FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi
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MÁEIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
— E isso continua há vinte e cinco séculos, acrescentou<br />
Artur.<br />
— Há vinte e cinco séculos, e talvez alguns mais ainda.<br />
Pois, no caso de Platão, foi o que se deu. Em seus diálogos,<br />
êle costumava falar muito dos "amigos das ideias ou formas".<br />
Esses amigos das formas eram os pitagóricos. Sócrates foi um<br />
pitagórico também, como o foram Parmênides e Anaxágoras<br />
e até Heraclito, embora tais palavras soem estranhas a muitos.<br />
Platão confirma sua filiação pitagórica na famosa sétima carta.<br />
E' esta a razão por que muitos se esforçaram tanto em<br />
negar autenticidade à mesma, mas inutilmente.<br />
— Mas, como se explica que, sendo o pitagorismo uma seita<br />
iniciática; em que o saber só é dado aos iniciados, foi Sócrates<br />
para o meio da rua discutir filosofia?, perguntou Ricardo.<br />
— Por uma razão muito simples. O que se dava na Grécia<br />
no tempb de Sócrates era algo muito semelhante ao que se<br />
dá hoje entre nós. A filosofia, até então, era apanágio dos<br />
iniciados. Mas, sábios dessa época resolveram torná-la acessível<br />
ao maior número, e nesse número havia muita gente que<br />
não merecia ter certos conhecimentos, porque o saber, nas mãos<br />
dos maus, Sjó pode servir ao mal e não ao bem. Esses sábios<br />
(em grego qophos), chamavam-se sofistas, e propunham-se ensinar<br />
a todps os conhecimentos mais vastos, em troca de dinheiro.<br />
Vendiam, assim, o que sabiam. E vendiam a mercadoria<br />
a gqsto do freguês. Dispunham-se, portanto, a dar<br />
argumentos a quantos astuciosos desejavam guindar-se aos<br />
altos postos da política. Facultavam, assim, aos manhosos<br />
meios de poderem impor-se aos olhos do vulgo como sumidades.<br />
E como os sofistas faziam uma obra perigosa e propalavam<br />
as ideias mais abstractistas e destructivas que se podem imaginar,<br />
Platão, como Sócrates, jamais se cansaram de os atacar<br />
e com uma veemência que espanta. Platão tem sempre expressões<br />
as mais duras para com os sofistas. E que fêz Sócrates?<br />
Como os sofistas se intitulavam os sábios, os homens<br />
que tinham a plenitude do conhecimento, foi para a praça<br />
pública para desmoralizá-los, e mostrar o saber que fanfarronavam<br />
era falso, era pechibesque, era moeda falsa. Como poderiam<br />
perdoá-lo pelo que fazia? Não foi difícil, lançando<br />
<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 251<br />
mão de alguns políticos, levar o povo de Atenas a cometer o<br />
maior crime que há na história: levar um sábio do porte de<br />
Sócrates à morte. Condenaram-no, como os fariseus conseguiram<br />
condenar Cristo, depois. E conseguiram açular as massas<br />
para que essas pedissem aos brados a condenação de um homem<br />
extraordinário, do mesmo modo que se fêz, séculos depois, com<br />
o Nazareno.<br />
— Tudo isso é realmente odioso e triste, disse, com mágoa,<br />
Artur.<br />
— E trágico, também, acrescentou Pitágoras. Tais crimes<br />
não sairão mais da história. E o povo de Atenas levará<br />
ferreteado o cognome de "assassino de Sócrates", como o povo<br />
de Jerusalém o de "assassino de Cristo".'<br />
E que conseguiram os sofistas, os fariseus da época? Conseguiram<br />
que o que havia de mais alto criado pelos gregos,<br />
que foi sem dúvida a filosofia, se tornasse ã força destructiva<br />
da Grécia. A filosofia viciada, prostituída pelos sofistas, corrompida<br />
por todas aquelas ideias falsas, conseguiu destruir um<br />
povo, desfazê-lo numa corrupção de ideias, que acompanha, por<br />
sua vez, a corrupção de toda a sua vida e também até dos romanos,<br />
pois estes sofreram, desde logo, a influência dessas ideias<br />
perniciosas, que desfizeram em frangalhos o que havia de positivo<br />
naquele povo. E não se pense que os cépticos, os cínicos,<br />
os epicuristas, os próprios estóicos, os sensualistas da época,<br />
enfim todos os que provieram dos sofistas não são culpados<br />
do que aconteceu aos gregos. Pois bem, justifico assim o facto<br />
de Sócrates ter ido para o meio da rua, ter ido para o mercado<br />
para denunciar, para demonstrar que tais sábios não eram tão<br />
sábios. E hoje, que assistimos a uma nova onda de sofistas,<br />
os Sócrates estão fazendo falta. E' preciso denunciar, mostrar<br />
os erros de tais sofistas modernos, desses falsos apóstolos<br />
do conhecimento, e provar que suas ideias são falsas, e que<br />
querem também destruir uma cultura, como seus irmãos do<br />
passado destruíram a grega.<br />
— Mas não será isso uma inevitabilidade da História?,<br />
perguntou Ricardo.