Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
www.nead.unama.br<br />
Na carta, entre outros tópicos, o primo dizia que:<br />
“... Se admirava muito <strong>de</strong> dizerem, e escreverem, que Maurício fazia coisas<br />
muito fora <strong>de</strong> caminho, levado por conselhos dum Portuguez muito do seu peito...”<br />
Gaspar Dias levantou para Maurício olhos que fuzilavam. Mas o <strong>Príncipe</strong>,<br />
com um gesto, or<strong>de</strong>nou ríspido:<br />
— Continue!<br />
A carta <strong>de</strong>senrolava-se <strong>de</strong>ste jeito:<br />
"... Que Maurício estivesse certo que se sabia tudo o que no Brasil se<br />
passava; e lhe fazia saber que em Olânda se affirmava que elle, Maurício <strong>de</strong><br />
<strong>Nassau</strong>, tinha tres gran<strong>de</strong>s amigos portuguezes com os quaes <strong>de</strong> continuo tratava, a<br />
saber: o primeiro, era um fra<strong>de</strong> <strong>de</strong> nome Frey Manoel do Salvador; o segundo, João<br />
Fernan<strong>de</strong>s Vieira; o terceiro, Gaspar Dias Ferreira. Este último fazia-lhe<br />
emprehen<strong>de</strong>r coisas injustas e executar muitos <strong>de</strong>saforos contra os moradores; que<br />
o caminho por on<strong>de</strong> este home o levava era o interesse <strong>de</strong> ajuntar dinheiro à custa<br />
do sangue dos pobres; que este home fazia. rico ao <strong>Príncipe</strong> e se fazia rico a si...<br />
Gaspar Dias arregalava os olhos, assombrado.<br />
— Que infames!<br />
<strong>Nassau</strong>, porém, com o seu gesto ríspido:<br />
— Continue!<br />
A carta arrematava então com este capítulo arrasador:<br />
"Que tambem se dizia — e isto era o mais grave! — que a primeira e<br />
principal causa <strong>de</strong> tanta privança <strong>de</strong>ste home, havia tomado fundamento por via <strong>de</strong><br />
CERTA MULHER, pessoa mui formosa, moradora na terra...” 29 .<br />
— É fabuloso, gesticulava Gaspar Dias, chamejando; que intriga mais vil!<br />
— É alusão direta a D. Ana Pais... Exclamava Maurício.<br />
— Direta, concordava Gaspar. É alusão clara. E quem seria essa almadanada<br />
que enviou para a Holanda tanta alcovitice?<br />
Os olhos piscos <strong>de</strong> Gaspar Dias <strong>de</strong>spediam centelhas. O raposão irradiava<br />
fúria. E <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um rápido silêncio:<br />
— O forgicador <strong>de</strong>sta trama, <strong>Príncipe</strong>, é alguém que se dói por D. Ana. Para<br />
mim, francamente, só há uma pessoa... — Carlos Tourlon! Bradou Gaspar Dias.<br />
— Carlos Toulon! Confirmou o <strong>Príncipe</strong> <strong>de</strong> <strong>Nassau</strong>. É ele! Não há outro.<br />
Nisto, abrindo <strong>de</strong> novo a porta, Estrembon penetrou com violência na câmara:<br />
— D. Ana Pais está aí; precisa falar com urgência a Vossa Alteza.<br />
— Que entre!<br />
29 Frei Calado, pág. 611.<br />
74