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FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

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40 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />

que também ainda não foi dita a última palavra e há muito<br />

pano para mangas. Chegou você à conclusão de que nem tudo<br />

quanto compõe o mundo intelectual do homem é ficção, e que<br />

alguma coisa corresponde à realidade do mundo exterior, não<br />

é isso?<br />

— E' isso, sim, Paulsen; mas realmente o que ficou comprovado<br />

é que nem tudo é mentira...<br />

— . . . e que nem tudo é verdade também — interrompeu-o<br />

Paulsen.<br />

— E' isso mesmo, Paulsen. O mundo de nosso conhecimento<br />

não pode ser todo mentira, nem todo verdade. A essa<br />

conclusão chegaremos também, se seguirmos outros caminhos.<br />

E, quem sabe, talvez tenhamos de segui-los, porque sempre a<br />

dúvida, que jamais abandona o homem, em suas múltiplas investigações,<br />

termina por exigir dele que siga uma e mais vezes<br />

o mesmo roteiro. A época negativista que vivemos exige de<br />

todos essas provas continuadas. O homem moderno vive uma<br />

crise perene, e dela não sabe afastar-se por mais que o deseje.<br />

E quando nela se abisma, afunda-se na voragem do pessimismo,<br />

do desespero. Só nos salvamos quando encontramos um ponto<br />

firme, um ponto de segurança, de onde contemplamos o espetáculo<br />

do mundo.<br />

— Mas onde está esse ponto de segurança? — Perguntou<br />

Paulsen. — Se você o achou, nem todos o acharam.<br />

— E' por isso que o problema crítico se impõe, e devemos<br />

seguir o exame desse ponto cuidadosamente. Sem confiança<br />

em nossos meios de conhecimento e sem saber qual o critério<br />

dos mesmos, o seu alcance e a sua validez, estamos perdidos e<br />

ameaçados de cair no desespero.<br />

— E se eu me colocasse na seguinte posição — propôs<br />

Ricardo — de achar que não há nenhuma razão de ser na prática,<br />

porque não há nenhum conhecimento suficiente para garantir<br />

a validez dos limites ou do âmbito que possamos estabelecer<br />

à nossa capacidade de conhecer? O que diria você,<br />

Pitágoras ?<br />

— Não poderia concordar, e estou certo de que você também<br />

não concorda. A exigência se legitima porque há aí um.<br />

<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 41<br />

grande problema humano: o da validez do nosso conhecimento.<br />

Não é de admirar que muitas filosofias comecem por enfrentá-lo,<br />

pois é da validez e do âmbito do conhecimento que se<br />

poderá estabelecer o valor de uma posição filosófica, no grau<br />

em que ela se justifica. O exame, portanto, do problema crítico,<br />

é fundamental para a filosofia, pois a exigência do nosso<br />

conhecer exige que se avalie o próprio conhecimento. Como<br />

poderemos afirmar que um conhecimento é certo e válido, sem<br />

que saibamos qual o grau de certeza e de validez de nossa própria<br />

afirmação?<br />

— Mas julga que podemos situar esse problema e analisá-lo?<br />

Não seria necessário dispormos já de certezas?' E quais<br />

são essas certezas? E que validez haveria em tais certezas?<br />

O problema crítico, portanto, da validez do conhecimento, exige<br />

a validez do conhecimento, já dada previamente. Creio que,<br />

desse modo, ficamos num círculo vicioso, e toda afirmação implica<br />

uma petitio principiis, pois irá exigir que se prove o que<br />

prova.<br />

— Não pode você negar, Ricardo, que só pode partir de<br />

alguma certeza. Josias partiu da ficção. Era para êle certo<br />

que todo o operar intelectual do homem se realiza sobre ficções<br />

em relação à realidade do mundo exterior, ou à realidade das<br />

coisas. Você não quer partir de alguma certeza? Pelo menos<br />

de você mesmo, da certeza de que você existe, da certeza de<br />

que duvida, da certeza de que não tem certezas?<br />

— Bem, não seria tão ingénuo nem tolo para querer negar<br />

tudo, e colocar-me num negativismo completo.<br />

— Mas há quem nele se coloque.<br />

— Sei, e até poderia, para ajudá-lo a dialogar, colocar-me<br />

numa posição assim. Mas agora quero reconhecer que temos<br />

certezas, que tenho alguma certeza. Mas como fundar sobre<br />

ela uma validez para o problema crítico? E' este o ponto para<br />

mim mais importante. Sem isso demonstrado, todo o problema<br />

crítico perde o seu valor.<br />

— Não concordou você que é uma exigência da filosofia a<br />

colocação do problema crítico? Que sem abordá-lo, e nele tomar<br />

uma posição, toda filosofia está fadada a perder-se, a<br />

evaporar-se, a desvanecer-se ?

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