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triunfadora <strong>de</strong> Loneq: fora aqui que <strong>de</strong>sembarcaram, nas suas pinaças bojudas, os<br />
soldados que ganharam para a Holanda a terra nova.<br />
Quanto sangue jorrado! Quanta <strong>de</strong>sesperada luta! Mas hoje — e o olhar do<br />
<strong>Príncipe</strong> corria ufano os longes do horizonte — mas hoje, por esse infinito além, por<br />
esse costão selvagem que o mar lambia, espumejando, tremulavam afinal, nos<br />
fortins e no velame dos patachos, as cores dos Estados! E era agora daqui, <strong>de</strong>stes<br />
brasis longínquos, que partiam para os <strong>de</strong>pósitos <strong>de</strong> Amsterdam, inundando-os,<br />
aqueles brutos galeões prenhes <strong>de</strong> açúcar macho; aqueles veleiros <strong>de</strong> garbosa<br />
mastreama, largos e sólidos, abarrotados <strong>de</strong> pau-brasil <strong>de</strong> tinta; aquelas fundas<br />
barcaças que zarpavam túrgidas <strong>de</strong> tabacos e <strong>de</strong> papagaios. Era daqui da terra<br />
nova, que ele, Maurício, mandara à pátria, todos os anos trezentos mil florins <strong>de</strong><br />
décimas, setecentos mil <strong>de</strong> pensões, afora os dois milhões <strong>de</strong> lucros na venda dos<br />
engenhos e quase seiscentos belos caravelões aprisionados.<br />
A política do <strong>Príncipe</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início do governo, fora a política <strong>de</strong><br />
conciliação. Era <strong>de</strong> ver-se os frutos <strong>de</strong>la! Que prodígio!<br />
Lá em baixo, na ilha <strong>de</strong> Antônio Vaz, florescia, nova, os telhados ainda<br />
vermelhos, aquela famosa Cida<strong>de</strong> Maurícia, o assombro da época, com o seu belo<br />
Palácio <strong>de</strong> Friburgo, com as pontes <strong>de</strong> rijo tabuado, as grossas fortalezas, roqueiras,<br />
as ruelas pitorescamente ensombradas <strong>de</strong> árvores e regadas <strong>de</strong> águas cantantes.<br />
Depois, em frente <strong>de</strong>la, o Recife; aquele Recife antigo, tradicional, on<strong>de</strong> os velhos<br />
homens da terra tinham as suas moradas alterosas <strong>de</strong> boa taipa, os tratantes ju<strong>de</strong>us<br />
as suas escuras lojas <strong>de</strong> moeda e <strong>de</strong> mercância.<br />
Lá estava, à sombra dos falcões <strong>de</strong> bronze dos fortes, a casa <strong>de</strong> pedra <strong>de</strong><br />
João Blaar, o sangrento general <strong>de</strong> Holanda. Rente <strong>de</strong>la, com as portas <strong>de</strong> rótula, a<br />
casinha <strong>de</strong> Frei Manuel do Salvador, o cura jeitoso e politicão, reinol <strong>de</strong> muitas letras<br />
e <strong>de</strong> muitas lábias. Além, toda <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira pintada, como em Flandres, a chácara <strong>de</strong><br />
Gilberto Van Dirth, flamengo apelintrado, um dos três do Conselho Político. Depois,<br />
entre coqueiros, o casarão <strong>de</strong> Gaspar Dias Ferreira, tremendo velhaco, rabulejador e<br />
patoteiro, o mais querido dos amigos do <strong>Príncipe</strong>. E não era só. Lá se viam pela<br />
cida<strong>de</strong>, chatas, nuas <strong>de</strong> enfeites, as moradas <strong>de</strong> todos os principais do país: a <strong>de</strong><br />
João Fernan<strong>de</strong>s Vieira, altíssima personagem da terra, mercante afortunado e rico; a<br />
<strong>de</strong> Antônio Bezerra, velho moedor <strong>de</strong> canas, pessoa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s teres e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
vida; a <strong>de</strong> Antônio Cavalcanti, sombrio inimigo <strong>de</strong> João Fernan<strong>de</strong>s, homem<br />
emproado, imensamente ensoberbecido do seu sangue e da sua linhagem; a <strong>de</strong><br />
Sebastião <strong>de</strong> Carvalho, lavrador <strong>de</strong> pau-<strong>de</strong>-tinta, sujeito estranho, <strong>de</strong> poucas falas,<br />
<strong>de</strong>votado parceiro dos holan<strong>de</strong>ses...<br />
Maurício, da praia, contemplava, orgulhoso, o panorama soberbo. Com um<br />
sorriso, o coração inflado, não pô<strong>de</strong> reprimir-se:<br />
Como isto é belo, Carlos Tourlon! Como é formosa esta terra! É a mais<br />
formosa terra do mundo...<br />
A tar<strong>de</strong> caíra. Tar<strong>de</strong> abafada, tar<strong>de</strong> languescedora, tropical. Ao longe, no<br />
porto, as naus adormentavam-se tranqüilas, numa doce quietu<strong>de</strong>, como pássaros<br />
enormes pousados à flor das águas. Apenas uma pinaça, velas abertas, balouçavase<br />
agitada, com muita escravaria correndo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la. O <strong>Príncipe</strong> notou aquele<br />
açodamento. E apontando para o barco:<br />
— É o patacho <strong>de</strong> Israel Voss?<br />
— É, <strong>Príncipe</strong>. Ainda está a carregar. Veleja amanhã cedo para Cabe<strong>de</strong>lo.<br />
Vai nele Segismundo Starke, levando os barris <strong>de</strong> pólvora que Vossa Alteza manda<br />
à Paraíba.<br />
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