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O guerrilheiro abaixou os olhos. Não sabia o que respon<strong>de</strong>r. Aquela amistosa<br />
jovialida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconcertara-o. Mas, D. Ana, muito natural, continuou com o seu sorriso:<br />
— A última vez ano nos vimos... Lembra-se, André Vidal?<br />
André Vidal estremeceu. Franziu o cenho e respon<strong>de</strong>u seco:<br />
— Não me lembro.<br />
— Ora, veja Vosmecê como são as coisas, tornou D. Ana sarcasticamente;<br />
eu me lembro muito bem!<br />
E abaixando a voz:<br />
— Ainda não me esqueci...<br />
Pieres Boninz, mestre-sala <strong>de</strong> Friburgo, entrou discretamente:<br />
— Está servido <strong>Príncipe</strong>!<br />
Os comensais, a um gesto convidativo <strong>de</strong> Maurício encaminharam-se para o<br />
comedor. Salão amplo, mesa florida, can<strong>de</strong>labros doirados nos bofetes, faianças<br />
pesadas <strong>de</strong> Delf, lacaios <strong>de</strong> jaqueta escarlate. A baixela era <strong>de</strong> prata. Aquela mesma<br />
famosa, riquíssima baixela que o rei do Congo mandara a <strong>Nassau</strong> numa embaixada<br />
que fez eco. Sentaram-se todos. Pieres Boninz fez servir as viandas. Estabeleceu-se<br />
logo, entre todos, quente cordialida<strong>de</strong>. A conversa, incendiada por vinhos capitosos,<br />
alastrou-se vivamente. O <strong>Príncipe</strong> dizia alto:<br />
— Mas como, André Vidal, Vosmecê teve a coragem <strong>de</strong> pôr a minha cabeça<br />
prêmio?<br />
Todos riram. Mas André Vidal, sem se perturbar, rindo-se como os outros:<br />
— É verda<strong>de</strong>. Cinco mil florins ofereci eu pela cabeça <strong>de</strong> Vossa Alteza Olhe<br />
que já é uma soma! E Vossa Alteza? Vossa Alteza teve a coragem <strong>de</strong> avaliar a<br />
minha na bagatela <strong>de</strong> dois mil florins. Convenhamos que o preço foi barato...<br />
Com esse bom-humor, joviais, aqueles homens <strong>de</strong>sataram a tagarelar como<br />
excelentes amigos. O assunto caiu logo sobre feitos <strong>de</strong> guerra. Maurício, que fora o<br />
vencedor <strong>de</strong> Porto Calvo, não se cansava <strong>de</strong> louvar com muitos louvores a Miguel<br />
Gilberto, <strong>de</strong>fensor daquele forte:<br />
— Valente soldado! Não me esquecerei jamais <strong>de</strong> sua bravura. O Con<strong>de</strong><br />
Bagnuolo, que era o general em chefe, já havia fugido pelo sertão...<br />
— Apesar da gota, aparteou Gaspar Dias.<br />
— Apesar da gota, tornou Maurício sorrindo. Pois mesmo assim<br />
<strong>de</strong>samparado na fortaleza, ainda se bateu como um bravo! Resistiu até o último grão<br />
<strong>de</strong> pólvora. Entusiasmei-me tanto, meus senhores, que concedi a Miguel Gilberto,<br />
quando o forte se ren<strong>de</strong>u, todas as honras; saiu com a espada em punho, morrões<br />
acesos, as caixas tocando. Foi vencido, sim; mas foi um bravo!<br />
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