FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
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MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
de argumentos racionais, que êle nega o valor à razão humana.<br />
Naturalmente, que não vou daí afirmar um dogmatismo exagerado,<br />
a ponto de reconhecer que a razão humana é sempre válida<br />
para alcançar a verdade, e é por isso que aceito que o problema<br />
crítico é legítimo, o que para um dogmático não é problema<br />
sob nenhuma forma. A pergunta que então se coloca<br />
é a seguinte: é a nossa mente apta a conhecer? E se o é, em<br />
que grau o 6?<br />
Para o dogmático não há problema, pois seria impossível<br />
investigar sobre o valor do conhecimento, porque essa investigação<br />
implica dúvida, e esta afirma a aptidão da mente a conhecer,<br />
pois duvidar é saber que não se sabe. A dúvida não<br />
pode resolver o problema, mas sim uma reflexão precisa. Os<br />
cépticos também não têm razão em suas afirmações, porque<br />
sua posição é contraditória, como já mostrei, e o estado dubitativo<br />
é puramente imaginário, porque o céptico não procede<br />
em sua vida como tal. A posição mais segura é a do exame<br />
cuidadoso que procurarei propor. Aceito que há um problema<br />
crítico, e sei que aqui todos aceitam que há.<br />
— Permita-me, Pitágoras, que perturbe um momento a<br />
sua boa exposição, mas a finalidade é atalhar longos caminhos,<br />
que acredito podem permitir que alcancemos mais facilmente<br />
o ponto de chegada. O que yocê deseja, e também eu desejo,<br />
é encontrar um critério seguro para que possamos, então, com<br />
êle, aferir o valor das nossas afirmativas, e o diálogo entre nós<br />
se torne mais seguro e mais proveitoso. Mas não há que negar<br />
que a inteligência moderna, perplexa ante as dificuldades teóricas<br />
e em face do malogro de todas as posições filosóficas, coloca-se<br />
numa atitude pessimista quanto ao conhecimento, chegando<br />
até ao negativismo mais completo. Não é verdade?, perguntou<br />
Ricardo.<br />
— Sem dúvida. E' um espetáculo que todos nós assistimos.<br />
Mas o negativismo, seja de que espécie fôr, nega-se a<br />
si mesmo.<br />
— Gostaria que me provasse o que diz, propôs Paulsen.<br />
— E não será difícil fazê-lo. Ponhamos de lado as razões<br />
de ordem histórica e psicológica que levam certa inteligência,<br />
um número bem elevado de intelectuais, a se colocarem numa<br />
<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 45<br />
posição que eu preferiria chamar de nihilista, porque na verdade<br />
tende para o nada. Há duas maneiras de filosofar: uma<br />
positiva e outra negativa. A primeira busca afirmações e coloca<br />
positividades, e sobre elas erige o edifício de uma construcção<br />
filosófica segura. A segunda posição predica a negação,<br />
a ausência de qualquer base suficiente. Mas a verdade é<br />
que o negativismo não se sustenta por muito tempo, se lhe fôr<br />
feita uma análise mais consentânea. Senão vejamos: a negação<br />
tomada em si mesma é nada, absolutamente nada. Se digo não,<br />
digo nada. Se digo não isto ou aquilo, nego isto ou aquilo. Tomada<br />
em si mesma, pois, a negação é absoluta; é relativa quando<br />
é a negação de alguma coisa. Ora o sustentáculo de tudo<br />
quanto há, aparece, surge, devem, vem-a-ser, transforma-se,<br />
transmuta-se, seja o que fôr, não pode ser uma negação pura<br />
e simples, mas somente uma negação de alguma coisa, ou seja<br />
em função de alguma coisa. Não é possível que o sustentáculo<br />
de tudo quanto há seja negativo, mas positivo. O que sustenta<br />
é uma presença, e não uma ausência total. Consequentemente,<br />
a afirmação tem de preceder necessariamente à negação; uma<br />
afirmação positiva, uma positividade tem de anteceder a tudo.<br />
E é a essa positividade que em todos os pensamentos cultos do<br />
mundo chamou-se ser. O ser é pois, de qualquer modo, antecedente<br />
a tudo; a afirmação antecede necessariamente a negação,<br />
e esta não pode ser compreendida sem aquela. Portanto,<br />
há um ser de qualquer modo, um SER que não é apenas a sigla<br />
de uma companhia de transportes, como já houve um tolo que<br />
assim o chamou, mas uma positividade, uma realidade, que antecede<br />
na ordem da eminência, na ordem cronológica, na ordem<br />
ontológica e na ordem ôntica a qualquer outro aspecto negativo.<br />
Nenhuma posição, por mais céptica que seja, poderia negar<br />
a realidade de uma afirmação, a afirmação de uma positividade.<br />
Pode o céptico negar validez ao conhecimento humano, ou<br />
pôr dúvidas sobre o mesmo; ou seja, flutuar seu pensamento,<br />
sua mente, sem decidir-se em afirmar com convicção que sabe<br />
ou que não sabe. O que, contudo, não pode fazer é afirmar a<br />
negação absoluta como fonte e origem de tudo, e terá, de qualquer<br />
modo, de partir da afirmação de que há alguma coisa<br />
sobre a qual êle desconhece o que seja, como seja, não, porém,<br />
que seja. Mesmo um louco, que tal afirmasse, estaria negando