FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
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136 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
escolástica somente na juventude e até aos dezenove anos. O<br />
mesmo se deu com Leibnitz. Hegel não conhecia Aristóteles,<br />
como também não o conhecia Kant. Este conhecia a escolástica<br />
através de seu mestre Wolf, que, como expositor, foi "um<br />
dos mais fracos e incapazes que o mundo já deu.<br />
— Mas nega você valor a esses filósofos?, perguntou Vítor.<br />
— Isso é outra coisa. Não nego o valor deles, admiro-os<br />
até, e me debruço a estudar-lhes a obra, mas nelas encontro<br />
deficiências tais que poderiam ser perfeitamente evitadas se<br />
não desconhecessem a obra dos grandes autores do passado, e<br />
muitas das objecções que apresentam, como ainda acontece em<br />
nossos dias, já foram respondidas com séculos de antecedência.<br />
— Dizem que Bergson não conhecia Aristóteles; é verdade?,<br />
perguntou Artur.<br />
— E' em grande parte verdade, pois o que conhecia do<br />
mestre grego era pouco e insuficiente. Muitas vezes são falsas<br />
as análises que faz da doutrina do Estagirita.<br />
— Modernamente, Heidegger, afirmam que também não<br />
conhecia nada da escolástica, tornou a dizer Artur.<br />
— Também, respondeu Pitágoras. Dizem, mesmo, que a<br />
modificação que sofreu ultimamente em suas ideias se deve ao<br />
conhecimento que travou com um frade franciscano, que lhe<br />
deu obras de Duns Scot para ler. Depois disso, Heidegger modificou<br />
muito as suas opiniões.<br />
— Opiniões?... Considera você que Heidegger é um filósofo<br />
de opiniões, para seguir a sua classificação?, perguntou<br />
Reinaldo.<br />
— Se me permitirem, deixarei para o futuro, e para outra,<br />
ocasião discutir a personalidade de Heidegger, que é, sem dúvida,<br />
um filósofo de grande notoriedade hoje. Prometo, nes'sa<br />
ocasião, provar que nele predominam opiniões...<br />
— Cobrarei essa promessa, disse Reinaldo.<br />
— E eu a pagarei de bom grado.<br />
— Agora ficou claro para nós a admiração que Pitágoras,<br />
tem pela escolástica. De minha parte sempre me causou espé-<br />
FlLOSOFIAS <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 137<br />
cie que não sendo você um católico praticante expressasse sempre<br />
tanta veneração pelos filósofos católicos.<br />
— Se não sou um católico praticante, sou cristão. E se<br />
me nego a falar de temas da Igreja Católica, tenho eu minhas<br />
profundas razões. Mas o que combato, e o faço com energia,<br />
são aqueles que acusam sem estudar a obra de seus grandes<br />
autores, retrucou Pitágoras.<br />
— Para mim, tenho a impressão de que um dia você acabará<br />
papando hóstias, disse sarcàsticamente Vítor.<br />
— Não brinque você com coisas cuja seriedade não pode<br />
compreender. E' fácil, Vítor, por ignorância, dizerem-se coisas<br />
como a que você disse. Não lhe quero mal por isso, nem<br />
desejo ofendê-lo com as minhas admoestações. Peço-lhe apenas<br />
que respeite o que não sabe e não entende. Se você quiser discutir<br />
comigo esse assunto, dou-lhe um ano para estudá-lo, e<br />
depois venha dizer o que disse."<br />
— Pensa você que aceitaria essas bobagens?, Vítor estava<br />
irritado.<br />
— Vítor, respeite o que não conhece. Vá estudar primeiro,<br />
e depois fale, mas fale com segurança. Gostaria que me<br />
viesse, demonstrando conhecer profundamente o tema de que<br />
discorda, mas com argumentos sólidos, e não com razões que<br />
revelam apenas ignorância.<br />
— Perdoem-me intervir, propôs Ricardo. Mas, se discutimos<br />
assim, daqui a pouco nós nos desviaremos de nossas normas.<br />
Vítor e Pitágoras que abandonem esse ponto. Sejamos<br />
dignos. Não conhecemos os fundamentos das ideias religiosas<br />
do catolicismo. Lembremo-nos de que a Igreja teve sempre de<br />
seu lado homens conspícuos e sábios do maior valor, e que toda<br />
a nossa cultura deve a eles o melhor que possui. Não neguemos<br />
nem ofendamos o que desconhecemos. Pitágoras nesse<br />
ponto tem razão. E' necessário respeitar a crença alheia. De<br />
minha parte, assumo um compromisso de honra com os amigos:<br />
seguirei o conselho de Pitágoras. Irei estudar a escolástica, e<br />
só me porei a atacá-la depois de a conhecer.<br />
— Muito bem, Ricardo. Sua atitude é nobre, e só posso<br />
encher-me de satisfação ao ouvir as suas palavras. Assim pro-