cruelmente/ Com ciúmes do gerente,<br />
impertinente/ Que dá ordens pra você.<br />
Sou do sereno/ Poeta muito soturno/ Vou<br />
virar guar<strong>da</strong>-noturno/ E você sabe por quê.<br />
Mas você não sabe/ Que enquanto você<br />
faz pano/ Faço junto do piano/ Esses versos<br />
pra você.<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
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Só para mexer com sua cabecinha: Numa socie<strong>da</strong>de que se quer democrática, e<br />
uma democracia que se pretende com tantos adjetivos, como ci<strong>da</strong>dã, popular e não<br />
sei mais o quê, não seria mais democrático garantir aos jovens uma situação que<br />
lhes permitisse constituir família em condições de prover a primeira educação de<br />
seus filhos, só os liberando para a educação extra-familiar no devido tempo? Pense<br />
bem: se você gozasse de uma condição material condigna, enviaria seus filhos para<br />
uma creche ou pré-escola ou lhes <strong>da</strong>ria uma mais longa educação familiar? Se, ao<br />
mesmo tempo, as famílias brasileiras fossem portadoras de um bom nível de<br />
escolari<strong>da</strong>de, prefeririam preparar seus filhos para a vi<strong>da</strong> escolar (ensino fun<strong>da</strong>mental)<br />
numa creche/pré-escola ou no âmbito familiar? Acho que o desafio 2 <strong>da</strong> Aula 3 pode<br />
ajudá-lo a refletir sobre isso.<br />
Em segundo lugar, como diz Rocha (2005), “escola e pré-escola detêm especifici<strong>da</strong>des<br />
próprias relaciona<strong>da</strong>s a sua história, organização, finali<strong>da</strong>de etc., que merecem abor<strong>da</strong>gens<br />
específicas.” Razão por que ela in<strong>da</strong>ga: “Valeriam para a educação infantil parâmetros pe<strong>da</strong>gógicos<br />
escolares estabelecendo-se apenas diferenciais relativos à faixa etária?” Ela mesma responde<br />
que não, argumentando<br />
Que a tarefa <strong>da</strong>s instituições de educação infantil não se limita ao domínio do<br />
conhecimento, assumindo funções de complementari<strong>da</strong>de e socialização<br />
relativas tanto à educação como ao cui<strong>da</strong>do, e tendo como objeto as relações<br />
educativas-pe<strong>da</strong>gógicas estabeleci<strong>da</strong>s entre e com as crianças pequenas (0 a<br />
6 anos). (ROCHA, 2005).<br />
(Fonte: . Acesso em: 19 abr. 2007).<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
166
DESAFIOS<br />
Organizem-se em grupos. Como, anteriormente, foi sugerido um desafio a ser enfrentado por<br />
grupos de cinco pessoas, façamos desse quantitativo uma regra. Sendo assim, nem mais nem<br />
menos que cinco.<br />
1) Formado o grupo, elaborem cinco perguntas a ser feitas a pessoas de famílias diferentes de<br />
um bairro <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de. Identifiquem o bairro. Da mesma forma, quero ter acesso às perguntas<br />
que vocês formularem. Em nenhum momento, registrem os nomes <strong>da</strong>s pessoas.<br />
Elaborem perguntas que evitem respostas do tipo “sim”, “não”, “mais ou menos”. Não se trata de<br />
questionário, mas de entrevista.<br />
2) Agora, vão ao bairro, munidos de um caderno de anotações. Caso vocês disponham de um<br />
gravador, será melhor. Mas tenham cui<strong>da</strong>do para não constranger seus entrevistados.<br />
Suas perguntas devem ser objetivas. A intenção é saber:<br />
a) Se a estrutura econômica <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de justifica o engajamento do poder público estadual ou<br />
municipal em políticas de expansão <strong>da</strong> rede escolar. Certamente, vocês devem apresentar um<br />
quadro representativo <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de, em termos de agricultura, comércio, indústria, turismo,<br />
economia informal;<br />
b) Em caso afirmativo, que tipo de escola deveria ser estimula<strong>da</strong>, adotando qual currículo, carga<br />
horária e sua distribuição ao longo do ano letivo...;<br />
c) Se a expansão <strong>da</strong> rede escolar pública de sua ci<strong>da</strong>de, seja pelo aumento do número de<br />
escolas, seja pela ampliação <strong>da</strong>s existentes, é fruto de reclamos <strong>da</strong> população, de interesses<br />
eleitoreiros ou tem outro motivo;<br />
d) Se a expansão física <strong>da</strong> rede escolar pública tem sido acompanha<strong>da</strong> pela melhoria <strong>da</strong> educação<br />
ofereci<strong>da</strong>, em termos de seleção e qualificação dos professores; adequação do currículo ao<br />
projeto político pe<strong>da</strong>gógico, <strong>da</strong> distribuição <strong>da</strong> carga horária, do horário de funcionamento para<br />
as necessi<strong>da</strong>des sociais... É claro que essa melhoria também passa pela localização e pelas<br />
condições físicas do prédio;<br />
e) Qual o papel desempenhado pela educação infantil (pré-escola e creche) nesse contexto.<br />
3) A seguir, produzam um texto equivalente a três lau<strong>da</strong>s, conforme o modelo dos desafios<br />
anteriores, dividido em quatro partes, a saber:<br />
a) As perguntas que vocês formularam;<br />
b) Caracterização <strong>da</strong> economia do seu Município;<br />
c) Sem perder de vista essa caracterização, analisar as respostas dos entrevistados;<br />
d) Conclusão.<br />
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AULA 5: CONCEPÇÕES DA HISTÓRIA E DA PEDAGOGIA NA HISTÓRIA DA<br />
EDUCAÇÃO BRASILEIRA<br />
Quando colhemos informações sobre a situação em<br />
que se encontram a criança e a educação escolar no<br />
Brasil de hoje e comparamos com informações obti<strong>da</strong>s do<br />
passado, a primeira impressão que temos é de que a<br />
história se repete, que as coisas foram sempre assim.<br />
Aliás, essa impressão tem sua razão de ser: desde<br />
crianças, uma <strong>da</strong>s formas como a história nos foi ensina<strong>da</strong><br />
foi a forma circular. Vejamos em que ela consiste.<br />
Para entender essa questão, trace um ponto num<br />
lugar qualquer sobre uma folha de papel, o qual representa<br />
o começo <strong>da</strong> história. A partir dele, desenhe um círculo.<br />
É como se a história caminhasse ao longo dessa linha e<br />
terminasse no ponto em que você começou. Agora,<br />
recomece o desenho cobrindo a linha inicial tantas vezes<br />
quantas você queira. Essa é a forma de representar a<br />
idéia de que a história se repete. Mas, será que ela se<br />
repete mesmo? Quando eu digo que o analfabetismo era<br />
uma reali<strong>da</strong>de do Brasil dos anos 1930, como é do Brasil<br />
de hoje, estou diante de uma questão de repetição ou de<br />
permanência?<br />
Havia um filósofo na Europa do Século XIX,<br />
(1770-1831), que pensava assim.<br />
Como ele se fez muito famoso no seu tempo, e muita<br />
gente gosta de imitar os famosos, chegando até a idolatrálos,<br />
mistificá-los, é comum ouvirmos pessoas repetindo<br />
suas palavras. É ver<strong>da</strong>de que ele disse muita coisa bonita<br />
e boa, mas também disse algumas bobagens, revelandose,<br />
até, uma pessoa preconceituosa. Pelo menos em<br />
relação a nós, latino-americanos, como no texto que<br />
segue:<br />
Apesar de termos algumas informações sobre a América e sua cultura,<br />
principalmente sobre o México e o Peru, sabemos que foram povos bem<br />
primitivos, que fatalmente sucumbiriam assim que o espírito se aproximasse<br />
deles. A América sempre se mostrou, e ain<strong>da</strong> se mostra, física e espiritualmente<br />
impotente. Depois que os europeus desembarcaram na América, os nativos<br />
declinaram gra<strong>da</strong>tivamente à sombra <strong>da</strong> ativi<strong>da</strong>de européia. Nos Estados livres<br />
<strong>da</strong> América do Norte [EUA], todos os ci<strong>da</strong>dãos são descendentes de europeus,<br />
com os quais os antigos habitantes não puderam se misturar, pois foram<br />
reprimidos. De fato, os nativos assimilaram alguns costumes dos europeus,<br />
como, por exemplo, o de beber aguardente, com resultados altamente<br />
destrutivos. No sul, os nativos foram tratados de forma mais violenta e<br />
utilizados para serviços pesados, para os quais as suas forças eram<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
168<br />
Georg Wilhelm Friedrich Hegel foi um<br />
dos mais influentes filósofos alemães<br />
do Século 19. Escreveu sobre<br />
psicologia, direito, história, arte e<br />
religião.<br />
Hegel concebeu um modelo de<br />
análise <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de que influenciou<br />
Marx, Rousseau, Goethe e até<br />
Wagner. Ele debruçou-se sobre<br />
domínios diversos, como lógica,<br />
direito, religião, arte, moral, ciência<br />
e história <strong>da</strong> filosofia e, em todos<br />
eles, viu a manifestação do Espírito<br />
Absoluto que se materializava<br />
através <strong>da</strong> <strong>História</strong> <strong>da</strong> Humani<strong>da</strong>de.<br />
Na filosofia hegeliana, a dialética<br />
permitiu compreender e eluci<strong>da</strong>r a<br />
racionali<strong>da</strong>de do real. Suas principais<br />
obras foram: “Fenomenologia do<br />
Espírito” (1806), “Ciência <strong>da</strong> Lógica”<br />
(1812-1816), “Enciclopédia <strong>da</strong>s<br />
Ciências Filosóficas” (1817-1830) e<br />
“Filosofia do Direito” (1817-1830).<br />
F o n t e : < h t t p : / /<br />
www.netsaber.com.br/biografias/<br />
ver_biografia_c_487.html>. Acesso<br />
em: 06 maio 2008.
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insuficientes. Mansidão e indiferença, humil<strong>da</strong>de e submissão perante um<br />
crioulo, e ain<strong>da</strong> mais perante um europeu, são as principais características<br />
dos americanos do sul, e ain<strong>da</strong> custará muito até que europeus lá cheguem<br />
para incutir-lhes uma digni<strong>da</strong>de própria.<br />
A inferiori<strong>da</strong>de desses indivíduos, sob todos os aspectos, até mesmo o <strong>da</strong><br />
estatura, é fácil de se reconhecer. Somente as tribos que vivem bem ao sul,<br />
como as <strong>da</strong> Patagônia, são de natureza mais robusta; porém, ain<strong>da</strong> bastante<br />
rudes e selvagens. Quando os jesuítas e o clero católico quiseram acostumar<br />
os índios à cultura e aos costumes europeus (é sabido que fun<strong>da</strong>ram um Estado<br />
no Paraguai e mosteiros no México e na Califórnia), deram início à convivência<br />
com eles. Os padres <strong>da</strong>vam-lhes ordens como se os nativos fossem<br />
incapacitados para as tarefas diárias, as quais eles aceitavam, mesmo sendo<br />
preguiçosos, por causa <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de dos primeiros. Esses regulamentos (à<br />
meia-noite, um sino devia lembrar-lhes de suas obrigações matrimoniais),<br />
inicialmente, visavam à criação de necessi<strong>da</strong>des — a força motriz <strong>da</strong> iniciativa<br />
<strong>da</strong> ativi<strong>da</strong>de humana. A fraqueza do nativo americano foi a principal razão de<br />
se levar negros para a América, com o objetivo de empregar a capaci<strong>da</strong>de que<br />
eles têm de trabalhar, pois os negros são muito mais receptivos à cultura<br />
européia do que os índios (HEGEL, Friedrich. Filosofia <strong>da</strong> <strong>História</strong>, 1995, p. 74-<br />
75).<br />
Outra bobagem que ele afirmou foi que a história se repete. É ver<strong>da</strong>de que houve quem<br />
tentasse repetir a história, reviver o passado. Isso pode ser divertido no cinema, como no filme<br />
“Déjà vu”, onde, na repetição, tudo ou quase tudo se conserta, e o final é sempre feliz. Mas, na<br />
vi<strong>da</strong> real, não dá. Heráclito de Éfeso, filósofo grego do Século V a.C., já comparara “as coisas<br />
com a corrente de um rio - que não se pode entrar duas vezes na mesma corrente”. E<br />
acrescentava: “Tudo flui, na<strong>da</strong> persiste, nem permanece o mesmo”.<br />
Seguindo as pega<strong>da</strong>s de Heráclito, Karl Marx (1818-1883), outro pensador europeu do<br />
Século XIX, como Hegel, foi muito severo na crítica que fez a esse filósofo. Veja o que ele<br />
escreveu:<br />
Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de<br />
grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes.<br />
E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segun<strong>da</strong> como<br />
farsa. Caussidière por Danton, Louis Blanc por Robespierre, a Montanha de<br />
1848-1851 pela Montanha de 1793-1795, o sobrinho pelo tio. E a mesma<br />
caricatura ocorre nas circunstâncias que acompanham a segun<strong>da</strong> edição do<br />
Dezoito Brumário!<br />
Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a<br />
fazem sob as circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se<br />
defrontam diretamente, lega<strong>da</strong>s e transmiti<strong>da</strong>s pelo passado. A tradição de<br />
to<strong>da</strong>s as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos.<br />
E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às<br />
coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de<br />
crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os<br />
espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra<br />
e as roupagens, a fim de apresentar a nova cena <strong>da</strong> história do mundo nesse<br />
disfarce tradicional e nessa linguagem empresta<strong>da</strong>.<br />
Assim, Lutero adotou a máscara do apóstolo Paulo, a revolução de 1789-1814<br />
vestiu-se alterna<strong>da</strong>mente como a república romana e como o império romano,<br />
e a revolução de 1848 não soube fazer na<strong>da</strong> melhor (MARX, Karl. “O 18 Brumário<br />
de Luís Bonaparte”. Karl Marx e Friedrich Engels – Textos. Volume <strong>II</strong>I. São<br />
Paulo: Edições Sociais, 1977. p. 203).<br />
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Idealizador de uma socie<strong>da</strong>de com uma distribuição de ren<strong>da</strong> justa e equilibra<strong>da</strong>,<br />
o economista, cientista social e revolucionário socialista alemão Karl Heinrich<br />
Marx nasceu em 05 de maio de 1818, cursou Filosofia, Direito e <strong>História</strong> nas<br />
Universi<strong>da</strong>des de Bonn e Berlim e foi um dos seguidores <strong>da</strong>s idéias de Hegel.<br />
Esse filósofo alemão foi expulso <strong>da</strong> maior parte dos países europeus devido ao<br />
seu radicalismo. Seu envolvimento com radicais franceses e alemães, no agitado<br />
período de 1840, fez com que ele levantasse a bandeira do comunismo e<br />
atacasse o sistema capitalista. Segundo esse economista, o capitalismo era o<br />
principal responsável pela desorientação humana. Ele defendia a idéia de que a<br />
classe trabalhadora deveria unir-se com o propósito de derrubar os capitalistas<br />
e aniquilar de vez a característica abusiva desse sistema que, segundo ele, era o maior<br />
responsável pelas crises que se viam ca<strong>da</strong> vez mais intensifica<strong>da</strong>s pelas grandes diferenças<br />
sociais.<br />
Fonte: . Acesso em: 06 maio 2008.<br />
Eu não sei sobre você, mas eu me acho um bom aluno porque<br />
só preciso de uma explicação sobre a mesma coisa para aprender,<br />
assim como de uma única experiência para o que a vi<strong>da</strong> me ensina.<br />
Não é questão de inteligência ou de burrice, mas é porque sou muito<br />
atencioso com meus professores. Pelo menos, quando encontro um<br />
bom professor. E acredito que Marx foi um bom professor de história.<br />
Mas, ao que parece, algumas pessoas tiveram dificul<strong>da</strong>de de aprender<br />
o que ele ensinou. Foi o caso do ex-presidente brasileiro, Fernando<br />
Collor de Melo, uma tragédia, ao tentar reviver a farsa que foi outro<br />
ex-presidente, Jânio Quadros. Atualmente, parece que é o que está<br />
acontecendo com o presidente norte-americano, George W. Bush,<br />
em relação ao ex-governante alemão, Adolf Hitler.<br />
Mas não foi somente com filósofos famosos que aprendemos essa maneira circular de<br />
enxergar a história. Mesmo porque, em nossas escolas de ensino básico, a filosofia é quase uma<br />
desconheci<strong>da</strong>, e a história é ensina<strong>da</strong> do modo que só vocês sabem como! Isso porque o<br />
conhecimento que a maioria desses nossos professores traz para a escola pouco tem a ver com<br />
o que poderia ser caracterizado como científico. Apesar <strong>da</strong> diplomação escolar, parece que no<br />
mundo cultural do qual muitos deles participam, ain<strong>da</strong> predomina a orali<strong>da</strong>de. Diferentemente do<br />
que se dá na cultura letra<strong>da</strong> que, estranhamente, tem sido pouco valoriza<strong>da</strong> em nossas escolas,<br />
Na orali<strong>da</strong>de primária, o tempo tem uma circulari<strong>da</strong>de cronológica, uma espécie<br />
de horizonte de eterno retorno, embora não esteja ausente uma certa<br />
consciência de sucessão temporal. A palavra tem como função fun<strong>da</strong>mental<br />
gerenciar a memória social, além de constituir-se como expressão pessoal e<br />
comunicação <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> cotidiana. Por esse motivo, as tecnologias intelectuais<br />
que se desenvolvem têm a função de utilizar ao máximo a memória de longo<br />
prazo. Daí a presença <strong>da</strong> dramatização, <strong>da</strong> reinvenção (tradução, a<strong>da</strong>ptação<br />
e “traição”) personaliza<strong>da</strong> dos “casos”, o uso de diversos artifícios narrativos<br />
e de técnicas mnemônicas que passam pelas <strong>da</strong>nças, pelos rituais, rimas e<br />
ritmos de poemas e canções. Suas formas canônicas de saber são as narrativas<br />
e os mitos. Os sujeitos pensam através de situações (NUNES, 2000, p. 38).<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
170<br />
A esse respeito, leia o<br />
artigo “11 de setembro”,<br />
escrito na segun<strong>da</strong>-feira,<br />
18 de julho de 2005.<br />
Acesse o site:<br />
h t t p : / /<br />
www.saindo<strong>da</strong>matrix.com.br/<br />
archives/2005/07/<br />
11_de_setembro.html.
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Ora, como diz o filósofo brasileiro, Paulo Giraldhelli Jr., para a concepção circular, a história<br />
caminha em círculos, sendo que os fatos do presente na<strong>da</strong> têm de original, pois apenas repetem<br />
situações análogas do passado. Os personagens mu<strong>da</strong>m, mas o enredo é sempre o mesmo.<br />
O problema dessa concepção <strong>da</strong> história (juntamente com a concepção linear), como<br />
observa Giraldhelli, é que,<br />
ao assumirem que existe um plano predeterminado <strong>da</strong> história, se identificam<br />
com a postura conservadora, que leva os homens à passivi<strong>da</strong>de ou ao<br />
oportunismo. Assim, os portadores <strong>da</strong> concepção linear argumentam que “tudo<br />
já está traçado”, que “o mundo é assim mesmo”, que “caminhamos para o<br />
juízo final” etc. Os adeptos <strong>da</strong> concepção circular adiantam que “a história se<br />
repete”, que “sempre existiram e sempre existirão os pobres e os ricos” etc.<br />
Em ambas as posições aparecem sintomas do parasitismo, segundo o qual a<br />
única maneira de sobreviver é não afrontar os poderosos e viver <strong>da</strong>s<br />
recompensas que os ricos, porventura, possam ceder aos pobres e aos lacaios<br />
(GIRALDHELLI Jr., 1986).<br />
E mais: essas duas concepções não existem ao acaso, pois atendem a interesses políticosociais<br />
bastante claros, vinculam-se às teorias sociais funcionalistas, que enfatizam a integração<br />
social. Cardoso (2007) as resume <strong>da</strong> seguinte maneira:<br />
A socie<strong>da</strong>de é vista como uma soma de indivíduos. Ca<strong>da</strong> indivíduo, por sua<br />
vez, é um ser delimitado, unificado, integrado, livre e transparente a si mesmo:<br />
um sujeito de conhecimento e um centro dinâmico de consciência, de emoção,<br />
de ação e de juízos. A complexi<strong>da</strong>de, a estratificação social e o estado teriam<br />
surgido <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong>des sociais. Os elementos básicos desta forma de pensar<br />
implicam que: 1) os interesses sociais são compartilhados, mais do que opostos;<br />
2) no sistema social, predominam as vantagens comuns, mais do que o domínio<br />
e a exploração de uma minoria sobre uma maioria; 3) tal sistema se mantém<br />
mais pelo consenso do que pela repressão ou coerção; 4) as socie<strong>da</strong>des são<br />
sistemas integrados que se modificam lentamente, em lugar de mu<strong>da</strong>rem por<br />
meio de rupturas descontínuas (revoluções) (CARDOSO, 2007).<br />
Trazendo a discussão para o campo específico <strong>da</strong> educação, Dermeval Saviani, no livro Escola<br />
e Democracia, denominaria essas teorias funcionalistas de teorias não críticas, porque<br />
“entende[m] ser a educação um instrumento de equalização social, [concebem] a socie<strong>da</strong>de<br />
como harmoniosa, tendendo à integração dos seus membros. [A educação] constitui, pois,<br />
uma força homogeneizadora que tem por função reforçar os laços sociais, promover a coesão<br />
e garantir a integração de todos os indivíduos no corpo social. [...] Como se vê, no que<br />
respeita às relações entre educação e socie<strong>da</strong>de, concebe-se a educação com uma ampla<br />
margem de autonomia em face <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de. Tanto que lhe cabe um papel decisivo na<br />
conformação <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de evitando sua desagregação e, mais do que isso, garantindo a<br />
construção de uma socie<strong>da</strong>de igualitária” (SAVIANI, 2003. p. 4-5).<br />
É possível que até aqui você ain<strong>da</strong> esteja confuso. Isso porque, se eu digo que a história<br />
não se repete, você pode dizer que conhece exemplos que dão a impressão de que isso ocorre. E<br />
agora, como resolver esse problema? A história se repete ou não se repete?<br />
Tenha cui<strong>da</strong>do com as aparências, pois, como você já ouviu muitas vezes e até já deve ter<br />
repetido outras tantas, “as aparências sempre enganam”. É isso mesmo. Muitas vezes,<br />
escorregamos, deixando que as aparências nos orientem, conduzam nossas ações, porquanto<br />
nos acomo<strong>da</strong>mos ao que nossos sentidos nos permitem perceber de imediato e deixamos de fazer<br />
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aquela perguntinha básica, que caracteriza uma toma<strong>da</strong> de posição crítica: Por quê? Sem essa<br />
pergunta, na<strong>da</strong> mais fazemos além de descrever, relatar, narrar o que estamos percebendo e o<br />
que chamamos reali<strong>da</strong>de. Ocorre que a reali<strong>da</strong>de que enxergamos não é uma coisa <strong>da</strong><strong>da</strong>, mas<br />
algo construído e em construção, isto é, tem uma história. E se ela se parece com reali<strong>da</strong>des<br />
passa<strong>da</strong>s, não é porque haja repetição, mas permanência. Isso mesmo, a história é feita de<br />
mu<strong>da</strong>nças e de permanências. E o que permanece, pode acreditar, é o que predomina. Daí a<br />
aparência de que a história se repete. Então, convém perguntar: por que predomina o que<br />
permanece?<br />
Acho que a explicação pode ser encontra<strong>da</strong> nas teorias sociais que se opõem às <strong>da</strong><br />
integração social, que receberam o nome de teorias do conflito social ou teorias críticas, e que<br />
enfatizam o conflito, a luta de classes. Elas foram resumi<strong>da</strong>s por Cardoso (2007), <strong>da</strong> seguinte<br />
maneira:<br />
O Estado teria surgido em função do aparecimento de interesses divididos na socie<strong>da</strong>de<br />
que se tornava complexa (tratar-se-ia <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de pós-tribal) e estaria baseado na dominação,<br />
na exploração, na coerção. Mais especificamente, as instituições governamentais de tipo estatal,<br />
fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong>s no monopólio <strong>da</strong> força arma<strong>da</strong>, na organização territorial, na cobrança de impostos,<br />
surgiram como mecanismos coercitivos e repressivos para resolver, em favor <strong>da</strong> posição privilegia<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> classe dominante, os conflitos intra-societais que surgiam por causa <strong>da</strong> estratificação econômica<br />
(proprietários/não-proprietários dos meios de produção mais importantes) e social. A classe<br />
dominante, para existir e manter-se como tal, explora e degra<strong>da</strong> as massas, a maioria <strong>da</strong> população<br />
(CARDOSO, 2007).<br />
Essas teorias estão diretamente associa<strong>da</strong>s a uma concepção <strong>da</strong> história que Giraldhelli<br />
(1986) concor<strong>da</strong> em denominar de história em zigue-zague, embora outros autores prefiram a<br />
expressão história em espiral. Tanto faz, porque, se você imaginar o desenho de um zigue-zague<br />
ou de uma espiral, perceberá , imediatamente, a diferença desses desenhos em relação a uma<br />
linha ou um círculo. Aquelas figuras, o zigue-zague e a espiral, indicam que a história. Se<br />
desenvolve entre avanços e recuos, sem predeterminações. Portanto, se desenvolve a partir de<br />
confrontos entre as classes sociais. Quando uma classe, no caso atual, a classe dos trabalhadores,<br />
obtém conquistas, então entendemos que a história avançou, progrediu. To<strong>da</strong>via, quando as<br />
forças sociais que representam a maioria <strong>da</strong> população são barra<strong>da</strong>s, ou até mesmo semidestruí<strong>da</strong>s,<br />
há, então, um retrocesso histórico.<br />
É por isso que os defensores dessa concepção <strong>da</strong> história a entendem como uma interpretação<br />
progressista. Para ela, não existe plano histórico predeterminado. Os homens constroem de fato<br />
sua própria história, só que o fazem a partir de certas condições materiais determina<strong>da</strong>s, que<br />
muitas vezes os obrigam a se organizar em classes. Tais classes não possuem os mesmos interesses<br />
e, portanto, se entrechocam, propiciando os avanços e recuos <strong>da</strong> história. Os adeptos dessa<br />
concepção admitem que o avanço histórico se efetiva quando as classes populares, que são a<br />
maioria, fazem valer seus interesses. Para eles, impõem-se a participação e o engajamento no<br />
processo social e na luta de classes (GIRALDHELLI Jr, 1986).<br />
Tudo isso serviu para lhe dizer que o que permanece na história é o que interessa a<br />
determinados grupos político-sociais porque eles se beneficiam com essas permanências, que são<br />
ensina<strong>da</strong>s como uma repetição do passado. Esses ensinamentos se fazem por meio <strong>da</strong>s agências<br />
que compõem a socie<strong>da</strong>de, a exemplo dos meios de comunicação de massa, como a televisão,<br />
por exemplo, com seus programas de auditório, novelas, noticiários e outras tantas ativi<strong>da</strong>des<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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aparentemente ingênuas e descomprometi<strong>da</strong>s; por meio ain<strong>da</strong> <strong>da</strong> igreja, <strong>da</strong> família e, pasmem, <strong>da</strong><br />
escola, pelo menos, dependendo <strong>da</strong> forma como ela está sendo vivencia<strong>da</strong>.<br />
Assim, quando colhemos informações sobre a situação em que se encontram a criança, a<br />
escola e a educação escolar do Brasil de hoje e a do passado, a primeira impressão que temos é<br />
de que a história se repete. Aliás, basta olhar para o Estado <strong>da</strong> Paraíba, que é um retrato do<br />
Brasil. O Jornal “Correio <strong>da</strong> Paraíba” de Domingo, 30 de setembro de 2007, no Caderno “Ci<strong>da</strong>des”,<br />
exibiu o seguinte quadro, tendo como fontes PNAD/2006; INEP/MEC e Instituto Paulo Montenegro:<br />
767 mil é o número de analfabetos com mais de cinco anos de i<strong>da</strong>de, em todo o Estado. Eles<br />
representam 23,1% <strong>da</strong> população;<br />
21,7% dos analfabetos são crianças de cinco a 14 anos; 10,7% são jovens entre 15 e 29<br />
anos e 67,6%, adultos maiores de 30 anos;<br />
56,7% dos analfabetos (435 mil) são homens;<br />
43,3% (332 mil) são mulheres;<br />
64,1% vivem na zona urbana;<br />
35,9% são <strong>da</strong> zona rural;<br />
112 mil crianças freqüentavam a 1ª série do Ensino Fun<strong>da</strong>mental, sendo que 84 mil eram <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de e 28 mil, do campo;<br />
23,3% dos alunos <strong>da</strong> primeira série são reprovados e 13,4% abandonam a escola;<br />
97,1% <strong>da</strong>s crianças de 7 a 14 anos freqüentam a escola, mas 68,2% dos estu<strong>da</strong>ntes que<br />
chegam à 4ª série não desenvolvem as habili<strong>da</strong>des básicas de leitura e 67% apresentam<br />
graves deficiências em Matemática;<br />
Apenas 14% dos jovens e adultos com i<strong>da</strong>des entre 15 e 64 anos atingem um grau de pleno<br />
letramento, desenvolvendo as habili<strong>da</strong>des de leitura/escrita e raciocínio matemático<br />
necessárias para terem um bom desenvolvimento pessoal e profissional.<br />
Três domingos antes, no dia 9 de setembro, o mesmo “Correio <strong>da</strong> Paraíba” abor<strong>da</strong>va a<br />
questão do ensino a partir dos professores. As manchetes eram bem eluci<strong>da</strong>tivas: 28 mil<br />
professores na PB são tapa-buraco: Docentes sem licenciatura acabam comprometendo a<br />
formação de alunos, principalmente do ensino médio; Carreira no magistério não atrai jovens:<br />
Estudo atribui desinteresse aos baixos salários, falta de condições de trabalho e à violência na<br />
escola; 50% dos docentes sem licenciatura: APLP diz que rede estadual tem formados, mas<br />
muitos atuam em áreas para as quais não foram qualificados; Alunos fracos são reflexo do<br />
ensino ruim: 68% dos estu<strong>da</strong>ntes chegam à 4ª série sem saber ler e 67% sem desenvolver<br />
habili<strong>da</strong>des matemáticas.<br />
No passado, as coisas não eram muito diferentes. Nicolaci-<strong>da</strong>-Costa, em artigo publicado<br />
na Revista Ciência Hoje, conta que<br />
Em 1933, foi nomeado diretor <strong>da</strong> Instrução Pública de<br />
Alagoas. Embora qualificasse a medi<strong>da</strong> de “disparate administrativo”, pôs mãos<br />
à obra. Após um balanço <strong>da</strong> situação <strong>da</strong>s escolas primárias, tomou decisões<br />
que, muitas delas, causaram escân<strong>da</strong>lo: não construir nenhuma escola nova,<br />
num estado carente delas; em vez disso, fazer cozinhas nas que já existiam<br />
e, como constatara, estavam às moscas (a meren<strong>da</strong> escolar nunca fora<br />
cogita<strong>da</strong> no país); encomen<strong>da</strong>r fardos de sarja azul e morim branco e sapatos<br />
para vestir e calçar a menina<strong>da</strong>; efetivar as mestras de roça, sem diploma,<br />
mediante concurso.<br />
[...] Passados 55 anos, boa parte <strong>da</strong> literatura produzi<strong>da</strong> no campo <strong>da</strong> educação<br />
e as estatísticas divulga<strong>da</strong>s pelos órgãos oficiais dão conta de que os problemas<br />
básicos <strong>da</strong> escola pública de primeiro grau no Brasil são aqueles mesmos<br />
percebidos por Graciliano em Alagoas... (NICOLACI-DA-COSTA, 1988, p. 40).<br />
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Graciliano Ramos de Oliveira (Quebrangulo, 27 de outubro de 1892 — Rio de Janeiro, 20 de março<br />
de 1953) foi um escritor, romancista, cronista, contista, jornalista e memorialista brasileiro do Século<br />
XX.<br />
Primogênito de dezesseis filhos do casal Sebastião Ramos de Oliveira e Maria Amélia Ramos,<br />
viveu os primeiros anos em diversas ci<strong>da</strong>des do Nordeste brasileiro. Terminando o segundo grau em<br />
Maceió, seguiu para o Rio de Janeiro, onde passou um tempo trabalhando como jornalista. Volta<br />
para o Nordeste em setembro de 1915, fixando-se junto ao pai, que era comerciante em Palmeira<br />
dos Índios, Alagoas. Neste mesmo ano casa-se com Maria Augusta de Barros, que morre em 1920,<br />
deixando-lhe quatro filhos.<br />
Foi eleito prefeito de Palmeira dos Índios em 1927, tomando posse no ano seguinte. Manterse-ia<br />
no cargo por dois anos, renunciando a 10 de abril de 1930. Segundo uma de suas autodescrições,<br />
“(...) Quando prefeito de uma ci<strong>da</strong>de do interior, soltava os presos para construírem<br />
estra<strong>da</strong>s.” Os relatórios <strong>da</strong> prefeitura que escreveu nesse período chamaram a atenção de Augusto<br />
Schmidt, editor carioca que o animou a publicar Caetés (1933).<br />
Entre 1930 e 1936 viveu em Maceió, trabalhando como diretor <strong>da</strong> Imprensa Oficial e diretor <strong>da</strong><br />
Instrução Pública do estado. Em 1934 havia publicado São Bernardo, e quando se preparava para<br />
publicar o próximo livro, foi preso em decorrência do pânico insuflado por Getúlio Vargas após a<br />
Intentona Comunista de 1935. Com aju<strong>da</strong> de amigos, entre os quais José Lins do Rego, consegue<br />
publicar Angústia (1936), considera<strong>da</strong> por muitos críticos como sua melhor obra. É libertado em<br />
janeiro de 1937. As experiências <strong>da</strong> cadeia, entretanto, ficariam grava<strong>da</strong>s em uma obra publica<strong>da</strong><br />
postumamente, Memórias do Cárcere (1953), relato franco dos desmandos e incoerências <strong>da</strong> ditadura<br />
a que estava submetido o Brasil.<br />
Em 1938 publicou Vi<strong>da</strong>s Secas. Em segui<strong>da</strong> estabeleceu-se no Rio de Janeiro, como inspetor<br />
federal de ensino. Em 1945 ingressou no Partido Comunista Brasileiro (PCB), de orientação soviética<br />
e sob o comando de Luís Carlos Prestes; nos anos seguintes, realizaria algumas viagens a países<br />
europeus com sua segun<strong>da</strong> esposa, Heloísa Medeiros Ramos, retrata<strong>da</strong>s no livro Viagem (1954).<br />
Ain<strong>da</strong> em 1945, publicou Infância, relato autobiográfico.<br />
Adoeceu gravemente em 1952. No começo de 1953 foi internado, mas acabaria falecendo em<br />
20 de março de 1953, aos 60 anos, vítima de câncer do pulmão.<br />
O estilo formal de escrita e a caracterização do eu em constante conflito (até mesmo violento) com o<br />
mundo, a opressão e a dor seriam marcas de sua literatura.<br />
Fonte: . Acesso em: 29 abr. 2008.<br />
Vinte anos depois do artigo de Costa, a mesma reali<strong>da</strong>de: repetição ou permanência? Por<br />
que essa permanência, depois de tantas promessas de políticos profissionais em tempo de<br />
campanha eleitoral, tantas leis, reformas educacionais, criação de novos organismos e liberação<br />
de vultosas somas em dinheiro para fins educacionais, introdução de novas tecnologias no<br />
sistema escolar... e novas pe<strong>da</strong>gogias? No entanto, as mu<strong>da</strong>nças não chegam, ou são muito<br />
pouco perceptíveis. Significa dizer que alguma coisa está faltando. Vamos pensar a respeito?<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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DESAFIOS<br />
1) Reunam-se em grupos de 5 colegas de turma e elaborem, em conjunto, entre 5 e 10 questões<br />
a ser feitas a membros de uma bairro de sua ci<strong>da</strong>de, de modo que ca<strong>da</strong> grupo de 5 colegas fique<br />
responsável por um bairro diferente, não importando a classe social dominante no bairro escolhido.<br />
- Essas perguntas têm de ser volta<strong>da</strong>s para os temas educação escolar, alimentação, saúde e<br />
habitação, devendo estar inter-relacionados;<br />
- As perguntas têm de ser as mesmas para todos os entrevistados, que devem ser em número de<br />
5, por bairro;<br />
- Nenhuma pergunta pode permitir resposta do tipo “sim”, “não”, “bom”, “ruim”, “muito”, “pouco”,<br />
quer dizer, não é um questionário, mas uma entrevista.<br />
a) Registre as respostas, seja num caderno ou num gravador;<br />
b) Agora, ca<strong>da</strong> grupo deve sintetizar as respostas que receberam, observando o que há de<br />
comum e o que há de diferente entre elas;<br />
c) Feito isso, voltem a se reunir no grande grupo, de posse de to<strong>da</strong>s as sínteses, para, então,<br />
proceder a uma nova síntese – façam isso registrando to<strong>da</strong>s as respostas num grande quadro<br />
parietal ou num computador; discutam tudo o que coletarem;<br />
d) Passo final: ca<strong>da</strong> grupo de 5 pessoas deve elaborar um texto de duas lau<strong>da</strong>s (fonte “times<br />
new roman”, número 12, espaçamento 1,5), ocupando todos os espaços <strong>da</strong> folha de papel A4,<br />
apresentando o resultado <strong>da</strong> sua pesquisa.<br />
2) Você observou, no texto que Graciliano Ramos escreveu, algumas obras em parceria. Ele e<br />
seus parceiros escritores fazem parte do modernismo brasileiro. Agora, o que peço é o seguinte<br />
desafio a ser vencido em grupo formado por 5 pessoas (pode ser o mesmo grupo do desafio<br />
anterior):<br />
a) Apresente em uma lau<strong>da</strong> de papel A4, conforme o modelo que tem sido definido, um estudo<br />
resumido sobre o modernismo brasileiro, enfatizando as características desse movimento literário,<br />
explicando-as. Para responder a esse desafio, não faltam livros didáticos de Literatura e artigos<br />
na Internet;<br />
b) Procure (o grupo), na sua ci<strong>da</strong>de ou na região, um escritor (de poesia ou prosa), artista<br />
plástico (desenhista, escultor, ceramista) ou qualquer outro artista (popular, inclusive, como<br />
cantadores, repentistas...) vivo ou falecido, que possa ser identificado com o modernismo. A<br />
seguir, produza um texto de uma lau<strong>da</strong>, segundo o modelo já conhecido, sobre esse artista. Não<br />
se esqueça de justificar porque ele é considerado um modernista.<br />
Em caso de dificul<strong>da</strong>de, procure professores de <strong>História</strong> e de Literatura que possam orientá-lo.<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
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Aula 6 Aula 7<br />
AULA 6: A EXPANSÃO DA ESCOLA ENTRE AS DÉCADAS DE 1930 E 1960<br />
Entre os primeiros anos <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1930 e os últimos <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1960, verificou-se<br />
grande expansão <strong>da</strong> educação escolar brasileira. Aumentaram o número de matrículas e a quanti<strong>da</strong>de<br />
de escolas. Essa expansão do ensino não se constituía um fato natural, simples prolongamento<br />
do crescimento demográfico, mas respondia às exigências do processo de modernização<br />
(industrialização e urbanização) <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de.<br />
Como ensina Brandão (1982), “Ninguém escapa <strong>da</strong> educação. Em casa, na rua,<br />
na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos, todos nós envolvemos pe<strong>da</strong>ços<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para<br />
saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vi<strong>da</strong><br />
com a educação”. Assim, a educação, para existir, prescinde de escola, pois, como<br />
diz Saviani (2003), “a educação é um fenômeno próprio dos seres humanos”.<br />
Segundo Brandão (1982), “quando o trabalho que produz os bens e quando o poder que<br />
reproduz a ordem são divididos e começam a gerar hierarquias sociais, também o saber comum<br />
<strong>da</strong> tribo se divide, começa a se distribuir desigualmente e pode passar a servir ao uso político<br />
de reforçar a diferença, no lugar de um saber anterior, que afirmava a comuni<strong>da</strong>de”.<br />
Brandão continua: “Então é o começo de quando a socie<strong>da</strong>de separa e aos poucos opõe: o<br />
que faz, o que se sabe com o que se faz e o que se faz com o que se sabe. Então é quando, entre<br />
outras categorias de especiali<strong>da</strong>des, aparecem as do saber e de ensinar a saber. Este é o<br />
começo do momento em que a educação vira o ensino, que inventa a pe<strong>da</strong>gogia, reduz a<br />
aldeia à escola e transforma ‘todos’ no educador” (BRANDÃO, 1982, pp. 7 e 27).<br />
No mundo <strong>da</strong>s classes sociais, assim como no mundo primitivo, embora em outro nível, a<br />
socie<strong>da</strong>de também é a grande agência educadora. Na moderni<strong>da</strong>de, por circunstâncias<br />
históricas, a escola foi alça<strong>da</strong> a tamanha responsabili<strong>da</strong>de educativa que hoje é impossível<br />
pensarmos em educação sem relacioná-la à escola.<br />
Mas não pense que é só a socie<strong>da</strong>de se modernizar, e a escola chegar. A não ser para<br />
poucos, os mais ricos. Então, os marginalizados reclamam escolas, principalmente, quando elas<br />
são apresenta<strong>da</strong>s como instrumento de ascensão social. De ascensão política, também, isto é,<br />
de ferramenta para o exercício <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia, compreendido como o direito ao voto. Isso, num<br />
país que, até 1988, negava-o aos analfabetos.<br />
Assim como hoje, pe<strong>da</strong>gogias, ou tendências pe<strong>da</strong>gógicas, circulavam e se confrontavam<br />
nessas escolas. Afinal, o Brasil estava se modernizando, ingressando no rol <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong>des<br />
modernas, na era do “novo”. O ano 1930 não assinalou o começo <strong>da</strong> República Nova, em comparação<br />
com o período anterior, a República Velha? Impunha-se, então, formar o homem novo. Para tanto,<br />
as propostas vinham dos autodenominados educadores novos, <strong>da</strong> igreja católica, dos integralistas<br />
e dos militares, que viam a escola como a grande instituição moderna capaz de viabilizar essa<br />
formação. Se já havia escolas, restava expandi-las. É o que veremos nesta aula.<br />
A população brasileira atual (<strong>da</strong>dos de 2002) chegou a 174 milhões de habitantes. Prevê-se<br />
que, em 2050, chegará aos 247 milhões. Assim, em 50 anos, um crescimento demográfico de<br />
pouco mais de 40%. O que é muito, só comparável a países subdesenvolvidos (também chamados<br />
emergentes, periféricos em desenvolvimento, do terceiro mundo), como Índia, China, Paquistão,<br />
Nigéria, Bangladesh, Indonésia.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Assim como acontece hoje com pós-moderni<strong>da</strong>de, novos paradigmas, sustentabili<strong>da</strong>de,<br />
o tema do subdesenvolvimento era a coqueluche dos anos 1950-1960. Não era para menos:<br />
as desigual<strong>da</strong>des entre as regiões do globo alcançavam níveis alarmantes, levando amplos<br />
setores <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de civil e política a discussões em torno do assunto na busca de soluções,<br />
dizia-se. Construíram-se teorias (a <strong>da</strong> Dependência, por exemplo), criaram-se órgãos (a exemplo<br />
<strong>da</strong> SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), elaboraram-se planos,<br />
liberaram-se verbas e mais verbas...<br />
Parece que a expressão subdesenvolvimento saiu do mapa, mas o problema persiste. Talvez, ain<strong>da</strong><br />
mais gravemente. Apesar <strong>da</strong> que<strong>da</strong> <strong>da</strong>s taxas de mortali<strong>da</strong>de infantil, do crescimento demográfico, do<br />
analfabetismo (?) e dos indicadores tradicionalmente usados para medir o nível de desenvolvimento <strong>da</strong>s<br />
socie<strong>da</strong>des. Pelo que vemos, a distância entre os países e entre as classes sociais acentua-se a ca<strong>da</strong> dia.<br />
Para discutir essa questão, seria interessante começar pela leitura do que o colunista Mário Prata<br />
escreveu, respondendo à pergunta que ele mesmo formulou: “A gente é o que mesmo?” (Revista ISTOÉ,<br />
1497, 10-6-98, p. 167).<br />
Para aprofun<strong>da</strong>r, por que não voltar no tempo e conhecer trabalhos de quem viveu<br />
àquela época e escreveu apaixona<strong>da</strong>mente sobre o tema? São exemplos: o sociólogo mexicano,<br />
Rodolfo Stavenhagen, autor <strong>da</strong>s “Sete teses equivoca<strong>da</strong>s sobre a América Latina”, escrito de<br />
1965, e o jornalista uruguaio, Eduardo Galeano, autor de As veias abertas <strong>da</strong> América<br />
Latina (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970). Este último encontra-se disponível, gratuitamente,<br />
na internet, bastando acessar o “Google” e escrever o nome do livro.<br />
Mas, se compararmos a taxa de crescimento demográfico atual com a que o Brasil<br />
apresentava entre o início <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1930 e o final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1960, chegaremos a outra<br />
conclusão. Durante esse período, nossa população passou de quase 40 milhões para pouco mais<br />
de 90 milhões, o que significa dizer que, em apenas 30 anos, a população brasileira cresceu mais<br />
de 100%, isto é, mais que dobrou. Esse <strong>da</strong>do nos permite afirmar que, comparando-se as duas<br />
épocas, o crescimento populacional brasileiro é, atualmente, lento. Só não é mais, talvez, porque<br />
o número de adolescentes que se tornam mães é ca<strong>da</strong> vez maior.<br />
Segundo Julienne Gananian, “Cresce, ca<strong>da</strong> vez mais, o número de meninas<br />
grávi<strong>da</strong>s. Um em ca<strong>da</strong> quatro dos partos atendidos pela Rede Hospitalar do SUS<br />
é de mulheres abaixo de 19 anos. Adolescentes que ain<strong>da</strong> estão se transformando<br />
física e psicologicamente dão à luz e ganham a responsabili<strong>da</strong>de de criar e<br />
sustentar uma outra criança. Os números assustam: no ano passado [2000],<br />
foram mais de 32.000 partos de meninas entre 10 e 14 anos.<br />
Para Gananian, “A gravidez precoce tornou-se um problema de saúde pública não só<br />
no Brasil, mas no mundo inteiro”. Gláucia Motta Bueno afirma que, nos EUA, entre 1975 e<br />
1989, a porcentagem dos nascimentos de adolescentes grávi<strong>da</strong>s e solteiras aumentou 74,4%,<br />
e que, em 1990, os partos de mães adolescentes representaram 12,5% de todos os<br />
nascimentos no País. Segundo ela, “No Brasil, a ca<strong>da</strong> ano, cerca de 20% <strong>da</strong>s crianças que<br />
nascem são filhas de adolescentes, número que representa três vezes mais garotas com<br />
menos de 15 anos grávi<strong>da</strong>s que na déca<strong>da</strong> de 70”.<br />
Como enfrentar a questão?<br />
Segundo Gananian, “Nos Estados unidos, a ex-primeira <strong>da</strong>ma, Hillary Clinton,<br />
recomendou a abstinência sexual para diminuir as estatísticas. Na França, o<br />
Ministério <strong>da</strong> Saúde autorizou que as adolescentes tomassem, com a supervisão<br />
<strong>da</strong>s enfermeiras escolares, a pílula do dia seguinte, sem necessi<strong>da</strong>de de receita<br />
médica”.<br />
Como você, em sua escola, abor<strong>da</strong>ria essa questão?<br />
Confira em:<br />
http://www.clicfilhos.com.br/site/display_materia.jsp?titulo=Gravidez<br />
http://globallone.sites.uol.com.br/infantil/adolesc3.html<br />
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À primeira vista, não deveria ser assim. Dados estatísticos revelam que a taxa de mortali<strong>da</strong>de<br />
infantil caiu muito entre nós, assim como aumentou a taxa de longevi<strong>da</strong>de, o que contribuiria para<br />
manter a demografia em alta. Ocorre que nossa taxa de fecundi<strong>da</strong>de vem caindo progressivamente,<br />
situando-se em 2,15 (número de filhos por casal), no ano 2005, puxando o crescimento demográfico<br />
para baixo. Quer dizer: já não se fazem mais meninos como antigamente! Para confirmar, você<br />
não precisa ir muito longe. Basta perguntar aos seus pais e aos pais <strong>da</strong> maioria dos seus vizinhos<br />
e conhecidos quantos filhos os pais deles tiveram. Filhos demais, não? Só não aceite que eles<br />
digam que foi por falta de televisão.<br />
Vive-se melhor porque se têm menos filhos ou têm-se menos filhos porque<br />
se vive melhor? A pobreza <strong>da</strong> maioria <strong>da</strong>s pessoas decorre do grande número de<br />
filhos dos pobres ou do alto nível de consumo dos ricos? Poderiam os pobres ser<br />
acusados do crescimento <strong>da</strong> pobreza no mundo quando países ricos atraem<br />
populações de países pobres para manter sua economia funcionando? A pobreza<br />
verifica<strong>da</strong> na maior parte do mundo decorre <strong>da</strong> escassez <strong>da</strong> produção ou <strong>da</strong> grande<br />
concentração <strong>da</strong> ren<strong>da</strong>?<br />
É interessante que você conheça o problema teoricamente. Por exemplo, em 1798, o<br />
pastor anglicano, Thomas Robert Malthus, em seu livro, Um ensaio sobre o Princípio <strong>da</strong><br />
População, profetizou, comparando o crescimento <strong>da</strong> taxa de crescimento demográfico (em<br />
progressão geométrica: 2, 4, 8, 16, 32) com a produção de alimentos (em progressão<br />
aritmética: 2, 4, 6, 8, 10), um futuro sombrio para seu país, a Inglaterra, e para a humani<strong>da</strong>de.<br />
O que não se verificou, pois a população inglesa, no Século XIX, pulou de 9 para 40 milhões<br />
de habitantes.<br />
Moralista, logo, contrário aos métodos contraceptivos, ele propôs o que mais de dois<br />
séculos depois proporia a batista norte-americana Hillary Clinton.<br />
A profecia de Malthus falhou, pois ele, simploriamente, não enxergou a possibili<strong>da</strong>de<br />
do avanço tecnológico aplicado à produção. Seus seguidores, os neomalthusianos, visando<br />
a fazer sobreviver a crença de que a fome, a pobreza e a miséria decorrem do crescimento<br />
populacional, deslocaram a explicação de sua causa do índice de fertili<strong>da</strong>de para a revolução<br />
médico-sanitária (vacinas, remédios, atendimento em postos de saúde). Da mesma maneira,<br />
deslocaram a solução para o problema: ao invés de esperarem que guerras, epidemias e<br />
catástrofes naturais fizessem subir as taxas de mortali<strong>da</strong>de, recorrem à distribuição de<br />
anticoncepcionais e esterilização em massa.<br />
To<strong>da</strong> essa preocupação dos ricos é com a situação dos pobres ou com o risco que isto<br />
pode representar para os próprios ricos? O que fazer se o crescimento populacional for<br />
contido, mas a fome, a pobreza e a miséria persistirem?<br />
É ver<strong>da</strong>de que a taxa de mortali<strong>da</strong>de infantil era muito alta naqueles tempos, mas os<br />
adultos insistiam em fazer crianças, e estas insistiam em viver. Melhor dizendo, em sobreviver. E<br />
tome gente!<br />
Acredito que, até agora, você está pensando que esta aula é de geografia, economia, ou<br />
outra coisa qualquer, menos de história <strong>da</strong> educação. Mas eu lhe digo que não, e provo. Veja<br />
bem: você tem ouvido, a três por quatro, que, quanto mais o povo é educado, mais controla a<br />
natali<strong>da</strong>de. Logo, a escola tem o papel, também, de contribuir para o controle de natali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />
socie<strong>da</strong>des. Mas, pelo que vemos, a escola brasileira, desde os anos 1930, foi expandi<strong>da</strong> ao<br />
mesmo tempo em que a população crescia. Se o crescimento <strong>da</strong> população, ultimamente, tem<br />
sido menor, seria por causa do aumento do nível de escolari<strong>da</strong>de dos nossos jovens? Lembre que<br />
o número de adolescentes que se tornam mães é ca<strong>da</strong> vez maior e que são adolescentes que<br />
freqüentam a escola. Tanto que o tema “gravidez precoce” é objeto de constantes debates nas<br />
nossas escolas, principalmente as públicas.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Vejamos outra questão. O maior crescimento de nossa população se dá, sobretudo, nos<br />
meios sociais mais pobres, na zona rural e na periferia <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des, onde se amplia a favelização<br />
e tudo o que decorre dela. Se a educação escolar não tem conseguido muito aju<strong>da</strong>r a frear o<br />
crescimento populacional brasileiro (ao que parece, isso ocorre mais por meios repressivos e<br />
moralistas do que educativos), o que ela pode fazer diante do fenômeno <strong>da</strong> favelização e de seus<br />
efeitos? Esse poder atribuído à educação não seria uma forma de mistificá-la? Reflita a respeito.<br />
Até onde vai o poder <strong>da</strong> educação? Cambi (1999) afirma que, “Na época<br />
contemporânea, afirmou-se e cresceu o ‘mito <strong>da</strong> educação’ (CAMBI, 1999, p.<br />
390). Eu pergunto a você: o que é um mito, em que ele consiste? Só existem<br />
mitos antigos, como os dos nativos <strong>da</strong> América, dos primeiros gregos ou dos<br />
autores <strong>da</strong> Bíblia? O que dizer dos mitos modernos, como os do desenvolvimento,<br />
<strong>da</strong> democracia e, por que não, <strong>da</strong> educação? A partir de quando a educação<br />
se torna um mito, ou, em outras palavras, em que consiste o mito <strong>da</strong> educação?<br />
Para que você reflita sobre essas questões, sugiro que consulte “O poder<br />
do mito”, entrevista concedi<strong>da</strong> por Joseph Campbell ao jornalista Bill Moyers;<br />
o capítulo “Os mitos”, do livro de Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia. A partir<br />
<strong>da</strong>í, leia o item 4 (“Mitos <strong>da</strong> educação”), capítulo I, Parte IV do livro de<br />
Franco Cambi, <strong>História</strong> <strong>da</strong> pe<strong>da</strong>gogia.<br />
Vamos para outra?<br />
Se nossa população era constituí<strong>da</strong>, sobretudo, de jovens (cerca de 40% dela ain<strong>da</strong> não<br />
completara 15 anos de i<strong>da</strong>de em fins <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1960, um quadro só levemente diferente do<br />
apresentado nos anos 1930), hoje é uma população que envelhece. Segundo <strong>da</strong>dos do IBGE<br />
(2002), em 1940, o percentual de jovens (entre 0 e 19 anos) era de 55,42%, e o de idosos (60<br />
anos ou mais), era de 4,06%. Em 2000 esses índices já eram de 40,16% e 8,75%, respectivamente.<br />
Ora, o que provocou essa mu<strong>da</strong>nça? Morria-se cedo no Brasil? Por quê? Apesar do crescimento<br />
e do envelhecimento <strong>da</strong> população brasileira, ain<strong>da</strong> morrem muitos jovens no Brasil. Os motivos<br />
são os mesmos? Quais as implicações de uma população predominantemente jovem ou velha para<br />
a economia de um país? Num caso ou noutro, onde haverá maiores gastos com educação?<br />
Se você já percebeu que não estamos fugindo do assunto, educação, acho que podemos<br />
continuar.<br />
Quando se pensa em educação, pensa-se na formação <strong>da</strong>s novas gerações, seu preparo<br />
para a vi<strong>da</strong> societária, participativa e, dentre outros, que lhes abra perspectivas. Você verifica<br />
isso no Brasil de hoje? E no Brasil do período que estamos estu<strong>da</strong>ndo? Por que se lutou tanto<br />
naquele período por educação escolar? Ain<strong>da</strong> hoje, luta-se no mesmo nível? Por quê? Hoje, existe<br />
garantia de emprego para quem estu<strong>da</strong>? E no período objeto de nosso estudo? Você concor<strong>da</strong><br />
com que quem não estu<strong>da</strong> deve ser excluído do emprego ou só exercer empregos de menor<br />
reconhecimento social? Por quê? E se o não estu<strong>da</strong>r não foi fruto de opção, mas de contingências?<br />
Agora, que a população brasileira envelhece, chega à velhice tendo recebido uma educação<br />
precária, além de ser expulsa precocemente do mercado de trabalho, a educação escolar tem<br />
algum papel a desempenhar nesse processo? Fala-se muito em educação para a terceira i<strong>da</strong>de.<br />
Como, se a <strong>da</strong> primeira ain<strong>da</strong> não foi resolvi<strong>da</strong>?<br />
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Ver<strong>da</strong>de seja dita: o ensino fun<strong>da</strong>mental, que o Estado brasileiro elegeu como obrigatório na<br />
déca<strong>da</strong> de 1990, está quase universalizado no Brasil. Vagas são ofereci<strong>da</strong>s em quanti<strong>da</strong>de<br />
satisfatória, não restam dúvi<strong>da</strong>s, mas nossas crianças conseguem permanecer na escola ao<br />
longo dos nove anos obrigatórios, ininterruptamente? Elas conseguem concluir a nona série no<br />
tempo regulamentar? Se não, por quê? Mesmo as que conseguem permanecer os nove anos<br />
obrigatórios na escola aprendem? Não penso apenas no que elas devam aprender para se safar<br />
em exames, testes, concursos, o que já significaria um grande passo <strong>da</strong>do pela escola. Penso,<br />
também e, sobretudo, na aquisição de conhecimentos, de saberes que lhes permitam <strong>da</strong>r significado<br />
às coisas, fazer desse aprender um instrumento não apenas do fazer, mas também do conviver e<br />
do ser. O que você acha? Pense a respeito disso.<br />
Espero, mais uma vez, tê-lo convencido de que não estamos fugindo do assunto. É assim<br />
mesmo. A história <strong>da</strong> educação tem de estar relaciona<strong>da</strong> com outros campos do conhecimento,<br />
como a geografia, a economia... Também com as outras trilhas que fazem parte do seu percurso.<br />
Assim sendo, vamos continuar.<br />
A população cresce, em geral, porque, em situações normais,<br />
verificam-se mais nascimentos do que mortes. É o que chamamos de<br />
crescimento vegetativo. Aliás, isso também ocorre com as demais<br />
espécies animais, como bem provou, no Século XIX, Charles Darwin,<br />
no livro, Origens <strong>da</strong>s espécies.<br />
Pode acontecer, também, de um país ou região conhecer, em<br />
determina<strong>da</strong>s épocas, maior expansão populacional, seja devido ao<br />
aumento <strong>da</strong> natali<strong>da</strong>de, estimulado ou não, seja em função de<br />
movimentos migratórios, como aconteceu no Brasil, devido à expansão<br />
<strong>da</strong> economia cafeeira, desde o último quartel do Século XIX, entrando<br />
pelo Século XX, com a industrialização. Certamente, você não pode<br />
desconectar esses fatos <strong>da</strong> abolição <strong>da</strong> escravidão negra brasileira<br />
(1888) e dos problemas existentes na Europa de então, continente<br />
de onde veio a maior parte dos imigrantes.<br />
Isso também pode ocorrer na relação entre as classes sociais,<br />
quer dizer, você pode verificar maior índice de crescimento vegetativo<br />
numa classe social do que em outra, como ocorre entre as pessoas<br />
de nível sócio-econômico mais baixo. Você pode encontrar, ain<strong>da</strong>,<br />
maior crescimento populacional em uma região do que em outra do<br />
mesmo país. Por exemplo, os imigrantes europeus de quem falamos<br />
dirigiram-se mais para a região brasileira que denominamos Sudeste.<br />
Era a terra do café. Como a indústria também prosperou ali, aquela<br />
era uma área de atração populacional. Por isso, muitos brasileiros de<br />
outras regiões, como o Nordeste, para lá se transferiram. E mais:<br />
para as ci<strong>da</strong>des que sobrepujaram, paulatinamente, o campo.<br />
Segundo Otaíza Romanelli (1997), a população brasileira, entre<br />
1920 e 1970, saltou de 30.635.605 para 94.501.554 51 habitantes.<br />
Esse crescimento demográfico, associado à indústria e à ci<strong>da</strong>de,<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
180<br />
Por que populações<br />
migram, deslocam-se? É<br />
por simples desejo de<br />
mu<strong>da</strong>r, porque o lugar onde<br />
vivem expulsa, um novo<br />
lugar atrai ou por tudo<br />
isso? As migrações têm<br />
caráter temporário ou<br />
definitivo?<br />
Observe que o Brasil é<br />
um país de imigrantes.<br />
Você sabe que uma ou<br />
outra manequim brasileira<br />
emigra, um ou outro<br />
jogador de futebol, um(a)<br />
ou outro(a) rapaz(moça)<br />
de programa faz o mesmo,<br />
mas, até agora você não<br />
presenciou levas de<br />
brasileiros em busca de<br />
outra pátria, como fizeram<br />
alemães, espanhóis,<br />
portugueses, italianos<br />
japoneses e outros tantos<br />
para o Brasil. Por quê? Você<br />
já parou para pensar qual<br />
o efeito dessas imigrações<br />
sobre nossa política de<br />
educação escolar?<br />
A ci<strong>da</strong>de onde você<br />
reside é um centro de<br />
imigração ou de<br />
emigração? Por quê?
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traria fortes repercussões sobre a educação escolar. Nesse mesmo período, as matrículas na<br />
escola primária cresceram muito mais: de 1.033.421 para 13.906.484. Assim, se a população<br />
brasileira pouco mais que triplicou, as matrículas na escola primária mais que decuplicaram. E os<br />
adultos que não foram atendidos por essa escola nas i<strong>da</strong>des próprias foram-no pela educação<br />
supletiva de adolescentes e adultos analfabetos, promovi<strong>da</strong> por ações de governos estaduais e<br />
pela União, como a Campanha de <strong>Educação</strong> de Adultos, instituí<strong>da</strong> em 1947, e o Movimento<br />
Brasileiro de Alfabetização (Mobral), criado em 1967. Essas ações não conseguiram erradicar o<br />
analfabetismo no Brasil, de modo que, se dos 23.639.769 jovens com 15 anos ou mais, em 1940,<br />
13.279.899 eram analfabetos, em 1970, dos 54.336.606 de brasileiros nessa faixa etária, eramno<br />
17.936.887. Como se vê, o percentual caiu, mas, em termos absolutos, o número aumentou.<br />
Ain<strong>da</strong> hoje, com a chama<strong>da</strong> universalização do ensino fun<strong>da</strong>mental (que já aponta para a<br />
universalização do conjunto <strong>da</strong> educação básica), os números continuam altos. Como você viu<br />
na aula anterior, quando nos referimos à situação educacional na Paraíba, um pequeno-grande<br />
retrato do Brasil. Isso sem falar no analfabetismo potencial ou no alfabetismo funcional, que você<br />
já conhece muito bem e, que, até recentemente, não faziam parte <strong>da</strong>s estatísticas.<br />
No ensino médio, o crescimento do número de matrículas foi ain<strong>da</strong> maior do que no primário.<br />
Segundo Romanelli, entre 1920 e 1970, o número de matrículas, nesse nível de ensino, pulou de<br />
109.281 para 4.989.776. Também houve crescimento no ensino superior. De 1932 a 1964, as<br />
matrículas saltaram de 15.943 para 112.641.<br />
A partir desse quadro, a impressão que se tem é de que a<br />
socie<strong>da</strong>de brasileira se fazia ca<strong>da</strong> vez mais democrática, porque mais<br />
gente estava na escola. Ora, essa é a fala de pessoas que não<br />
pensam no que dizem. Empolgam-se com números, deixando-se levar<br />
pela quanti<strong>da</strong>de, sem se preocupar com a quali<strong>da</strong>de e com as<br />
condições sob as quais aqueles números acontecem. Além disso,<br />
intencionalmente ou não, fazem uso indevido de certas palavras<br />
como democracia. Tento explicar.<br />
Em primeiro lugar, seria interessante você fazer leituras que o<br />
ajudem a perceber a diferença entre democratização e massificação.<br />
Essas leituras também o aju<strong>da</strong>rão a entender que não há democracia<br />
educacional, democracia política ou outra qualquer, enquanto se<br />
reproduzirem, como no caso brasileiro, fortes desigual<strong>da</strong>des sociais e<br />
as condições que as geram. Lembre-se do que escreveu João Fragoso,<br />
citado na Aula 3 <strong>da</strong> nossa Uni<strong>da</strong>de I.<br />
Em segui<strong>da</strong>, observe que ain<strong>da</strong> são muito grandes os índices<br />
de evasão e repetência em nossas escolas de educação básica. Só<br />
não são maiores porque são acobertados por mecanismos inventados<br />
pelo Estado para a promoção dos alunos. Sem esquecer que muitos<br />
professores, mesmo reclamando <strong>da</strong>s políticas de avaliação escolar<br />
dos governos, também inventam os seus para se livrarem mais cedo<br />
Não nos ilu<strong>da</strong>mos. Para<br />
que uma escola seja<br />
considera<strong>da</strong> de quali<strong>da</strong>de,<br />
democrática, ci<strong>da</strong>dã,<br />
popular ou que receba<br />
outro adjetivo qualquer,<br />
tão ao gosto de muitos<br />
demagogos, não basta que<br />
mais pessoas lhe tenham<br />
acesso. Nem que elas<br />
permaneçam na escola,<br />
porque isso pode ser<br />
conseguido por meio de<br />
artifícios, como você, que já<br />
atua em sala de aula, bem<br />
conhece. Tudo isso é<br />
importante, mas vira letra<br />
morta se o aluno não<br />
aprende. E, parece-me,<br />
esse é o grande problema<br />
do nosso ensino, hoje: a<br />
criança não aprende. Como<br />
resolver essa questão?<br />
desses alunos. Como resultado, temos alunos que concluem a educação básica em condições<br />
pouco satisfatórias, diria mesmo, de semi-analfabetismo, ingressando nos cursos de nível superior<br />
<strong>da</strong> forma como bem conhecemos.<br />
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Outro ponto: a expansão <strong>da</strong> educação brasileira não se deu apenas pelo aumento do<br />
número de matrículas, mas também pelo aumento <strong>da</strong>s uni<strong>da</strong>des escolares, sobretudo sob a<br />
iniciativa priva<strong>da</strong>. Você tem dúvi<strong>da</strong>s? Foi priva<strong>da</strong>, mesmo! O problema é que, olhando ao redor,<br />
você tem uma impressão diferente. Afinal, na sua ci<strong>da</strong>de, você vê a maioria <strong>da</strong>s crianças e dos<br />
adolescentes freqüentando escolas públicas. Manuseando <strong>da</strong>dos estatísticos, você pode até<br />
partir para a briga, em defesa de suas impressões. O quadro abaixo parece lhe <strong>da</strong>r razão, ao<br />
menos quando se trata do ensino básico. Mas dê uma olha<strong>da</strong> mais cui<strong>da</strong>dosa na última linha do<br />
quadro e verá que, no ensino superior, há mais matrículas nas escolas priva<strong>da</strong>s do que nas<br />
públicas. Sabe por quê? Acompanhe meu raciocínio.<br />
Fonte: <strong>Educação</strong> . Acesso em: 08 dez. 2006.<br />
Já faz tempo que a educação escolar é um bom negócio para quem busca rendimento para<br />
o seu dinheiro. A princípio, não tanto para o ensino pré-escolar, porque, no processo de<br />
industrialização brasileira, os empregos eram majoritariamente masculinos e, por tradição, as<br />
mulheres permaneciam no lar. Não faz muito tempo, levantamentos de <strong>da</strong>dos sobre a estrutura<br />
familiar por ocupação registravam maior número de mulheres fora do mercado de trabalho, como<br />
“domésticas”, “do lar”, e suas ativi<strong>da</strong>des no lar incluíam o que seria absorvido, mais tarde, pela<br />
creche e pela pré-escola.<br />
Se havia uma ativi<strong>da</strong>de profissional que comportava muitas mulheres, essa era<br />
o magistério, principalmente <strong>da</strong> escola primária. Diga-se de passagem, exerci<strong>da</strong><br />
como um sacerdócio. Em 1935, elas já representavam 85% do professorado e,<br />
em 1958, 93%.<br />
E lá estava a “tia”, a “professorinha”, já homenagea<strong>da</strong> quando ain<strong>da</strong> na fase <strong>da</strong><br />
formação profissional. Como na música “Normalista”, composta por Benedito<br />
Lacer<strong>da</strong> e Davi Nasser, em 1949, interpreta<strong>da</strong> por Nelson Gonçalves:<br />
Vesti<strong>da</strong> de azul e branco/ Trazendo um sorriso franco/ No rostinho encantador/ Minha lin<strong>da</strong><br />
normalista/ Rapi<strong>da</strong>mente conquista/ Meu coração sem amor.<br />
“Eu te trazia fechado/ Dentro do peito guar<strong>da</strong>do/ Meu coração sofredor/ Estou bastante inclinado/<br />
A entregá-lo ao cui<strong>da</strong>do/ Daquele brotinho em flor.<br />
Mas a normalista lin<strong>da</strong>/ Não pode casar ain<strong>da</strong>/ Só depois de se formar/ Eu estou apaixonado/<br />
O pai <strong>da</strong> moça é zangado/ E o remédio é esperar.<br />
Foi somente com a maior inserção <strong>da</strong> mulher no mundo do trabalho, em ativi<strong>da</strong>des que<br />
contribuíssem para um melhor padrão de vi<strong>da</strong> familiar, que ela transferiu o cui<strong>da</strong>do <strong>da</strong>s suas<br />
crianças para a pré-escola. Nem tanto para a creche, coisa de pobre, ela achava, preferindo a<br />
babá. E quando não tem a babá, a criança é coloca<strong>da</strong> num “berçário” ou “maternalzinho”.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Kramer (1982) afirma que “A educação pré-escolar começou a ser reconheci<strong>da</strong><br />
como necessária tanto na Europa quanto nos estados Unidos durante a<br />
depressão de 30. Seu principal objetivo era o de garantir emprego a professores,<br />
enfermeiros e outros profissionais e, simultaneamente, fornecer nutrição,<br />
proteção e um ambiente saudável e emocionalmente estável para crianças<br />
carentes de dois a cinco anos de i<strong>da</strong>de” (KRAMER, 1982, p. 26).<br />
Foi também em meio à depressão de 30 que o presidente norte-americano do partido<br />
democrata, Franklin Delano Roosevelt (1933-1945), por meio de programas de reformas<br />
conhecidos como New Deal (Novo Tratamento), estabeleceu um vasto programa de obras<br />
públicas, absorvendo a mão-de-obra ociosa, diminuiu a jorna<strong>da</strong> de trabalho, tornou os<br />
sindicatos legais, dinamizou a previdência social, criou o seguro desemprego... Era a política<br />
do Welfare State (Estado de Bem-estar, ou Estado Providência). E, prevendo a guerra (2ª<br />
Guerra Mundial) que se aproximava, investiu na indústria bélica. Estado do Bem-estar?<br />
O combate ao desemprego, promovido por Roosevelt, não era um ato de boa vontade, mas<br />
fruto de uma política econômica encabeça<strong>da</strong> por John Keynes, visando à superação <strong>da</strong> crise<br />
pela qual passava o sistema capitalista. Vários países do mundo seguiram, ao seu modo, a<br />
receita keynesiana. Você a encontraria nos países nazi-fascistas e nos ditos socialistas,<br />
como a ex-União Soviética. O Brasil de Getúlio Vargas faria o mesmo. Veja a legislação<br />
trabalhista de Vargas: uma cópia <strong>da</strong> Carta del Lavoro, <strong>da</strong> Itália de Benito Mussolini.<br />
Roosevelt ain<strong>da</strong> assumiu o controle <strong>da</strong> produção agrícola e industrial para evitar a<br />
superprodução, inclusive queimando grande quanti<strong>da</strong>de de trigo. A Argentina destruía uvas,<br />
e o Brasil, café. Visando a salvar os cafeicultores, Vargas comprou e destruiu, entre 1931 e<br />
1944, 78 milhões de sacas de café. Sabe como? Jogando ao mar ou usando como combustível<br />
para locomotivas.<br />
Atribuir a responsabili<strong>da</strong>de sobre a educação <strong>da</strong> criança pequena ao espaço extra-familiar,<br />
naqueles tempos, tanto era uma prática <strong>da</strong>s famílias mais pobres, que boa parte <strong>da</strong>s mães que<br />
procuravam as creches eram emprega<strong>da</strong>s domésticas. Ao mesmo tempo, esse espaço, a creche,<br />
guar<strong>da</strong>va caráter assistencial, cui<strong>da</strong>ndo, basicamente, <strong>da</strong> saúde, <strong>da</strong> alimentação, do combate à<br />
mortali<strong>da</strong>de infantil.<br />
Quanto à educação pré-escolar, trata-se de uma reali<strong>da</strong>de pós-1970, quando se observava<br />
uma crescente evasão escolar e repetência <strong>da</strong>s crianças sócio-economicamente pobres no então<br />
ensino de primeiro grau. Daí seu caráter compensatório, visando a suprir as carências culturais<br />
existentes entre as famílias dessas crianças. É claro que, se a existência <strong>da</strong> pré-escola só se<br />
justificasse por essas razões, dificilmente o setor privado se interessaria por ela, porque volta<strong>da</strong><br />
para um público de baixa ren<strong>da</strong>, mas, a partir dos discursos de pe<strong>da</strong>gogos que alardeavam as<br />
vantagens <strong>da</strong> educação pré-escolar sobre a exerci<strong>da</strong> pela família, no processo de socialização e<br />
de aquisição, pelas crianças, dos instrumentos que lhes proporcionassem melhor aproveitamento<br />
na futura vi<strong>da</strong> escolar. Empresários, ávidos por novos mercados, perceberam a possibili<strong>da</strong>de de<br />
explorar a educação pré-escolar, agora que havia um mercado em potencial.<br />
Essa é a pré-escola <strong>da</strong> classe média e dos remediados, que atende a uma clientela<br />
numericamente pouco inferior àquela que procura o setor estatal. Pudera, pois até os professores<br />
<strong>da</strong> pré-escola estatal, apesar dos baixos salários, <strong>da</strong>s frágeis condições materiais, procuram a<br />
empresa priva<strong>da</strong> para seus filhos! Você já refletiu sobre por que isso acontece?<br />
Voltando à tabela, nas linhas referentes aos ensinos fun<strong>da</strong>mental e médio, a distância<br />
numérica entre as escolas pública e priva<strong>da</strong>, quanto às matrículas, em favor <strong>da</strong>s públicas, pode<br />
fazer-nos pensar que essa fatia do mercado não interessa ou nunca interessou ao setor privado.<br />
Ledo engano. Segundo Clarice Nunes (2000), ao longo do período histórico situado entre os anos<br />
1930 e 1960, registrou-se grande expansão do ensino secundário (nossos atuais ensinos de 5ª a<br />
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9ª série e ensino médio). Suas matrículas atingiram 490% de aumento, entre 1933 e 1954. Você<br />
sabe por quê? É ver<strong>da</strong>de que as cama<strong>da</strong>s subalternas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de pressionavam o Estado, por<br />
meio de políticos profissionais, por oportuni<strong>da</strong>des educacionais para seus filhos, educação escolar<br />
que era, até então, privilégio. Mas não se ilu<strong>da</strong>: esses mesmos políticos eram pressionados por<br />
empresários que tinham os olhos em cima do ensino secundário. Explico.<br />
Um caso típico aconteceu no, então, Estado <strong>da</strong> Guanabara, sob o governo de Carlos<br />
Lacer<strong>da</strong>, entre 1960 e 1965. Ain<strong>da</strong> segundo Nunes (2000), esse governador promoveu a expansão<br />
escolar primária, estabelecendo a obrigatorie<strong>da</strong>de de ensino. Sem condições (?) de atender a<br />
esse público, quando atingisse a escola secundária, deixou um vazio a ser preenchido. Por quem?<br />
Claro, pelo setor privado, amparado e financiado pelo poder público. Como? Repassando verbas<br />
públicas para o setor privado via bolsas de estudo. E a festa, em favor de Lacer<strong>da</strong>, fez-se em<br />
nome do “incentivo à democratização <strong>da</strong> educação para parcelas maiores <strong>da</strong> população e em<br />
níveis escolares mais altos” (NUNES, 2000, p. 47).<br />
Foto de Carlos Lacer<strong>da</strong><br />
E Nunes (2000) continua:<br />
Ao longo do período histórico que estamos estu<strong>da</strong>ndo, três<br />
partidos se destacavam no cenário político brasileiro: PSD<br />
(Partido Social-Democrata), UDN (União Democrática Nacional)<br />
e PTB (Partido Trabalhista Brasileiro). Na UDN, destacava-se<br />
Carlos Lacer<strong>da</strong>, jornalista e empresário (dono do jornal Tribuna<br />
<strong>da</strong> Imprensa). Segundo Schmidt, Lacer<strong>da</strong> era um orador<br />
brilhante, inteligência agu<strong>da</strong>, mas reacionário, oportunista e<br />
sem escrúpulos políticos. Através do seu jornal, atacava todo<br />
mundo, fazia denúncias escabrosas sem mostrar provas,<br />
insuflava a classe média contra os trabalhistas e os<br />
comunistas [do PCB, Partido comunista do Brasil]. Lacer<strong>da</strong><br />
devastava os inimigos com sua metralhadora cuspindo nuvens<br />
de palavras. Outras figuras importantes <strong>da</strong> UDN eram os<br />
banqueiros, políticos e magnatas <strong>da</strong> grande imprensa, como<br />
Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados, Júlio<br />
Mesquita (O Estado de São Paulo) e a família Marinho (O Globo).<br />
“O maranhense José Sarney e o baiano Antônio Carlos<br />
Magalhães começaram suas carreiras políticas na velha UDN.<br />
E para você não ter mais dúvi<strong>da</strong>s, quem pediu e apoiou o<br />
golpe militar de 1964 foi a UDN” (SCHMIDT, Mário Furley. Nova<br />
história crítica do Brasil: 500 anos de história malconta<strong>da</strong>.<br />
São Paulo: Nova Geração, 1997, p. 290.).<br />
A UDN também tem história na Paraíba. Observe quantas<br />
lideranças políticas paraibanas pertenceram a essa sigla:<br />
Osvaldo Trigueiro, José Américo, Ribeiro Coutinho, Pedro<br />
Gondim, João Agripino, Ernani Sátiro.<br />
O investimento do Banco do Estado <strong>da</strong> Guanabara financiando bolsas de estudo<br />
para as escolas priva<strong>da</strong>s do ensino médio foi significativo durante o governo<br />
Lacer<strong>da</strong>. O total de bolsas financia<strong>da</strong>s se eleva de 7.761, em 1962, para 45.900<br />
bolsas em 1965. Nesse mesmo período as matrículas <strong>da</strong> rede pública de ensino<br />
médio pouco mais que duplicaram, enquanto as matrículas <strong>da</strong> rede priva<strong>da</strong><br />
sustenta<strong>da</strong>s por bolsas de estudo multiplicaram-se por quase seis vezes<br />
(NUNES, 2000, p. 47).<br />
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Esse processo de privatização <strong>da</strong> educação escolar brasileira continuou, embora em escala<br />
menor. O empobrecimento crescente <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> classe média urbana fê-la pressionar por mais<br />
escolas públicas, e o Estado cedeu. O que não trouxe maiores problemas para o setor privado,<br />
que encontrou formas de compensação, estimulando os governos a adotar programas de<br />
fornecimento de meren<strong>da</strong>, de livro didático, de recursos áudio-visuais e, mais recentemente, de<br />
computadores. E com o número crescente de egressos do ensino médio reclamando universi<strong>da</strong>des,<br />
mais uma vez, o Estado alegava falta de condições para atender, satisfatoriamente, a tal deman<strong>da</strong>,<br />
deixando um vazio a ser preenchido... pela esfera priva<strong>da</strong>.<br />
Então? Já deu para você entender por que, no ensino superior, temos hoje mais matrículas<br />
na rede priva<strong>da</strong> do que na rede pública? E veja que a diferença em favor <strong>da</strong> priva<strong>da</strong> não é<br />
pequena.<br />
Calma! Vamos esfriar a cabeça e fazer uma pausa para mais um desafio?<br />
DESAFIOS<br />
Conheçamos mais um pouco a sua ci<strong>da</strong>de e a sua educação. Nesse sentido, reúna-se com seus<br />
colegas de turma, discutam as questões que proponho, formem pequenos grupos de modo a<br />
tornar possível obter as informações necessárias à solução do desafio. Depois <strong>da</strong>s informações<br />
obti<strong>da</strong>s, socializem-nas, para que todo o grupo lhes tenha acesso. Discutam-nas nos grupos mais<br />
amplos possíveis, se possível, com to<strong>da</strong> a turma reuni<strong>da</strong>, pelo menos por ci<strong>da</strong>de. Finalmente,<br />
formem grupos menores, variando entre 3 ou 4 pessoas, façam uma discussão mais pormenoriza<strong>da</strong><br />
e produzam um texto de duas lau<strong>da</strong>s, segundo o modelo até agora adotado. As informações a<br />
serem levanta<strong>da</strong>s devem responder às seguintes questões:<br />
a) Qual o nome <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de? Em que região e sub-região político-administrativa ela se<br />
encontra? Em que ano ela nasceu como ci<strong>da</strong>de, deixando de ser distrito de qual outra ci<strong>da</strong>de?<br />
b) Qual a população atual <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de? E a população infantil entre 0 e 5 anos? (nos dois<br />
casos, podem ser valores aproximados).<br />
c) Qual era a população <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de à época do último recenseamento? E <strong>da</strong> população<br />
infantil entre 0 e 5 anos? (indique o ano desse recenseamento).<br />
d) Descrevam as ativi<strong>da</strong>des econômicas dominantes em sua ci<strong>da</strong>de, o lugar que esse(s)<br />
produto(s) ocupa(m) no conjunto <strong>da</strong> economia paraibana e o percentual <strong>da</strong> população<br />
economicamente ativa ocupa<strong>da</strong> nessa(s) ativi<strong>da</strong>de(s). Organizem um quadro comparativo dessas<br />
ativi<strong>da</strong>des, considerando agro-pecuária, comércio regular, comércio informal, indústria e serviço<br />
público (destacando o setor educacional).<br />
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Aula 6 Aula 7<br />
e) Observando a evolução <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de, em termos populacionais, você diria que ela<br />
diminuiu, cresceu ou estagnou? Como você explica esse fato? Se a população <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de<br />
cresceu, isso se deve ao crescimento vegetativo ou a migrações? Se cresceu por migrações, foi<br />
do campo para a zona urbana ou proveniente de outras ci<strong>da</strong>des? A partir de então, você consideraria<br />
sua ci<strong>da</strong>de um centro de atração ou de expulsão populacional? Se de atração, o que atrai? Se de<br />
expulsão, qual a razão?<br />
f) Hoje, quantas pré-escolas e creches há em sua ci<strong>da</strong>de? E no tempo do último<br />
recenseamento, quantas havia? De lá para cá, o número cresceu? Se cresceu, foi mais na zona<br />
rural ou na urbana? Por quê?<br />
g) Qual o nível médio de escolari<strong>da</strong>de dos pais que matriculam seus filhos nas creches e nas<br />
pré-escolas <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de?<br />
h) Existem mais creches e pré-escolas públicas ou priva<strong>da</strong>s em sua ci<strong>da</strong>de?<br />
i) Você entende a existência <strong>da</strong> creche e <strong>da</strong> pré-escola pública em sua ci<strong>da</strong>de como uma<br />
necessi<strong>da</strong>de para a criança (aprender, socializar-se), para as mães (tempo para poder trabalhar,<br />
supressão <strong>da</strong> sua carência intelectual na formação de seus filhos, garantia de uma alimentação<br />
mínima que falta em casa), para políticos locais (tome escola, dê-me voto), tudo isso ou algo<br />
mais?<br />
Agora que você já leu to<strong>da</strong>s as questões, procure, em uma lau<strong>da</strong>, fazer um quadro-síntese<br />
de suas respostas para, na seguinte, escrever em forma de re<strong>da</strong>ção.<br />
Não esqueça de responder ao desafio refletindo com base no conteúdo <strong>da</strong> aula.<br />
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AULA 7: A EXPANSÃO DA ESCOLA E A DIFUSÃO DE IDEOLOGIAS<br />
Voltando ao tema <strong>da</strong> população, tratado na aula anterior, direi<br />
que, pelo menos, num ponto, você não teria muita dificul<strong>da</strong>de de<br />
viver com aquela gente do final dos anos 1960. Como a de hoje, ela<br />
também era vidra<strong>da</strong> em futebol. Era uma gente que também passava<br />
dificul<strong>da</strong>des, estava priva<strong>da</strong> de muitas coisas fun<strong>da</strong>mentais, mas<br />
não abria mão de um aparelho de televisão. Logo agora, quando se<br />
aproximava a copa mundial de futebol de 1970, <strong>da</strong> qual o País sairia<br />
tricampeão. Já havia até uma para comemorá-la.<br />
Esta não seria a única marchinha que o regime militar implantado<br />
na déca<strong>da</strong> de 1960 utilizaria para ensinar o nacionalismo ao povo,<br />
como no exemplo abaixo.<br />
“Este é um país que vai pra frente/ Ro, Ro, Ro, Ro, Ro/<br />
De uma gente amiga e tão contente/ Rô, Ro, Ro, Ro,<br />
Ro/<br />
Este é um país que vai pra frente/ Ro, Ro, Ro, Ro, Ro./<br />
um país que canta, trabalha e se agiganta/<br />
É o Brasil do nosso amor!”<br />
Ao mesmo tempo em que divulgava músicas de caráter ufanista, o<br />
Estado sob os militares estimulava a mediocri<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Jovem<br />
Guar<strong>da</strong>: Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Vanderléia, Martinha,<br />
Ronnie Von... Eram tantos!<br />
E se hoje temos a mediocri<strong>da</strong>de de ban<strong>da</strong>s de “forró” (Calypso,<br />
Calcinha Preta, Aviões do Forró...), na época, era a dos conjuntos<br />
de yê, yê, yê (The Fevers, Renato e seus Blue Caps, Brazilian<br />
Beatles, Golden Boys...). Atente para os nomes dos conjuntos:<br />
todos em inglês. A maioria de suas músicas eram versões de<br />
músicas norte-americanas. Houve até cantores que não se<br />
satisfizeram em cantar músicas em inglês, chegando a estrangeirar<br />
seus nomes artísticos. Fábio Júnior foi um exemplo. Abaixo, mais<br />
um exemplo de ufanismo, na composição de Dom, interpreta<strong>da</strong> pela<br />
dupla Dom e Ravel.<br />
“As praias do Brasil ensolara<strong>da</strong>s/ O chão onde o país se elevou,/ A<br />
mão de Deus abençoou/<br />
Mulher que nasce aqui tem muito mais amor/<br />
O céu do meu Brasil tem mais estrelas/ O sol do meu país, mais<br />
esplendor/ A mão de Deus abençoou/<br />
Em terras brasileiras vou plantar amor.<br />
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo/ Meu coração é verde, amarelo,<br />
branco, azul anil.<br />
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo/ Ninguém segura a juventude do<br />
Brasil”.<br />
Noventa milhões em ação/<br />
Pra frente Brasil do meu<br />
coração/ Todos juntos<br />
vamos/ Pra frente Brasil<br />
salve a seleção/ De<br />
repente é aquela corrente<br />
pra frente/ Parece que todo<br />
o Brasil deu a mão/ Todos<br />
ligados na mesma emoção/<br />
Tudo é um só coração/<br />
Todos juntos, vamos, pra<br />
frente Brasil, Brasil/ Salve<br />
a Seleção.”<br />
(Composição de Miguel<br />
Gustavo, ano 1970)<br />
Agora, preste atenção para a palavra nacionalismo. Se perguntássemos a uma pessoa<br />
que não teve acesso a um longo período de escolari<strong>da</strong>de o que ela entende por nacionalismo,<br />
possivelmente ela diria tratar-se de amor à pátria, de apego às coisas do seu país, do enaltecimento<br />
dos valores e <strong>da</strong> cultura <strong>da</strong> sua nação em face <strong>da</strong>s outras. Diria também que um governo<br />
nacionalista é aquele que não só estimula essas ações entre seu povo, como também as pratica,<br />
que está comprometido com a afirmação <strong>da</strong> sua nação no cenário internacional.<br />
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Aula 6 Aula 7<br />
Mas, se aquela pessoa lesse, cui<strong>da</strong>dosamente, o primeiro quadro desta Aula, franziria a<br />
testa, ficaria com a pulga na orelha diante de sua própria resposta. É que ela não entenderia o<br />
porquê de tanto ufanismo em meio a tanto estrangeirismo. E mais: especificamente, norteamericano.<br />
Se, depois, você perguntasse à mesma pessoa de onde veio aquele entendimento sobre o<br />
nacionalismo, é possível que ela indicasse como fontes opiniões que teria ouvido de pessoas mais<br />
velhas, sem muita escolari<strong>da</strong>de, como ela; talvez indicasse o que ouviu em comícios eleitorais na<br />
rua, no rádio ou assistindo à televisão; talvez, ain<strong>da</strong>, a leitura de algum artigo de jornal ou<br />
revista.<br />
É preciso que você tenha muito cui<strong>da</strong>do com os meios de comunicação de massa, como<br />
o rádio, a televisão, o jornal. Por exemplo, encontrei na edição de sábado, 22 de março último,<br />
no Caderno “....”, do Diário de Pernambuco, p. 6, sob o título “Quem foi D João VI? O rei do<br />
Brasil”:<br />
[...] Depois de 200 anos do episódio (desembarque <strong>da</strong> coroa portuguesa no Brasil, em<br />
1808), os historiadores começam a fazer justiça ao homem responsável pelo grande<br />
desenvolvimento do país no período.<br />
[...]<br />
Para não ter de entregar o trono a Napoleão Bonaparte, imperador <strong>da</strong> França, a Coroa<br />
portuguesa decidiu mu<strong>da</strong>r-se para o Brasil. Depois de uma longa jorna<strong>da</strong> de navio, a<br />
chega<strong>da</strong> ao Brasil foi desagradável para a maioria dos viajantes. D. João, porém, não<br />
parecia incomo<strong>da</strong>do com a simplici<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Colônia. Pelo contrário, ficou encantado com as<br />
paisagens do Rio de Janeiro e <strong>da</strong> Bahia, onde havia chegado primeiro. Ex-escravos, índios<br />
e colonos pobres eram bem recebidos por D. João, que logo se tornou amado pelos<br />
brasileiros.<br />
[...]<br />
Aliás, D. João era um homem pacífico.<br />
Mas é possível, também, que ela acusasse a escola.<br />
Agora, imagine que aquela pessoa esteja, hoje, na casa dos 70 ou 80 anos, conheceu o<br />
tempo em que o rádio era o nosso grande meio de comunicação como, em parte, ain<strong>da</strong> é. Ora,<br />
por meio do rádio, ela seria informa<strong>da</strong>, estimula<strong>da</strong> a comprar, de bens de uso a imagens de<br />
políticos profissionais, passando por propagan<strong>da</strong>s de governos. Ela poderia até receber um curso<br />
de educação a distância, como você recebe hoje pela Internet. Mas o que esses meios de<br />
comunicação não fazem é mostrar o que está por trás <strong>da</strong>s coisas. Para isso, ela precisaria <strong>da</strong><br />
escola, onde demonstraria interesse como um bom aprendente, recorrendo sempre àquela<br />
perguntinha mágica: por quê? Essa escola, ao mesmo tempo, deveria contar com ensinantes que<br />
dominassem os conteúdos a serem ensinados e assumissem a responsabili<strong>da</strong>de de uma intervenção<br />
constante e contínua sobre os aprendentes, ousando fazer com eles um trabalho de aprofun<strong>da</strong>mento<br />
e desmascaramento <strong>da</strong>s ideologias, como ensina o historiador <strong>da</strong> educação, Georges Snyders.<br />
A invenção do rádio é atribuí<strong>da</strong>, geralmente, ao cientista italiano Guglielmo Marconi, a<br />
partir de experiências de laboratório anteriormente realiza<strong>da</strong>s por Heinrich Hertz, Augusto<br />
Righi e outros. Isso foi em 1895. Mas há quem atribua a invenção ao padre gaúcho, Roberto<br />
Landell de Moura, em 1893. Autoria à parte, Edgard Roquete Pinto é considerado “o pai do<br />
rádio” no Brasil por ser seu grande vulgarizador, ao perceber sua importância como meio de<br />
difusão <strong>da</strong> cultura popular. A primeira irradiação no Brasil se deu em 1922, durante as<br />
Comemorações do Centenário <strong>da</strong> Independência, realiza<strong>da</strong>s no alto do Corcovado, no Rio de<br />
Janeiro, transmitindo o discurso do então presidente Epitácio Pessoa, embora na cronologia<br />
<strong>da</strong> comunicação eletrônica de massa brasileira o surgimento do rádio no Brasil seja marcado<br />
com a fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> Rádio Clube de Pernambuco por Oscar Moreira Pinto, no Recife, em seis de<br />
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abril de 1919. A partir <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1930, o rádio ganhou populari<strong>da</strong>de e, como a televisão<br />
faria mais tarde, influenciando o modo de vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s pessoas. Essa populari<strong>da</strong>de também se<br />
deveu à ação do governo de Vargas. Visando a consoli<strong>da</strong>r a ditadura (implanta<strong>da</strong> em 1937),<br />
Vargas criou vários órgãos de propagan<strong>da</strong> dos atos do governo e <strong>da</strong> exaltação de sua figura,<br />
de modo a aproximá-lo <strong>da</strong>s massas, a exemplo do DIP (Departamento de Imprensa e<br />
Propagan<strong>da</strong>). Quanto ao papel do rádio nesse processo, leia as palavras de seu ex-ministro <strong>da</strong><br />
educação, agora ministro <strong>da</strong> justiça: “Não é preciso contato físico [entre o líder e a massa] para<br />
que haja multidão. É possível hoje [...] transformar a tranqüila opinião pública do século passado<br />
em um estado de delírio ou alucinação coletiva, mediante os instrumentos de propagação, de<br />
intensificação e de contágio de emoções, torna<strong>da</strong>s possíveis precisamente graças ao progresso<br />
que nos deu a imprensa de grande tiragem, a radiodifusão, o cinema, os recentes processos de<br />
comunicaçkão.” (Francisco Campos, citado em Nosso século. São Paulo, Abril Cultural, 1985, v. 6,<br />
p. 65).<br />
Mas se aquela pessoa acusasse a escola, como sugeri, eu não<br />
acharia isso absurdo. Aliás, veria com a maior naturali<strong>da</strong>de. E digo<br />
porque: se o professor não lê, não estu<strong>da</strong>, limita seu conhecimento<br />
às informações obti<strong>da</strong>s nos meios de comunicação de massa, ele não<br />
pode, com certeza, oferecer muita coisa para seus alunos. Quer<br />
dizer, o que se pode esperar de um professor que divide suas tardes<br />
de domingo entre Faustão, Gugu e Raul Gil? Ou que, numa noite de<br />
folga escolar, opta por uma novela de televisão, Hebe Camargo ou<br />
Big Brother, quando existem bons livros, CDs e DVDs? É triste dizer,<br />
mas já tive a infelici<strong>da</strong>de de constatar, tanto ao longo <strong>da</strong> minha<br />
experiência profissional quando durante a minha pesquisa de mestrado,<br />
que boa parte do que muitos ensinantes transmitem aos seus<br />
aprendentes não encontra suporte nos livros constantes de sua<br />
disciplina. Daí, como eles podem ousar?<br />
Assim, acredito que o primeiro passo de um ensinante que<br />
deseja ousar, que se propõe a fazer com que aquela pessoa supere a<br />
maneira de ver as coisas pela aparência, deve ser estu<strong>da</strong>r, dominar<br />
os conteúdos a serem ensinados. Lembrando que dominar os<br />
conteúdos não se restringe a reter mil e uma informações sobre o<br />
assunto. Isso é muito importante, mas implica também conhecer as<br />
ideologias para saber e ensinar o que está por trás <strong>da</strong>s coisas. O<br />
nacionalismo, por exemplo, é uma ideologia, uma retórica, que tem<br />
como função unir as pessoas que constituem uma <strong>da</strong><strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
em torno de objetivos comuns, de uma causa comum. Ocorre que<br />
não pode haver causa comum senão numa comuni<strong>da</strong>de, nunca, numa<br />
socie<strong>da</strong>de, que é constituí<strong>da</strong> de classes, logo, de grupos de pessoas<br />
com interesses antagônicos. É por isso que dizemos que a nação é<br />
uma abstração. E o nacionalismo não é mais do que um instrumento<br />
utilizado por uma classe social, ou uma fração de classe visando a<br />
conseguir a adesão de to<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong>de para a consecução de um<br />
projeto que aten<strong>da</strong> aos seus interesses, apresentando-o como um<br />
projeto de todos, de to<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong>de, <strong>da</strong> “nação”.<br />
Como afirma Melo (1982),<br />
defender que o<br />
profissional do ensino<br />
deva ter competência<br />
técnica não é a mesma<br />
coisa que ser tecnicista,<br />
mas reclamar-lhe<br />
competência profissional,<br />
extrapolar os limites do<br />
saber a ser veiculado na<br />
sala-de-aula, chegando<br />
até a “compreensão mais<br />
ampla <strong>da</strong>s relações entre<br />
a escola e a socie<strong>da</strong>de”.<br />
Porém, como o ensinante<br />
pode chegar a esse nível,<br />
se “Há alguns que<br />
dominam mal os próprios<br />
conteúdos que deveriam<br />
transmitir, que<br />
desconhecem princípios<br />
elementares do manejo<br />
de classes de<br />
alfabetização e que,<br />
muitas vezes, sequer<br />
possuem domínio<br />
satisfatório <strong>da</strong> própria<br />
língua materna?” (MELO,<br />
1982, p. 55).<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
No período histórico de que estamos tratando, o projeto era o <strong>da</strong> modernização do Brasil,<br />
identifica<strong>da</strong> com o crescimento econômico nos moldes capitalistas, o que significaria a adequação<br />
do País ao modelo de desenvolvimento definido pelas nações considera<strong>da</strong>s desenvolvi<strong>da</strong>s. O<br />
modelo a ser seguido pelo Brasil estaria nos Estados Unidos <strong>da</strong> América, país com o qual o Brasil<br />
aumentava a ca<strong>da</strong> dia suas relações comerciais e culturais, sobretudo a partir <strong>da</strong> Segun<strong>da</strong><br />
Guerra, e a classe social que perseguia esse projeto era uma fração <strong>da</strong> classe burguesa, a<br />
chama<strong>da</strong> burguesia urbano-industrial.<br />
Para a realização desse projeto, era preciso que as pessoas <strong>da</strong> outra classe, os trabalhadores,<br />
produzissem, gerassem riqueza, pensando que estariam fazendo o Brasil crescer e, com o Brasil,<br />
eles também, porque “todos juntos vamos, pra frente Brasil,[...] naquela corrente pra frente,<br />
[...] tudo é um só coração.”<br />
Paralelamente ao nacionalismo e a ele associa<strong>da</strong> surgiu outra ideologia: o desenvolvimentismo.<br />
Por que desenvolvimentismo?<br />
O que a parcela <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de que se valia <strong>da</strong> retórica do nacionalismo pretendia para o<br />
Brasil não era mais do que crescimento econômico, acumulação de capital. No entanto, a palavra<br />
que aparecia em sua fala era desenvolvimento. Ora, entre crescimento econômico e<br />
desenvolvimento, vai uma grande diferença. Crescimento econômico só tem a ver com<br />
desenvolvimento se for associado à repartição <strong>da</strong> riqueza produzi<strong>da</strong> entre todos os que participam<br />
do processo de crescimento. Nesse sentido, convenhamos, o Brasil cresceu, mas não desenvolveu.<br />
A prova é de que, ain<strong>da</strong> hoje, se fala em políticas de inclusão social, de combate à pobreza... No<br />
combate à pobreza, o Estado, em vez de garantir trabalho, conseqüentemente, dinheiro, distribui<br />
bolsas: bolsa família, bolsa escola, bolsa gás...<br />
Até agora, estamos de posse do conhecimento de duas ideologias que predominaram no<br />
Brasil durante o período histórico que estamos estu<strong>da</strong>ndo: o nacionalismo e o desenvolvimentismo.<br />
Vejamos, agora, uma terceira, que tinha como base as duas primeiras: o populismo. Tentemos<br />
entendê-lo.<br />
O Brasil, como de resto a América Latina, detinha uma tradição de exportador de produtos<br />
primários para os países ricos. Era coisa que vinha desde os tempos coloniais, quando a região<br />
começou a ser explora<strong>da</strong> pelos europeus. Durante o Século XIX, vieram os movimentos de<br />
independência e, nesse contexto, o Brasil , em 1822, separou-se de Portugal, constituindo-se<br />
como Estado independente. Sua economia, no entanto, permaneceu, grosso modo, como nos<br />
tempos coloniais: agrário-exportadora. O que não impedia que experimentássemos, vez ou outra,<br />
surtos industriais, como aconteceu em decorrência <strong>da</strong><br />
Queima de café no período Vargas<br />
lei pela abolição do tráfico negreiro, em 1850.<br />
Veio a República em 1889. Mudou o regime<br />
político, mas a reali<strong>da</strong>de econômica brasileira<br />
permaneceu a mesma: exportação de produtos primários<br />
com breves surtos de industrialização, como se deu<br />
por conta <strong>da</strong> Primeira Guerra (1914-1918). Entretanto,<br />
com a crise do capitalismo internacional de 1929, que<br />
trouxe sérios transtornos para a economia nacional,<br />
empresários brasileiros decidiram que o País deveria VICENTINO, C.; DORIGO, G. <strong>História</strong> do<br />
Brasil. São Paulo: Scipione, 1997, p. 351.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Aula 6 Aula 7<br />
industrializar-se. Certamente, sem trazer prejuízos para a agricultura de exportação. Como a do<br />
café, por exemplo, de onde provinha grande parte do capital a ser investido na ativi<strong>da</strong>de industrial.<br />
E você viu como Vargas protegeu os cafeicultores, comprando seus excedentes de produção<br />
para, em segui<strong>da</strong>, queimá-los. Só não deixe de imaginar de onde saiu o dinheiro para isso.<br />
Para avançar no processo de industrialização brasileira, os empresários que a desejavam e<br />
a faziam caminhar precisavam <strong>da</strong> adesão <strong>da</strong>s demais frações <strong>da</strong> burguesia, como aquela liga<strong>da</strong> à<br />
agro-exportação, por exemplo. Isso porque a burguesia não constitui um todo homogêneo, ao<br />
menos conjunturalmente. A adoção de uma política econômica que favoreça a ativi<strong>da</strong>de industrial<br />
traz prejuízos para o setor agro-exportador e vice-versa. Mas, como a burguesia constitui um<br />
todo homogêneo, estruturalmente, seria fácil encontrar a saí<strong>da</strong> para a industrialização. Os industriais,<br />
no poder, negociariam com os agro-exportadores, democraticamente, porque entre pares, formas<br />
de compensá-los, como vimos acima.<br />
Essa mesma burguesia industrial também necessitava, para levar seu projeto adiante, <strong>da</strong><br />
adesão <strong>da</strong> classe trabalhadora. Afinal, não há produção industrial apenas com capital e matériasprimas,<br />
pois o trabalho se constitui um dos elementos essenciais do processo. As pessoas que<br />
executam o trabalho formam uma classe, tenham consciência disso ou não. Enquanto classe, os<br />
trabalhadores são movidos por interesses, tanto quanto a burguesia. Se aqueles, no processo de<br />
produção, visam a obter ganhos na forma de salários crescentes e outras vantagens, esta tem<br />
lucros como objetivo, o que implica forçar salários e vantagens dos trabalhadores para baixo.<br />
Nesse caso, como conseguir a adesão dos trabalhadores ao projeto <strong>da</strong> burguesia industrial, qual<br />
seja, crescimento econômico com baixos custos?<br />
Em primeiro lugar, é preciso entender que os imigrantes representavam grande número<br />
dentre os trabalhadores. Provenientes, sobretudo, <strong>da</strong>s áreas industrializa<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Europa, traziam<br />
suas práticas sindicalistas, anarquistas, comunistas e socialistas para o Brasil. Vargas, “mãe dos<br />
ricos”, logo, comprometido com a burguesia, tratou de reprimi-los, expulsando os inconvenientes<br />
e dificultando novas imigrações. Os demais seriam convocados a aderir ao projeto nacional (ista),<br />
a se integrarem à nação, apresentando-se a educação escolar como um forte instrumento nesse<br />
sentido.<br />
Além dos imigrantes havia os migrantes nacionais, gente proveniente <strong>da</strong>s mais diferentes<br />
partes do País, sobretudo <strong>da</strong> zona rural nordestina. Sem tradição de vi<strong>da</strong> urbana, sem experiência<br />
sindical ou político-partidária, inchavam as novas áreas urbano-industriais. Para eles, a educação<br />
escolar também seria ofereci<strong>da</strong> como instrumento de adesão ao projeto burguês. Por um lado,<br />
prepara-los-ia para transitarem no mundo moderno, urbano-industrial, conhecendo e adequandose<br />
às suas idéias, normas, princípios, valores, costumes; por outro lado, fornecer-lhes-ia o<br />
certificado legal que os habilitaria a participar <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>dã, uma vez que o voto era negado aos<br />
analfabetos. Assim, fazia-se importante a escolarização dos trabalhadores urbanos, exército<br />
potencial de votantes em favor do projeto burguês a ser decidido no “jogo democrático”, diga-se,<br />
nas urnas, embora esses trabalhadores devessem acreditar que essa educação seria fator-chave<br />
para sua conscientização política, sua ascensão social, a garantia de um lugar no mercado de<br />
trabalho, o desenvolvimento do País... Assim, voltamos ao mito <strong>da</strong> educação, abor<strong>da</strong>do na aula<br />
anterior.<br />
Sela<strong>da</strong> a aliança entre as frações <strong>da</strong> burguesia, abafa<strong>da</strong>s ou elimina<strong>da</strong>s muitas <strong>da</strong>s lideranças<br />
dos trabalhadores, estrangeiras e domésticas, a industrialização brasileira avançava. Não significa<br />
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Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
dizer que não aparecesse, de quando em vez, algum setor <strong>da</strong> burguesia descontente, reclamando<br />
alguma coisa do Estado, mas logo aparecia uma saí<strong>da</strong>. Quanto aos trabalhadores e suas lideranças,<br />
movimentos de contestação receberiam tratamento preventivo. Para isso, havia os meios de<br />
comunicação de massa, como o rádio, primeiro, seguido do cinema, <strong>da</strong> imprensa escrita, mais<br />
tarde, <strong>da</strong> televisão... E a escola, por meio dos professores, do livro didático.<br />
Por meio desses canais, sem esquecer a família e a religião, além dos sindicatos, sob<br />
controle estatal, e dos partidos políticos, fazia-se a propagan<strong>da</strong> dos governos, ensinava-se a<br />
disciplina necessária ao “operário-padrão”, estimulava-se o sentimento de amor e obediência à<br />
nação... Mas o que é a nação senão uma abstração, como já dissemos? Então, para ser ama<strong>da</strong> e<br />
obedeci<strong>da</strong>, a nação precisaria ser materializa<strong>da</strong>, o que se fez, recorrendo-se ao líder carismático,<br />
populista, a encarnação <strong>da</strong> nação.<br />
Agora, preste muita atenção. Só existe carisma, notorie<strong>da</strong>de, magnetismo de alguém sobre<br />
você quando você está carente. Esse alguém percebe sua carência e, se ele é um mau caráter,<br />
ele ataca, tira proveito de você. É assim que agem as lideranças políticas populistas. Observam,<br />
estu<strong>da</strong>m a socie<strong>da</strong>de, percebem as necessi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> maioria de uma população, os mais pobres,<br />
melhor dizendo, empobrecidos, e, em vez de descer até eles, contribuir para sua organização e<br />
construção de ações coletivas volta<strong>da</strong>s para a solução dos seus problemas, promovem-se,<br />
prometem ser a solução desses problemas, pousando de pais dos pobres quando, na ver<strong>da</strong>de,<br />
são as mães dos ricos. De modo que, ao final do man<strong>da</strong>to de um governante populista, os ricos<br />
<strong>da</strong>quela socie<strong>da</strong>de estão mais ricos, porque seu compromisso é com os ricos, a burguesia. Mas<br />
ele não explicita com quem está comprometido, pousando de popular. Então, mostra-se simpático,<br />
comunicativo, afetuoso com as pessoas comuns. Afinal, ca<strong>da</strong> voto na urna vale ouro.<br />
Acredito que você tenha conhecido presidentes de república que foram populistas. Getúlio<br />
Vargas (1930-1937 e 1951-1954), para começar. Juscelino Kubitschek (1955-1961) também o<br />
foi. Quanto mais os meios de comunicação eram aperfeiçoados, mais o populismo se refinava, a<br />
exemplo de Jânio Quadros (1961), com a difusão <strong>da</strong> televisão no Brasil. Seu sucessor, João<br />
Goulart (1961-1964), também encarnou o populismo. E, como disse Karl Marx, se a história se<br />
repete - <strong>da</strong> primeira vez, como farsa, <strong>da</strong> segun<strong>da</strong>, como tragédia -, como não relacionar Fernando<br />
Collor de Melo (1990-1992) a Jânio Quadros?<br />
Em outros níveis <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> política, também tivemos lideranças populistas: Padre Cícero, no<br />
Ceará, Adhemar de Barros, em São Paulo, Miguel Arraes, em Pernambuco, Leonel Brizola, no Rio<br />
de Janeiro... E, na Paraíba, você conseguiria identificar alguma liderança política populista? Creio<br />
que não seja preciso fazer muito esforço.<br />
Mas não se ilu<strong>da</strong> pensando que práticas populistas sejam privilégio de políticos de carreira.<br />
Se Juscelino Kubitschek prometeu fazer “50 anos em 5” (o slogan do seu governo), Paulo Freire,<br />
no campo <strong>da</strong> educação, não seria menos ambicioso. Como disse Paiva (1980), o educador<br />
pernambucano, durante o governo de João Goulart, propôs um método capaz de alfabetizar<br />
adultos em apenas 40 horas. Esse método viria a ser a base do também ambicioso Plano Nacional<br />
de Alfabetização (PNA), instituído nos termos do Decreto nº. 53.465, de 22 de janeiro de 1964,<br />
que tinha como meta alfabetizar cinco milhões de brasileiros em apenas dois anos.<br />
Ain<strong>da</strong> segundo Paiva (1980), Paulo Freire ganhou notorie<strong>da</strong>de não só em função do “método”,<br />
mas porque ele era apresentado num contexto de analfabetismo que beirava 50% <strong>da</strong> população.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
Ora, a alfabetização <strong>da</strong> população implicaria a extensão do direito ao voto, necessário à realização<br />
do projeto nacionalista-desenvolvimentista <strong>da</strong> burguesia industrial brasileira, não sem razão, a<br />
experiência de Freire em Angicos, no Rio Grande do Norte, foi legitima<strong>da</strong> pela presença e pelo aval<br />
do Presidente Goulart.<br />
Paiva (1980), que estudou a trajetória <strong>da</strong> ação pe<strong>da</strong>gógica e <strong>da</strong> produção teórica de Freire<br />
até 1965, disse, ain<strong>da</strong>, que o projeto nacionalista-desenvolvimentista, tradução política e intelectual<br />
do keynesianismo para a reali<strong>da</strong>de brasileira dos anos 1950 e 1960, era apoiado, no início dos<br />
anos 1960, pelo governo norte-americano, em face <strong>da</strong> ameaça <strong>da</strong> expansão soviética, no contexto<br />
<strong>da</strong> Guerra Fria. Quanto ao método Paulo Freire, não causava temor, por isso sua experimentação<br />
foi financia<strong>da</strong> parcialmente pela agência norte-americana US. Agency for International Development.<br />
Abor<strong>da</strong>ndo o assunto, Beiseguel (2004) afirmou que, “Pelas suas características, o método<br />
Paulo Freire respondia às expectativas dos grupos dirigentes, no Governo <strong>da</strong> União, e aos objetivos<br />
fixados para o movimento estu<strong>da</strong>ntil na área <strong>da</strong> educação. [Que] a educação popular, assim<br />
concebi<strong>da</strong>, atendia integralmente às necessi<strong>da</strong>des dos grupos governamentais e estu<strong>da</strong>ntes<br />
comprometidos com a política <strong>da</strong>s ‘reformas estruturais’. [...] Mas o projeto atendia também às<br />
expectativas dos grupos orientados para uma transformação mais radical <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de”, grupos<br />
estes que ultrapassavam “os limites possíveis do processo de democratização do ensino e <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong>de, na ordem social capitalista, no Brasil”.<br />
Enquanto muitos militantes <strong>da</strong> educação popular que ultrapassavam os limites do Estado<br />
populista eram duramente reprimidos a partir do golpe de 1964, Paulo Freire era poupado. Católico,<br />
defensor dos interesses privatistas <strong>da</strong> educação, quando <strong>da</strong> elaboração <strong>da</strong> Lei 4.024/61, foi<br />
preso, depois exilado. No exílio, como observou Paiva (1980), transformou-se no “tradutor”<br />
pe<strong>da</strong>gógico do Concílio Vaticano <strong>II</strong>, além de ganhar projeção internacional, ao atuar em movimentos<br />
de libertação nacional de viés desenvolvimentista.<br />
Se, como observou Francisco Wefort, as preocupações de Paulo Freire, nessa época, eram<br />
fun<strong>da</strong>mentalmente educativas, seus trabalhos, “Desde o início, [...] foram assimilados mais pelas<br />
suas virtuali<strong>da</strong>des enquanto meio de mobilização do que enquanto expressão de um conjunto<br />
articulado de idéias educacionais” (BEISEGUEL, 2004, pp. 415-416). Apesar do caráter conservador<br />
do regime político implantado no País em 31 de março (ou 1 de abril?) de 1964, o método Paulo<br />
Freire foi a<strong>da</strong>ptado pelo MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), embora não reconhecido<br />
oficialmente.<br />
Quanto à educação <strong>da</strong> criança pequena, de 0 a 6 anos, deixemos para discuti-la na próxima<br />
Uni<strong>da</strong>de, uma vez que é só a partir dos anos 1980 que ela recebe a devi<strong>da</strong> atenção.<br />
Passemos agora a novos desafios.<br />
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UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 4 Aula 5<br />
Aula 6 Aula 7<br />
DESAFIOS<br />
Acredito que vocês já ouviram falar e talvez também tenham dito por aí que quem estu<strong>da</strong><br />
tem maior poder de compreensão <strong>da</strong>s coisas, maior nível de consciência. Isso pode ser ver<strong>da</strong>deiro,<br />
mas o seu contrário também. Em tudo o que a escola ensina vai uma visão social de mundo, uma<br />
ideologia. Na ver<strong>da</strong>de, ideologias. Elas estão presentes na fala do professor, bem como em seus<br />
gestos e atitudes; no conteúdo do livro didático; na maneira como seu Diretor administra a<br />
escola.<br />
Assim como aprendemos em relação à Pe<strong>da</strong>gogia, as muitas ideologias, no fundo, provêm<br />
de duas matrizes. Uma é chama<strong>da</strong> liberal, volta<strong>da</strong> para reproduzir a socie<strong>da</strong>de capitalista; a<br />
outra, que se opõe a esse modelo de socie<strong>da</strong>de, propondo uma socie<strong>da</strong>de diferente, é denomina<strong>da</strong><br />
marxista.<br />
Vejamos, agora, em que consiste esse Desafio.<br />
Após a leitura de textos sobre ideologia, liberalismo e marxismo, que vocês encontram<br />
facilmente acessando o Google, além dos componentes curriculares de Sociologia Educacional I e<br />
<strong>II</strong>, proce<strong>da</strong>m a um fichamento individual. A seguir, reúnam-se em grupos de 5 pessoas, para<br />
discutir o que aprenderam. Preferencialmente, distribuam entre si textos de autores diferentes e,<br />
se possível, que defen<strong>da</strong>m ideologias contrárias.<br />
Feita a discussão, sintetizem o que discutiram num fichamento comum. Em segui<strong>da</strong>, tomem<br />
um livro didático de <strong>História</strong> utilizado na 2ª. série do ensino fun<strong>da</strong>mental, escolham uma aula<br />
comum ao grupo e, à luz do seu conhecimento sobre ideologia, liberalismo, marxismo e o conteúdo<br />
do texto didático, analisem esse capítulo.<br />
Por último, produzam um texto de duas lau<strong>da</strong>s, conforme o padrão que temos utilizado,<br />
reproduzindo sua análise.<br />
Não esqueçam que, no corpo do seu texto, deve ficar explícito seu entendimento sobre<br />
ideologia, liberalismo e marxismo.<br />
Não deixem de indicar o título do capítulo que vocês analisaram, o nome do livro, o(s)<br />
autor(es), editora, local e <strong>da</strong>ta de edição, bem como os textos que fun<strong>da</strong>mentaram sua análise<br />
(pelo menos três).<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 9<br />
AULA 8: USOS E ABUSOS DO “NOVO” NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA<br />
Prezado(a) aprendente,<br />
Parece que estamos demorando muito a entrar na história <strong>da</strong> educação infantil relativa às<br />
crianças pequenas, essas que a Lei situou entre 0 e 5 anos de i<strong>da</strong>de. Mas, temos uma explicação<br />
para isso. O fato é que, até o final do período que estamos estu<strong>da</strong>ndo, não havia, no Brasil, uma<br />
política de educação defini<strong>da</strong> para essas crianças. Aliás, esta só estaria visível a partir <strong>da</strong> Lei<br />
9.394/1996. E, se não havia uma política de educação para tal faixa etária, como pensar a<br />
explicitação de uma pe<strong>da</strong>gogia? Pe<strong>da</strong>gogia havia, mas a que estava clara para nós era a que se<br />
voltava para as crianças a partir <strong>da</strong> escola primária, o que corresponderia, nos dias de hoje, ao<br />
ensino <strong>da</strong>s séries iniciais, estendendo-se até o término do que denominamos educação básica.<br />
Talvez fosse melhor falarmos em pe<strong>da</strong>gogias, porque, numa socie<strong>da</strong>de dividi<strong>da</strong>, dificilmente<br />
encontraríamos uma única pe<strong>da</strong>gogia, mas, pelo menos duas, correspondendo ca<strong>da</strong> uma ao<br />
projeto de socie<strong>da</strong>de de ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s classes sociais fun<strong>da</strong>mentais. Ca<strong>da</strong> uma delas, que<br />
poderíamos identificar como matrizes pe<strong>da</strong>gógicas, comportaria ramificações que poderíamos<br />
chamar tendências pe<strong>da</strong>gógicas.<br />
Quanto às matrizes, estas seriam,<br />
fun<strong>da</strong>mentalmente, duas, cujas denominações já estão<br />
consagra<strong>da</strong>s pela vasta literatura pe<strong>da</strong>gógica: a liberal e<br />
a dialética, ambas modernas porque fruto <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
moderna. O que as distingue é que ca<strong>da</strong> uma representa<br />
os interesses de uma <strong>da</strong>s classes sociais fun<strong>da</strong>mentais<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de moderna, ou capitalista. A primeira,<br />
associa<strong>da</strong> aos interesses do capital, visa à reprodução, à<br />
conservação <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de capitalista. Daí dizermos que<br />
se trata de uma pe<strong>da</strong>gogia conservadora. Ela nos tem<br />
sido apresenta<strong>da</strong> sob três formas, ou tendências<br />
pe<strong>da</strong>gógicas, que correspondem a necessi<strong>da</strong>des de ca<strong>da</strong><br />
momento <strong>da</strong> dinâmica capitalista: Tradicional, ou<br />
concepção humanista tradicional <strong>da</strong> educação; Escola<br />
Nova, ou tendência humanista moderna <strong>da</strong> educação; <strong>da</strong><br />
produtivi<strong>da</strong>de, ou tendência tecnicista <strong>da</strong> educação.<br />
Tenha cui<strong>da</strong>do com as palavras: a tendência<br />
humanista tradicional é tão moderna e liberal quanto a<br />
tendência humanista moderna.<br />
Detalhes sobre ca<strong>da</strong> uma dessas<br />
pe<strong>da</strong>gogias e suas vertentes podem<br />
ser encontrados no livro de José<br />
Carlos Libâneo, Democratização <strong>da</strong><br />
escola pública: a pe<strong>da</strong>gogia críticosocial<br />
dos conteúdos. 8ª. ed. São<br />
Paulo: Loyola, 1989. O capítulo 1<br />
deste livro, intitulado “Tendências<br />
pe<strong>da</strong>gógicas na prática escolar”, foi<br />
publicado anteriormente na Revista <strong>da</strong><br />
ANDE, nº. 6, 1982, assim como foi<br />
reproduzido por Cipriano Luckesi no<br />
livro Filosofia <strong>da</strong> educação (São<br />
Paulo: Cortez, 1994). Esse tema<br />
também aparece no livro de Maria <strong>da</strong><br />
Graça N. Mizukami, Ensino: as<br />
abor<strong>da</strong>gens do processo. São Paulo:<br />
EPU, 1986.<br />
É bom que você se adiante nessas<br />
leituras, preparando-se para uma<br />
futura discussão pormenoriza<strong>da</strong> no<br />
futuro componente curricular<br />
“Didática”.<br />
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UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Com relação à pe<strong>da</strong>gogia dialética, diremos que<br />
ela se volta para os interesses do trabalho, a outra face<br />
<strong>da</strong> moe<strong>da</strong> capitalista. Ela também é denomina<strong>da</strong> crítica,<br />
questionadora, revolucionária, transformadora. Não que<br />
seja capaz de transformar, de revolucionar a socie<strong>da</strong>de<br />
capitalista, mas aponta para essa possibili<strong>da</strong>de,<br />
instigando os homens oprimidos, organizados em classes,<br />
a fazê-lo. Essa pe<strong>da</strong>gogia nos tem sido apresenta<strong>da</strong> sob<br />
duas vertentes ou tendências: a pe<strong>da</strong>gogia libertadora<br />
e a pe<strong>da</strong>gogia histórico-crítica.<br />
Dessas pe<strong>da</strong>gogias, a que predomina, tanto em<br />
nossas escolas quanto no conjunto <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, é a<br />
pe<strong>da</strong>gogia liberal, em qualquer <strong>da</strong>s suas vertentes.<br />
Aliás, nas três vertentes, pois, embora sem muita consciência disso, carregamos, em nossa<br />
prática pe<strong>da</strong>gógica, um pouco de ca<strong>da</strong> uma delas. Talvez até muito, se compararmos com o que<br />
há de pe<strong>da</strong>gogia dialética em nosso trabalho escolar.<br />
Uma coisa me preocupa nisso tudo: é que a palavra liberal é divulga<strong>da</strong> como sinônimo de<br />
avançado, progressista, de tal modo que, se eu lhe perguntasse se você se considera um<br />
professor liberal, tenho quase certeza de que você responderia que sim. Digo isso porque,<br />
recentemente, fiz essa pergunta a um grupo de professores de educação básica, a quem eu<br />
animava num encontro de capacitação, e a resposta foi, invariavelmente, a mesma: -”sim”. A<br />
seguir, perguntei-lhes o que entendiam por ser um professor liberal, e eles responderam que seria<br />
um professor moderno, avançado, não tradicional.<br />
Até o ponto em que aqueles professores identificaram o liberal com o moderno, concordei<br />
com eles. De fato, o pensamento liberal é um pensamento moderno, nascido em meio à luta <strong>da</strong><br />
burguesia européia ascendente contra o pensamento medieval. Por isso, a pe<strong>da</strong>gogia liberal é<br />
uma pe<strong>da</strong>gogia moderna, fruto <strong>da</strong> Moderni<strong>da</strong>de, esse tempo que nossos livros didáticos de <strong>História</strong><br />
denominam I<strong>da</strong>des Moderna e Contemporânea. É o tempo <strong>da</strong> ascensão e consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
capitalista. Como a ideologia que explica justificando esse modelo de socie<strong>da</strong>de é a ideologia<br />
liberal, a pe<strong>da</strong>gogia liberal é aquela que se volta para a formação do homem de modo a orientar<br />
suas ações, no sentido de reproduzir a socie<strong>da</strong>de burguesa, capitalista, liberal. Em outras palavras,<br />
moderna.<br />
Até aqui, tudo bem. Mas, quando aqueles mesmos professores relacionaram liberal a avançado<br />
e separaram o moderno e o liberal do tradicional, fiquei preocupado e resolvi intervir. Explico<br />
minhas razões.<br />
Em primeiro lugar, porque aqueles professores entendiam liberal como defensor <strong>da</strong><br />
liber<strong>da</strong>de, aberto, e até democrático. Eles teriam razão? Vejamos.<br />
O pensamento liberal, como modernamente o entendemos, é uma construção <strong>da</strong><br />
burguesia, classe social que começou a se projetar no Século XV<strong>II</strong> europeu, desenvolveu-se no<br />
XV<strong>II</strong>I e consolidou-se a partir <strong>da</strong> Revolução Industrial.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
196<br />
Aula 9<br />
Extrapolando os limites <strong>da</strong> didática e<br />
buscando os fun<strong>da</strong>mentos <strong>da</strong>s<br />
pe<strong>da</strong>gogias dialéticas ou<br />
progressistas, recomen<strong>da</strong>ria os livros<br />
de Moacir Gadotti, Concepção<br />
dialética <strong>da</strong> educação – um estudo<br />
introdutório. 5ª. ed. São Paulo:<br />
Cortez: Autores Associados, 1987, e<br />
Dermeval Saviani, Pe<strong>da</strong>gogia<br />
histórico crítica. 8ª. ed. Campinas,<br />
SP: Autores Associados, 2003.
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Carlos Eduardo Novaes e Wilmar<br />
Rodrigues, no livro Capitalismo para<br />
principiantes (22ª. ed. São Paulo: Ática,<br />
1995. p. 207-208), ensinam como<br />
capitalismo (liberalismo) e democracia são<br />
inconciliáveis:<br />
“A ideologia dominante (no mundo<br />
ocidental) protege o mais que pode a<br />
palavra Capitalismo. Prefere sempre<br />
substituí-la por uma expressão mais<br />
sedutora: Democracia!<br />
Só que Capitalismo não fecha com<br />
Democracia. Capitalismo é um sistema<br />
econômico baseado na desigual<strong>da</strong>de<br />
(precisa <strong>da</strong> desigual<strong>da</strong>de!; Democracia é<br />
um regime político baseado na igual<strong>da</strong>de.<br />
Então, como é que fica?”<br />
Realmente, os pensadores liberais defendiam a liber<strong>da</strong>de, mas não a liber<strong>da</strong>de em geral, o<br />
que seria uma abstração, embora fosse esse o tom do seu discurso. Feito com tanta veemência<br />
que muita gente, ain<strong>da</strong> hoje, entende o liberalismo dessa forma, como os meus capacitandos. Se<br />
eles conseguissem enxergar que os pensadores liberais estavam para a burguesia ascendente,<br />
assim como a Igreja estava para a nobreza feu<strong>da</strong>l, isto é, enquanto seus ideólogos, entenderiam<br />
que, por trás do discurso <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de, em geral, estava a defesa <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de que apontava para<br />
a expansão dos negócios <strong>da</strong> burguesia. Ou seja, a liber<strong>da</strong>de, em geral, não passava de retórica.<br />
Assim, a qual liber<strong>da</strong>de concreta aqueles pensadores se referiam?<br />
Tratava-se <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de política, para o que seria preciso<br />
substituir a monarquia absolutista, que era um dos<br />
sustentáculos <strong>da</strong> nobreza feu<strong>da</strong>l, por um regime político<br />
constitucional ou parlamentar. Esse regime, por sua vez,<br />
seria o instrumento de adoção de políticas econômicas<br />
favoráveis à concorrência contra as práticas mercantilistas,<br />
nota<strong>da</strong>mente o monopólio, que era outro ponto de apoio do<br />
feu<strong>da</strong>lismo. Com a expansão dos negócios e visando a<br />
reforçá-la, os liberais defendiam a liber<strong>da</strong>de do trabalhador<br />
face aos laços <strong>da</strong> servidão, de modo que eles pudessem ser<br />
explorados sob a forma de assalariados.<br />
Ora, se a burguesia lutava por liber<strong>da</strong>de política<br />
(constitucionalismo), econômica (concorrência) e de trabalho<br />
(assalariamento), porque isso atendia aos seus interesses,<br />
enquanto classe, era porque seu oposto (absolutismo,<br />
mercantilismo e servidão) atendia aos interesses de outra<br />
classe, que era a nobreza feu<strong>da</strong>l, a aristocracia.<br />
Aula 9<br />
NOVAES, C. E.; RODRIGUES, V. Capitalismo para<br />
principiantes. 22ª. ed. São Paulo, 1995, p. 207-208.<br />
Feu<strong>da</strong>lismo e trabalho servil,<br />
mercantilismo, absolutismo são<br />
assuntos que você deve dominar<br />
porque fazem parte,<br />
obrigatoriamente, <strong>da</strong> formação<br />
do aluno <strong>da</strong> escola de ensino<br />
básico. Se sua escola não<br />
abordou esses temas<br />
devi<strong>da</strong>mente, o jeito é recorrer a<br />
livros didáticos de <strong>História</strong> Geral<br />
de nível médio. Uma boa sugestão<br />
é o livro <strong>História</strong> <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong>des,<br />
de Rubim S. L. de Aquino, <strong>da</strong><br />
Editora ao Livro Técnico. Livro em<br />
2 volumes.<br />
197
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Como to<strong>da</strong> classe social, a aristocracia detinha uma ideologia, quer dizer, uma visão de<br />
mundo que, embora sua, era apresenta<strong>da</strong> ao conjunto <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de como váli<strong>da</strong> para todos, para<br />
que todos orientassem suas ações sociais e políticas por essa visão de mundo. Ao mesmo tempo,<br />
ela possuía canais de elaboração e divulgação dessa ideologia, sendo a Igreja o mais significativo.<br />
Tamanha a presença <strong>da</strong> Igreja que, quando olhamos para a I<strong>da</strong>de Média européia, pensamos que<br />
ela era a dona do pe<strong>da</strong>ço e nos esquecemos de enxergar a aristocracia, a nobreza feu<strong>da</strong>l, classe<br />
social à qual a Igreja servia. Como viria a servir, mais tarde, à burguesia, quando esta tivesse seu<br />
poder consoli<strong>da</strong>do.<br />
Como acontece no Brasil de hoje, na socie<strong>da</strong>de européia <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média, também havia<br />
escolas. Naquela socie<strong>da</strong>de e, por extensão, em suas escolas, circulava uma pe<strong>da</strong>gogia. Uma só?<br />
Que nome atribuir àquela(s) pe<strong>da</strong>gogia(s)? Será que as pessoas <strong>da</strong>quela época estavam<br />
preocupa<strong>da</strong>s em discutir, como as de hoje, nomes de pe<strong>da</strong>gogias? Se havia mais de uma, qual<br />
seria a outra, além <strong>da</strong>quela que muitos denominam Tradicional? Tradicional em relação a quê? O<br />
que caracterizaria uma pe<strong>da</strong>gogia tradicional? Tradicional é sinônimo de velho? Você não acha<br />
essa imagem que os ditos escolanovistas pintam do que eles chamam tradicional um tanto<br />
caricatural? Existiria uma pe<strong>da</strong>gogia tradicional em estado “puro”?<br />
Georges Snyders, um estudioso <strong>da</strong> educação, diz que<br />
É indispensável, em primeiro lugar, tirar, dessa expressão (pe<strong>da</strong>gogia<br />
tradicional), qualquer sentido pejorativo, depreciativo, esse sentido que se<br />
tornou tão habitual pela leitura dos teóricos dos ‘métodos novos’. [...] e talvez<br />
sejamos levados a considerar, nela, valores que não podem, pura e<br />
simplesmente, ser tratados com desprezo, coisa que, de modo algum, implicará<br />
que se apresentem como definitivos, que recusem a<strong>da</strong>ptação às novas épocas<br />
e, até, transmutação profun<strong>da</strong>. (SNYDERS, 1974).<br />
E se eu lhe disser que a elaboração dessa tendência pe<strong>da</strong>gógica de matriz liberal, a que se<br />
convencionou denominar Tradicional, pertence a Friedrich Herbart, na segun<strong>da</strong> metade do Século<br />
XIX e que, buscando suas origens, encontrá-la-emos no jesuíta Francisco Suárez, no Século XVI,<br />
e nos protestantes Ratichius e Comenius, no Século XV<strong>II</strong>, logo, na moderni<strong>da</strong>de?<br />
Acredito que você, refletindo a partir<br />
dessas in<strong>da</strong>gações, concluirá que Tradicional<br />
não tem a ver, necessariamente, com Igreja<br />
(Católica) e com Medievalismo. Da mesma<br />
forma que o discurso do “Novo” tem pouca<br />
consistência. Lembre, por exemplo, a<br />
expressão República Nova, utiliza<strong>da</strong> para<br />
caracterizar o período <strong>da</strong> história republicana<br />
brasileira a partir de 1930! O que ele trazia de<br />
Novo em relação ao que se acusava como<br />
Velho ou Tradicional, a República Velha? E a<br />
Nova República, denominação atribuí<strong>da</strong> a essa<br />
que começou, em 1985, o que ela trouxe de Novo em relação ao período que a antecedeu, o<br />
Regime Militar? E se o Novo tem a ver com liber<strong>da</strong>de, com democracia e coisas do gênero, por que<br />
a ditadura varguista (1937-1945) é denomina<strong>da</strong> Estado Novo?<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
198<br />
Aula 9<br />
Estudo interessante sobre as tendências<br />
pe<strong>da</strong>gógicas de matriz liberal é feito por<br />
Dermeval Saviani, no livro Escola e<br />
democracia. Nesse livro, dentre outras<br />
coisas, ele compara a Pe<strong>da</strong>gogia<br />
Tradicional (Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong> Essência) com<br />
a Escola Nova (Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong> Existência),<br />
desde suas bases filosóficas,<br />
denunciando a mistificação de que a<br />
Escola Nova é fruto.<br />
O livro, cuja primeira edição é de 1983,<br />
continua atual. No ano 2003, ele já se<br />
encontrava na edição 36.<br />
É inadmissível que um estu<strong>da</strong>nte do Curso<br />
de Pe<strong>da</strong>gogia não possua esse livro!
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Depois de você haver refletido sobre o Novo na política, tenho certeza de que não será<br />
difícil tirar conclusões sobre o discurso do Novo na educação. Você concluirá, garanto, que o<br />
Novo, nesse caso, trata-se, apenas, de uma figura de retórica, uma forma de obter a adesão <strong>da</strong><br />
totali<strong>da</strong>de social para a realização de um projeto particular, qual seja, o de uma classe ou fração<br />
de classe social, apresentado em nome <strong>da</strong>quela totali<strong>da</strong>de. Essa classe, ou fração de classe, que<br />
se apresenta como capaz de gerir uma socie<strong>da</strong>de como a nossa (subdesenvolvi<strong>da</strong>, terceiromundista,<br />
em desenvolvimento, emergente ou sei lá o quê) necessita de um discurso unificador,<br />
aglutinador dos diversos segmentos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de. Um discurso possível é o do Novo. Novo em<br />
relação a quê?<br />
significa, em última instância, estar de acordo com as<br />
ver<strong>da</strong>des enuncia<strong>da</strong>s no discurso <strong>da</strong>s forças políticas, cujo projeto<br />
de gerenciamento <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de mostrou-se vitorioso. Em nosso caso<br />
particular, aquele projeto que levou Vargas ao poder, em 1930, mesmo<br />
tendo sido derrotado nas urnas. O mais grave é que esse projeto foi<br />
reforçado em 1937, com o estabelecimento de uma ditadura, e em<br />
1950, pela via eleitoral, quando o mesmo Vargas voltou ao poder,<br />
depois de um breve repouso como senador pelo seu Estado, o Rio<br />
Grande do Sul. Isso, para não falar nos governos subseqüentes,<br />
eleitos, e naqueles que se estenderam a partir de 1964. E de 1985.<br />
Que projeto era esse, então? O que havia de Novo a partir dos<br />
governos que se sucederam no Brasil desde 1930? A resposta a<br />
essas perguntas exigiria muita reflexão de nossa parte. Como reflexão<br />
pressupõe conhecimento, teríamos que recorrer a bons livros de<br />
história do Brasil. Essa história, que inclui o econômico, o político, o<br />
social, é de fun<strong>da</strong>mental importância para que passeemos pela história<br />
<strong>da</strong> educação com certa segurança. Anísio Teixeira, um dos expoentes<br />
<strong>da</strong> pe<strong>da</strong>gogia renovadora, escrevia, já em 1934, que “a escola deve<br />
ser uma réplica <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de a que ela serve”. Compreendê-la, assim<br />
como a história <strong>da</strong> educação, passaria, necessariamente, por uma<br />
compreensão <strong>da</strong> história mais ampla.<br />
Aula 9<br />
Assim como “novo”,<br />
democracia é outra<br />
palavra vicia<strong>da</strong> em<br />
nosso vocabulário.<br />
Quantas ditaduras<br />
não têm se instalado<br />
no poder em nome <strong>da</strong><br />
garantia <strong>da</strong>s<br />
l i b e r d a d e s<br />
democráticas? E se a<br />
democracia ain<strong>da</strong> não<br />
tiver chegado pode ser<br />
decreta<strong>da</strong>. Ou você<br />
não sabe que tivemos<br />
no Brasil um<br />
presidente-cavaleiroditador<br />
que se gabava<br />
em dizer que faria<br />
deste país uma<br />
democracia?<br />
Embora estejamos num curso de nível superior, este não é um curso de <strong>História</strong>, mas<br />
de Pe<strong>da</strong>gogia. Nesse sentido, não há por que amedrontá-lo exigindo a leitura de<br />
autores clássicos sobre a <strong>História</strong> do Brasil. Mesmo porque existe boa produção didática<br />
em nível de ensino médio, a exemplo do livro <strong>História</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de brasileira, de<br />
Francisco Alencar, Editora Ao Livro Técnico.<br />
Anísio Teixeira também afirmou ser urgente “reformar a escola para que ela possa acompanhar<br />
o avanço material de nossa civilização e preparar uma mentali<strong>da</strong>de que moral e espiritualmente se<br />
ajuste com a presente ordem <strong>da</strong>s coisas”. Essa presente “ordem <strong>da</strong>s coisas”, apoia<strong>da</strong> no tripé<br />
199
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
constituído pela ciência, pelo industrialismo e pela democracia, como explica o , requer, como diz Saviani, interpretando Anísio Teixeira, “a<br />
reforma <strong>da</strong> escola [que] terá que se apoiar em uma nova psicologia, construí<strong>da</strong> a partir <strong>da</strong><br />
evolução do conceito de aprender, que passa a ser entendido com o significado de ‘ganhar um<br />
modo de agir’” (SAVIANI, 2003, p. 10).<br />
O Manifesto dos Pioneiros <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> Nova, lançado em 1932, é de tamanha importância para<br />
o estudioso <strong>da</strong> educação brasileira, que não vejo sentido em conhecê-lo por meio de outrem.<br />
Mesmo porque é um documento de fácil acesso. Não apenas é citado em livros, como pode ser<br />
encontrado, na íntegra, via Internet. Basta você entrar no Google e escrever Manifesto dos Pioneiros.<br />
Não lhe custará na<strong>da</strong>. Vamos fazer isso?<br />
Bem! Conhecer em que consistem as tendências pe<strong>da</strong>gógicas denomina<strong>da</strong>s Tradicional e<br />
Nova, o que essencialmente as distingue, é coisa que requer, como você está observando, muita<br />
leitura. Essas tendências, que estiveram em confronto ao longo de todo o período que estamos<br />
estu<strong>da</strong>ndo e que terminou pela vitória <strong>da</strong> segun<strong>da</strong>, ain<strong>da</strong> são objeto, vez ou outra, de discussões<br />
entre professores, muitas delas, sem o menor sentido. Primeiro, porque a tendência pe<strong>da</strong>gógica<br />
dominante em nossas escolas já não é a escolanovista. Desde fins dos anos 1960, a tendência<br />
pe<strong>da</strong>gógica produtivista de base tecnicista vem se impondo em nossa educação, de modo que,<br />
como diz Saviani,<br />
A partir <strong>da</strong> reforma instituí<strong>da</strong> pela Lei nº. 5.692, de 11 de agosto de 1971,<br />
essa concepção [...] converti<strong>da</strong> em pe<strong>da</strong>gogia oficial, foi encampa<strong>da</strong> pelo<br />
aparelho de Estado que procurou difundi-la e implementá-la em to<strong>da</strong>s as<br />
escolas do País. Na medi<strong>da</strong> em que se processava a abertura “lenta, gradual<br />
e segura” que desembocou na Nova República, as orientações pe<strong>da</strong>gógicas<br />
<strong>da</strong>s escolas foram sendo flexibiliza<strong>da</strong>s mantendo-se, porém, como diretriz básica<br />
<strong>da</strong> política educacional, a tendência produtivista. (SAVIANI, 2003, p. 19)<br />
De tal maneira que a tendência pe<strong>da</strong>gógica tradicional ain<strong>da</strong> se mantém viva entre nós,<br />
embora muitos professores não admitam reconhecerem-se como tais, devido ao sentido pejorativo<br />
que essa palavra, tradicional, recebeu.<br />
Em segui<strong>da</strong>, eu diria que aquelas discussões tomam o secundário pelo principal. Para um<br />
professor que entende que pe<strong>da</strong>gogia é formação e que, nesse sentido, tem caráter essencialmente<br />
político, pois aquele que forma conduz, e quem conduz, conduz para algum lugar, e que esse lugar<br />
é o <strong>da</strong> conservação ou <strong>da</strong> transformação, <strong>da</strong> obediência ou <strong>da</strong> desobediência, <strong>da</strong> subserviência<br />
ou <strong>da</strong> contestação, <strong>da</strong> aceitação ou do questionamento, o que está em jogo, para quem se<br />
pretende comprometido com a construção de uma socie<strong>da</strong>de alternativa a essa fun<strong>da</strong><strong>da</strong> na<br />
desigual<strong>da</strong>de, na injustiça, não é a primazia do aprender (pe<strong>da</strong>gogia tradicional), do aprender a<br />
aprender (pe<strong>da</strong>gogia escolanovista) ou do aprender a fazer (pe<strong>da</strong>gogia tecnicista), mas do para<br />
que aprender. É preciso superar os limites <strong>da</strong>s propostas pe<strong>da</strong>gógicas liberais.<br />
Por último, percebo que, nessas discussões, há um deslocamento do pe<strong>da</strong>gógico para o<br />
disciplinar. Assim, o professor tradicional é visto como aquele que cobra freqüência dos alunos na<br />
sala de aula, faz provas, exige comportamento adequado dos alunos ao encaminhamento do<br />
trabalho pe<strong>da</strong>gógico, disciplina, controla. Enfim, é um careta, cafona, boco-moco, porque um<br />
professor “moderno”.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
200<br />
Aula 9
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Aula 9<br />
Ora, se existe controle sobre o aluno na escola, esse é muito maior nas escolas experimentais,<br />
ou escolas novas. É o que demonstra Nicolaci <strong>da</strong> Costa. O texto é longo, mas indispensável,<br />
sobretudo porque diz respeito ao nosso objeto de trabalho, a educação infantil:<br />
Gostaria de argumentar que é nessa precarie<strong>da</strong>de (ou ausência) de uma linha<br />
divisória entre o público e o privado, acopla<strong>da</strong> à ênfase <strong>da</strong><strong>da</strong> à liber<strong>da</strong>de de<br />
expressão e ao incentivo conferido ao desenvolvimento de capaci<strong>da</strong>des<br />
idiossincráticas (características vistas por muitos como ‘liberadoras’ ou<br />
‘revolucionárias’) que se instaura um potencial de controle jamais sonhado<br />
em qualquer pe<strong>da</strong>gogia dita tradicional.<br />
Explico: ao expressar-se livremente na presença de observadores (professores<br />
e seus assistentes) atentos, treinados e com tempo disponível, as crianças<br />
facultam aos mesmos uma observação minuciosa e penetrante de todos (ou<br />
quase todos) os aspectos de seu fazer e de seu ser.<br />
Isso é facilmente constatável por meio dos relatórios enviados aos pais por<br />
escolas que adotam as pe<strong>da</strong>gogias experimentais , principalmente as do<br />
período pré-escolar. Neles, fica claro que o alvo <strong>da</strong> avaliação não é mais o<br />
mero ‘desempenho escolar’ <strong>da</strong> criança – como nos boletins <strong>da</strong>s escolas<br />
tradicionais, onde ela era (ou é) avalia<strong>da</strong> por seu aproveitamento em disciplinas<br />
como ciências, matemática, português etc. -, mas seu ‘desenvolvimento global’,<br />
aferido por uma multiplici<strong>da</strong>de de micro-categorias de avaliação.<br />
Além do exemplo já citado de um relatório (sobre uma criança de quatro anos)<br />
que continha 360 categorias de avaliação, cabe apresentar um segundo, onde<br />
a minúcia <strong>da</strong> observação se evidencia de outro modo. Um subitem intitulado<br />
‘organização motora de base’, do item ‘estruturação <strong>da</strong>s funções intelectuais’,<br />
parte de um longo relatório semestral enviado aos pais de uma aluna por uma<br />
escola carioca, contém a seguinte observação:<br />
Cristina an<strong>da</strong> e corre com segurança. Sobe as esca<strong>da</strong>s alternando os pés, não<br />
necessitando de apoio <strong>da</strong> parede (...). Para descer, não alterna os pés. Não<br />
demonstra dificul<strong>da</strong>de ao passar de senta<strong>da</strong> para em pé, deita<strong>da</strong> para senta<strong>da</strong> ou<br />
deita<strong>da</strong> para em pé.<br />
Em outro item do mesmo relatório, intitulado ‘desenvolvimento <strong>da</strong> comunicação’,<br />
podemos ler:<br />
Cristina sempre verbaliza suas necessi<strong>da</strong>des com todos na sala. Conversa muito<br />
com os amigos, com vocabulário adequado, dramatizando situações e referindo-se<br />
a si mesma pelo pronome ‘eu’. Responde às perguntas feitas sobre um objeto<br />
podendo determinar sua localização, função e características.<br />
Finalmente, na seção dedica<strong>da</strong> ao ‘desenvolvimento emocional’, encontramos:<br />
Cristina é muito desembaraça<strong>da</strong>, carinhosa e amiga. A<strong>da</strong>ptou-se com tranqüili<strong>da</strong>de<br />
ao ambiente escolar e aos amigos, com os quais tem um carinho especial. Está<br />
sempre atenta e disposta a cooperar nas rodinhas, gostando de fazer perguntas e<br />
conversar sobre o assunto <strong>da</strong>do ou falado. Realiza muito bem suas ativi<strong>da</strong>des,<br />
gostando muito <strong>da</strong> colagem, onde realiza bonitos trabalhinhos. Verbaliza to<strong>da</strong>s as<br />
suas necessi<strong>da</strong>des e enfrenta com tranqüili<strong>da</strong>de situações novas. Está sempre<br />
sorrindo e de bom humor.<br />
É incontestável que esse avaliador conhece Cristina muito bem. Além de suas<br />
capaci<strong>da</strong>des e preferências, é capaz de descrever em detalhes até seu modo<br />
de subir e descer esca<strong>da</strong>s.<br />
É também fora de dúvi<strong>da</strong> que esse tipo de conhecimento profundo sobre o<br />
outro é fonte de poder (e de eventual controle) sobre ele. Aliás, tanto a vigilância<br />
minuciosa como fonte de saber quanto o saber como fonte de poder não são<br />
novi<strong>da</strong>de e, além de terem sido deti<strong>da</strong>mente analisados por Michel Foucault,<br />
Basil Bernstein e Pierre Bourdieu, foram elementos básicos do pesadelo de<br />
muitos, como do 1984, de George Orwell.<br />
201
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Seriam portanto as crianças submeti<strong>da</strong>s às pe<strong>da</strong>gogias experimentais<br />
realmente mais livres que aquelas que foram ou estão sendo educa<strong>da</strong>s nos<br />
moldes propostos pela pe<strong>da</strong>gogia tradicional?<br />
Seria, ain<strong>da</strong>, desejável, <strong>da</strong><strong>da</strong> a análise que esbocei, que as pe<strong>da</strong>gogias<br />
experimentais fossem, como tantos parecem desejar, implanta<strong>da</strong>s na rede<br />
pública de ensino – mesmo que fosse possível eliminar o maior obstáculo ao<br />
projeto: seu alto custo -, para que crianças <strong>da</strong>s cama<strong>da</strong>s populares a elas<br />
pudessem ser submeti<strong>da</strong>s?<br />
Estas são algumas questões que a análise do discurso e <strong>da</strong>s práticas <strong>da</strong>s<br />
pe<strong>da</strong>gogias tradicionais e experimentais permite levantar. São questões que,<br />
a meu ver, deveriam suscitar maior reflexão e aprofun<strong>da</strong>mento por pais,<br />
educadores e outros profissionais envolvidos com a formação <strong>da</strong>s novas<br />
gerações. (NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria. “Nova pe<strong>da</strong>gogia – velha vigilância”.<br />
In: Revista Ciência Hoje, vol. 8, nº. 45, Agosto/1988, p. 42).<br />
DESAFIO<br />
Reúnam-se em grupos de cinco pessoas. Leiam o texto que constitui esta aula, coletivamente. A seguir,<br />
individualmente, relacionem as palavras e frases que lhes pareçam mais significativas para a compreensão<br />
sobre o Liberalismo, a Pe<strong>da</strong>gogia Tradicional e a Pe<strong>da</strong>gogia Nova. Agora, voltem a se reunir, comparando o que<br />
ca<strong>da</strong> um produziu, e procurem construir um novo quadro de palavras e frases que contemplem a compreensão<br />
de ca<strong>da</strong> um. Se necessário, recorram a aulas anteriores, como aquela intitula<strong>da</strong> “Concepções <strong>da</strong> história e <strong>da</strong><br />
pe<strong>da</strong>gogia na história <strong>da</strong> educação brasileira”, bem como a aulas deste e de outros componentes curriculares.<br />
De posse desse conhecimento, abram uma discussão em torno dos problemas mais freqüentes ou, pelo menos,<br />
os que têm merecido maior cui<strong>da</strong>do na escola onde vocês trabalham. Dos vários problemas apresentados,<br />
escolham um que seja comum ao grupo. Discutam profun<strong>da</strong>mente sobre ele, sem perder de vista que ele se<br />
relaciona com os outros problemas. Não se limitem a discutir apenas a partir <strong>da</strong> maneira como vocês o vêem,<br />
mas tragam para a discussão o que já ouviram dos alunos, dos pais dos alunos e dos funcionários a respeito.<br />
É possível que vocês atuem em escolas diferentes. Nesse caso, centrem sua discussão sobre apenas uma delas,<br />
mas trazendo para ela o que vocês perceberam nas demais.<br />
Agora vai chumbo grosso: em duas lau<strong>da</strong>s, conforme o modelo já conhecido, registrem o problema, as discussões<br />
que vocês travaram sobre ele e como sugeririam a sua solução.<br />
Na conclusão do seu escrito, que deve conter entre 10 e 15 linhas, explicitem qual concepção <strong>da</strong> história e <strong>da</strong><br />
pe<strong>da</strong>gogia orientou sua toma<strong>da</strong> de posição.<br />
Trilhas do Aprendente, Vol. 2 - <strong>História</strong> <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>II</strong><br />
202<br />
Aula 9
UNIDADE I UNIDADE <strong>II</strong><br />
UNIDADE <strong>II</strong>I<br />
Aula 8<br />
Aula 9<br />
AULA 9: EDUCAÇÃO INFANTIL: UM LONGO CAMINHO A PERCORRER<br />
Neste momento, estamos entrando na fase final de nosso percurso. Certamente, ain<strong>da</strong> há<br />
muito o que discutir sobre a educação brasileira, referente ao período histórico compreendido<br />
entre as déca<strong>da</strong>s de 1930 e 1960, mas nosso espaço é por demais limitado. Também haverá muito<br />
o que dizer sobre o período histórico seguinte mas, pelo mesmo motivo, seremos breves.<br />
Quanto ao período histórico de que agora trataremos, situá-lo-emos entre a déca<strong>da</strong> de<br />
1960 e os dias atuais. O ano preciso para demarcar seu início, como aconteceu com o anterior,<br />
depende do objeto de estudo do historiador. Poderia ser 1961, como sugeriu Saviani (2003),<br />
quando, levando em conta o legado do longo Século XX brasileiro para educação pública, considerou<br />
a promulgação <strong>da</strong> nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> (Lei 4.024/1961) um<br />
marco <strong>da</strong> maior importância.<br />
Também poderia ser o ano 1969, quando o mesmo Saviani, tendo como objeto de estudo<br />
“As concepções pe<strong>da</strong>gógicas na história <strong>da</strong> educação brasileira”, destacou essa <strong>da</strong>ta como o<br />
momento <strong>da</strong> emergência <strong>da</strong> concepção pe<strong>da</strong>gógica produtivista entre nós. Ain<strong>da</strong> que nos anos<br />
1960, segundo o autor, se verificasse intensa experimentação educativa, expressando a hegemonia<br />
do movimento renovador, com a consoli<strong>da</strong>ção dos colégios de aplicação, o surgimento dos ginásios<br />
vocacionais, o grande impulso à renovação do ensino de matemática e de ciências, o modelo<br />
renovador se esgotava. Exemplo disso foi o fechamento do Centro Brasileiro de Pesquisas<br />
Educacionais. Ao mesmo tempo, crescia o IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos), fun<strong>da</strong>do em<br />
1961, e que representaria importante papel na conflagração do golpe de Estado que ocorreria em<br />
1964. Os novos governos procederiam a uma reorientação geral do ensino.<br />
No que diz respeito ao momento final desse período, Saviani situou, no segundo caso, os<br />
dias de hoje, quando ain<strong>da</strong> predomina a concepção pe<strong>da</strong>gógica produtivista. Já no primeiro caso,<br />
ele destacou o ano 1996, quando foi promulga<strong>da</strong> nossa atual LDBEN (Lei 9.394/1996). Essa <strong>da</strong>ta<br />
é <strong>da</strong> maior importância para a história <strong>da</strong> educação infantil brasileira, pois foi somente a partir<br />
dessa Lei que a educação <strong>da</strong> criança pequena, a educação infantil, aí incluí<strong>da</strong>s a creche e a préescola,<br />
ganhou status legal. Tamanha essa importância que, se reduzíssemos a história <strong>da</strong> educação<br />
brasileira à história <strong>da</strong> educação infantil brasileira, seria coerente consider apenas dois períodos<br />
históricos: um anterior e outro posterior a 1996.<br />
Observe que temos insistido, ao longo do nosso percurso, em periodizar a história, como<br />
orienta Saviani (2003), segundo critérios internos ao objeto investigado, qual seja, a educação.<br />
Não quer dizer com isso que preten<strong>da</strong>mos proceder a uma história <strong>da</strong> educação autônoma em<br />
relação aos processos político, econômico, social e cultural de que a educação faz parte e<br />
expressa. O pe<strong>da</strong>gogo renovador, Anísio Teixeira (1900-1971), já observara, em 1968, que “a<br />
escola é o retrato <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de a que serve”. Ao mesmo tempo, combatemos a maneira de<br />
escrever a história <strong>da</strong> educação como um mero apêndice do processo histórico mais amplo, a<br />
exemplo de alguns manuais didáticos de história <strong>da</strong> educação, que separam o que seus autores<br />
denominam “contextualização histórica” do conteúdo <strong>da</strong> educação propriamente dito. Por esse<br />
viés, eles deixam de enxergar a dinâmica própria do fenômeno educativo, além de incorrer naquilo<br />
que, muitas vezes, dizem combater: uma história fragmenta<strong>da</strong>.<br />
No trabalho de proceder a uma “contextualização histórica”, aqueles autores privilegiam um<br />
dos aspectos <strong>da</strong> história, seja o político, o econômico, o cultural. O aspecto político, por exemplo,<br />
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Aula 8<br />
muitas vezes aparece como se fosse a própria história, e a educação não o fosse. Isso fica<br />
evidente na abor<strong>da</strong>gem sobre educação, com base numa periodização que tem como parâmetros<br />
os fatos <strong>da</strong> história política. Se eu, por exemplo, participasse dessa posição, certamente começaria<br />
esse período que agora estu<strong>da</strong>mos em 1964 (“Revolução” de 31 de março”), faria um corte em<br />
1985 (“fim” do regime militar, nascimento <strong>da</strong> “Nova” República) e seguiria até os dias de hoje.<br />
Ora! Essa periodização <strong>da</strong> história segundo marcos políticos já é complica<strong>da</strong> em si mesma.<br />
Primeiro, porque camufla a presença <strong>da</strong> instituição militar em to<strong>da</strong> a nossa história republicana.<br />
Segundo, mas não em ordem de importância, porque esconde que as políticas de governo<br />
desenvolvi<strong>da</strong>s ao longo do Século XX brasileiro guar<strong>da</strong>m um forte caráter de continui<strong>da</strong>de,<br />
independentemente de provir de regimes “de exceção” ou de regimes “democráticos”, políticas<br />
que não vão além <strong>da</strong> adequação do País às exigências do capital internacional.<br />
Em terceiro lugar, por ser herdeira <strong>da</strong>quela periodização <strong>da</strong> história universal elabora<strong>da</strong> no<br />
Século XIX, e que você conheceu, na Aula 3 <strong>da</strong> Uni<strong>da</strong>de I, uma história dos eventos, ou dos<br />
grandes acontecimentos, uma histoire événémentielle, como diriam os franceses, feita por heróis.<br />
Trata-se de uma história que deseduca, melhor dizendo, que educa para a submissão, a<br />
subserviência, a passivi<strong>da</strong>de dos aprendentes, porque ensina que há quem faça a história por<br />
eles.<br />
E como já entramos, nesse terceiro arrazoado, no coração <strong>da</strong> educação e <strong>da</strong> pe<strong>da</strong>gogia, eu<br />
diria que os cortes artificiais que são feitos na elaboração <strong>da</strong> periodização <strong>da</strong> história, segundo<br />
parâmetros de ordem política, impedem o observador pouco atento de perceber, por um lado, a<br />
continui<strong>da</strong>de de políticas educacionais e de projetos pe<strong>da</strong>gógicos na passagem de um regime<br />
político dito democrático (os governos populistas) para outro dito de exceção (o regime militar),<br />
e para outro, ain<strong>da</strong>, dito democrático (nova república). Vamos ilustrar?<br />
Como você sabe, no ano de 1961, entrou em vigor a primeira LDBEN brasileira. No processo<br />
de tramitação dessa Lei, já estava presente a concepção produtivista <strong>da</strong> educação, inspira<strong>da</strong> na<br />
Teoria do Capital Humano. Você já leu algo sobre essa Teoria, formula<strong>da</strong> nos anos 1950 por<br />
Theodore Shultz, e que surgiu, no período dominado pela economia keynesiana e pela política do<br />
Estado de Bem-estar Social. Você também já leu a respeito e deve saber que o nome “keynesianismo”<br />
derivou do economista John Maynard Keynes (1883-1946). A aplicação de suas idéias no campo<br />
econômico levou o mundo capitalista a superar a crise dos anos 1930 e a conhecer o que ficou<br />
conhecido como a era de ouro do capitalismo. Preconizava-se o pleno emprego. Nesse momento<br />
de euforia, porque a economia capitalista (nos grandes centros) an<strong>da</strong>va a passos largos, Shultz<br />
ensinou que a educação teria como função preparar as pessoas para atuar em um mundo em<br />
expansão, que exigia força de trabalho educa<strong>da</strong>. Pablo Gentilli, citado por Saviani (2003), diz que<br />
O processo de escolari<strong>da</strong>de era interpretado como um elemento fun<strong>da</strong>mental<br />
na formação do capital humano necessário para garantir a capaci<strong>da</strong>de<br />
competitiva <strong>da</strong>s economias e, conseqüentemente, o incremento progressivo<br />
<strong>da</strong> riqueza social e <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> individual.<br />
Ora, nos anos 1970, advinha mais uma crise no sistema capitalista, e mais uma “era de<br />
ouro” do capitalismo chegava ao final. O que fazer com a Teoria do Capital Humano? Como<br />
justificar a crença na contribuição <strong>da</strong> educação para o processo econômico produtivo se a<br />
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economia, passados aqueles quase vinte anos de euforia, não <strong>da</strong>va a resposta espera<strong>da</strong>? Recessão<br />
econômica, inflação, desemprego constituíam a nova reali<strong>da</strong>de. Pior para os países periféricos,<br />
pois os desníveis regionais agravavam-se a ca<strong>da</strong> dia. Mas era preciso manter a crença no poder<br />
<strong>da</strong> educação. Para tanto, bastava a<strong>da</strong>ptar a Teoria à nova reali<strong>da</strong>de, refuncionalizá-la. Saviani<br />
(2003), seguindo os passos de Pablo Gentili, assim se manifesta:<br />
Passou-se de uma lógica <strong>da</strong> integração em função de necessi<strong>da</strong>des e deman<strong>da</strong>s de caráter<br />
coletivo (a economia nacional, a competitivi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s empresas, a riqueza social etc.) para uma<br />
lógica econômica estritamente priva<strong>da</strong> e guia<strong>da</strong> pela ênfase nas capaci<strong>da</strong>des e competências<br />
que ca<strong>da</strong> pessoa deve adquirir no mercado educacional para atingir uma melhor posição no<br />
mercado de trabalho.<br />
Nesse novo contexto não se trata mais <strong>da</strong> iniciativa do Estado e <strong>da</strong>s instâncias de<br />
planejamento [mas do] indivíduo que terá que exercer sua capaci<strong>da</strong>de de escolha visando a<br />
adquirir os meios que lhe permitam ser competitivo no mercado de trabalho. E o que ele pode<br />
esperar <strong>da</strong>s oportuni<strong>da</strong>des escolares já não é o acesso ao emprego, mas apenas a conquista do<br />
status de empregabili<strong>da</strong>de.<br />
A partir do que foi dito até agora, você não acha que está faltando alguma coisa, que essa<br />
relação direta que a Teoria do Capital Humano estabelece entre educação (escola) e economia<br />
(trabalho) está fura<strong>da</strong>? Pois bem, isso foi percebido por muitos estudiosos e tornou-se objeto de<br />
muitos trabalhos acadêmicos. Na crítica a essa Teoria vieram, primeiro, os chamados críticoreprodutivistas.<br />
Depois, vieram os críticos dos críticos, destacando-se o brasileiro Cáudio Salm.<br />
Ca<strong>da</strong> um desses trabalhos, por melhor que sejam, sempre deixam de enxergar alguma coisa. Foi<br />
assim que outro brasileiro, Gaudêncio Frigoto, superou as críticas feitas por Salm que, por sua<br />
vez, havia superado os crítico-reprodutivistas. E agora, será que as conclusões a que Frigoto<br />
chegou sobre a crítica à Teoria do Capital Humano representam o ponto final <strong>da</strong> discussão? Sobre<br />
esse assunto existe um texto de autoria de Roberto Leher, que encontrei recentemente na<br />
Internet, sob o endereço: . É um<br />
material muito rico, por isso vale a pena conhecê-lo por completo. Nesse estudo, o autor mostra<br />
o que está por trás <strong>da</strong> Teoria do Capital Humano e dos discursos e pretensas políticas em favor<br />
<strong>da</strong> educação básica, volta<strong>da</strong> para o trabalho e a formação do ci<strong>da</strong>dão. Encontros e mais encontros,<br />
conferências e mais conferências, fóruns e mais fóruns de debates sobre educação, investimentos,<br />
reformas, novas propostas pe<strong>da</strong>gógicas. Mas, o que está por trás de tudo isso? Leher oferece<br />
uma explicação.<br />
E quanto à educação infantil, essa primeira etapa <strong>da</strong> educação básica? As posições a<br />
respeito são muitas e contraditórias. Sem pretender <strong>da</strong>r conta <strong>da</strong> questão, cito algumas dessas<br />
posições para vocês refletirem. Existem os que fazem o apanágio <strong>da</strong> educação infantil, como nas<br />
palavras de uma professora:<br />
Acredito que o termo “pré-escola seja inadequado para o século XXI. Pré pressupõe uma<br />
preparação para a escola. A <strong>Educação</strong> Infantil, na ver<strong>da</strong>de é muito mais que isso. Aqui são<br />
lança<strong>da</strong>s as bases de to<strong>da</strong>s as aprendizagens futuras.<br />
O economista Gustavo Ioship (que é ou era na época <strong>da</strong> entrevista, em 2007, consultor do<br />
Banco Mundial) assim se pronunciou:<br />
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Aula 8<br />
Ca<strong>da</strong> vez mais a <strong>Educação</strong> Infantil (ou pré-escolar) ocupa um lugar de<br />
destaque nas discussões sobre a <strong>Educação</strong> Básica no Brasil. Como o sr.<br />
avalia esse tendência? quarta-feira, 10 de janeiro de 2007.<br />
Começa a se acumular evidência sóli<strong>da</strong> de que a <strong>Educação</strong> Infantil tem impactos<br />
positivos, ain<strong>da</strong> que de magnitude não muito grande, sobre o aprendizado<br />
posterior. Assim, essa é uma tendência benéfica.<br />
Contudo, a experiência internacional demonstra que a <strong>Educação</strong> Infantil não<br />
é condição necessária para o bom aprendizado no Ensino Fun<strong>da</strong>mental. Por<br />
isso, fico preocupado que usemos a <strong>Educação</strong> Infantil no Brasil para desviar a<br />
atenção do principal, que é a melhoria do Ensino Fun<strong>da</strong>mental.<br />
Temos de parar de pensar em termos quantitativos (mais escolas, mais classes,<br />
mais anos de ensino etc.) e pensar em termos qualitativos. Temos de fazer<br />
melhor com o sistema que já está aí.<br />
O pior que pode acontecer para a educação brasileira é se firmar a conclusão<br />
de que a <strong>Educação</strong> Infantil é indispensável para a quali<strong>da</strong>de no Ensino<br />
Fun<strong>da</strong>mental, porque assim perderemos mais dez anos universalizando a<br />
<strong>Educação</strong> Infantil para, então, nos <strong>da</strong>rmos conta de que o esforço foi em vão.<br />
Fonte: . Acesso em: 19 abr. 2007.<br />
Uma pe<strong>da</strong>goga assim se expressou sobre a questão:<br />
A educação pré-escolar no Brasil é um fenômeno relativamente recente, que<br />
está sem dúvi<strong>da</strong> associado à grande participação <strong>da</strong>s mulheres na força de<br />
trabalho, assim como associado a seu acesso a oportuni<strong>da</strong>des educacionais.<br />
Dados os níveis extremamente baixos dos salários, o trabalho feminino se<br />
torna praticamente indispensável para a ren<strong>da</strong> familiar, fato a que se<br />
acrescenta o grande número de famílias de um só cônjuge, normalmente a<br />
mulher, principalmente nos setores de pior condição social. Para estas<br />
mulheres, a possibili<strong>da</strong>de de poder deixar seus filhos algumas horas por dia<br />
em um ambiente educacional protegido é um recurso de importância<br />
inestimável. Os <strong>da</strong>dos sobre quem financia a educação pré-escolar — os<br />
municípios, no atendimento às comuni<strong>da</strong>des locais, e o setor privado, no<br />
atendimento às classes médias — parecem confirmar esta interpretação sobre<br />
a função <strong>da</strong> educação pré-escolar.<br />
Menos claro é o significado <strong>da</strong> educação pré-escolar em termos propriamente<br />
educacionais. A interpretação corrente é que a educação pré-escolar prepararia<br />
as crianças para a alfabetização e o ensino de primeiro grau, reduzindo as<br />
taxas alarmantes de repetência <strong>da</strong> primeira série. No entanto, existem sérias<br />
dúvi<strong>da</strong>s sobre os custos emocionais e intelectuais de uma separação prematura<br />
entre mães e filhos. Tudo depende <strong>da</strong>s condições do lar em que a criança<br />
habita e <strong>da</strong>s condições <strong>da</strong> escola que ela freqüenta. Um sistema de educação<br />
pré-escolar bem conduzido pode compensar situações familiares pouco<br />
favoráveis, enquanto escolas e creches de má quali<strong>da</strong>de, que funcionam<br />
sobretudo como depósitos de crianças, podem prejudicar o envolvimento <strong>da</strong>s<br />
mães com a vi<strong>da</strong> intelectual e emocional de seus filhos, com sérias<br />
conseqüências para seu desenvolvimento ulterior. As poucas evidências<br />
disponíveis parecem sugerir que a educação pré-escolar não tem tido um<br />
impacto significativo na redução <strong>da</strong> repetência escolar de primeiro grau. Além<br />
disso a faixa etária de muitos dos alunos presentes — 7 anos, inclusive —<br />
sugere que o pré-escolar pode estar funcionando como uma forma disfarça<strong>da</strong><br />
de retenção para estu<strong>da</strong>ntes que não conseguem progredir na aquisição dos<br />
conteúdos culturais que a escola exige.<br />
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Estas considerações sugerem que a universalização <strong>da</strong> educação pré-escolar<br />
talvez não deva ser uma meta explícita para a educação pública brasileira,<br />
cujos problemas financeiros e administrativos mais cruciais se manifestam no<br />
nível <strong>da</strong> educação básica. Seria importante, neste contexto, distinguir com<br />
clareza as necessi<strong>da</strong>des de cui<strong>da</strong>dos infantis, para os filhos de mães que<br />
trabalham, <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong>des educacionais propriamente ditas, ain<strong>da</strong> que estas<br />
duas coisas não possam ser totalmente separa<strong>da</strong>s.<br />
Simon Schwartzman, Eunice Ribeiro Durham e José Gol. A EDUCAÇÃO NO<br />
BRASIL EM UMA PERSPECTIVA DE TRANSFORMAÇÃO. Disponível em: . Acesso em: 20 abr. 2008.<br />
E quanto a uma pe<strong>da</strong>gogia para a pré-escola:<br />
Cabe então, in<strong>da</strong>gar, a esta altura <strong>da</strong> discussão: Valeriam para a educação<br />
infantil parâmetros pe<strong>da</strong>gógicos escolares estabelecendo-se apenas<br />
diferenciais relativos à faixa etária?<br />
Minha tendência neste momento é responder que não, uma vez que a tarefa<br />
<strong>da</strong>s instituições de educação infantil não se limita ao domínio do conhecimento,<br />
assumindo funções de complementari<strong>da</strong>de e socialização relativas tanto à<br />
educação como ao cui<strong>da</strong>do, e tendo como objeto as relações educativaspe<strong>da</strong>gógicas<br />
estabeleci<strong>da</strong>s entre e com as crianças pequenas (0 a 6 anos).<br />
De fato, a multiplici<strong>da</strong>de de fatores que estão presentes nestas relações,<br />
sobretudo nas instituições responsáveis pelas crianças pequenas, exige um<br />
olhar multidisciplinar que favoreça a constituição de uma Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong><br />
<strong>Educação</strong> Infantil, e tenha como objeto a própria relação educacionalpe<strong>da</strong>gógica<br />
expressa nas ações intencionais que, diferentemente <strong>da</strong> escola<br />
de ensino fun<strong>da</strong>mental, envolvem além <strong>da</strong> dimensão cognitiva, as dimensões<br />
expressiva, lúdica, criativa, afetiva, nutricional, médica, sexual etc. Acredito<br />
que a extensão desta perspectiva pode influenciar a escola e passar a constituir<br />
uma Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong> Infância (0 a 10 anos). Mas fiquemos alertas. Por se referir<br />
a instituições educativas, to<strong>da</strong> Pe<strong>da</strong>gogia <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> Infantil traz à tona as<br />
velhas ambivalências: liber<strong>da</strong>de-subordinação, dependência-autonomia,<br />
atenção-controle, inerentes à relação infância e Pe<strong>da</strong>gogia.<br />
Vamos, agora, ao nosso último desafio?<br />
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DESAFIOS<br />
1) Retome suas leituras e os fichamentos que você já deve ter feito sobre as concepções<br />
pe<strong>da</strong>gógicas mais presentes no dia-a-dia em sua escola. Para tanto, você fez as leituras que<br />
recomen<strong>da</strong>mos, além de outras que sua curiosi<strong>da</strong>de estimulou. Além disso, você é uma pessoa<br />
atenta para o que ocorre ao seu redor, você é um bom observador.<br />
2) De posse desse material escrito, reúna-se com seus colegas - o grupo de sempre - e discutam<br />
sobre essas concepções pe<strong>da</strong>gógicas. A partir de então, elaborem 5 perguntas a ser feitas a<br />
vereadores <strong>da</strong> sua ci<strong>da</strong>de. É importante que vocês mantenham contato com os outros grupos,<br />
por duas razões. Em primeiro lugar, para que as perguntas sejam as mesmas ou, no mínimo, as<br />
mais próximas possíveis, de modo a não encher a paciência do entrevistado. Em segundo lugar,<br />
para evitar que todos procurem um ou dois vereadores, e os demais fiquem de fora. A idéia é<br />
conhecer o pensamento dominante na Câmara sobre educação.<br />
3) As perguntas são uma criação exclusivamente sua. Tenham cui<strong>da</strong>do para não ser inconvenientes<br />
com o entrevistado, que deve ser tratado com o maior respeito. Abordem-no sem preconceito,<br />
pois se ele, por acaso, não chegou a uma Universi<strong>da</strong>de como você, nem por isso deixa de ter<br />
certo nível de compreensão <strong>da</strong>s coisas, inclusive sobre educação.<br />
4) Como vocês já tiveram experiências a partir de entrevistas anteriores, sabem que as perguntas<br />
devem ser curtas, objetivas, diretas. Identifiquem os entrevistados pelos números 1, 2, 3... ou A,<br />
B, C..., nunca, pelo nome. Basta citar, na sua re<strong>da</strong>ção, o sexo e a i<strong>da</strong>de média do entrevistado.<br />
Ninguém, afora vocês, poderá identificar qualquer dos entrevistados.<br />
Não entreguem perguntas para que os entrevistados respon<strong>da</strong>m depois, por escrito. Por esse<br />
caminho, vocês não vão conseguir muita coisa.<br />
5) Agora vocês devem estar inquietos, querendo saber sobre o conteúdo dessas perguntas. Acho<br />
que não é difícil descobrir. Se você leu esta aula com bastante atenção, dá para perceber que<br />
quero saber o que os vereadores do seu município pensam sobre educação infantil e o ensino <strong>da</strong>s<br />
séries iniciais (sua importância, necessi<strong>da</strong>de social, responsabili<strong>da</strong>de do poder público municipal,<br />
funcionamento de uma creche ou pré-escola, projetos discutidos na Câmara sobre o assunto,<br />
capacitação dos professores, financiamento desses níveis de educação, satisfação <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de<br />
quanto aos serviços educacionais prestados pelo poder público municipal, propostas de melhoria<br />
quanto a esses serviços, políticas de combate à evasão e à repetência, enfim, há muito o que<br />
saber).<br />
6) Feito isso, redijam um texto que dê conta do que vocês coletaram dos entrevistados, associando<br />
sua fala a uma ou mais concepções <strong>da</strong> educação que vocês já conhecem. Tenham cui<strong>da</strong>do para<br />
não separar as coisas: o mais importante nesse desafio está em vocês demonstrarem a capaci<strong>da</strong>de<br />
de estabelecer relações. O texto deve ser feito em duas lau<strong>da</strong>s, conforme o modelo dos desafios<br />
anteriores. Não esqueçam de escrever as perguntas que vocês elaboraram e a bibliografia<br />
utiliza<strong>da</strong>.<br />
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