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FILOSOFIAS DA AFIRMAÇÃO E DA NEGAÇÃO - iPhi

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198<br />

MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />

— Isso mesmo. E permita-me acrescentar. Se olharmos<br />

para o depois, há uma possibilidade infinita de actualizações<br />

das sucessões das mutações dos seres criaturais. A criação<br />

pode existir sempre numa sucessão sem fim. E há algum absurdo<br />

aí?<br />

— Não, não há.<br />

— Pois volvamos para o antes. Não há, nem haveria<br />

absurdo em que o antes fosse também potencialmente infinito.<br />

Nós, colocados no agora, no agora da nossa consciência, podemos<br />

perfeitamente sentir o depois como potencialmente infinito,<br />

e também o antes, desde que não consideremos o tempo<br />

como um ser existente em si mesmo, o que não é. Não concorda<br />

comigo?<br />

Reinaldo fêz um longo silêncio antes de responder. Sem<br />

dúvida meditava. Olhou para Ricardo e Paulsen, como em<br />

busca de algum auxílio. Estes mostravam-se mais ansiosos pelo<br />

auxílio de Reinaldo que propriamente de virem em seu apoio.<br />

Finalmente, este respondeu:<br />

— Colocado como o faz, a sua explicação resolve uma aporia<br />

da sua concepção. Mas também vem a meu favor.<br />

— Como?<br />

— Porque, nesse caso, a matéria teria também esse antes,<br />

e esse depois, e a dificuldade que ofereceu para recusá-la como<br />

fonte e origem de todas as coisas cai por terra.<br />

— Isso não, respondeu Pitágoras, com veemência.<br />

— Como não, retrucou-lhe Reinaldo.<br />

— Não, por uma razão bem simples. O tempo não é imanente<br />

ao Ser Supremo, nem o é a criação. O Ser Supremo é<br />

transcendente a tudo isso. Mas a matéria não o é. Ela é imanente<br />

ao mundo, ao cosmos, que é uma mutação dela. Neste<br />

caso, o tempo seria da sua essência, e também a mutação, e<br />

o tempo teria positividade outra que no primeiro caso. E as<br />

mesmas dificuldades surgiriam, e os mesmos absurdos já salientados.<br />

Pitágoras olhou-o com firmeza. Reinaldo calou-se. Meditava.<br />

Ninguém vinha em seu auxílio.<br />

<strong>FILOSOFIAS</strong> <strong>DA</strong> <strong>AFIRMAÇÃO</strong> E <strong>DA</strong> <strong>NEGAÇÃO</strong> 199<br />

— Então, qual o papel do Ser Supremo na criação?, perguntou<br />

Reinaldo, sem esperanças de salvar-se da dificuldade<br />

em que se encontrava.<br />

— Penso que não deseja que eu examine a concepção criacionista,<br />

segundo as religiões. A linguagem das religiões merece-me<br />

respeito, mas é uma linguagem religiosa. Eu procuro<br />

uma linguagem filosófica, e esta se poderia reproduzir nestes<br />

termos: a criação é a revelação do supremo poder do Ser Supremo.<br />

Há um ser que pode tudo quando pode ser. E' êle o<br />

omnipotente, pois êle tem todo poder e todo poder é dele. Os<br />

seres criados são mistos de poder e de não-poder, do que têm<br />

e do que não têm, porque todo ser que é isto, é outro que<br />

outro, não é aquilo. A perfeição, nesse ser, é o que é positivamente<br />

real, existente; a deficiência, o que lhe falta, quer gradativa,<br />

quer totalmente. O Ser Supremo é o poder ser em sua<br />

potencialidade máxima. Esse ser existe. E todos vocês, sejam<br />

de que posições filosóficas forem, aceitam-no. Há, sem dúvida,<br />

um ser que tem todo o poder de ser, porque tudo quanto há,<br />

ou vem a haver, ou houve, não surgiu do nada, não foi feito<br />

de nada, mas sim de um poder que já havia, que já antecedia<br />

a todas as coisas. Todo o poder possível já está nele. Êle é<br />

todo poderoso. Podem chamá-lo como o quiserem: Deus, matéria,<br />

energia, ideia, força, Brahma, Allah, pouco importa. Mas<br />

nenhum de vós, nem o mais céptico de vós, deixará de aceitar<br />

que êle existe. Aí todos nós nos unimos, e nos encontramos.<br />

O que nos separa, o que cria as nossas divergências, está apenas<br />

na procura de qual a natureza desse ser, qual a sua essência.<br />

Mas creio (e o afirmo com toda a convicção de minha<br />

alma) que tais divergências podem ser vencidas e aplainadas,<br />

e podemos todos, todos, encontrarmo-nos no mesmo caminho.<br />

— Quererias revelá-lo um dia para nós?, perguntou humilde<br />

e sinceramente Artur.<br />

Pitágoras olhou-o com firmeza. Os olhos brilhantes e<br />

sinceros do jovem eram expectantes. Um grande sorriso invadiu<br />

o rosto de Pitágoras, um sorriso cheio de esperanças e<br />

de bondade. E foi com uma voz que saía do coração, mas sem<br />

perda de firmeza, que êle respondeu:

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