O Príncipe de Nassau - Unama

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19.04.2013 Views

— Entendeu? — Perfeitamente!, — Pois então vá. Faça tal qual eu disse... www.nead.unama.br Rodrigo saiu. João Fernandes acompanhou-o até à porta. Fora, pelo acampamento, ia o mesmo silêncio uma ou outra fogueira, muito amortecida, ainda avermelhava pelas redondezas. Somente numa barraca, que era a de Cavalcanti, distinguiam-se algumas sombras de homens que gesticulavam. João Fernandes lançou para lá um olhar comprido. E no silêncio da noite, cerrando o punho, murmurou: — Hás de pagar caro, Cavalcanti! Hás de pagar caríssimo. O madeirense tornou a entrar. E de novo, pela noite quieta, caiu um silêncio enorme. De repente, quebrando a soturnidade da hora, ecoou na solidão brusco patear de cavalo. Ouviu-se pelo acampamento súbita agitação. A sentinela bradou armas. E logo, à presença do chefe, apareceu um cavaleiro. Vinha esbaforido, anelante. Era Rodrigo Mendanha. O moço exclamou dum fôlego: — Os holandeses avançam! Há pelo mato rumores de marcha... Não terminou. João Fernandes mandou trombetear o toque de alarma. O clarim reboou seco. Imediatamente, por todo o campo foi um arranco só! Os cabos de guerra precipitaram-se fora das barraras, a espada em punho. Cerraram-se todos em redor do Chefe. Grande alarido. Lufa-lufa tumultuoso. Partiam ordens rápidas. Os soldados estenderam-se em linha de combate. Aquela presteza, aquele ímpeto no momento do perigo, mostrava claro o decidido dos ânimos. João Fernandes envaideceu-se. Montou o seu ginete, desembainhou a espada, correu vistosamente por aquelas filas de homens. Não faltava um só! Todos a postos... Foi então, diante do exército, diante daqueles soldados distendidos, que o Governador da Liberdade, desembainhando a espada, gritou com retumbância: — Soldados! O inimigo está prestes a surgir. Fui eu que vos chamei. Eu que vos arregimentei. Eu que vos conduzi até aqui. Agora, soldados, chegou o momento de vos levar a combate. Quereis seguir o vosso Chefe? Houve um momento de estupor. Nenhuma voz se levantou. João Fernandes, alto e firme, continuou teatralmente: — Quereis seguir o vosso Chefe? Tendes confiança no vosso Chefe? Dizeio, soldados! Pois, se não confiais em mim, se não quereis seguir-me, escolhei um outro que me substitua. Irei então ao vosso lado, como vosso irmão, derramar o meu sangue pela salvação de Pernambuco! Soldados: que dizeis? Das fileiras, isolada e forte, retumbou uma voz atroante: — Viva João Fernandes Vieira! 84

www.nead.unama.br Aquela voz foi a descarga elétrica. Rajadas de entusiasmo sacudiram o exército. Os soldados romperam numa algazarra delirante: — Viva! Viva! — Viva o Chefe! Viva o nosso grande chefe 32 . Em meio a esse férrido alvoroço, Rodrigo Mendanha, subitamente, varou desabalado pelo acampamento. Vinha, de novo, num galope furioso. Os soldados emudeceram. O rapaz aproximou-se de João Fernandes, perfilou-se, murmurou umas palavras atropeladas. O rosto do Governador da Liberdade iluminou-se. Com a espada na mão, bradou alto, num gesto largo: — Soldados! Deus está nos ajudando. Acabamos de ter um rebate falso! A sentinela tomou por inimigos os que vêm como amigos. Não são os flamengos, não! São os primeiros índios de Camarão e os primeiros negros de Henrique Dias que aí chegam. Vêm eles aí, atroando os matos, anunciar a chegada próxima dos dois grandes guerreiros... Surgiram na estrada vários bandos. Logo, entre berros selvagens, estrondaram mescladamente um rufar de atabaques e um troar de inúbias. Eram os índios! Eram os negros! Aqueles toques e rufos revolucionaram os soldados. Forte estremeção perpassou nas fileiras. De todas as bocas partiram gritos de festa. Dois nomes reboaram freneticamente: — Henrique Dias! — Camarão! João Fernandes, sutil e astuto, compreendeu o momento. Agarrou duma bandeira e desfraldou-a ao vento. Correu um frêmito por todos. O Governador da Liberdade reuniu os oficiais. E ali, em pleno acampamento, diante das linhas, ordenou com autoridade ao bravo Domingos Fagundes: — Vosmecê, que é o mais velho, jure, por esta bandeira, em nome dos camaradas, que hão de todos ser fiéis ao seu Rei e ao seu Chefe! A cena foi desnorteante. Não houve tempo para reflexões. O bravo Fagundes não vacilou: — Juro, por esta bandeira, que havemos de ser fiéis ao nosso Rei e ao nosso Chefe! 32 Castrioto. Todos, estendendo a mão, a uma só voz: — Juro! 85

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Aquela voz foi a <strong>de</strong>scarga elétrica. Rajadas <strong>de</strong> entusiasmo sacudiram o<br />

exército. Os soldados romperam numa algazarra <strong>de</strong>lirante:<br />

— Viva! Viva!<br />

— Viva o Chefe! Viva o nosso gran<strong>de</strong> chefe 32 .<br />

Em meio a esse férrido alvoroço, Rodrigo Mendanha, subitamente, varou<br />

<strong>de</strong>sabalado pelo acampamento. Vinha, <strong>de</strong> novo, num galope furioso. Os soldados<br />

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umas palavras atropeladas. O rosto do Governador da Liberda<strong>de</strong> iluminou-se. Com a<br />

espada na mão, bradou alto, num gesto largo:<br />

— Soldados! Deus está nos ajudando. Acabamos <strong>de</strong> ter um rebate falso! A<br />

sentinela tomou por inimigos os que vêm como amigos. Não são os flamengos, não!<br />

São os primeiros índios <strong>de</strong> Camarão e os primeiros negros <strong>de</strong> Henrique Dias que aí<br />

chegam. Vêm eles aí, atroando os matos, anunciar a chegada próxima dos dois<br />

gran<strong>de</strong>s guerreiros...<br />

Surgiram na estrada vários bandos. Logo, entre berros selvagens,<br />

estrondaram mescladamente um rufar <strong>de</strong> atabaques e um troar <strong>de</strong> inúbias. Eram os<br />

índios! Eram os negros!<br />

Aqueles toques e rufos revolucionaram os soldados. Forte estremeção<br />

perpassou nas fileiras. De todas as bocas partiram gritos <strong>de</strong> festa. Dois nomes<br />

reboaram freneticamente:<br />

— Henrique Dias!<br />

— Camarão!<br />

João Fernan<strong>de</strong>s, sutil e astuto, compreen<strong>de</strong>u o momento. Agarrou duma<br />

ban<strong>de</strong>ira e <strong>de</strong>sfraldou-a ao vento. Correu um frêmito por todos. O Governador da<br />

Liberda<strong>de</strong> reuniu os oficiais. E ali, em pleno acampamento, diante das linhas,<br />

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— Vosmecê, que é o mais velho, jure, por esta ban<strong>de</strong>ira, em nome dos<br />

camaradas, que hão <strong>de</strong> todos ser fiéis ao seu Rei e ao seu Chefe!<br />

A cena foi <strong>de</strong>snorteante. Não houve tempo para reflexões. O bravo<br />

Fagun<strong>de</strong>s não vacilou:<br />

— Juro, por esta ban<strong>de</strong>ira, que havemos <strong>de</strong> ser fiéis ao nosso Rei e ao<br />

nosso Chefe!<br />

32 Castrioto.<br />

Todos, esten<strong>de</strong>ndo a mão, a uma só voz:<br />

— Juro!<br />

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