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FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

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222 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />

necessidade, pois não é verdade que todos os corpos sejam verdes,<br />

nem é necessariamente que os corpos verdes são verdes,<br />

tais juízos não são científicos. Os juízos analíticos, que nada<br />

aumentam ao conhecimento, são universais e necessários, e são<br />

todos a 'priori, mas também não são científicos. Resta uma<br />

terceira forma de juízos, os sintéticos a posteriori. Estes é<br />

que são científicos, porque aumentam o conhecimento. São necessários<br />

e universais, mas não decorrem da mera análise dos<br />

termos do juízo, nem são afirmados pela experiência. Decorrem<br />

de condições que estão ocultas, mas que não pendem da<br />

experiência, nem são conhecidos analiticamente, porque se trata<br />

de juízos sintéticos. São, portanto, a priori.<br />

Para Kant, a metafísica especula sobre três objectos principais:<br />

Deus, que é objecto da Teologia; a alma, que é objecto<br />

da Psicologia, e o cosmos, que é objecto da Cosmologia. Esses<br />

três objectos não são reais, mas ideais a priori, da razão pura.<br />

E como surgem para êle tais objectos? Como síntese suprema<br />

dos fenómenos internos do Ego, surge a ideia de alma; dos fenómenos<br />

do mundo, a ideia do Cosmos, o Universo, e daí a<br />

síntese das supremas condições de todas as coisas, a ideia de<br />

Deus.<br />

Conclui Kant que a metafísica é impossível porque é impossível<br />

transcender a experiência, e a metafísica quer alcançar<br />

as coisas em si. Mas convenhamos num ponto de máxima<br />

importância. Conhecia Kant a metafísica greco-romana e a<br />

escolástica? Absolutamente não. E tanto é assim que a sua<br />

classificação fundava-se apenas na que é dada por Leibnitz,<br />

através de Wolf, ou, seja, a metafísica racionalístico-leibnitziana.<br />

Daí concluir êle que a Psicologia não pode estabelecer<br />

nenhuma tese segura, certa, nem a Cosmologia pode fugir das<br />

suas famosas antinomias, nem a Teologia pode provar a existência<br />

de Deus. Rejeita, assim, o argumento ontológico, porque<br />

é, para êle, puro paralogismo; o argumento cosmológico<br />

funda-se na causalidade, que só é válida para o mundo dos<br />

fenómenos; e o argumento teológico, fundado na causa final,<br />

não chega a concluir a existência de um Deus criador, mas apenas<br />

a de um arquiteto, de um ordenador do mundo. Toda a<br />

argumentação kantiana cinge-se em mostrar a invalidade da<br />

metafísica racionalista-leibnitziana, e apenas esta.<br />

<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 22:\<br />

— Mas, a prova de que a posição de Kant é falsa não foi<br />

suficiente. De minha parte, até agora, não encontrei defeito»<br />

no pensamento de Kant. A você é que cabe demonstrar que<br />

eles existem. Mas, antes, explique-me bem como entende o fenómeno<br />

e o noumeno?<br />

— Farei a sua vontade, Josias. O fenómeno, como sabe,<br />

vem de uma palavra grega, cujo verbo é phainomenon, o aparente,<br />

o que aparece. Noumeno, vem de noeô, daí no-oumenon,<br />

o pensado, o que é em si. Nós podemos captar sensivelmente<br />

os fenómenos, mas só podemos pensar sobre o que as<br />

coisas são em si, ou melhor: o que nos aparece das coisas é<br />

o que aparece, o fenómeno. O resto permanece oculto aos sentidos,<br />

e apenas pode ser pensado.<br />

Pitágoras fêz uma pausa, e prosseguiu:<br />

— A posição de Kant, quanto à metafísica, é falsa. Não<br />

há, em mim, nenhum intuito de desmerecer a obra desse grande<br />

autor, da qual sou grande admirador, e o coloco entre os<br />

maiores de todos os tempos. Mas é preciso lembrar que<br />

Kant combatia a metafísica de Leibnitz. E a falta de certos<br />

conhecimentos da filosofia clássica não lhe facilitaram senão<br />

confusões, que vou procurar mostrar. Compreendam os amigos<br />

que a minha tarefa não é fácil, sobretudo quando me tenho<br />

de valer apenas da memória. Kant caiu no velho problema<br />

dos universais, e num aspecto que já havia sido abordado e<br />

resolvido por Aristóteles e, posteriormente, pelos escolásticos.<br />

Raciocinava Kant deste modo: se toda experiência é concreta<br />

e singular, como se podem alcançar conceitos universais? Ora,<br />

isso já demonstramos quando analisamos essa velha polémica,<br />

e mostramos a validez da abstracção aristotélica e da abstracção<br />

formal.<br />

— Acredita você que Kant ignorasse essa solução?, perguntou<br />

Ricardo.<br />

— Kant, na verdade, não trata dela nem a ela se refere.<br />

Como para mim era um homem digno, certamente ignorava<br />

essa solução, porque, do contrário, o seu silêncio só poderia ser<br />

julgado como falta de sinceridade ao medo de abordar um ponto<br />

que refutava com antecedência a sua tese, o que não aceito.

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