FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
82 MÁEIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
com a máxima segurança. Anima-me apenas um desejo: vivendo,<br />
como vivo, numa época negativista e supinamente confusionista<br />
como a nossa, em que as ideias mais destructivas<br />
procuram arrastar a humanidade aos descaminhos mais trágicos,<br />
tudo farei para contribuir em favor do que possa oferecer<br />
um dique a tais pretensões. — Fêz uma pausa, e prosseguiu:<br />
— Ku creio num Ser Supremo e também que êle nos<br />
assiste nos momentos mais difíceis, e é com fé nele, e esperando<br />
o seu apoio indesmentido, que empreenderei a minha tarefa.<br />
Mas desejo que creiam que não há em mim nenhuma vaidade,<br />
ou pelo menos assim julgo, mas apenas o desejo de cooperar<br />
com meus amigos, embora num âmbito restrito, em devolver-<br />
-lhes alguma segurança, para que possam enfrentar as forças<br />
dissolventes que procuram por todos meios fazer soçobrar o<br />
homem num dos seus momentos históricos mais graves. E fêz<br />
uma pausa como se orasse. Uma palidez invadiu o seu rosto.<br />
Pouco depois ergueu os olhos, e sorriu.<br />
— Vamos, Pitágoras. Todos aqui aguardam as suas palavras,<br />
falou Artur. Os outros ficaram apenas na expectativa.<br />
— Proponho, para que tenhamos melhor êxito neste diálogo,<br />
que as objecções sejam apresentadas, logo que eu tenha<br />
exposto um fundamento da posição que aceito, a fim de impedir<br />
que o diálogo possa degenerar em assuntos accidentais ou<br />
de pouca monta. Concordam?<br />
Todos concordaram. Então Pitágoras iniciou:<br />
— Quando se fala da verdade, diz-se que ela está ou nas<br />
coisas, ou nas palavras, ou no conhecimento. Em si, todos<br />
aceitam que as coisas são o que são, e como são. Um mobilista,<br />
que afirme que tudo flui, dirá que a verdade da coisa que flui<br />
é o seu fluir. Ninguém poderá negar que o que é de certo<br />
modo não seja a sua própria verdade, porque se fosse a sua<br />
falsidade não seria o que é, e haveria contradicção. O ficcionalista<br />
dirá que a ficção é verdadeiramente ficção, e até o<br />
céptico dirá que o alguma coisa que haja, é o que é, do modo<br />
que o ser é êle mesmo. Ninguém, pois, nega que há uma verdade<br />
nas coisas, a de serem o que são e como são.<br />
E que verdade pode haver nas palavras? Uma palavra é<br />
verdadeira quando ela assinala um conceito que a ela corres-<br />
<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 83<br />
ponde. A palavra cavalo é o sinal verbal que pronunciamos<br />
e escrevemos para indicar o conceito de cavalo. Em outras<br />
línguas, podem haver outras palavras, mas o conceito é o mesmo.<br />
Neste caso, em todas as línguas tais palavras são verdadeiras<br />
quando elas se referem ao conceito que elas assinalam.<br />
Por isso pode-se dizer que há palavras falsas, quando elas não<br />
assinalam realmente o que há na intencionalidade de quem as<br />
pronuncia. São falsas as palavras de um homem que afirma<br />
cumprir alguma coisa quando a sua intenção não é o de fazê-lo.<br />
Creio que até aqui tudo está claro e não cabe objecção. Aguardou<br />
Pitágoras que alguém falasse, mas o silêncio revelava o<br />
assentimento geral. Êle, então, pôde continuar: — Uma coisa<br />
é verdadeira em si mesma porque, em si mesma, seu existir<br />
conforma-se com o que ela é. Uma palavra é verdadeira quando<br />
se conforma com o conceito que ela assinala. E a terceira<br />
verdade, a do conhecimento, da cognição, que pode ser? Um<br />
conhecimento só pode ser verdadeiro se o que o intelecto apreende<br />
é adequado, se conforma com a coisa, que é conhecida. Só<br />
se poderia dizer que um conhecimento é verdadeiro se o esquema<br />
mental desse conhecimento é adequado e conforme à coisa<br />
conhecida. Não é assim?<br />
Não se ergueu nenhuma voz em objecção. Apenas Ricardo<br />
disse:<br />
— Realmente, Pitágoras, até aqui ninguém pode discordar<br />
de ti. Estás conduzindo bem o teu exame. Já notamos o que<br />
pretendes demonstrar. As tuas teses já se evidenciam. Até<br />
aqui, de minha parte, nada tenho a objectar.<br />
— Melhor assim. E seria mesmo inútil objectar, pois não<br />
poderia ser de outro modo, uma vez que não diríamos ser verdadeira<br />
a coisa que não é ela mesma, nem verdadeira a palavra<br />
que não expressa o conceito que ela assinala, nem o conhecimento<br />
que não seja adequado e conforme à coisa conhecida.<br />
Fêz uma pausa e prosseguiu: A essa verdade, que consiste na<br />
adequação da nossa mente com a coisa, deu-se o nome de verdade<br />
lógica, assim como a verdade da coisa, de verdade ontológica,<br />
e a que está no intelecto, de verdade gnoseológica.<br />
Há alguns que negam ao conceito de verdade o de conformidade<br />
ou de adequação. A verdade seria o esplendor do pró-