19.04.2013 Views

FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

36<br />

MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />

— Veja bem, Josias. Você não pode negar isso, a não ser<br />

que faça um apelo à loucura, e não terá nenhum valor esse<br />

apelo. Você tem de admitir que todos os universos ficcionais<br />

possíveis se fundamentam em alguma realidade que é absolutamente<br />

real, e sem mescla de nenhuma ficcionalidade.<br />

lecida.<br />

— Sem dúvida... — respondeu Josias, com a voz desfa­<br />

— E essa realidade última ou é uma só, ou são várias.<br />

Que acha?<br />

— Não sei — respondeu vacilante.<br />

— Vejamos se é a mesma ou se são muitas. Mas antes<br />

não podemos deixar de aceitar que a realidade absolutamente<br />

sem mescla de ficcionalidade, que é o sustentáculo do que somos,<br />

da qual somos uma ficção, não pode ser outra absolutamente<br />

outra, separada absolutamente de nós, porque somos<br />

sustentados por ela. Neste caso, algo há em nós, à semelhança<br />

dessa realidade, porque, do contrário, como poderíamos ser dela<br />

sem ser dela?<br />

— Aceito.<br />

— E também o mesmo se daria com todos os outros uni­<br />

versos ficcionais.<br />

— Também — era um sopro a voz de Josias.<br />

— Então entre todos os universos ficcionais haveria algo<br />

em comum: o terem uma semelhança com a realidade absoluta<br />

que os sustenta. Não é?<br />

— E\<br />

— Neste caso, entre o nosso universo ficcional e os outros<br />

universos ficcionais, também há algo em comum: o sermos à<br />

semelhança do sustentáculo.<br />

Josias concordou apenas com um leve aceno.<br />

— Então, entre o nosso universo e os outros há algo que<br />

identifica, pois o assemelhar-se é uma realidade, uma vez que,<br />

se não há tudo, tudo cairá outra vez. Temos, pois, algo em<br />

comum com os outros.<br />

— Temos.<br />

<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> :;7<br />

— E qual é o sustentáculo dessa realidade comum? Não<br />

pode deixar de ser senão um mesmo sustentáculo, porque sendo<br />

ficcionais todos esses universos ficcionais, o que os unifica é<br />

à semelhança de algo que é comum a eles, e esse algo, que é<br />

comum a eles, tem de, ser o mesmo, e o mesmo só pode ser o<br />

sustentáculo. Portanto, há um sustentáculo que é o mesmo de<br />

todos os universos ficcionais. Há, pois, uma realidade absolutamente<br />

real, que é o sustentáculo de todos os universos ficcionais.<br />

Não está certo, Josias? — Perguntou Pitágoras com<br />

insistência.<br />

Josias concordou sem força.<br />

E Pitágoras prosseguiu:<br />

— Neste caso, Josias, o nosso universo ficcional, o do<br />

homem, não é absolutamente estanque do universo do mundo<br />

exterior, e havendo entre eles algo em comum, tudo quanto o<br />

constitui, sendo à semelhança do mesmo fundamento, tudo o<br />

que há, tanto num como noutro, tem de ter uma semelhança...<br />

Josias não respondia mais. Havia uma ansiedade em todos.<br />

E Pitágoras continuou:<br />

— ..., portanto, o nosso universo ficcional não pode deixar<br />

de ser ficcional em relação ao mundo real exterior, e, assim<br />

sendo, as nossas ficções não são puras ficções, e deve haver<br />

entre ambos um ponto de realidade comum. Neste caso, o homem<br />

em alguma coisa conhece verdadeiramente o mundo real<br />

exterior. Não é a conclusão inevitável a que chegamos?<br />

Josias baixou a cabeça e desviou o olhar. Não queria responder.<br />

Mas Ricardo interrompeu o silêncio para dizer:<br />

— Seus argumentos são sólidos, Pitágoras. Estão certos.<br />

Há esse fio de realidade que ligaria, então, o mundo ficcional<br />

intelectual do homem com a realidade. Mas não é êle absolutamente<br />

a cópia fiel do outro. Há um ponto em que ambos<br />

se encontram, mas também onde ambos se separam. Não é<br />

nosso dever aceitar com honestidade essa afirmação, Josias?<br />

Josias apenas meneou inexpressivamente a cabeça.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!