You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
— Santo Deus! Eu aqui a palrar coisas <strong>de</strong> somenos. Vamos ao nosso caso,<br />
isso sim! Estou aqui meu nobre André Vidal <strong>de</strong> Negreiros, pronto para ouvir e servir<br />
a Vosmecê. Já falei e repito agora: Eu tenho muita honra nisso. Diga, portanto, sem<br />
rebuço tudo o que Vosmecê preten<strong>de</strong>.<br />
André Vidal, que ardia <strong>de</strong> impaciência, entrou logo em matéria:<br />
— O negócio que me traz a casa <strong>de</strong> Vosmecê, Gaspar Dias, é <strong>de</strong> carecer eu<br />
<strong>de</strong> sua ajuda...<br />
— Valha-me Deus!<br />
— De sua ajuda, sim senhor! E é isto: preciso que Vosmecê me arranje,<br />
custe o que custar, uma or<strong>de</strong>m do escolteto...<br />
— Uma or<strong>de</strong>m do escolteto?<br />
— Uma or<strong>de</strong>m do escolteto, afirmou André. Eu explico por quê. Vosmecê<br />
sabe <strong>de</strong> certo que João Blaar arrebatou da casa <strong>de</strong> D. Joana a minha Carlota<br />
Haringue.<br />
— Sei <strong>de</strong> tudo. Então?<br />
— Então, continuou Vidal, eu preciso que Vosmecê ma faça restituir. Essa<br />
menina é a minha loucura. Eu a estimo como filha. Trouxe-a pequenina, via crescer,<br />
ficou moça. Agora é noiva do Rodrigo Mendanha. Ora, como Vosmecê vê, não há<br />
tirania mais crua do que essa que os flamengos acabam <strong>de</strong> fazer: arrancar a noiva<br />
do seu noivo! E arrancá-la assim, caprichosamente, para dá-la a outro que ela nem<br />
conhece. É duro! Vosmecê há <strong>de</strong> concordar que é muito duro!<br />
Gaspar Dias ouviu aquilo, meneou a cabeça. Não respon<strong>de</strong>u palavra. Mas<br />
André, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> certa pausa, irrompeu <strong>de</strong> novo:<br />
— Por causa disso, por causa <strong>de</strong>ssa brutalida<strong>de</strong>, é que venho me recorrer a<br />
Vosmecê. Eu bem sei do seu po<strong>de</strong>r junto aos escabinos. Se Vosmecê quiser, com<br />
pequeno esforço, alcançará do escolteto a or<strong>de</strong>m do livramento. E Vosmecê não<br />
haverá <strong>de</strong> trabalhar assim <strong>de</strong> mão beijada! Longe disso! Diga Vosmecê o quanto<br />
necessita por esse trabalho: eu lhe entregarei a soma sem titubear.<br />
Gaspar Dias coçou a barbicha. Tossiu. Semicerrou os olhos...<br />
— É quanto quiser, Gaspar Dias! É quanto quiser! Exclamava André<br />
insistente e tentador. Não se embarace no pedido! Vosmecê terá tudo o que<br />
<strong>de</strong>sejar...<br />
O velho repuxão continuava a coçar a barbicha e a menear a cabeça...<br />
Enfim, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> angustioso silêncio, virou-se para o guerreiro com um sorriso dúbio:<br />
— O negócio <strong>de</strong> Vosmecê não é assim coisa tão complicada como imagina,<br />
André Vidal. Ao contrário! É tudo quanto há <strong>de</strong> mais fácil.<br />
André sentiu um alvoroço no coração. Olhou para o velho com surpresa:<br />
— Tudo quanto há <strong>de</strong> mais fácil, continuou o velhaco, sorrindo com o seu<br />
sorriso dúbio. Basta um pouco <strong>de</strong> jeito, meu amigo, um pouquinho <strong>de</strong> jeito, só isso, e<br />
Carlota estará <strong>de</strong> novo nas mãos <strong>de</strong> Vosmecê.<br />
59